ARTIGOS ORIGINAIS
Investigação experimental do movimento de um corpo sobre trajetórias com diferentes perfis: reta inclinada, parábola e cicloide
Experimental investigation of a body movement on trajectories with different profiles: inclined line, parabola and cycloid
Investigación experimental del movimiento de un cuerpo sobre trayectorias con diferentes perfiles: línea inclinada, parábola y cicloide
Investigação experimental do movimento de um corpo sobre trajetórias com diferentes perfis: reta inclinada, parábola e cicloide
Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 22, núm. 2, 2020
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
Recepción: 30 Octubre 2019
Aprobación: 16 Junio 2020
Resumo: Este trabalho foi desenvolvido sob a metodologia de Ensino por Investigação tomando por base os pressupostos da Teoria da Aprendizagem Significativa. Nosso objetivo foi investigar a eficácia do uso de um experimento simples no auxílio do ensino-aprendizagem de conceitos e grandezas da mecânica newtoniana. A prática experimental permitiu não somente a observação do fenômeno como também a aquisição de dados com auxílio do aplicativo de celular Lexis Audio Editor. A interdisciplinaridade entre a Física e a Matemática se fez presente ao projetarmos um aparato cujas vias são em formas geométricas conhecidas: reta, parábola e cicloide. O produto foi aplicado a uma turma do 1o ano do ensino médio da rede pública estadual da cidade do Rio de Janeiro. Foi observado que a atividade possibilitou mudança conceitual levando os estudantes a reconstrução e ampliação de suas aprendizagens. Eles também desenvolveram habilidades experimentais, tão relevantes na formação básica do ensino formal.
Palavras-chave: Ensino de física, Atividade experimental, Aprendizagem significativa.
Abstract: This study was conducted under the Research Teaching methodology, based on the assumptions of the Theory of Meaningful Learning. Our objective was to investigate the effectiveness of using a simple experiment to aid the teaching-learning of concepts and magnitudes in Newtonian mechanics. The experimental practice allowed not only the observation of the phenomenon, but also the acquisition of data with the aid of the Lexis Audio Editor mobile application. The interdisciplinarity between Physics and Mathematics was present when designing an apparatus in which these familiar geometric shapes were used: line, parabola and cycloid. The product was applied to a class in the 1st year of a public High School in the city of Rio de Janeiro. It was observed that the activity enabled conceptual change, allowing students to reconstruct and expand their learning. They also developed experimental skills considered to be quite relevant to basic training in formal education.
Keywords: Physics teaching, Experimental activity, Meaningful learning.
Resumen: Este trabajo fue desarrollado bajo la metodología de Enseñanza por Investigación basada en los supuestos de la Teoría del Aprendizaje Significativo. Nuestro objetivo fue investigar la efectividad del uso de un experimento simple para ayudar a la enseñanza-aprendizaje de conceptos y magnitudes de la mecánica newtoniana. La práctica experimental permitió no solo la observación del fenómeno, sino también la adquisición de datos con la ayuda de la aplicación móvil Lexis Audio Editor. La interdisciplinariedad entre Física y Matemáticas estuvo presente al diseñar un aparato cuyos caminos tienen formas geométricas conocidas: recta, parábola y cicloide. El producto se aplicó a una clase del primer año de secundaria en la red pública estatal de la ciudad de Río de Janeiro. Se observó que la actividad permitió un cambio conceptual que llevó a los estudiantes a reconstruir y ampliar su aprendizaje. También desarrollaron habilidades experimentales, que son tan relevantes para la formación básica de la educación formal.
Palabras clave: Enseñanza de física, Actividad experimental, Aprendizaje significativo.
1 Introdução
Num mundo repleto de informações a escolha de quê e como ensinar em sala de aula não são tarefas fáceis. São tantos assuntos novos, abordados em milhares de trabalhos científicos publicados por ano, que se dificulta a atualização até mesmo para um cientista dentro de sua própria área de pesquisa. Além disso, a evolução tecnológica vem caminhando a passos largos nestas últimas décadas, criando dispositivos inovadores, na maior parte das vezes, facilitadores de tarefas do cotidiano, assim como artefatos altamente complexos desenvolvidos para prevenção da saúde humana. Desse modo, deseja-se que os conteúdos curriculares a serem trabalhados com os alunos acompanhem, em parte, as novas descobertas, mas ao mesmo tempo não podem perder de vista a fundamentação básica de cada esfera do saber.
Não somente o conhecimento a ser ensinado definirá a democratização de oportunidades para o aprendiz, como também a forma de ensinar permitirá o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico. Esses dois itens irão prepará-lo para o mundo do trabalho, sua sociabilidade e cidadania. Nesse sentido, o ensino desenvolvido nos espaços formais de educação deve despertar no discente o permanente desejo por novos aprendizados, mesmo após o término da formação básica, como conclama a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9.394/96 (LDB) (BRASIL,1996).
Ao refletir sobre a complexidade dessas relações e na gama de possibilidades a serem postas em sala de aula, a Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro, no ano de 2012, criou o currículo mínimo (RIO DE JANEIRO, 2012). Esse documento tem o objetivo de nortear as escolas e professores da rede de ensino público sobre quais são os conteúdos relevantes dentro de uma abordagem simplificada em cada disciplina.
