Artigos Originais
Projetos de Intervenção em uma formação continuada: percepções e reflexões pedagógicas de Gestores escolares da Zona da Mata Mineira, Brasil
Project of Intervention in continuing training: perceptions and pedagogical reflections of School Managers in the Zona da Mata Mineira, Brazil
Proyecto de Intervención en formación continuada: percepciones y reflexiones pedagógicas de directores escolares de la Zona da Mata Mineira, Brasil
Projetos de Intervenção em uma formação continuada: percepções e reflexões pedagógicas de Gestores escolares da Zona da Mata Mineira, Brasil
Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 22, núm. 1, 2020
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
Recepción: 23 Mayo 2019
Aprobación: 07 Octubre 2019
Resumo: Neste artigo, objetiva-se identificar e analisar as percepções e as reflexões pedagógicas dos Projetos de Intervenção em uma formação continuada realizados por Gestores Escolares da Zona da Mata Mineira, Brasil. Para responder aos questionamentos da pesquisa, adota-se como perspectiva metodológica a abordagem qualitativa, utilizando a revisão de literatura e, como procedimento, a análise de documentos. Os resultados indicaram que os desafios escolares são muitos e, por mais que as escolas estejam presentes em contextos diferenciados, a abordagem de situações-problema pelos gestores é sempre muito semelhante. Com base na literatura específica e nos dados obtidos, conclui-se que os temas trabalhados extrapolam as competências e possibilidades de solução imediata no âmbito escolar.
Palavras-chave: Formação Continuada de Gestores, Projeto de Intervenção, Políticas Educacionais.
Abstract: This article aims to identify and analyze perceptions and pedagogical reflections of Intervention Projects in a continuing education program conducted by School Managers in the Zona da Mata Mineira, Brazil. To answer the research questions, the qualitative approach is adopted as methodological perspective, as well as literature review and document analysis. Results indicate that school challenges are many and, although schools are present in different contexts, management of problem situations by school managers are always quite similar. From the specific literature and data obtained, it is concluded that the themes discussed in the study surpass the skills and possibilities of immediate solutions in the school environment.
Keywords: Continuing Training of Managers, Intervention Project, Educational Policies.
Resumen: Este artículo tiene como objetivo identificar y analizar las percepciones y reflexiones pedagógicas del Proyecto de Intervención en formación continuada realizada por directores de escuela de Zona da Mata Mineira, Brasil. Para responder a las preguntas de investigación, el enfoque cualitativo se adopta como una perspectiva metodológica, utilizando la revisión de la literatura y, como procedimiento, el análisis de documentos. Los resultados indicaron que los desafíos escolares son muchos y, aunque las escuelas están presentes en diferentes contextos, la gestión de situaciones problemáticas por parte de los directores siempre es muy similar. A partir de la literatura específica y de los datos obtenidos, se concluye que los temas trabajados extrapolan las habilidades y posibilidades de solución inmediata en el entorno escolar.
Palabras clave: Formación Continuada de Directores, Proyecto de Intervención, Políticas Educativas.
1 Introdução
A análise e a identificação das percepções e reflexões pedagógicas de gestores escolares em escolas públicas municipais e estaduais foram pautadas, para a realização deste artigo, nos Projetos de Intervenção (PI)1 realizados por esses profissionais da Zona da Mata Mineira2, entre 2014 e 2015, em uma formação continuada à distância. Essa especialização, voltada especificamente para gestão escolar, foi ofertada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), concernente às políticas educacionais instituídas pelo Ministério da Educação (MEC).
Para iniciar a discussão, é importante ressaltar que essa formação específica, orientada pelo Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica (PNEGEB)3, foi interrompida abruptamente, como outras políticas educacionais de formação. O referido curso fortalecia a prática dos gestores em efetivo exercício, para que estes, junto às suas respectivas comunidades, em processo de diálogo e solidariedade, construíssem um novo padrão organizacional e gerencial da educação brasileira.
Nessa linha argumentativa, a compreensão das questões foi possibilitada pela construção dos projetos4 propostos aos gestores durante a formação. De acordo com a matriz curricular do curso, os temas a serem trabalhados deveriam abordar casos vivenciados no cotidiano escolar, ou seja, situações-problema ligadas à gestão escolar, as quais poderiam resultar em uma pesquisa-ação5, desenvolvida pelo próprio gestor dentro da sua realidade escolar.
Com essa explanação, além da análise dos projetos, buscou-se evidenciar as políticas educacionais e a formação continuada de professores e gestores a partir de 1990, que constituíram um marco importante para a educação brasileira. Acredita-se que essa formação foi relevante para a conduta desses profissionais como gestores escolares, mas que, não obstante, os temas trabalhados no PI extrapolam as competências e as possibilidades de solução imediata no âmbito escolar.
2 As Políticas Educacionais e a Formação Continuada de professores e gestores a partir de 1990
No Brasil, a partir de 1990, surgiram mudanças intensas nos âmbitos sociais, políticos, econômicos, principalmente no contexto educacional. Desde então, vivencia-se um momento no qual a formação e o conhecimento são requisitos essenciais para a qualidade do profissional da educação.
