DOSSIÊ TEMÁTICO: “PENSAR E FAZER A CIDADE: EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL”

Programa saúde na escola: rastreamento de estudantes com alterações audiológicas matriculados em duas escolas municipais de Macaé

School health program: screening of students with hearing disorders enrolled in two municipal schools in Macaé

Programa de salud en la escuela: tamizaje de los alumnos con trastornos de la audición inscritos en dos escuelas municipales en Macaé

Paula Silva Figueiredo 1
Brasil
Tathyana Bichara de Souza Neves 2
Brasil
Kelly Mariana Pimentel Queiroz 3
Brasil
Vivian de Oliveira Sousa Corrêa 4
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
Jane de Carlos Santana Capelli 5
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil

Programa saúde na escola: rastreamento de estudantes com alterações audiológicas matriculados em duas escolas municipais de Macaé

Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 22, núm. 3, 2020

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense

Este documento é protegido por Copyright © 2020 pelos Autores.

Recepción: 03 Abril 2020

Aprobación: 04 Noviembre 2020

Resumo: Introdução: O Programa Saúde na Escola prevê a ação “Promoção da saúde auditiva e identificação de educandos com possíveis sinais de alteração”. Objetivo: Identificar a proporção de estudantes que apresentam comportamentos indicativos de alterações audiológicas, em duas escolas da rede municipal de ensino de Macaé. Desenvolvimento: Foi realizado um estudo descritivo, com estudantes entre 8 e 14 anos, de duas escolas de Macaé, em 2018. Utilizou-se um formulário com informações sobre comportamentos indicativos de perda auditiva, assinalados pelo próprio estudante. Dos 199 estudantes, 46,2% eram da escola 1 e 53,8% eram da escola 2. Quanto o comportamento indicativo de alterações audiológicas, para a opção SEMPRE as maiores proporções foram: viram a cabeça na direção da voz do professor ou do colega quando fala (25,6%); têm dificuldade de ouvir o que o professor fala, quando escreve a matéria no quadro de costas (16,1%); apresentam dificuldade de falar o que está pensando (11,1%); sentem um zumbido na orelha (12,6%). Conclusão: Virar a cabeça na direção da voz do professor ou do colega quando fala e ter dificuldade de ouvir o que o professor fala quando escreve de costas foram as alterações audiológicas de maior proporção.

Palavras-chave: Audição, Educação, Estudantes, Promoção da Saúde.

Abstract: Introduction: The Health at School Program provides the action “Promotion of hearing health and identification of students with possible signs of alteration”. Objective: To identify the proportion of students who show behaviors indicative of audiological changes, in two schools in the municipal teaching network of Macaé. Development: A descriptive study was carried out, with students between 8 and 14 years old, from two schools in Macaé, in 2018. A form was used with information on behaviors indicative of hearing loss, indicated by the student himself. Of the 199 students, 46.2% were from school 1 and 53.8% were from school 2. As for the behavior indicative of audiological changes, for the option ALWAYS the greatest proportions were: they turned their heads towards the teacher or colleague’s voices when talking (25.6%); they have difficulty hearing what the teacher says when they write the material on the blackboard from the back (16.1%); have difficulty speaking what they are thinking (11.1%); feel a ringing in the ear (12.6%). Conclusion: Turning your head in the direction of the teacher or colleague's voice when speaking and having difficulty hearing what the teacher says when writing from the back were the major audiological changes.

Keywords: Hearing, Education, Students, Health Promotion.