No que se refere ao ensino de Física, para o primeiro ano do ensino médio, o conteúdo de Cinemática permite a seguinte ênfase “[...] É importante que os alunos aprendam conceitos básicos associados aos movimentos dos corpos, mas é dispensável o estudo detalhado do formalismo matemático das funções dos movimentos.” (RIO DE JANEIRO, 2012, p. 3). O documento vai além, acrescentando algumas sugestões das habilidades e competências a serem trabalhadas nesta série escolar:
- Perceber a relação entre causa e efeito, movimento e transformação de estado e as leis que regem o movimento. - Caracterizar causas ou efeitos dos movimentos de partículas, substâncias, objetos ou corpos celestes. - Compreender fenômenos naturais ou sistemas tecnológicos, identificando e relacionando as grandezas envolvidas. Reconhecer a diferença entre massa e peso e suas unidades de medida (RIO DE JANEIRO, 2012, p. 5).
Assim, o trabalho a ser exposto neste artigo foi elaborado a partir dessas proposições. Foi baseado na Teoria da Aprendizagem Significativa (AUSUBEL; NOVAK; HANESIAN, 1980) e utilizou a metodologia de Ensino por Investigação (CARVALHO, 2013, p. 1). Para tal, elaborou-se uma sequência didática objetivando o ensino-aprendizagem de alguns conceitos, princípios e grandezas da mecânica newtoniana (HEWITT, 2015), que fora aplicada a alunos do 1º ano do Ensino Médio de uma escola pública do Rio de Janeiro.
As perguntas de pesquisa tomaram a seguinte forma: O formato da trajetória influencia no tempo de percurso de um corpo sujeito a ação da gravidade? O menor tempo de descida de um corpo pode ser obtido através de um percurso mais longo? A velocidade média deste corpo pode ser maior se a distância percorrida for maior? Qual é a influência da massa do corpo sobre a velocidade média, sobre as energias potencial e cinética? Para aprendizagem desse conteúdo e compreensão dessas perguntas, aplicamos uma atividade experimental elaborada com material de baixo custo, que aborda aspectos fenomenológicos da cinemática e da dinâmica newtoniana, assim como permite aquisição de dados de grandezas físicas elementares: tempo, espaço e massa. Na atividade experimental foi utilizado o aplicativo de celular Lexis Audio Editor como instrumento de medida do tempo.
Um outro aspecto relevante da nossa proposta é a presença da interdisciplinaridade (ARTEMANN; ZIMMERMANN, 2007; SANTIAGO; ARENAS, 2018) entre os conteúdos de Física e os da Matemática, ao projetar um aparato cujas vias são em formas geométricas conhecidas: uma reta, uma meia parábola e uma meia cicloide.
2 Referências teórico-metodológicas
Este trabalho foi desenvolvido sob a metodologia de Ensino por Investigação (EI) (CARVALHO et al., 2013), tomando por base os pressupostos da Teoria da Aprendizagem Significativa (TAS) de Ausubel, Novak e Hanesian (1980). A metodologia de EI preocupa-se de como e de que modo, o professor deve atuar em sala de aula para que os alunos construam seus aprendizados, enquanto que a TAS preocupa-se em interpretar, de maneira geral, como ocorrem os processos cognitivos nos indivíduos. Pela metodologia de Ensino por Investigação, Brito e Fireman (2018) apontam que
O ensino de Ciências implica trabalhar os conteúdos científicos em sala de aula em forma de problemas que considerem procedimentos como: teste de hipóteses, controle de variáveis, observação de evidência, sistematização de resultados coletivamente. Em outras palavras, implica em trabalhar o ensino de Ciências por investigação, que se constitui em uma perspectiva capaz de tornar o conteúdo mais interessante ao passo que permite ao aluno aprender Ciências por meio de suas próprias ações criativas. (BRITO; FIREMAN, 2018, p. 463).
Consequentemente, essa metodologia oportuniza aos alunos não somente aprender conteúdos científicos, mas compreender como as Ciências e seus métodos são feitos, ampliando pedagogicamente o papel da atividade científica, e dando luz onde sempre esteve: como parte integrante da atividade sociocultural humana. Entretanto, não se espera que os alunos, de pronto, irão se comportar como cientistas, como cita Carvalho,
O que se propõe é muito mais simples - queremos criar um procedimento em sala de aula de Ciências de tal forma que possamos ensinar (conduzir/mediar) os alunos no processo (simplificado) do trabalho científico para que possam gradativamente ir ampliando sua cultura científica, adquirindo, aula a aula, a linguagem científica… se alfabetizando cientificamente. (CARVALHO, 2013, p. 9).
Por outro lado, não se almeja que os conteúdos científicos propostos consigam abarcar questões sociais importantes e atuais, mas espera-se que aos poucos a interdisciplinaridade (ARTEMANN; ZIMMERMANN, 2007; KAWAMURA, 2003) aconteça e seja estimulada onde possa ser apresentada e debatida.
No EI “qualquer que seja o tipo de problema escolhido, este deve seguir uma sequência de etapas visando dar oportunidade aos alunos de levantar e testar suas hipóteses, passar da ação manipulativa à intelectual estruturando seu pensamento.” (CARVALHO, 2013, p. 10). O problema experimental é o que normalmente estimula a participação dos alunos, e em parte, a nossa escolha por uma sequência didática que contivesse uma atividade experimental foi ponderada por este aspecto, entre outros motivos.
A teoria de Aprendizagem Significativa (MOREIRA, 2011) estabelece os marcos responsáveis pela construção da cognição humana. Nela, destacam-se três condições essenciais e iniciais para que a aprendizagem possa acontecer.