Em relação à política educacional, as decisões possuem incidência no ambiente escolar enquanto local de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, o governo propõe uma condição exclusiva no que se refere à formulação, deliberação, implementação e monitoramento do processo educacional. Azevedo (2013, p. 23) explica que “política pública é tudo o que um governo faz e deixa de fazer, com todos os impactos de suas ações e de suas omissões”.
Quanto às regulamentações e normatizações, Gatti et al. (2008) revelam que, nos anos de 1990, com o advento da LDB 9394/96, a formação continuada apresentou um crescimento exponencial, passando a ser um caminho para equacionar os problemas originários da formação inicial e ao longo da carreira dos profissionais da educação. Em um estudo mais recente, Gatti (2017) reforça que há a necessidade de se refletir sobre a formação de professores, visto que é por meio desta que se constroem caminhos para viabilizar a transformação educacional do cenário atual.
Diante desse contexto, nota-se que a demanda pela continuidade da formação, ao longo do exercício profissional, só encontra sentido uma vez alcançada a autonomia laboral, conforme elucidado por Freire (1997, p. 23): “não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro”.
Segundo Silva Júnior (2002), os anos 90 foram marcados pela luta por melhores condições de trabalho e salários dos profissionais da educação, assim como por propostas mundiais de políticas educacionais, como a Declaração Mundial de Educação para Todos, realizada em Jomtien, Tailândia.
A Declaração Mundial de Educação para Todos foi organizada pela UNESCO6, em 5 de março de 1990, estabelecendo indicadores e medidas relacionadas à formação continuada, profissão, carreira e salário, ética profissional, direitos e obrigações, seguridade social e condições mínimas para um exercício docente eficaz. O documento propiciou um crescente investimento na valorização e no desenvolvimento dos saberes dos professores, destacando-os enquanto sujeitos intelectuais capazes de produzir conhecimentos, de participar de decisões, da gestão da escola e dos sistemas, trazendo, portanto, perspectivas para a reinvenção da escola democrática (MALANCHEN; VIEIRA, 2006).
A Conferência de Jomtien funcionou como um espaço de difusão das políticas internacionais para educação. O Brasil buscou cumprir os compromissos firmados na declaração por meio do Plano Decenal de Educação para Todos:
[…] o Plano Decenal de Educação para Todos é a expressão brasileira do movimento planetário orquestrado por UNESCO, BIRD/Banco Mundial e assumido pelo Brasil como orientador das políticas públicas para a educação que resultaram na reforma educacional brasileira dos anos de 1990, realizada em todos os níveis e modalidades, com diretrizes curriculares, referenciais curriculares, Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para níveis e modalidades de ensino, produzidos estes de forma competente por especialistas – em geral pesquisadores e professores universitários – de melhores universidades e instituições de pesquisa, afinados com o compromisso assumido pelas autoridades políticas brasileiras em todas as áreas de ação do Estado, particularmente para a educação (SILVA JÚNIOR, 2002, p. 206).
Observa-se, assim, que as reformas educacionais no Brasil foram articuladas com as recomendações de organismos internacionais, com especial destaque para o Banco Mundial7 (BM), Banco Interamericano de Desenvolvimento8 (BID) e UNESCO:
[…] as reformas educacionais na América Latina, particularmente no Brasil, são uma intervenção consentida realizada pelas autoridades educacionais nos moldes das agências multilaterais, no contexto da universalização do capitalismo, direcionadas por uma razão instrumental e pela busca de consenso social geral, que se constitui no epicentro de um processo de mercantilização da esfera política, em geral, em particular da esfera educacional – lócus privilegiado para o Estado de formação do ser social, portanto, de construção de um novo pacto social. (SILVA JÚNIOR, 2002, p. 207)
A agenda dos organismos internacionais, ao analisar a realidade dos países da América Latina e Caribe em 1990, apontou uma crise nesses Estados e indicou a necessidade de um processo de reforma nessas nações. A superação da crise educacional advém da adoção de mecanismos corretivos baseados no mercado, o que significa que a educação deixa de ser compreendida como direito para ser tratada como consumo. Trata-se, portanto, “de transferir a educação da esfera da política para a esfera do mercado, negando-se sua condição de direito social e transformando-a em uma possibilidade de consumo individual, variando segundo o mérito e a capacidade dos consumidores” (GENTILI, 1998, p. 19).
Nesse contexto, as reformas educacionais implementadas no Brasil foram legitimadas por um discurso que atribuiu a crise da educação à ineficiência de aspectos específicos, como gestão, má formação dos professores, currículos inadequados, falta de insumos, entre outros. Assim, a ineficiência do Estado na administração educacional foi evidenciada, defendendo-se a necessidade da reforma associada à ideia de modernização dos sistemas.