Resumen: Introducción: El Programa Salud en la Escuela prevé la acción “Promoción de la salud auditiva e identificación de estudiantes con posibles signos de alteración”. Objetivo: identificar la proporción de estudiantes que muestran comportamientos indicativos de cambios audiológicos en dos escuelas de la red de enseñanza municipal de Macaé. Desarrollo: Se realizó un estudio descriptivo, con estudiantes entre 8 y 14 años, de dos escuelas en Macaé, en 2018. Se utilizó un formulario con información sobre comportamientos indicativos de pérdida auditiva, indicado por el propio estudiante. De los 199 estudiantes, 46.2% eran de la escuela 1 y 53.8% eran de la escuela 2. En cuanto al comportamiento indicativo de cambios audiológicos, para la opción SIEMPRE las mayores proporciones fueron: volvieron la cabeza hacia la voz del maestro o del colega cuando habla (25.6%); tienen dificultades para escuchar lo que dice el maestro cuando escribe el material en la pizarra y está de espaldas (16.1%); tienen dificultad para hablar lo que piensan (11.1%); siente un zumbido en el oído (12.6%). Conclusión: Girar la cabeza en la dirección de la voz del maestro o colega al hablar y tener dificultades para escuchar lo que el maestro dice al escribir cuando está de espaldas fueron los principales cambios audiológicos.

Palabras clave: Audición, Educación, Estudiantes, Promoción de la Salud.

1 Introdução

No espaço escolar, a saúde e a educação podem se complementar por meio de iniciativas como ações de diagnóstico clínico e social, estratégias de triagem e encaminhamento aos serviços de saúde (CASEMIRO; FONSECA; SECCO, 2014). Nesse contexto, encontra-se o Programa de Saúde na Escola (PSE), política intersetorial da saúde e da educação, instituído em 2007, com o objetivo de contribuir para a formação integral dos estudantes por meio de ações de promoção, prevenção e atenção à saúde, com vistas ao enfrentamento das vulnerabilidades que comprometem o pleno desenvolvimento de crianças e jovens da rede pública de ensino (BRASIL, 2007).

O PSE tem como proposta a realização de 12 ações voltadas à prevenção de doenças e promoção da saúde, sendo a décima ação a “Promoção da saúde auditiva e identificação de educandos com possíveis sinais de alteração”, sendo a avaliação auditiva a sexta atividade prevista (BRASIL, 2008; BRASIL, 2009). Isto porque, a deficiência auditiva em seus diferentes graus, distúrbios auditivos transitórios, discretos, leves ou até mesmo unilaterais passam despercebidos durante anos pelos familiares, podendo acarretar efeitos adversos na compreensão da fala, no raciocínio lógico, no processo de ensino e aprendizagem, dentre outros (MINAS GERAIS, 2018).

Os efeitos negativos da deficiência auditiva na aprendizagem são observados nos primeiros anos de vida, e nas crianças o diagnóstico de deficiência auditiva leve já apresentam inúmeras dificuldades, principalmente quando chegam ao terceiro ano do ensino fundamental, devido a “mudanças na complexidade da linguagem, do menor número de pistas visuais, da maior demanda de informações auditivas encadeadas e de evocações (…)” (TAMANINI et al., 2015, p. 1.404).

Diante deste contexto, a escola desempenha um papel relevante no campo da saúde auditiva, sendo o professor um importante protagonista, uma vez que está diariamente em contato com o escolar, percebendo alterações sutis ou bem evidentes no que se relaciona a perda auditiva e/ou dificuldade de aprendizado. No entanto, cabe considerar que todos os profissionais do âmbito educacional são importantes atores envolvidos nesse processo, e a articulação entre os setores de educação e saúde, por meio do PSE, permite a triagem auditiva, o encaminhamento do escolar com suspeita de perda auditiva às unidades de saúde competentes a fim de realizarem testes auditivos (BRASIL, 2009). Além do mais, aqueles com diagnóstico de perda parcial ou total da audição, devem ser inseridos e acolhidos no ensino regular de forma adaptada por meio de práticas inclusivas, levando-se sempre em consideração as peculiaridades do indivíduo (RIOS; NOVAES, 2009; SENO, 2009).

Desta forma, compreendendo a relevância da saúde no espaço escolar, torna-se fundamental a realização da avaliação auditiva dos estudantes, principalmente do ensino fundamental I, no qual a alfabetização deles é o objetivo a ser alcançado (BRASIL, 2009; MINAS GERAIS, 2018).