A primeira condição necessária é a existência de subsunçores1 para que o processo ocorra. Portanto, o professor, antes de iniciar a prática de um novo conteúdo, necessita verificar os conhecimentos prévios dos seus estudantes sobre a temática que pretende ensinar. Para que a aprendizagem significativa aconteça é necessário a existência de subsunçores onde o novo conhecimento seja ancorado. Conforme a teoria da Aprendizagem Significativa, “os significados são construídos cada vez que o aluno estabelece relações substantivas entre o que aprende e o que já conhece. Por isso, a maior ou menor riqueza na produção desses significados dependerá das relações que o aluno for capaz de estabelecer.” (ZÔMPERO; LABURÚ, 2010, p. 13). Para a TAS, a aprendizagem se dá por ampliação da estrutura cognitiva, em que a construção de novos conceitos depende da inter-relação com os existentes, onde este novo conhecimento vai ser ancorado. Se a aprendizagem significativa aconteceu, o aprendiz consegue explicitar determinado conteúdo segundo sua própria oratória, mostrando clareza, precisão e diferenciação de significados, ampliando assim, sua linguagem. A segunda se refere ao interesse dos estudantes em aprender o conteúdo a ser ensinado em sala de aula, em outras palavras, precisam estar mobilizados a se engajarem nas atividades didáticas. Sem o interesse pessoal por aquilo que se apresenta em sala de aula, o aprendiz não relacionará a nova informação aos seus conhecimentos prévios relevantes para que ocorra a construção do novo conhecimento.
E por último, cabe ao professor desenvolver um material de aprendizagem potencialmente significativo. Segundo Moreira (2011), "quando o material de aprendizagem não é significativo (não relacionável de maneira substantiva e não-arbitrária à estrutura cognitiva), não é possível a aprendizagem significativa. … do ponto de vista ausubeliano não foram modificados os subsunçores existentes…"
Assim, um determinado conteúdo, apresentado através de um material significativo, vai se relacionar com os conhecimentos prévios presentes na estrutura cognitiva do aprendiz. Não são quaisquer subsunçores, mas especificamente os relevantes nos quais a nova aprendizagem será acomodada. Desse modo, a construção da aprendizagem acontece de maneira não arbitrária. A substantividade vai ampliar o arcabouço de ideias e relações na mente do indivíduo, de modo que ele criará condições para expressá-las a partir da sua própria linguagem, com seus próprios signos, ou grupo deles.
O EI se conecta perfeitamente com TAS, porque permite a socialização entre os estudantes, a interação do estudante com o professor e a interação do estudante com o material didático no desenvolvimento da tarefa. Segundo Belmont (2016, p. 82), "independentemente das estratégias de ensino e dos recursos instrucionais escolhidos pelos professores, as situações propostas devem instigar o pensar com e sobre o conhecimento, estimulando a interação entre os alunos, deles com o conteúdo e como professor, como propõe Gowin (1981)."
A seguir serão discutidos brevemente os conceitos de tempo de percurso em trajetórias curvilíneas, em especial, a curva chamada braquistócrona, que está presente no aparato experimental.
3 A curva Braquistócrona
A Braquistócrona é o nome dado a curva que une dois pontos posicionados a diferentes alturas no mesmo plano vertical, sobre a qual um corpo sujeito ação da gravidade a percorre no menor tempo possível ao partir do repouso. Historicamente, descobrir qual o perfil da curva que apresentasse esse aspecto instigou estudiosos renomados do século XVII: o Sr. Isaac Newton, Leibinz, L´Hôpital e os irmãos Bernoulli. Em pouco tempo, por diferentes caminhos (ANDRADE; FERREIRA FILHO, 2015), eles chegaram à conclusão que a curva procurada era a cicloide. Para tal propósito, alguns utilizaram o cálculo variacional, que àquela época ainda não estava bem estabelecido, enquanto Johann Bernoulli usou uma analogia com o Princípio de Fermat da Óptica (HECHT, 1991, p. 94). Curiosamente a cicloide não é a curva com o menor comprimento, no entanto ela é a que permite minimizar o tempo de descida do corpo. Outra propriedade surpreendente que a cicloide tem é o tautocronismo: o corpo sempre demorará o mesmo intervalo de tempo para atingir o nível inferior da trajetória, independente da sua posição inicial sobre a pista. Esses fenômenos são explicados pelo fato de o vetor aceleração resultante, que age sobre o corpo, ter módulo igual à aceleração da gravidade e apontar na direção do centro da circunferência que gera a cicloide (ANDRADE; FERREIRA FILHO, 2015).
A curva cicloide pode ser construída a partir de um ponto que pertence a uma circunferência. Esse ponto vai descrever uma curva cicloide quando a circunferência executa um giro completo sem deslizar sobre a superfície até atingir novamente a posição inicial (Figura 1).
Atualmente, a braquistócrona é empregada em diversos fins no nosso dia a dia, por exemplo, na pista de skate halfpipe. Nos campeonatos de skate dessa modalidade, o atleta tem um intervalo de tempo predefinido para se apresentar, então é importante que ele não perca tempo na parte baixa da pista, para poder produzir mais manobras aéreas no cume das laterais da pista. Por esses aspectos, a pista de skate halfpipe tem formato de cicloide, justamente para que o atleta chegue à posição inferior em menos tempo e tenha velocidade média grande durante o contato com a pista. Em Arquitetura, estruturas em formato de cicloide são empregadas na construção de teto, facilitando assim, o direcionamento da iluminação para o centro da curva quando desejado (VENCESLAU, 2015, p. 52), entre outros exemplos. A partir dessas motivações, construímos o produto deste trabalho que será apresentado no tópico a seguir.
