ARTIGOS DE REVISÃO
O crescimento da geração distribuída no contexto da crise hidroenergética na região Sudeste do Brasil: aspectos ambientais e socioeconômicos
Growth of distributed generation in the context of the hydropower crisis in the Southeast of Brazil: environmental and socioeconomic aspects
El crecimiento de la generación distribuida en el contexto de la crisis hidroenergética en el sudeste de Brasil: aspectos ambientales y socioeconómicos
O crescimento da geração distribuída no contexto da crise hidroenergética na região Sudeste do Brasil: aspectos ambientais e socioeconômicos
Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 22, núm. 3, 2020
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
Recepción: 12 Mayo 2020
Aprobación: 25 Agosto 2020
Resumo: Diante da crise hidroenergética na região Sudeste (SE) do Brasil, ocorrida entre 2012-2015, o objetivo deste trabalho é analisar como os consumidores da região supracitada foram conduzidos a implantar sistemas de Geração Distribuída (GD) nesse período. Para isso, realizou-se uma pesquisa exploratória de dados referentes ao nível dos reservatórios do subsistema Sudeste/Centro-Oeste, ao consumo e ao custo de eletricidade da região e à evolução da GD. Esta pesquisa possibilitou notar que a crise hídrica ampliou a necessidade do uso das usinas térmicas e, consequentemente, aumentou as emissões dos gases do efeito estufa (GEE) e fez com que o custo da energia elétrica fosse elevado, principalmente, para os consumidores das classes residencial e comercial do SE. Assim, como forma de reduzir os custos com eletricidade, os consumidores investiram em fontes renováveis de energia (FRE). Dentre elas, a energia solar fotovoltaica (ESFV) foi a fonte de energia mais utilizada por todas as classes de consumidores, principalmente, a residencial e a comercial, em toda a região SE.
Palavras-chave: FRE, Diversificação, Matriz elétrica, Energia fotovoltaica.
Abstract: Given the hydropower crisis in the Southeast region of Brazil in the years 2012-2015, the objective of this work is to analyze how consumers in the aforementioned region were led to implement Distributed Generation systems in that period. An exploratory data analysis was carried out regarding the level of reservoirs in the Southeast / Midwest sub-system, the consumption and cost of electricity in the region, and the evolution of Distributed Generation. This research made it possible to notice that, the water crisis increased the need for the use of thermal plants and, as a result, it increased the emissions of greenhouse gases, causing the cost of electricity to be high, especially for residential and commercial consumers in the Southeast. Thus, in order to reduce electricity costs, consumers invested in renewable energy sources. Among them, photovoltaic solar energy was the most used source of energy by all classes of consumers, mainly residential and commercial throughout the Southeast region.
Keywords: Renewable Energy Source, Diversification, Electric Power Sources, Photovoltaic Energy.
Resumen: En vista de la crisis de la energía hidroeléctrica en la región sudeste de Brasil que se produjo entre 2012-2015, el objetivo de este documento es analizar cómo los consumidores de la región mencionada se vieron obligados a implementar sistemas de generación distribuida en este período. Para esto, se realizó una encuesta exploratoria de datos sobre el nivel de los reservorios del subsistema Sudeste / Medio Oeste, el consumo y el costo de la electricidad en la región y la evolución de la generación distribuida. Esta investigación permitió notar que la crisis del agua aumentó la necesidad del uso de plantas térmicas y, en consecuencia, aumentó las emisiones de gases de efecto invernadero y causó que el costo de la electricidad sea alto, especialmente para los consumidores en las clases residenciales y comercial en el sudeste. Por lo tanto, como una forma de reducir los costos de electricidad, los consumidores invirtieron en fuentes de energía renovables. Entre ellos, la energía solar fotovoltaica fue la fuente de energía más utilizada por todas las clases de consumidores, principalmente residenciales y comerciales, en toda la región Sudeste.
Palabras clave: Fuentes de energía renovables, Diversificación, Matriz eléctrica, Energía fotovoltaica.
1 Introdução
A matriz elétrica brasileira é constituída por um balanço hidrotérmico com predominância da geração hídrica. Essa matriz, segundo o Balanço Energético Nacional 2019 – ano base 2018, era composta por 66,6% de geração hídrica, 8,5% por geração térmica de biomassa e 8,1% por energias eólica e solar, o que torna a matriz elétrica brasileira uma das mais renováveis do mundo (BRASIL, 2019a).