Análises realizadas por organismos como BM, CEPAL e UNESCO afirmam, enfaticamente, a presença de um descompasso entre a educação oferecida pelos sistemas educacionais e as necessidades do mercado de trabalho; segundo os analistas dos organismos internacionais, esse descompasso traduz-se em uma situação de crise, que revela o anacronismo e a ineficácia das escolas. Considera-se que a educação é um aspecto essencial à competitividade das empresas e das nações, constituindo-se na via privilegiada para o desenvolvimento com base na equidade social. (CAMPOS, 2002, p. 2)
O governo brasileiro foi produzindo o consenso da necessidade da reforma educacional, ancorado nas críticas realizadas pelos organismos internacionais que indicavam a ineficiência do Estado como principal responsável por gerir a Educação, culpando-o pela crise no sistema educacional. Entre os aspectos defendidos pelas políticas reformadoras, cita-se o entendimento de que a intervenção estatal era prejudicial para a concretização de uma educação de qualidade.
Sob esse viés, a reforma implementada no Estado brasileiro visa adequar a educação às novas dinâmicas competitivas do mercado mundial. Com isso, busca-se também a adequação dos indivíduos à sociabilidade exigida pelo novo momento de mundialização do capital, dos pontos de vista ético e técnico-profissional.
A educação é vista como fator importante para a constituição desta nova sociabilidade e para a qualificação dos recursos humanos requeridos pelo novo padrão de desenvolvimento, no qual a produtividade e a qualidade dos bens e produtos são decisivas para a competitividade internacional, como destaca Oliveira (2005). Assim, a Teoria do Capital Humano é resgatada e, mais uma vez, a educação é considerada como um “pré-investimento”. (SILVA, 2005, p. 4)
Portanto, as reformas do Estado brasileiro nos anos de 1990 foram materializadas por leis, decretos, resoluções, pareceres, entre outros atos normativos. A aprovação da LDB, Lei 9394, de dezembro de 1996, representou o marco da institucionalização de políticas educacionais brasileiras que foram planejadas e implantadas pelo MEC e pelo governo do presidente Itamar Franco. Shiroma, Moraes e Evangelista (2007, p. 51) postulam que é importante “compreender como o governo conseguiu sancionar uma legislação que, por omitir as responsabilidades cabíveis ao Estado, não cerceia o Executivo de pôr em andamento seu próprio projeto político-educativo por outras vias”.
Voltando à questão da formação, Gatti (2017) elucida que o profissional da educação não constrói sua formação por meio da acumulação de cursos, conhecimentos ou técnicas, sendo preciso, também, considerar sua história de vida e seus valores para constituir um trabalho reflexivo e contínuo em sua prática. Dessa forma, o profissional forma sua carreira a partir de suas identidades pessoal e profissional.
Em outros termos, a identidade docente está associada ao saber social adquirido no contexto de uma formação profissional, a qual está sujeita a incorporações, modificações e adaptações advindas das fases de uma carreira, ao longo de uma história profissional, pois o educador aprende a ensinar fazendo o seu trabalho.
Adicionalmente, quanto à formação dos professores, nos anos 90 preponderavam as seguintes preocupações temáticas no âmbito escolar: "A valorização da escola e de seus profissionais nos processos de democratização da sociedade brasileira, a organização da escola; os currículos; os espaços e os tempos de ensinar e aprender; o projeto político-pedagógico; as condições de trabalho e de estudo; o trabalho coletivo e a escola como espaço de formação contínua." (LIBÂNEO, 2013, p. 80)
No cenário dessas reflexões, a UNESCO instaurou, em 1993, a Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI para identificar as tendências da educação nas próximas décadas e, em 1996, divulgou seu relatório conclusivo, denominado Relatório Jacques Delors. O documento foi elaborado por especialistas de vários países, determinando, entre outras questões, que as aprendizagens são os pilares da educação nas próximas décadas, por configurarem vias de acesso ao conhecimento e ao convívio social democrático.
Compreende-se que essa perspectiva já era uma tendência em formação há alguns anos na comunidade educacional, adotando uma nova concepção de educação escolar. Nela, redimensiona-se o papel dos professores, exigindo uma formação profissional muito superior à atual. O próprio relatório da UNESCO enfatiza a relevância do papel dos professores para a formação dos alunos e, consequentemente, a urgência de uma formação adequada ao exercício profissional, oferecendo as condições necessárias para um trabalho educativo eficaz.
Nessa perspectiva, destaca-se novamente a relação entre a formação de gestores e o seu desenvolvimento pessoal e profissional. A prática acontece de maneira indissociável da experiência de vida, e a atuação inicial se impõe como indispensável à formação continuada cujas “práticas profissionais se tornam o terreno de formação” (MARQUES, 2003, p. 194).
A formação continuada é, portanto, uma releitura das experiências que ocorrem na escola, significando uma atenção prioritária às práticas dos professores e gestores. Cabe, então, reafirmar que a formação continuada e a prática pedagógica, como condições de mudanças exigidas, são atividades articuladas e integradas ao cotidiano dos profissionais e das escolas. Nesse caso, é importante buscar coerência entre as concepções que as desenham e as ações que as revelam. Por essa razão, os elementos teóricos retomam e visam explicar as concepções referidas no presente estudo.
Gatti (2017) retrata com maestria a questão da formação continuada, já que esta é um fator importante – apesar de não ser o único – no desenvolvimento profissional docente; fatores como salário, carreira, estruturas de poder e de decisão, assim como clima de trabalho na escola são igualmente essenciais. Não se pode aceitar a explicação simplista de que basta melhorar a formação docente para que se consiga melhorar a qualidade da educação.