4 Sequência Didática comentada
Neste tópico vamos apresentar a sequência didática onde a atividade experimental incorpora parte deste processo. Ao longo dos itens, apontamos como o professor pode se posicionar mediante a sua prática a fim de atender os modos operantes da metodologia de ensino por investigação (CARVALHO, 2013). Também optamos em lançar luz aos pontos da sequência didática nos quais os conceitos dos referenciais teóricos estão presentes. Vale salientar, que a instituição participante do estudo autorizou a coleta e divulgação dos dados sem a identificação da mesma e dos indivíduos na apresentação deste texto. Nos quadros 1 e 2 apresentamos com mais detalhes a sequência didática desenvolvida.
Tema | Investigar a eficácia do uso de experimento simples no auxílio do ensino-aprendizagem de conceitos e grandezas da mecânica newtoniana. |
Público-alvo e tempo estimado | Alunos do 1o ano do ensino médio. Dois a três tempos de aula, de preferência, com tempos seguidos. |
Objetivo geral | Ensino-aprendizagem de conteúdos da mecânica newtoniana e desenvolvimento de habilidades experimentais segundo o método científico. |
Objetivos específicos | Análise experimental do movimento de um corpo deslizando sobre pistas com diferentes perfis sob ação da gravidade. Aquisição de dados das grandezas tempo, espaço e massa. Discutir a influência da forma da pista sobre a minimização do tempo de percurso de um corpo sob ação da gravidade. Discutir a influência da massa do corpo sobre a velocidade média, sobre as energias potencial e cinética. Conhecer os conhecimentos prévios dos estudantes sobre o tema do produto. |
Conteúdo disciplinar | Velocidade média, energia potencial, energia cinética, incertezas da medida, submúltiplos do segundo, estudo simples das curvas matemáticas: cicloide, parábola e reta. |
Material utilizado no experimento | Aparato com três pistas de diferentes perfis1; duas bolinhas: uma de bilhar e uma de gude, de mesmo volume e massas diferentes; fita métrica; balança digital; celular com aplicativo Lexis Audio Editor2. |
ETAPAS | Discussão das etapas da metodologia |
Investigação dos conhecimentos prévios dos aprendizes Através do Questionário A Através do Questionário B Através do Questionário C | Este momento precede a realização da atividade experimental. Deve-se investigar junto aos alunos o que eles sabem (MOREIRA, 2011) sobre alguns fenômenos e grandezas físicas associadas ao experimento. Optamos por aplicar três questionários pré-estruturados para que sejam respondidos individualmente. O primeiro questionário, A, foi construído a partir de dois enfoques da TAS, que afirma que para haver uma aprendizagem é necessário conhecer os conhecimentos prévios dos estudantes com objetivo de identificar seus subsunçores. Além disso, para que a aprendizagem de fato aconteça os aprendizes precisam estar interessados na temática proposta pelo professor. Portanto, o questionário inicial objetiva investigar o conhecimento prévio do estudante, como também tem a preocupação em motivá-lo no engajamento da sequência didática que seguirá, ao apresentar uma situação habitual do universo juvenil que é um skatista descendo uma rampa. Segundo a TAS (MOREIRA, 2011), o aluno adquire ganho de aprendizagem se ele for capaz de estabelecer conexão com suas experiências anteriores. Por esse motivo, este exemplo foi escolhido para começar o projeto, uma vez que as pistas reais de skate, as chamadas halfpipe, são em formato de cicloide, justamente para que os atletas consigam atingir maiores velocidades médias. O segundo questionário, B, também propõe investigar os conhecimentos prévios, mas desta vez, problematizando a partir do aparato experimental com três pistas (Figura A1 no Apêndice A). As perguntas abordam sobre o menor intervalo de tempo de percurso e maior velocidade média nestas pistas para dois corpos com massas distintas. O professor mostra para turma o aparato com as três pistas, relata detalhes acerca da forma e extensão de cada uma das vias, nomeando-as: reta, meia-parábola e meia-ciclóide. Neste primeiro momento, ele não realiza o experimento, ou seja, não mostra as bolinhas percorrendo as vias, apenas apresenta a situação-problema a ser investigada: Em qual das pistas a bolinha percorrerá a trajetória em menor tempo? Qual das pistas proporcionará a maior velocidade média da bolinha? Por quê? Entre outras. Ainda problematizando a partir do aparato, o último questionário, C, investiga os conhecimentos prévios dos estudantes acerca da energia cinética de translação e potencial de corpos ao se deslocarem sob ação da gravidade nestas vias. |
Apresentação da situação-problema e uso do aparato experimental | A situação-problema (CARVALHO, 2014, p. 10) é apresentada pelo professor, e como se trata de um trabalho experimental investigativo com aquisição de dados, o professor apresenta o material que compõe todo o aparato experimental, explicando para que serve e como se utiliza cada instrumento. Deseja-se que os estudantes sejam capazes de obter os dados do intervalo de tempo do percurso da bolinha nas três trajetórias, utilizando como sensor de tempo o aplicativo para celular Lexis audio editor1. Para melhor orientar seus estudantes, o professor confeccionou um roteiro da atividade experimental (Quadro 6), contendo instruções dos procedimentos. Antes dos alunos iniciarem a investigação experimental com coleta de dados, faz-se uma breve revisão a respeito dos submúltiplos do segundo, unidade de tempo do sistema internacional, uma vez que os intervalos de tempo que envolvem os movimentos das bolinhas nas três vias são menores do que um segundo. |