No município de Macaé, o PSE foi implantando no ano de 2013 com a realização de parte das ações propostas, todavia ainda não abarcando a décima ação. Para atender essa demanda, as Secretarias Municipal de Saúde e Educação e a coordenação do PSE firmaram parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ-Campus Macaé Professor Aloísio Teixeira, em setembro de 2017, entendendo a necessidade da elaboração de um projeto visando nortear as ações de saúde na escola a serem desenvolvidas e articuladas às equipes da Atenção Básica em saúde, considerando os campos da Extensão (FIGUEIREDO et al., 2019) e Pesquisa, fundamentais na academia.

Como não há estudos conhecidos no município de Macaé sobre comportamentos indicativos de alterações audiológicas em escolares, o presente estudo visa identificar a proporção de estudantes que apresentam comportamentos indicativos de alterações audiológicas, em duas escolas da rede municipal de ensino de Macaé.

2 Metodologia

2.1 Desenho do estudo

Trata-se de um estudo observacional, com delineamento descritivo, de base escolar, desenvolvido no segundo semestre de 2018, na área urbana do município de Macaé/RJ, localizado na região do Norte Fluminense, com uma estimativa populacional, para o ano de 2010, de 206.728 habitantes (IBGE, 2010), contemplando duas escolas da rede de ensino fundamental atendidas pelo PSE.

2.2 População de estudo

Todos os estudantes do ensino fundamental entre 7 a 14 anos inclusive, cujos pais autorizaram a participar do estudo com a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

2.3 Critério de exclusão

Todas as crianças que já tiverem o diagnóstico de perda auditiva estabelecido pelo médico otorrinolaringologista não entrarão no estudo. O levantamento deste diagnóstico foi feito previamente com a diretora da escola e unidade de saúde do território referente à escola.

2.4 Instrumento e variáveis de estudo

Utilizou-se um formulário contendo as seguintes variáveis: nome da escola, data da avaliação, nome do estudante, sexo, idade (em anos), número da turma e turno (Manhã, Tarde). Contém um quadro com 8 afirmativas (OPÇÕES) relacionadas aos comportamentos indicativos de perda auditiva (sinais e sintomas), observados pelo próprio estudante, no qual terá que assinalar com um X as opções SEMPRE, ÀS VEZES ou NUNCA. Esse formulário foi adaptado do estudo de Oliveira & Oliveira (2009).

A equipe do projeto, composta por docentes, bolsistas e voluntários, foi capacitada quanto à orientação para o preenchimento do formulário, a ser respondido pelo estudante individualmente, que em caso de dúvidas em relação às afirmativas, tirava-as com um dos membros da equipe presente na coleta.

2.5 Coleta de dados

Em reunião previamente agendada, a equipe Saudi apresentou o projeto ao diretor de cada escola, e junto a direção estabeleceu o melhor dia para a realização da coleta de dados, uma vez que todas as turmas (incluindo os turnos da manhã e da tarde) com crianças presentes em sala de aula participariam da pesquisa. O TCLE foi enviado pela criança e adolescente aos pais, que entregaram até dois dias antes da coleta aos professores, e esses a diretora da escola. As crianças cujos responsáveis não enviaram o TCLE não participaram da pesquisa.

Após contato prévio com a diretora da escola, por telefone ou em visita presencial, a equipe do projeto Saudi foi a cada escola no dia definido, e por meio do auxílio de um responsável indicado pela direção, foi encaminhada a cada turma (sala de aula) prevista.

Na sala de aula, um dos membros da equipe Saudi leu e explicou o preenchimento do formulário, entregando-o para cada criança ou adolescente. O participante que teve dificuldades no preenchimento, contou com o apoio de um dos membros da equipe para tirar as dúvidas existentes. Ao final, os formulários foram preenchidos.

2.6 Digitação e Análise dos dados

Os dados foram digitados e consolidados em uma planilha de dados do Excel for Windows 2010, paralelamente a coleta de dados. Foi realizada uma análise descritiva das variáveis por meio de distribuições de frequências absolutas e relativas, além da média, do desvio padrão e dos valores máximo e mínimo, utilizando-se o programa estatístico computacional SPSS versão 20.0®.