De acordo com Mattos (2005, p. 30), “a formação continuada é um dos aspectos importantes para reunir a teoria e a prática no contexto profissional”. Professores e gestores necessitam tornar os momentos de ensino-aprendizagem mais claros e interessantes aos educandos. Pivetta (2009) também acredita que a formação parte do próprio sujeito, ou seja, este se forma por seus próprios meios, a partir de si mesmo, ou seja, cada profissional agrega à sua prática as experiências positivas e negativas que julgar adequadas.
Destarte, a formação continuada deve ser aquela que busca alicerçar-se numa reflexão, na prática e sobre a prática, através de dinâmicas de investigação e de formação, valorizando os saberes profissionais da educação que funcionam como interlocutores. A partir dessas considerações e do breve histórico exposto aqui, observa-se que, no Brasil, a concepção e as finalidades da formação continuada de professores foram mudando ao longo do tempo de forma intrinsecamente ligada ao contexto econômico, político e social do país.
3 O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica na Universidade Federal de Viçosa e em âmbito nacional
O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica (PNEGEB) é fundamentado na concepção de que é preciso reforçar a formação dos gestores em efetivo exercício nas escolas públicas de ensino para que esses profissionais possam, conjuntamente às suas respectivas comunidades, em processos de diálogo e solidariedade, construir um novo padrão organizacional e de gestão da educação brasileira. Segundo Abrucio (2018), para se alcançar tais metas na área educacional, deve-se dar um destaque diferenciado à gestão escolar. O mesmo autor explica que estudos nacionais e internacionais revelaram que a qualificação dos gestores escolares contribui significativamente no processo de ensino e aprendizagem.
Dada a importância da complementação do trabalho do gestor, o PNEGEB surgiu para promover reflexão sobre a qualidade da educação, constituindo uma das políticas públicas para formação dos profissionais da educação básica do Ministério da Educação (MEC), iniciada no Governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010). De acordo com a Secretaria de Educação Básica (SEB), o programa advém da necessidade de se construir um processo de formação de gestores escolares que contemplasse a concepção do direito à educação escolar junto à qualidade social, baseando-se nos princípios da gestão democrática, sob o olhar da inclusão social e da emancipação humana no âmbito escolar (BRASIL, 2009).
Sob esse viés, o programa teve início em 2005, mas foi somente em 2006 que passou a ser coordenado pela SEB/MEC. O curso apresentava carga horária de 400 h, totalizando um período de três semestres, na modalidade a distância, sendo voltado para a formação continuada de dirigentes da educação básica, sobretudo a equipe gestora da escola, formada pelo diretor e vice-diretor.
Segundo Teixeira (2011), cabia à Instituição Federal de Ensino Superior (IFES) a decisão sobre o melhor formato para a oferta do curso no estado. Para tanto, cada instituição poderia consultar a Secretaria de Educação do estado e a representação regional da UNDIME9. O mesmo acontecia em relação às vagas que deviam estar dentro da possibilidade e disponibilidade de recursos humanos, de infraestrutura nos estados e dos espaços universitários públicos federais de educação para a implantação do programa.
Ressalta-se que um dos princípios básicos defendidos pelo programa na época era um olhar profundo para formação e prática do Gestor escolar, já que é por meio da ação desse profissional que poderão ocorrer participações democráticas no âmbito escolar. Essa valorização do diretor é reforçada por Paro (2011) em estudo que retrata a importância desse profissional para o bom funcionamento escolar. Segundo o referido autor, o que incomoda em relação a essa classe de profissionais é a relativa escassez, no “âmbito das investigações sobre a realidade escolar no Brasil, de estudos e pesquisas a respeito das funções e relações do gestor escolar à luz da natureza educativa das instituições escolares” (PARO, 2011, p. 766).
De acordo com documentos do MEC, a centralidade da formação dos gestores escolares no avanço da qualidade e fortalecimento da gestão democrática da educação pública necessita ser prioridade no contexto educacional. Logo, o curso de Especialização em Gestão Escolar, na perspectiva da gestão democrática da educação, deve ser orientado pelo direito à educação escolar básica com qualidade social. Assim, os componentes curriculares e a abordagem teórico-metodológica devem considerar os fatores externos e internos associados à produção e gestão das escolas.
A esse respeito, para implementação do programa, a UFV encaminhou ao Ministério da Educação (MEC) um projeto de curso e dispôs-se ao atendimento de 400 cursistas. Uma das razões que contribuiu para a instituição integrar o grupo de IFES mineiras foi, sem dúvida, a evidente demanda de formação de profissionais da educação para a área de gestão. Nesse sentido, a UFV, em parceria com o MEC, implementou oficialmente o curso de Pós-Graduação Lato Sensu (especialização) em Gestão Escolar em setembro de 2008. A iniciativa da instituição teve o apoio do Departamento de Educação e da Coordenação de Educação Aberta e a Distância (CEAD).