Embora haja uma predominância de fontes renováveis de energia na matriz elétrica, Hunt, Stilpen e Freitas (2018) afirmam que essa configuração do setor elétrico brasileiro propicia maior vulnerabilidade frente às mudanças hidrológicas intensas. Além disso, os autores apontam para existência de uma sazonalidade nas crises hídricas no país com ciclos em intervalos de 10 a 15 anos. Prado e colaboradores (2016) argumentam que, além da vulnerabilidade às mudanças hidrológicas intensas, as políticas energéticas ineficientes e o uso indevido de recursos financeiros para construções desnecessárias de usinas contribuíram para o aumento da insegurança energética no país.
Então, é consenso entre os pesquisadores que o incremento das fontes renováveis de energia (FRE), como eólica, biomassa e solar, pode contribuir para diversificação da matriz elétrica, diminuir a insegurança energética e ainda mitigar as emissões dos gases de efeito estufa (GEE), como o Dióxido de Carbono Equivalente (CO2eq.) para a atmosfera. Além disso, a expansão da energia eólica, solar e biomassa são economicamente mais viáveis que a construção de outras hidroelétricas (ANDRADE GUERRA et al., 2015; GEORGESON; MASLIN; POESSINOUW, 2016; GILS; SIMON; SORIA, 2017).
Nesse sentido, o governo brasileiro assinou o Acordo de Paris se comprometendo a contribuir para redução das mudanças climáticas globais. De acordo com o Intended Nationally Determined Contribution (INDC) o país incentiva a ampliação do uso das fontes renováveis de energia, sendo o mesmo ratificado, em 2016, por meio do Congresso Nacional. Com isso, o Brasil se comprometeu a reduzir as emissões de GEE em 37% até 2025, na comparação com os níveis registrados de 2005; e em 43% até 2030. No item do INDC relacionado à energia, o país se dispôs a ampliar o uso das fontes renováveis, além da energia hídrica, a eólica, biomassa e a solar (BRASIL, 2016b).
Nessa linha, diversas ações vêm contribuindo para minimizar o cenário de dependência da geração hidroelétrica, tais como: o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas (PROINFA); as Resoluções Normativas 482/2012 e 687/2015 da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL); o Programa de Desenvolvimento da Geração Distribuída de Energia Elétrica (ProGD); e os leilões de energia específicos para as FRE (BRASIL, 2016d; BRASIL, 2018a; BRASIL, 2018d; SILVA et al., 2013).
Contudo, as ações e as políticas públicas relacionadas à geração distribuída (GD) foram moldadas e implementadas no auge da crise hidroenergética. Diante disso, o objetivo deste trabalho é analisar e compreender como a referida crise hídrica e as políticas públicas específicas contribuíram para o crescimento da GD na região Sudeste (SE) do Brasil no período de 2010 a 2017.
2 Referencial teórico
2.1 Conceito de Geração Distribuída
A GD pode ser definida como “… qualquer fonte geradora com produção destinada, em sua maior parte, a cargas locais ou próximas, alimentadas sem necessidade de transporte da energia através da rede de transmissão, e que tenha capacidade de mobilidade no que diz respeito à sua localização física.” (AMARAL et al., 2016, p. 3).
Em relação à fonte de energia primária utilizada na GD, ela pode ser renovável ou não renovável. Dentre as fontes não renováveis utilizadas destacam-se o gás natural (GN) em microturbinas, células a combustível e motores alternativos com combustão interna. As fontes renováveis utilizadas são as pequenas centrais hidroelétricas, energia eólica, biomassa em termoelétricas, biogás em microturbinas e solar fotovoltaica (ALLAN et al., 2015; CARLEY, 2009).
Para Teixeira et al. (2006), a GD torna-se uma alternativa para o sistema elétrico a partir do momento em que reúne benefícios. Esses, por sua vez, podem adequar-se ao mercado de energia e aumentar a eficiência na utilização dos recursos naturais, mitigando os impactos ambientais provenientes da geração centralizada.
2.2 Resoluções Normativas (RN)
No Brasil, a GD é regulamentada pela ANEEL mediante a RN 482 de 17 de abril de 2012 e a 687 de 24 de novembro de 2015. A RN 482/2012 foi um marco para GD no Brasil. Todavia, ela tinha limitações no uso da energia excedente e nas modalidades de utilização dos sistemas, além do elevado tempo para os trâmites burocráticos junto à concessionária local de energia elétrica, o que se tornava outro fator limitante para sua expansão (VAZQUEZ; HALLACK, 2018).