2.7 Aspectos Éticos

O projeto está em atendimento à Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Campos/Fundação Benedito Pereira Nunes, sob CAAE nº 79564717.9.0000.5244. A devida autorização para participação do estudo foi solicitada aos diretores das escolas e aos pais ou representante legal das crianças e adolescentes, utilizando-se o TCLE, com a respectiva assinatura e entrega.

3 Resultados

Do total de estudantes presentes nos dias da entrevista (n=199), participaram do estudo 191 estudantes, dos quais, 46,2% eram da Escola 1 e 53,8% eram da Escola 2. Oito estudantes não tiveram o TCLE assinados pelos pais, e por isso não puderam participar do estudo.

Dos 92 estudantes da Escola 1, 51,1% eram meninas e 48,9% meninos; na Escola 2 (n=99), 50,5% eram meninas e 49,5% meninos (Figura 1).

Frequência percentual de estudantes segundo idade, sexo e Escolas 1 e 2, da rede pública de ensino do município de Macaé, 2018. Escolas 1 (n=92) e 2 (n=99)
Figura 1.
Frequência percentual de estudantes segundo idade, sexo e Escolas 1 e 2, da rede pública de ensino do município de Macaé, 2018. Escolas 1 (n=92) e 2 (n=99)
Fonte: Dados da pesquisa

Em relação as idades, verificou-se a média±DP de 9,6±1,23 anos nos estudantes da Escola 1, com a idade máxima de 14 e a mínima de 8 anos; e da Escola 2, de 10,03±1,10 anos, com idade máxima 13 e a mínima 8 anos (Tabela 1).

Tabela 1.
Valores médios, desvio padrão (DP), máxima e mínima das idades dos estudantes segundo Escolas 1 e 2, da rede pública de ensino do município de Macaé, 2018
EscolasIdade (em anos)
Média±DPMáximaMínima
Escola 19,6±1,23148
Escola 210,03±1,10138
Fonte: Dados da pesquisa

Na Escola 1, detectaram-se 20,7% dos estudantes indicando que SEMPRE viram a cabeça na direção da voz do professor ou do colega quando fala; e, na Escola 2, 32,3%. Detectou-se também que tanto a Escola 1 (76,1%) como a Escola 2 (76,8%), os estudantes assinalaram que ÀS VEZES “pedem para que o professor repita as frases ou as palavras que disse”, bem como possuem “dificuldade de entender a matéria dada em sala de aula pelo professor”, 76,1% e 60,6%, respectivamente. Cabe ressaltar ainda, que na Escola 1, 39,1% dos estudantes referiram ÀS VEZES “ter dor de ouvido” e, na Escola 2, 57,5% (Tabela 2).

Tabela 2.
Distribuição percentual de afirmativas relacionadas aos comportamentos indicativos de possíveis alterações audiológicas referidos pelos estudantes durante as aulas, segundo Escolas 1 e 2, da rede pública de ensino do município de Macaé, 2018
Comportamentos indicativos de possíveis alterações audiológicasEscola 1 (n=92)Escola 2 (n=99)
Sempre n(%)Às vezes n(%)Nunca n(%)Sempre n(%)Às vezes n(%)Nunca n(%)
Você pede para que o professor repita a frase ou as palavras que disse na aula.5(5,4)70(76,1)17(18,5)7(7,1)76(76,8)16(16,1)
Você vira a cabeça na direção da voz do professor ou do colega quando fala.19(20,7)27(29,3)46(50,0)32(32,3)32(32,3)35(35,4)
Você tem dificuldade de ouvir o que o professor fala, quando escreve a matéria no quadro (o professor fica de costas).15(16,3)25(27,2)52(56,5)17(17,1)24(24,3)58(58,6)
Você tem dificuldade de entender a matéria dada em sala de aula pelo professor.9(9,8)70(76,1)23(25,0)11(11,1)60(60,6)28(28,3)
Você tem dor de ouvidos.5(5,4)36(39,1)51(55,4)5(5,1)57(57,5)37(37,4)
Você tem dificuldade de falar o que está pensando.9(9,8)40(43,5)43(46,7)9(9,1)40(40,4)50(50,5)
Você tem dificuldade de entender o que o colega fala.10(10,9)36(39,1)46(50,0)8(8,1)42(42,4)49(49,5)
Você sente um zumbido (barulho ruim) dentro da orelha.9(9,8)40(43,5)43(46,7)16(16,2)41(41,4)42(42,4)
Fonte: Dados da pesquisa