Em relação às inscrições para o curso, estas eram gratuitas e realizadas virtualmente. Os interessados realizavam um cadastro na plataforma PVANET10 e aguardavam um e-mail com as orientações e a solicitação de documentos para a efetivação da matrícula. Nesse caso, as vagas eram pré-determinadas pelo MEC, não sendo limitado o número de participantes por munícipio, somente por escola. No Quadro 1, elencam-se os municípios mineiros atendidos pelo programa.
Municípios atendidos pelo programa na UFV | ||
Abre Campo | Alto do Jequitibá | Alvinópolis |
Antônio Dias | Araxá | Belo Horizonte |
Betim | Bicas | Braúnas |
Cajuri | Canaã | Caputira |
Carandaí | Carangola | Carmésia |
Casa Grande | Cataguases | Coimbra |
Contagem | Cordisburgo | Dom Cavati |
Durandé | Ervália | Espera Feliz |
Governador Valadares | Guaraciaba | Guarani |
Ibirité | Ipatinga | Itamuri |
Janaúba | Juiz de Fora | Lavras |
Leopoldina | Manhuaçu | Mar de Espanha |
Mariana | Mário Campos | Matipó |
Mercês | Miradouro | Miraí |
Muriaé | Oratórios | Orizânia |
Pará de Minas | Passos | Paula Cândido |
Pedra do Anta | Pedro Leopoldo | Piedade de Ponte Nova |
Piranga | Piraúba | Pitangui |
Ponte Nova | Porciúncula | Porto Firme |
Presidente Bernardes | Raul Soares | Reduto |
Rio Casca | Rio Pomba | Rosário de Limeira |
Santana da Vargem | Santo Antônio do Grama | São Geraldo |
São Gotardo | São João do Manhuaçu | São João do Pacuí |
São João Nepomuceno | São Miguel do Anta | São Pedro dos Ferros |
Senhora de Oliveira | Sericita | Taiobeiras |
Teixeiras | Três corações | Ubá |
Urucânia | Viçosa | Visconde do Rio Branco |
Na UFV, a equipe do programa era composta por duas coordenadoras (geral e adjunta), dez professores, dez tutores presenciais, dez tutores de polo, um suporte tecnológico e três auxiliares administrativos. Dentro das áreas abrangidas pelo programa, havia um tutor de polo responsável pelo atendimento dos cursistas de sua região, de forma individualizada.
É importante salientar que, caso o total das vagas não fosse preenchido pelos gestores e coordenadores, os professores do ensino fundamental e médio, efetivos nas escolas, poderiam se matricular no curso. Vale ressalvar que, como processo de aprendizagem, essa formação continuada não era obrigatória para os gestores das escolas, mas tornava-se essencial para que o profissional tivesse consciência das dificuldades e pudesse ressignificá-las para possíveis soluções.
4 Projeto de Intervenção: um mecanismo de pesquisa-ação na escola
Nesse tópico apresenta-se uma concisa contextualização sobre o Projeto de Intervenção nessa formação específica, visto que se trata de uma pesquisa-ação colaborativa no contexto escolar. O foco principal desses projetos era contribuir para a articulação do processo de interação família/escola e toda a comunidade escolar, a fim de minimizar os problemas disciplinares e pedagógicos que a escola enfrenta cotidianamente.
Não constitui objetivo estender informações sobre a matriz curricular do curso, contudo, para explicitar sobre a análise dos PI e sua importância, faz-se necessário expor brevemente sobre a Sala Ambiente Projeto Vivencial. Nessa sala, a atividade central consistia na formulação e no desenvolvimento de um PI vinculado ao Projeto Político-Pedagógico (PPP) da escola, assumido como mecanismo fundamental para a realização da gestão democrática na educação e na escola. O trabalho do cursista nessa sala ambiente poderia ser desenvolvido desde o início do curso, articulando-se com as demais salas até o final do curso (BRASIL, 2006).
Para a elaboração dos PI, era necessário considerar as especificidades de cada escola, transcursando por etapas essenciais como: fundamentação teórica; sensibilização e mobilização da comunidade; diagnóstico da escola; planejamento; implementação e avaliação do projeto (BRASIL, 2006). Sob essas orientações, para complementação da formação dos gestores escolares, eram organizados quatro encontros presenciais na UFV, Campus Viçosa11/MG, com o objetivo de sanar as dúvidas decorrentes das atividades do curso, mas principalmente de potencializar a elaboração dos projetos, havendo, além disso, avaliações e recuperações para aqueles que não tinham obtido rendimento satisfatório. O último encontro presencial aconteceria no final da Pós-Graduação para apresentação dos PI como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).
Os encontros presenciais eram previamente estabelecidos pelo MEC e pela UFV no Plano de Trabalho com o intuito de proporcionar aos alunos um espaço de aprendizado e troca de experiências entre os profissionais. Desse modo, os cursistas poderiam tirar suas dúvidas acerca dos PI, realizar reflexões e trocar informações que não foram totalmente efetivadas virtualmente com professores e tutores.
5 Procedimentos Metodológicos
Os percursos vinculados neste estudo podem ser compreendidos pela abordagem metodológica de uma pesquisa qualitativa. Segundo Gomes (2012), essa metodologia prima pela leitura, interpretação, e aproximação das diferentes configurações que um problema de investigação assume, assim como suas possíveis dimensões de enfoque, quando se pensa na complexidade.