Discussão em grupo e investigação experimental | Nesta etapa os alunos vão trabalhar em pequenos grupos, na perspectiva de estabelecerem colaboração potencializando a aprendizagem significativa devido à troca de significados que se estabelece em tal situação. A situação-problema apresentada dá oportunidade aos aprendizes em elaborarem suas hipóteses, e especularem sobre a investigação experimental, manipulando livremente o artefato. É um momento de interação entre eles, que debatem sobre o fenômeno a fim de obterem os resultados desejados. O professor acompanha o desenvolvimento da prática dando dicas experimentais e teóricas. Neste momento é importante que o professor conheça os subsunçores dos alunos para orientá-los em busca do sucesso da pesquisa. No caso particular deste trabalho, onde o aparato permite investigar em qual das vias o corpo, sob ação da gravidade, adquire a maior velocidade média, são necessárias algumas explicações iniciais do procedimento experimental. Embora seja um artefato construído com material de baixo custo, esse experimento, além da observação do fenômeno, permite aquisição de dados de tempo, espaço e massa. Assim, os estudantes desde cedo podem desenvolver as habilidades experimentais sugeridas nos Parâmetros Curriculares Nacionais (KAWAMURA, 2003), mesmo que o colégio não tenha bons equipamentos para atividades laborais em ensino de Física. Portanto, o professor irá ensinar como usar o aplicativo de medida de tempo, Lexis Audio editor2, e como atribuir incertezas das medidas nos diversos equipamentos. |
Análise dos dados experimentais | A partir dos dados obtidos via experimento, inicia-se a análise, e por meio da teoria física previamente conhecida, a obtenção das grandezas físicas solicitadas no roteiro experimental (Quadro 6). Ainda em grupo, os alunos se mantêm intelectualmente ativos, debatem entre si e com o professor, levando à diferenciação progressiva do conteúdo específico, na qual os conceitos prévios se reorganizam e adquirem novos significados, aumentando a complexidade da aprendizagem. |
Discussão com todos juntos | Neste momento o professor promove uma roda de conversa com a turma, colocando-se como mediador das discussões. Estimula os grupos/alunos a relatarem como conseguiram encontrar as respostas da pesquisa (perguntas dispostas no roteiro experimental); quais as dificuldades foram encontradas ao longo do processo e como foram superadas. O professor deve auxiliar a narrativa do aluno em vista da ampliação do vocabulário científico, na apropriação dos conceitos e grandezas físicas, tais como, velocidade média, energia potencial e cinética. Incentivá-los a lançar argumentos científicos que justifiquem a trajetória cicloide ser a curva mais rápida frente as outras, e solicitar que elaborarem generalização do fenômeno observado, estimulando-os a apresentarem outros exemplos do cotidiano semelhantes a pista de skate. Aqui é encontrada outra relação entre a Teoria de Aprendizagem Significativa e Ensino por Investigação (ZÔMPERO; LABURU, 2010), a participação dos alunos na roda de conversa permite sistematização dos conhecimentos, pois eles os expressam da maneira como entenderam o conteúdo. Momento em que são evidenciados se novos significados foram construídos, e se a complexidade da aprendizagem aconteceu como desejada. |
5 Coleta, análise dos dados e resultados da aprendizagem
Neste tópico vamos apresentar a análise dos dados e os resultados da aprendizagem a partir da sequência didática anteriormente descrita. O projeto foi aplicado à turma do 1o. ano do ensino médio pelo professor regente e por um dos autores deste texto. Esta turma, a partir daqui chamada de turma Regular, estudava em horário integral num colégio público na cidade do Rio de Janeiro.
A primeira análise consiste em mostrar os resultados dos conhecimentos prévios dos estudantes em respostas aos questionários A, B e C, dispostos nos quadros 3, 4 e 5. Em seguida, será apresentada a coleta de dados e análise de aprendizagem do trabalho experimental realizado pelos estudantes. Esta parte da metodologia tem por objetivo desenvolver a aprendizagem por descoberta, na qual a construção do conhecimento se dá gradualmente à medida que os alunos vão interagindo entre si, com o professor e com o experimento.
O Gráfico 1 apresenta os resultados percentuais das respostas dos estudantes da turma Regular ao questionário A (Quadro 3). Iniciamos investigando os conhecimentos prévios da turma a partir de uma situação corriqueira do cotidiano dos jovens, que é a prática esportiva de skate em rampas. Neste item, a grande maioria respondeu que o skatista gastaria menos tempo se optasse em descer pela rampa reta em vez de descer pela curva, apenas 20% respondeu acertadamente. Embora este resultado fosse esperado, foi importante conhecer o percentual da turma que trazia esta concepção alternativa divergente da científica. É muito comum que a maioria das pessoas atribuam ao menor percurso como sendo a via mais rápida. Entretanto, nem sempre isto é verdade, como acontece neste caso particular, onde a aceleração imposta ao objeto é somente a gravitacional nas duas vias. Esse aspecto ficará evidente na segunda parte da sequência didática quando o aprendizado acontecerá por descoberta ao realizarem o experimento. Talvez o pequeno grupo de estudantes que acertou a questão fosse praticante de skate, assim, sua experiência prática sensorial determinou a resposta correta.