4 Discussão

Neste estudo, em ambas as escolas, encontrou-se elevada proporção de estudantes referindo sempre apresentar comportamentos indicativos de alterações audiológicas, sendo eles: virar a cabeça na direção da voz do professor ou do colega quando fala e ter dificuldade de ouvir o que o professor fala, quando escreve de costas.

A literatura revela que a detecção da perda auditiva ocorre em sua maioria na escola, e a sua percepção ocorre por meio de alguns comportamentos observados nos escolares como: solicitação recorrente para repetir frases ou palavras, demonstração de esforço ao tentar ouvir, desatenção nos debates realizados em sala de aula, dentre outros (TAMANINI et al., 2015; VIEIRA; MACEDO, 2007), sendo observados nos escolares avaliados nesse estudo.

Vieira; Macedo (2007) apontam que certos sinais e sintomas estão associados à perda auditiva, e por isso, devem ser observados, como a respiração oral, a tontura, a otalgia e o zumbido. Segundo o autor, a avaliação auditiva deve ser realizada em crianças que apresentam dificuldades na linguagem oral como, por exemplo, confusões fonéticas, inversões, dissimulações e trocas na articulação; na linguagem escrita, ou seja, dificuldades na expressão escrita e na leitura; e de outra natureza, como a dislexia, disfasia e alterações comportamentais (VIEIRA; MACEDO, 2007).

A falta de uma avaliação auditiva ainda na maternidade, nas primeiras 48h de vida a partir da realização de exames de triagem auditiva neonatal (FERNANDES et al., 2018), por meio dos exames de Emissões Otoacústicas Evocadas (EOAE) e do Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (PEATE); ou da avaliação audiométrica nos primeiros anos de vida, impedem o diagnóstico precoce, bem como a implementação de intervenções imediatas de forma a minimizar prejuízos na aquisição da linguagem receptiva e expressiva, no desenvolvimento cognitivo e socialização, na escrita e leitura. Futuramente, no desenvolvimento acadêmico e nas relações interpessoais (BRASIL, 2009; COLELLA-SANTOS et al., 2009; FERNANDES et al., 2018; TAMANINI et al., 2015).

A avaliação das alterações audiológicas pelo PSE, portanto, é de grande relevância para a identificação precoce de comprometimentos na audição (BRASIL, 2009) e o encaminhamento do escolar à unidade de saúde. Isto porque, há diferentes tipos de deficiência auditiva (condutiva, mista ou sensorioneural), e cada uma delas pode afetar o desenvolvimento de uma criança (CAPELLI; ALMEIDA, 2013), variando a intensidade, o grau da perda (leve, moderada, severa ou profunda), frequência e período de tempo em que a criança permanece sob essa condição (BRASIL, 2012; COMITÊ BRASILEIRO SOBRE PERDAS AUDITIVAS NA INFÂNCIA, 2000).

Diante da importância da detecção da deficiência auditiva o mais precoce possível, uma vez que os comprometimentos irão interferir principalmente no desenvolvimento oral do escolar e no seu aprendizado, o Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e o Laboratório de Biofísica Neurossensorial da Universidade Clermont-Auvergne (UCA), França, idealizaram, desenvolveram e validaram um instrumento de triagem auditiva infantil com o objetivo de “identificar em tempo oportuno crianças susceptíveis de apresentar alterações auditivas, com o intuito de minimizar os danos causados pela deficiência auditiva na primeira infância” (MINAS GERAIS, 2018, p. 12).