Lüdke e André (1986) esclarecem que a análise documental constitui valiosa fonte de informações sobre o objeto de estudo, pois revela aspectos ou complementa informações obtidas a partir da utilização de outras técnicas. Sendo uma fonte estável, os documentos podem ser consultados diversas vezes, o que possibilita a retirada de evidências que fundamentam afirmações e declarações do pesquisador. A respeito da análise bibliográfica, Gil (2006) garante que sua principal vantagem reside no fato de esta permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que quando pesquisada diretamente.
Nessa perspectiva, realizou-se um levantamento de 72 Projetos de Intervenção dos gestores do período de 2014-2015, visando identificar os principais desafios do ambiente de trabalho. A escolha temporal ocorreu pelo fato de esses projetos serem os PI mais recentes, ou seja, os últimos produzidos pelos gestores na UFV.
Para tanto, utilizou-se como método a análise de conteúdo, que, de acordo com Triviños (1995), deve ser feita por meio das seguintes etapas interligadas: pré-análise, descrição analítica dos dados e interpretação referencial. Lüdke e André (1986) salientam que a análise dos dados obtidos durante uma pesquisa de cunho qualitativo é uma tarefa imprescindível e requer muitos cuidados por parte do pesquisador.
Um aspecto relevante a ser considerado diz respeito ao número de PI ser bem menor que o número de egressos no curso. Essa questão pode ser explicada pelo fato de os trabalhos serem produzidos em equipes com no mínimo três e no máximo cinco integrantes. Isso significa que os participantes de uma mesma escola ou de um mesmo município poderiam se agrupar para a realização de um mesmo projeto.
Faz-se necessário ressalvar que o presente estudo foi submetido à análise do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Instituição Federal, havendo obtido parecer favorável à análise dos PI. Em linhas gerais, esta pesquisa primou pelo caminho investigativo, no qual os instrumentos metodológicos escolhidos serviram de apoio para o levantamento dos dados.
6 Resultados e discussões: compreensão dos contextos vivenciados pelos Gestores por meio dos Projetos de Intervenção
Para identificar e problematizar os elementos presentes nos PI selecionados, realizou-se uma sinopse geral sobre as temáticas abordadas, conforme apresentado na Tabela 1. Vale pontuar que os 72 trabalhos foram analisados na íntegra mediante o diálogo destes com a literatura disponível sobre o assunto.
Temáticas dos Projetos de Intervenção | Quantitativo dos PI | Total em % |
Inclusão | 16 | 22,2 |
Gestão Democrática | 20 | 27,7 |
Indisciplina | 18 | 25 |
Tecnologias | 8 | 11,1 |
Relação Família/Escola | 10 | 13,8 |
Total: | 72 | 100 |
Os PI que trataram sobre Inclusão tiveram por objetivo demonstrar a importância de um trabalho educacional compartilhado entre escola, família e sociedade na promoção do ensino para o aluno com defasagem de aprendizagem, seja ele especial ou não. Dessa forma, os gestores puderam constatar que as escolas pesquisadas são instituições que objetivam construir cidadãos que, mesmo possuindo diferenças, são capazes de viver condignamente em sociedade.
Esses trabalhos trouxeram como tema principal de pesquisa a Inclusão, apresentando a escola como o principal espaço de vivência, de convivência e de relações pedagógicas. Foram encontrados avanços, embora houvesse carências na realidade dessas escolas públicas, que não favorecem a diversidade e as diferenças dos alunos. Nesse contexto, destaca-se a Declaração de Salamanca, que passou a significar o marco histórico da Educação Inclusiva, transformando-se na diretriz educacional de quase todos os países (MITTLER, 2003).
Mittler (2003, p. 34) descreve a educação inclusiva como “aquela baseada em um sistema de valores que faz com que todos se sintam bem-vindos e acolhidos na diversidade”. Para o autor, o sistema escolar brasileiro tem representado apenas a abertura das portas das escolas para a educação inclusiva. No entanto, não basta aceitar o aluno na escola, é preciso inseri-lo no contexto da instituição, para que ele possa, junto aos demais, fazer parte do processo de aprendizagem e do convívio social.
Em relação aos PI que destacaram a Gestão Democrática, os gestores elencaram que a melhoria da qualidade da educação não depende somente das ações de uma gestão democrática, mas também de ações planejadas com a participação de todos os envolvidos nesse processo, levando em consideração as particularidades da escola e da comunidade na qual se insere. Desse modo, ficou evidente o excesso de dedicação como profissionais aos assuntos burocráticos e administrativos, requerendo, assim, a implementação de capacitações pautadas nas competências inerentes à função. Adicionalmente, conclui-se que, para haver uma gestão democrática, é necessário compartilhar as dificuldades e buscar resolver os conflitos juntos.