Em seguida, os alunos são desafiados a responder as questões investigativas contextualizadas no movimento de uma bolinha nas pistas da maquete experimental (Figura A1 no Apêndice A). Mas, uma vez, vale ressaltar que neste momento de investigação dos conhecimentos prévios, o professor não realiza o experimento, ele apenas apresenta a maquete discorrendo sobre a funcionalidade dela, e pede para que os alunos respondam o questionário B do Quadro 4. A primeira e terceira pergunta deseja investigar os conhecimentos prévios dos estudantes a respeito da influência da forma da trajetória no tempo de percurso, e na velocidade média do objeto ao descer pelas vias em formatos distintos por ação da gravidade2. O objetivo dessas perguntas era conhecer a estrutura cognitiva dos estudantes sobre essas grandezas, a fim de revelar a presença ou não de subsunçores. Vale ressaltar que os estudantes já haviam tido aula teórica de cinemática.
A maioria dos estudantes não atribuiu como possível um corpo obter o menor tempo de percurso por uma via com maior comprimento (Gráfico 2). Isto se reflete na escolha da reta inclinada como a pista ideal para que isto ocorra, em seguida a parábola, e por fim, a cicloide. A maioria dos estudantes respondeu que a maior velocidade média seria obtida pela pista de perfil reto (questão 3 do Questionário B), ou seja, a que a tem o menor comprimento. É importante o professor tomar conhecimento dos conhecimentos prévios, também chamados de alternativos, dos estudantes para que possa definir estratégias de aprendizagens em atividades posteriores. Também, é igualmente importante para o aluno, pois possibilita refletir sobre o que pensa a respeito de um determinado assunto. Assim, na nossa sequência didática, mais adiante o estudante revisita este item, e por descoberta, via realização do experimento, ele verifica que a pista cicloide permite o corpo adquirir maior velocidade média, embora tenha o maior comprimento, mas a percorre em menor tempo. Desse modo, a nova aprendizagem tem onde se ancorar (MOREIRA, 2011) para que os novos significados sejam internalizados.
Questionário BInvestigação dos conhecimentos prévios sobre tempo de percurso e velocidade média |
Questão 1: Considere as três pistas da maquete: ciclóide, parábola e reta. Em qual das pistas a bolinha percorrerá a via em menor tempo se for largada a partir da mesma altura? ( )ciclóide; ( )parábola; ( )reta |
Questão 2: Para duas bolinhas com mesmo volume e massas diferentes, se largadas da mesma altura numa certa pista (em momentos distintos), qual delas apresentará o menor tempo de descida quando percorrer? a) A ciclóide: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )descem ao mesmo tempo. b) A parábola: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )descem ao mesmo tempo c) A reta: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )descem ao mesmo tempo. |
Questão 3: Em qual das pistas a bolinha terá a maior velocidade média se percorrer toda distância? ( )ciclóide; ( )parábola; ( )reta. |
A partir deste ponto, optamos em não mais apresentar os dados sob forma de gráficos por uma questão de economia de espaço e porque os resultados são perfeitamente traduzidos em palavras e números sem grande complexidade. Justificamos a apresentação dos dois gráficos acima, por serem os resultados das grandezas físicas prioritárias na nossa investigação: o menor tempo e maior velocidade média.
Quando questionados sobre qual das pistas a bolinha terminaria o percurso com maior energia cinética, questão 1 do Questionário C, a maior parte dos alunos (60%) respondeu que seria na reta, enquanto que, 20% (10%) disseram que seria a parábola (cicloide), outros 10% atribuíram que a energia cinética seria a mesma ao final de todas as pistas. O objetivo dessa pergunta era verificar os conhecimentos prévios dos estudantes sobre conservação de energia, uma vez que eles já haviam tido aula teórica sobre o assunto. Embora não seja uma pergunta fácil de ser imediatamente respondida, porque muitas considerações podem ser atribuídas, esse tema será revisitado na parte experimental e na roda de conversa. Então, para que aconteça ampliação da aprendizagem é necessário que existam pontos de ancoragem (MOREIRA, 2011).
Quando questionados sobre qual das pistas a bolinha teria a maior energia potencial caso fosse solta da maior altura das pistas (questão 3 do Questionário C), os alunos optaram por responder que seria a reta. Através da figura da maquete é possível observar que todas as pistas têm a mesma altura. Portanto, fica notório que os estudantes não tiveram o devido aprendizado sobre essa grandeza em aulas teóricas anteriores, ou, por sua vez, não conseguiram fazer a devida transposição para uma situação real e concreta.
Questionário CInvestigação dos conhecimentos prévios sobre energia cinética de translação e potencial |
Questão 1:Para a mesma bolinha largada da mesma altura nas três pistas, em qual delas apresentará maior energia cinética de translação ao final do percurso? ( )ciclóide, ( )parábola, ( )reta, ( )a energia cinética é a mesma. |
Questão 2: Para duas bolinhas, de mesmo volume e massas diferentes, largadas da mesma altura, qual delas apresentará maior energia cinética de translação ao final do percurso: a) Da ciclóide: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )a energia cinética é a mesma. b) Da parábola: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )a energia cinética é a mesma. c) Da reta: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )a energia cinética é a mesma. |
Questão 3: Para duas bolinhas, de mesmo volume e massas diferentes, largada da mesma altura, qual delas apresentará maior energia potencial no início do movimento? a) na ciclóide: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )a energia potencial é a mesma. b) na parábola: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )a energia potencial é a mesma. c) na reta: ( )a de menor massa; ( )a de maior massa; ( )a energia potencial é a mesma. |
As questões 2a, 2b e 2c do Questionário B no Quadro 4; assim com as questões 2a, 2b, 2c, 3a, 3b e 3c do Questionário C no Quadro 5 investigam os conhecimentos prévios dos estudantes acerca da influência da massa sobre o tempo do percurso, sobre as energias cinética e potencial nas três pistas.