Para sanar as lacunas da RN 482/2012, foi publicada a RN 687/2015 que alterou a primeira RN. Dentre as alterações realizadas, estão a definição de microgeração1 e minigeração2 distribuídas (BRASIL, 2016c).
482/2012 | 687/2015 | ||
Definições | Microgeração | P ≤ 100 kW | P ≤ 75 kW |
Minigeração | P < 100 kW ≤ 1MW | P < 75kW ≤ 3MW (hídrica) ou 5 MW (cogeração qualificada) | |
Modalidades | Autoconsumo remoto | Autoconsumo remoto | |
-------------- | Geração Compartilhada | ||
-------------- | Empreendimento com múltiplas unidades consumidoras | ||
Créditos de energia excedente | 36 meses | 60 meses | |
Prazos dos trâmites administrativos para concessão da conexão à rede junto às distribuidoras | Máximo 82 dias | Máximo de 34 dias para microgeração Máximo de 49 dias para minigeração |
Em relação ao tempo de utilização dos créditos de energia pelo usuário, passou dos 36 meses previstos inicialmente (RN 482/2012) para 60 meses (RN 687/2015). Entretanto, o sistema de compensação de energia elétrica continuou como net metering tariff (BRASIL, 2015). A nova RN também instituiu inovações nas modalidades de utilização da GD, tais como: empreendimento com múltiplas unidades consumidoras; geração compartilhada; e autoconsumo remoto (BRASIL, 2016c).
3 Metodologia
A região SE do Brasil é a segunda menor região do país, que possui uma área de 924.620 km², sendo composta pelos estados do Espírito Santo (ES), Minas Gerais (MG), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP) (Figura 1).
Assim, apesar de ela ser uma das menores regiões, concentra aproximadamente 55% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, e tem a maior população (87.711.946 habitantes em 2018). Isso, consequentemente, produz uma elevada densidade populacional (94,86 habitantes/km²) em termos de Brasil, e elevado Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre as regiões brasileiras (cerca de 0,794). Por conseguinte, o maior consumo de energia elétrica com 235.399 GWh foi no ano de 2018, ou seja, um consumo médio de 2,68 MWh por habitante, sendo a média nacional de 2,24 MWh por habitante (BRASIL, 2019b; IBGE, 2019).
As informações apresentadas anteriormente mostram a importância da região SE para o país do ponto de vista socioeconômico. Entretanto, entre os anos de 2010 e 2017, o Brasil sofreu uma redução no regime de chuvas que impactou diretamente no abastecimento de água e na produção de eletricidade do país, em especial a região SE (PIRES DO RIO; DRUMMOND; RIBEIRO, 2016). Com isso, o foco deste estudo foi verificar o aumento da GD no período da crise hidroenergética nessa região no período compreendido entre 2010 e 2017. Para isso, realizou-se uma pesquisa exploratória de dados dividida em duas etapas: análise descritiva dos dados e uma análise estatística.
Na primeira etapa, foram levantados dados referentes ao consumo de energia elétrica e ao valor médio das tarifas de eletricidade na região SE no período da crise hídrica, utilizando para isso os Relatórios de Consumo e Receita de Distribuição da ANEEL (BRASIL, 2018b). Investigou-se o percentual de energia armazenada nos reservatórios (EAR) do subsistema Sudeste/Centro-Oeste a partir do histórico da geração do Operador Nacional do Sistema (ONS) (ONS, 2018). Além disso, foi realizado o levantamento do PIB brasileiro no período estudado.
Os outros dados levantados e, posteriormente, analisados descritivamente foram relacionados à GD com potência instalada de até 5 MW3 na região SE entre 17 de abril de 2012 (data da publicação da RN 482) e 31 de dezembro de 2017. Para isso, foram obtidos dados no banco de informações de geração relacionados à GD, em que se considerou o comportamento deste tipo de geração de eletricidade levando em consideração os seguintes aspectos: tipos de fonte de energia utilizada e tipos de classes consumidoras (residencial, comercial, industrial e rural) (BRASIL, 2018c).