Luck (2011) reforça essa tese ao delinear que a gestão democrática propõe uma educação com relevante valor social, já que é a partir de uma ação coletiva que as mudanças acontecem. Com a participação ativa dos pais, comunidade, estudantes, professores e equipe diretiva, há um maior envolvimento de todos e, consequentemente, maior conscientização do papel de cada um, gerando mudanças na metodologia com vistas à completude do trabalho desenvolvido. Como resultado, as famílias estariam mais envolvidas no processo ensino-aprendizagem, os alunos ficariam mais interessados e participativos, e os professores motivados e atuantes, propiciando uma melhoria na qualidade da educação pública.
Segundo Luck (2011), o gestor tem como função precípua coordenar e orientar todos os esforços no sentido de que a escola como um todo produza o melhor resultado possível no atendimento às necessidades dos educandos e na promoção do seu desenvolvimento.
Na categoria Indisciplina, os resultados dos PI indicaram que essa é uma questão de alta complexidade e envolve diferentes fatores sociais, culturais, econômicos e emocionais, tornando-se mais complexa e desafiadora ao longo dos anos. Para os gestores, fica evidente que, ao ingressarem na escola, os alunos entram em contato com a cultura própria da instituição, influenciando e sendo influenciados por ela. No caso da indisciplina escolar, acredita-se que ela se manifesta no contexto da transmissão cultural por meio de fatores sociais. Os alunos, muitas vezes, resistem à cultura escolar, tentando impedir não só o trabalho da escola, como o trabalho da cultura em si.
Amado (2001) sugere que essa resistência pode ser entendida como uma fonte de indisciplina, e a escola passa a ser um local de confronto ativo, onde os alunos resistem a valores que se opõem aos seus e aos de seu grupo, dando origem ao que ele denomina de contracultura12. Assim, a indisciplina poderia ser compreendida como “resistência” às escolas e aos seus projetos.
Outra categoria que se destacou durante as análises dos PI foi Tecnologias. Nota-se que os professores compreendem a importância do uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) no processo de ensino-aprendizagem, porém a maioria deles não se sente preparada para utilizá-las em suas aulas. A conclusão dos gestores é, portanto, que existe a necessidade de participação dos professores em cursos, palestras ou pós-graduações a fim de que entendam as tecnologias e coloquem em prática os conhecimentos construídos nessa formação.
Ainda, no que diz respeito à deficiência de um olhar específico para a tecnologia nas políticas de formação de professores no interior da própria escola, Kenski (2009) revela que a conjuntura entre educação e tecnologia requer muitas discussões por parte do sistema educacional e do próprio governo, pois tais resistências merecem ser trabalhadas principalmente na formação inicial e continuada de professores, integrando as TICs nos currículos e desenvolvendo habilidades, conhecimentos e atitudes para a utilização de novas técnicas no meio educacional.
Outro tema presente nos PI é a relação Família e Escola. Foi possível perceber a hipótese de que o sucesso ou o fracasso escolar dos alunos depende, em grande parte, da participação dos pais no processo de ensino e aprendizagem por eles vivenciado, ou seja, os alunos apresentam melhor desempenho quando existe maior interação entre a família e a escola.
O contexto familiar é o primeiro espaço de socialização e é nele que o indivíduo aprenderá valores e conhecimentos que nortearão sua vida. Todavia, a escola também se encontra imersa na tarefa de educar o ser humano na medida em que o trabalho realizado pelos educadores visa ao desenvolvimento integral do indivíduo, enfatizando o trabalho pedagógico na construção de um ser preparado tanto para os saberes escolares quanto para a vida em sociedade.
Para Faria Filho (2017), a prática pedagógica dos professores e dos gestores coloca em evidência um fato: a forma e a intensidade das relações entre família e escola variam significativamente, estando relacionadas a diversos fatores, tais como estrutura e tradição de escolarização das famílias, classe social, meio urbano ou rural, número de filhos e ocupação dos pais, entre outros.
Dayrell e Nogueira (2012) acentuam que atualmente as mudanças na relação família e escola são perceptíveis. Os papéis desempenhados por cada uma delas foram redefinidos: a escola extrapolou suas funções de desenvolvimento intelectual, abrangendo as dimensões corporais, morais e emocionais da formação; e a família passou a intervir constantemente no terreno do ensino e dos processos pedagógicos de modo geral.
Nesse embate, durante as análises dos PI percebeu-se que a maioria dos gestores demonstrou preocupação com as situações que envolvem as questões pedagógicas da escola. Porém, em um único trabalho, houve a abordagem de vários assuntos, não focando na principal temática de pesquisa. Essa questão pode estar relacionada ao fato de a construção do PI ocorrer em grupo, havendo cada gestor salvaguardado uma visão diferente do seu ambiente de trabalho, ou ao fato de ser uma formação continuada em serviço, não dispondo o profissional de muito tempo para se dedicar ao estudo.
Em geral, observa-se que os temas trabalhados pelos gestores têm origem tanto dentro quanto fora da escola. Os conflitos gerados por meios extraescolares têm raiz nos problemas sociais, de sobrevivência, de qualidade de vida ou de relações familiares. No interior da escola, de outro lado, apontam-se aspectos como a indisciplina, o processo de inclusão, as dificuldades em relação à gestão democrática, o uso das tecnologias e o desinteresse do aluno, entre outros.