Questionados qual seria a bolinha, a de maior ou a de menor massa, que chegaria em menor tempo ao final da trajetória (entendendo a trajetória, ora reta, ora parábola ou cicloide), a grande maioria das respostas dos alunos, atribuiu que o corpo mais pesado obteria o menor intervalo de tempo ao descer qualquer que fosse a pista. Na nossa investigação, poucos alunos, entorno de 10%, acertaram a questão, apontando que o tempo do percurso seria independe da massa. Essa questão é bastante conhecida, tema de inúmeras reflexões desde a época de Galileo Galilei (MOURA; CANALLE, 2001, p. 243) até os tempos atuais. A massa do objeto não influencia seu tempo de queda quando sujeito exclusivamente à aceleração da gravidade. Na realização do experimento os alunos poderão visualizar este efeito ao colocarmos duas esferas de massas distintas percorrendo as vias.
Boa parte dos estudantes respondeu acertadamente, que o corpo de maior massa adquiriria maior energia cinética ao final da trajetória independentemente do formato da pista. Neste ponto interpretamos que seus conhecimentos prévios estavam de acordo com o respectivo conteúdo da mecânica newtoniana. Alguns poucos estudantes apontaram que a energia cinética seria a mesma para qualquer que seja a massa. Provavelmente, para esse grupo deve ter ocorrido erro de interpretação da questão, e não atentaram que pergunta se referia a massas distintas.
Quando questionados sobre a influência da massa na energia potencial no início das trajetórias, boa parte da turma respondeu que o corpo de maior massa teria a maior energia potencial em todas pistas. Resposta de acordo com a teoria física. Entretanto, um grupo considerável de alunos, entorno de 40%, respondeu que a energia potencial de um corpo na cicloide independe da massa, ou seja, tanto faz ter mais ou menos massa que a energia potencial inicial seria a mesma ao percorrer essa via. Esse grupo não refletiu que a expressão da energia potencial depende da massa e da altura do corpo. Após essa análise, fica claro, que para parte dos estudantes, os conceitos de energia potencial e energia cinética não têm significados claros nem precisos. Ao longo do trabalho experimental, e na roda de conversa, tais elementos serão revisitados a fim de promover diferenciação progressiva e mudança conceitual de tais conceitos e grandezas físicas.
Após a investigação dos conhecimentos prévios, os alunos foram divididos em grupos de três ou quatro elementos para a realização do experimento, e pela mediação do professor, fizeram coleta e análise de dados segundo o roteiro da experiência (Quadro 6).
Roteiro da experiência com aquisição de dados |
Objetivo · Calcular a velocidade média e energias cinética e potencial do corpo em cada pista a partir dos dados de intervalo de tempo e comprimento da pista. Material utilizado · Maquete com três pistas diferentes (reta inclinada, parábola e cicloide), duas bolinhas com massas distintas e mesmo volume, fita métrica, aplicativo de celular para medida de tempo, balança digital portátil. Procedimento experimental · Meça o comprimento de cada pista e registre os valores. Não esqueça da incerteza da medida de comprimento. · Meça a altura do ponto de partida de cada pista. Registre os valores. · Meça as massas da bolinha 1 e bolinha 2. Registre os valores. · Meça três vezes o intervalo de tempo de descida da bolinha 1 em cada pista. Registre na tabela 1. Use o aplicativo. Não esqueça da incerteza da medida do tempo. · Repita o item acima para bolinha 2, registre na tabela 2. Análise de dados · Obtenha a média aritmética dos intervalos de tempo para as bolinhas 1 e 2 em cada pista. Registre nas tabelas 1 e 2, respectivamente. · Obtenha as velocidades médias de cada bolinha ao percorrer cada pista. Utilize o valor médio do tempo de percurso de cada pista. Registre na tabela 3. · Obtenha a energia potencial inicial de cada bolinha no ponto de partida de cada pista. Perguntas · Qual das pistas a bolinha 1 obteve o menor tempo de descida? O mesmo aconteceu para a bolinha 2? Explique a sua análise. · Qual das pistas a bolinha 1 obteve a maior velocidade média? O mesmo aconteceu para a bolinha 2? Explique a sua análise. · Qual das pistas a bolinha 1 obteve maior energia potencial? O mesmo aconteceu para a bolinha 2? Explique a sua análise.· Os intervalos de tempo médio de percurso obtidos para as duas bolinhas foram muito diferentes? Discuta o que influenciou este resultado. |
Os valores das massas das bolinhas, m1=5,2 g e m2=6,4 g, a altura do ponto de partida do corpo, h=0,6 m (posição mais alta das pistas), e comprimento das pistas, foram medidos e coletados pelos estudantes logo no início do procedimento, com balança digital e fita métrica, respectivamente.
Com relação à aquisição de dados via aplicativo, foram obtidas três medidas de tempo3 para cada bolinha em cada trajetória, a fim de minimizar os erros aleatórios. Cada bolinha percorreu cada pista três vezes. Assim, a média aritmética entre os três valores dos intervalos de tempo de cada percurso foi considerada o melhor valor que representaria o tempo real de descida do corpo. Obter experimentalmente o valor do tempo de descida do corpo é importante porque possibilita a verificação imediata da “via mais rápida”, como também esta informação vai se relacionar de maneira substantiva com a expressão teórica da velocidade média.