O instrumento pode ser aplicado tanto pelo profissional da educação como da saúde ao responsável do escolar, e de preferência no momento da matrícula no período inicial das aulas, para o encaminhamento da criança para a realização da avaliação auditiva, ainda no início do período letivo (MINAS GERAIS, 2018). Isto porque, segundo Boothray (1982), crianças com deficiência auditiva apresentam o desenvolvimento cognitivo inferior quando comparados aquelas com audição considerada nos parâmetros da normalidade. De forma geral, as crianças com o diagnóstico de deficiência auditiva possuem um atraso de cerca de dois anos nas atividades escolares quando comparadas aos demais colegas de sala de aula (HODGSON, 1989; SANTEE; VALE, 2006).

Assim, importantes esforços no âmbito do PSE devem ser investidos na detecção do escolar com perda auditiva, para que o encaminhamento ao serviço especializado seja realizado o mais rápido possível. De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069 de 13 de Julho de 1990, em seu capítulo IV, do direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer, em seu art. 53, “a criança e o adolescente tem direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1990); como também a Lei Brasileira de Inclusão (BRASIL, 2015). Portanto, para que a criança com deficiência auditiva tenha garantido o seu direito em lei, precisa ser conhecida, ou seja, sair da invisibilidade, uma vez que a deficiência auditiva é “invisível” quando comparada a outros tipos de deficiência como, a deficiência física e a síndrome de Down.

5 Considerações finais

A proporção de estudantes que apresentaram comportamentos indicativos de alterações audiológicas foi considerada alta nas duas escolas avaliadas. O presente estudo reforça a importância das ações do PSE no município de Macaé, no âmbito da saúde auditiva, pois são fundamentais para triarem os escolares que apresentam perda auditiva, para posterior encaminhamento à unidade básica de saúde.

O diagnóstico de deficiência auditiva pelo profissional especializado permitirá que a escola, com base nas peculiaridades e necessidades individuais de cada estudante, minimize as desigualdades, a discriminação e os preconceitos, bem como assegure o respeito às diferenças e dê oportunidades ao uso de recursos humanos, tecnológicos, estruturais, dentre outros, como previsto nas políticas públicas voltadas ao grupo estudado, como previsto, por exemplo na Lei Brasileira de Inclusão, publicada no ano de 2015.

Referências

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VIEIRA, A. B. C.; MACEDO, L. R. O diagnóstico da perda auditiva na infância. Pediatria, São Paulo, v. 29, p. 43-49, 2007.

Notas de autor

1 Médica e Enfermeira, graduada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro/Campus UFRJ-Macaé Professor Aloisio Teixeira, Macaé/RJ - Brasil. E-mail: paulafigueiredo.pf9@gmail.com
2 Acadêmica do Curso de Graduação em Medicina na Universidade Federal do Rio de Janeiro/Campus UFRJ-Macaé Professor Aloisio Teixeira, Macaé/RJ - Brasil. E-mail: ta.bichara@gmail.com
3 Graduada em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio de Janeiro/Campus UFRJ-Macaé Professor Aloisio Teixeira, Macaé/RJ - Brasil. E-mail: kelly.pimentel@hotmail.com.
4 Doutora em Ciências Morfológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2009). Professora Associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro/Campus UFRJ-Macaé Professor Aloisio Teixeira, Macaé/RJ - Brasil. E-mail: sousa.vo@gmail.com
5 Pós-Doutorado em Surdez no PROJETO SURDOS-UFRJ/Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis/CCS/Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Doutora em Ciências pelo Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Fiocruz (2005). Professora Associada II do Curso de Nutrição, da Universidade Federal do Rio de Janeiro/Campus UFRJ-Macaé Professor Aloísio Teixeira, Macaé/RJ - Brasil. E-mail: janecapelli@macae.ufrj.br.
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