Nessa etapa estatística, foi utilizada Análise de Regressão com o software BioEstat versão 5.3 com o objetivo de verificar as relações existentes entre: geração termoelétrica na região SE e a EAR; geração termoelétrica e emissões de CO2eq. e; custo médio das tarifas de energia elétrica e a potência instalada por GD.
4 Resultados e Discussão
A Figura 2 apresenta um conjunto de mapas referentes à precipitação total acumulada no Brasil entre os anos de 2010 e 2017, em que se destacam os estados da região SE, foco deste estudo.
Nota-se, pelos mapas apresentados (Figura 2), uma drástica redução nas precipitações acumuladas, principalmente nas regiões Nordeste (NE) e SE. A região SE, como mencionado anteriormente, mostra que a estiagem trouxe restrições no abastecimento de água para os quatro estados, além dos impactos negativos em suas economias. Sendo que, para Pires do Rio, Drummond e Ribeiro (2016), a crise hídrica experimentada pelo país “indica muitos problemas subjacentes relacionados à gestão da água” e segundo Targa e Batista (2015), a crise trouxe à tona para sociedade, a importância da discussão da água e da floresta amazônica para a manutenção do regime de chuvas no SE.
Nesse sentido, a Figura 3 apresenta a geração elétrica, em GWh, a partir do percentual de EAR na região SE, juntamente com o aumento do uso de usinas termoelétricas durante a crise hídrica.
Observa-se que a redução da energia potencial hidráulica se iniciou por volta de 2012 e continuou decaindo até 2014, chegando ao menor patamar e se manteve no ano seguinte. Adverte-se, também, que, a partir de 2016, houve uma melhora na EAR, contudo esses valores não mais alcançaram os mesmos de EAR referente a 2012.
Como consequência da redução na EAR, houve redução da geração de energia elétrica, uma vez que a maioria das usinas hidroelétricas da região SE se configuram como usinas à fio d’água, ou seja, usinas em que seus reservatórios são projetados para prover regularização diária ou semanal (REIS, 2011). Goldemberg (2015, p. 39) afirma que “usinas a fio d’água se tornaram a regra e não a exceção. Com esse tipo de usina a produção de eletricidade fica totalmente dependente do regime de chuvas e fluxo de água dos rios”.
Por outro lado, fez-se necessária a ampliação no uso das usinas termoelétricas, principalmente a GN, como forma de compensar a redução da geração hidroelétrica e manter o suprimento de eletricidade (MENDES; STHEL, 2017), tendo a geração térmica alcançado seu maior patamar em 2015 com cerca de 6.250 GWh de energia produzida. Então, para verificar a existência de uma relação significativa entre a EAR e a geração termoelétrica aplicou-se como método estatístico a regressão linear (Figura 4).
Na Figura 4, é apresentada a equação que mais se aproximou do conjunto de pontos representados no diagrama de dispersão, mostrando a variação da geração termoelétrica (GWh) com a EAR (%). O coeficiente de determinação (R²) igual a 0,9302 e constata a influência significativa exercida da EAR sobre a geração térmica (p = 0,0003) em um intervalo de confiança (IC) de 95%, corroborando a afirmação de Mendes e Sthel (2017).
E, do ponto de vista ambiental, tal cenário proporcionou o aumento de GEE da matriz elétrica brasileira, tornando-a mais intensiva em carbono. Nesse aspecto, as mudanças hidrológicas expuseram a insustentabilidade do modelo hidrotérmico utilizado na matriz elétrica no país (HUNT; STILPEN; FREITAS, 2017).
Na Figura 5, são apresentas as emissões de CO2, em MtCO2eq., compreendidas entre anos de 2010 e 2017 do setor de energia nos quatros estados que compõem a região SE. Nela, observam-se dois momentos distintos no que diz respeito ao período estudado: 2010 até 2014 e 2014 até 2017.
No primeiro momento, houve um aumento das emissões de CO2eq. em todos os estados. Dentre os quatro estados, o Espírito Santo possuiu as menores taxas de emissões de CO2eq., pois o mesmo possui a menor população e PIB da região. Por outro lado, São Paulo é o maior emissor de CO2eq., uma vez que possui a maior população e PIB.