Embora os intervalos de tempo para as três trajetórias sejam muito próximos (Tabela 1), ao largar três bolinhas idênticas da mesma altura, uma em cada pista ao mesmo tempo, é possível perceber a olho nu que a bolinha que percorre a semicicloide invertida (Figura A1 no Apêndice A) chega ao final da trajetória antes das outras. A apresentação desse fenômeno evidenciou aos estudantes a veracidade dos dados coletados, contrariando suas concepções alternativas relatadas na questão 1 do Questionário B, e possibilitando uma mudança conceitual desejada (MOREIRA, 2011).
Através da teoria previamente estudada e com os dados do tempo mínimo em cada pista, os alunos calcularam a velocidade média das duas bolinhas e suas respectivas energias potenciais em cada curva. Todas essas grandezas estão registradas na Tabela 1. Mesma surpresa se deu ao constatarem, através de seus cálculos, que a bolinha ao descer a cicloide adquire maior velocidade média do que na parábola ou na reta. Neste ponto, podemos ressaltar que o trabalho experimental permitiu seguir os passos do método científico em vista da aprendizagem significativa e não mecânica. Assim, os fenômenos e grandezas físicas vão sendo gradativamente internalizadas na estrutura cognitiva do indivíduo em acordo com os pressupostos científicos.
Curva | Tempo médio (s) | Vel. média (m/s) | E. potencial (10-3 J) | |||
bola 1 | bola 2 | bola 1 | bola 2 | bola 1 | bola 2 | |
Cicloide | 0,54 | 0,53 | 2,28 | 2,32 | 30,57 | 37,63 |
Parábola | 0,55 | 0,54 | 2,20 | 2,24 | 30,57 | 37,63 |
Reta | 0,56 | 0,55 | 2,09 | 2,12 | 30,57 | 37,63 |
Na situação experimental apresentada não foi possível determinar quantitativamente a energia cinética de cada bolinha no ponto mais baixo das trajetórias, visto que os intervalos de tempo de descida eram pequenos, impossibilitando, então, coletar os tempos relativos a intervalos de espaços menores ainda nas trajetórias do aparato4. Portanto, a velocidade instantânea no final de cada trajetória não foi obtida. No entanto, toda essa análise foi debatida com os alunos na roda de conversa, enfatizando-se principalmente a diferença entre velocidade média e velocidade instantânea, e os aspectos do experimento que deveriam ser desprezados para haver conservação de energia, como por exemplo a força de arrasto devido à resistência do ar.
6 Considerações finais
Elaboramos uma sequência didática, baseada na metodologia de Ensino por Investigação sob os pressupostos da Teoria de Aprendizagem Significativa para o ensino-aprendizagem de fenômenos, princípios e grandezas físicas do movimento de um corpo ao percorrer diferentes trajetórias sob ação da gravidade. Optou-se por trabalhar com atividade experimental, porque, de modo geral, é a que mais envolve os alunos em termos participativos, e também porque desenvolve as proposições desejadas do método científico e as habilidades experimentais.
Este produto foi aplicado a uma turma do 1o ano do ensino médio da rede pública estadual da cidade do Rio de Janeiro. Podemos destacar que, um dos principais resultados foi o envolvimento dos alunos na atividade experimental, de modo que concluímos que a sequência didática e o aparato experimental proposto foram um material que motivou os estudantes possibilitando aprendizagem significativa. Outro aspecto importante foi que o material e a situação-problema apresentados propiciaram ativar os conhecimentos prévios dos estudantes, e a atividade prática possibilitou mobilizá-los na busca do sucesso.
A aprendizagem do uso de instrumentos de medidas, em especial, a medida da grandeza tempo via áudio com aplicativo de celular e análise dos dados para a obtenção de grandezas indiretas foram bastante produtivas. Os resultados experimentais obtidos diferem das concepções espontâneas dispostas nos questionários iniciais. Estes revelaram que o menor tempo de percurso e a maior velocidade média ocorrem para a maior trajetória do aparato experimental, que, neste caso, era a cicloide. Embora os tempos de percurso do corpo nas três vias sejam próximos, quando soltamos três bolinhas idênticas simultaneamente nas vias, é possível perceber a olho nu que a que estava na cicloide era a mais rápida.
Verificou-se, na roda de conversa, que a atividade experimental colaborou para aprendizagem significativa provocando uma mudança conceitual, remodelando os conhecimentos prévios em conhecimentos de acordo com a teoria científica. Nesta etapa, também pode-se notar ampliação do vocabulário e organização das ideias, na qual os novos significados para grandezas antes não bem estabelecidas foram ganhando diferenciação progressiva, como por exemplo a energia cinética e a influência da massa no tempo do percurso.
Além disso, a atividade aproximou o conteúdo didático da vivência cotidiana dos estudantes ao perceberem o emprego da braquistócrona (cicloide) nas pistas de skate halfpipe. De todo modo, este aparato no uso de uma atividade experimental ainda é um trabalho inicial, tem bom potencial didático para o ensino de Física devido à sua fácil construção, transporte e aquisição de dados, mas ainda carece de aprimoramento com relação às suas possíveis potencialidades didático-pedagógicas.
Agradecimentos
O autor Marcelo Perrota Raymundo agradece à Capes a concessão da bolsa de mestrado durante o período do trabalho de pesquisa, e ambos agradecem ao técnico de laboratório da UERJ, Adelino Carlos F. de Souza, no auxílio à confecção da maquete.
Referências
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Apêndice
Apêndice A - Construção da Maquete com três pistas: ciclóide, parábola e reta
Notas
Notas de autor