Assim sendo, situações-problema importantes foram reveladas nos PI, deixando explícito que a educação brasileira sofre com diversas complicações e carências de origem socioeconômica e política.
Atesta-se que os temas trabalhados extrapolam as competências e as possibilidades de solução imediata no âmbito da escola, o que significa que, ainda que os problemas sejam solucionados, a longo prazo, outros surgirão, daí a necessidade de uma formação constante, pois o conhecimento é inesgotável e exige renovação na contemporaneidade.
7 Considerações Finais
Na parte do estudo em que foram apresentadas as políticas de educação implementadas no Brasil, observou-se que elas são resultado das transformações decorrentes dos processos de reestruturação e manutenção do sistema capitalista mundial. Nesse contexto, destaca-se o papel do Banco Mundial (BM), o qual revela sua preocupação com a formação do quadro de professores da educação básica, a fim de disseminar suas ideias, perpetuando o projeto de dominação sobre os países periféricos.
Em relação às análises dos PI, os que trataram sobre Inclusão Escolar tiveram como objetivo demonstrar a importância de um trabalho educacional compartilhado entre escola, família e sociedade na promoção do ensino para o aluno com defasagem de aprendizagem, seja ele especial ou não. Os cursistas/gestores compreenderam por meio dessa temática que a escola é um local que objetiva construir cidadãos, ainda que possuindo diferenças, capazes de viver condignamente em sociedade, sendo, para isso, a participação da família na formação de seus alunos de fundamental importância.
Verificou-se também, em relação à Gestão Democrática, que muitas mudanças vêm ocorrendo e que todos os gestores entenderam o real sentido do trabalho democrático. Somente em um dos PI, os profissionais descreveram que, por mais que compreendessem esse processo, sentiam dificuldades em colocar em prática o princípio democrático no ambiente escolar. Não se pode ignorar, porém, que um dos maiores problemas encontrados no processo de gestão democrática está principalmente na transformação do pensamento daqueles que atuam nessas instâncias superiores.
Para os autores sobre os PI de Indisciplina, o estudo apontou que as atitudes indisciplinares não possuem origem no ambiente escolar e sim em grupos externos, como a família e a sociedade em geral. Assim, urge a necessidade de se realizarem medidas socioeducativas em conjunto com órgãos e instituições de influência social, não somente aos educandos, mas também a toda a sociedade, a fim de buscar possíveis contribuições para as questões indisciplinares.
Cabe ressaltar também os problemas relatados com as Tecnologias, já que é por meio dessa ferramenta que o curso foi realizado. Inicialmente, os cursistas abordaram a dificuldade em compreender como funcionavam as salas ambientes, os fóruns e as postagens das atividades. Nessa ambiência, é inegável que as tecnologias assumem cada vez mais um espaço de destaque na sociedade contemporânea, tornando-se imprescindíveis pesquisas que analisem a implantação das tecnologias nas escolas municipais e estaduais públicas, especialmente no que diz respeito à formação continuada dos profissionais das escolas e ao uso dessa ferramenta como instrumento didático.
Os PI que abordaram a relação Família e Escola na contemporaneidade reforçam que um dos principais problemas na educação das crianças e dos jovens é o afastamento das famílias das escolas. Os relatos nos projetos reforçam que as relações estabelecidas entre família e escola ocupam um espaço importante no âmbito educacional, já que as duas entidades são as principais responsáveis pela formação integral do indivíduo, cada um desempenhando papéis distintos, embora complementares, na educação que é oferecida para a criança ou adolescente.
A partir do levantamento dos Projetos de Intervenção, conclui-se que o curso de Especialização em Gestão Escolar, proposto pelo MEC, trata os aspectos teóricos em articulação com problemas concretos vivenciados no espaço escolar. Percebe-se que os desafios escolares são muitos e, por mais que as escolas possuam espaços e culturas diferenciadas, a abordagem de situações-problema pelos gestores é sempre muito semelhante.
Do mesmo modo, notou-se a importância de uma formação específica dos profissionais da gestão para o bom desempenho da instituição escolar. Nessa perspectiva, o estudo de Abrucio (2018) sobre “As Singularidades da Gestão educacional” reforça essa questão ao enfatizar que a formação de diretores escolares é estratégica para o país, visto que grande parte desses profissionais é formada por professores que se deslocam para funções gestoras, sem possuírem, contudo, as competências necessárias para o cargo. Assim, espera-se que ocorram investimentos em programas de formação em gestão escolar para conjugar a transmissão de conteúdos com o aprendizado prático trabalhado na própria escola, sem intercorrer retrocessos ou marasmos que permeiam as políticas de formação na atualidade.
Por fim, a partir dos pressupostos teóricos e das análises apresentadas neste estudo, pode-se asseverar que não basta oferecer formação continuada a esses profissionais, é necessário também construir coletivamente caminhos e alternativas em prol do crescimento humano e profissional de todos, avaliando constantemente as práticas profissionais regentes na escola. Nesse sentido, a democratização da gestão escolar implica a superação dos processos centralizados de decisão e a vivência da gestão colegiada cujas decisões devem nascer de discussões coletivas, mediante o envolvimento de todos os segmentos escolares em um processo pedagógico.
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Notas
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