Já o Rio de Janeiro emitiu mais CO2eq. que Minas Gerais. Isso se deve ao fato de o PIB do Rio de Janeiro ser maior que o de Minas Gerais. Porém, outro fator para a maior emissão do Rio de Janeiro está relacionado ao uso intensivo de usinas térmicas, uma vez que o estado sedia a bacia petrolífera de Campos e detém facilidade logística para o escoamento e distribuição de petróleo e GN (MENDES; STHEL, 2018).
Vale salientar que os dados das emissões do setor de energia foram compostos de emissões fugitivas e pela queima de combustíveis dos seguintes segmentos econômicos: transporte (48,2%), indústrias (15,8%), geração de eletricidade (12,8%), produção de combustíveis (12,8%) e outros (10,5%), dados para todo o Brasil (SEEG, 2019).
Então, para verificar a existência de uma relação significativa entre a geração termoelétrica e as emissões de CO2eq. do setor de energia, aplicou-se como método estatístico a regressão linear (Figura 6).
Na Figura 6, é apresentada a equação que mais se aproximou do conjunto de pontos representados no diagrama de dispersão, mostrando a variação das emissões de CO2eq. (MtCO2eq.) com a geração termoelétrica (GWh). O R² foi igual a 0,8078, o que constata a influência significativa exercida da geração térmica sobre as emissões de CO2eq. (p = 0,0363) em um IC de 95%. Portanto, os aumentos das emissões de CO2eq. na região SE, no primeiro momento estudado (2010-2014), têm participação direta do segmento geração de eletricidade, devido à crise hídrica e ao aumento no uso de fontes não renováveis, também corroborando o trabalho de Mendes e Sthel (2017).
A partir de 2014, observa-se, na Figura 5, uma sutil queda das emissões de CO2eq. em todos os estados devido à redução das suas atividades econômicas. Foi a maior queda ocorrida no estado de São Paulo, sendo mostrada a variação do PIB, em percentual, no Brasil no período estudado na Figura 7. Nela, é possível notar com clareza também dois momentos distintos: 2010 a 2014 e 2015 a 2017.
Em geral, no período estudado, o PIB foi decrescente, porém ainda positivo até 2014. Todavia, entre 2015 e 2017 o indicador variou negativamente, sendo nesse último ano pesquisado marcado por um aceno de recuperação. Esse cenário de decrescimento do PIB gerou uma das maiores recessões da história econômica brasileira, tendo fortes indícios de relação com erros nas políticas públicas e instabilidade política instaurada no país (BARBOSA FILHO, 2017).
O crescimento econômico expresso pelo resultado do PIB em 2010 gerou um maior poder de compra dos brasileiros (PODER…, 2018). Isso refletiu no maior consumo de eletricidade e, aliado a isso, houve também, nos anos seguintes, temperaturas mais elevadas no país (BRASIL, 2018f). Nesse sentido, a Figura 8 apresenta a evolução do consumo de energia elétrica, em MWh, na região SE e as tarifas médias, em R$/MWh, na mencionada região entre os anos de 2010 e 2017.
Nota-se, pela Figura 8, que o consumo de eletricidade foi crescente entre os anos de 2010 e 2014. A pesquisa aponta ainda que, apesar da redução nos níveis dos reservatórios e da geração hídrica, em 2013, o governo brasileiro anunciou a redução nas tarifas de energia elétrica a partir da Lei 12.783/2013, incentivando ainda mais o consumo de eletricidade pelos brasileiros (BRASIL, 2018a; DILMA…, 2018).
Entretanto, a partir de 2014, a economia brasileira começou a entrar em recessão. Concomitantemente, a crise hídrica se agravou e as usinas térmicas tiveram que ser acionadas em plenitude, forçando assim o aumento das tarifas de energia elétrica e contribuindo para o maior aprofundando da crise econômica (MENDES; STHEL, 2017).
Evidentemente, na região SE, o cenário de aumento nos preços da energia elétrica foi o mesmo verificado no país e pode ser visto na Figura 9, que apresenta a evolução do custo da energia elétrica, em R$/MWh, especificamente na região em questão para os consumidores das classes residencial, comercial, industrial e rural no período de 2010 a 2017, por exemplo.
Constata-se uma redução, em 2013, do custo da energia elétrica para todas as quatro classes de consumidores, como indicado na Lei 12.783/2013. Entretanto, no ano seguinte houve crescimento do preço da tarifa de eletricidade para todos os consumidores mencionados pelos motivos citados por Mendes e Sthel (2017).
Na Figura 10, é mostrado o número de instalações e potência instalada, em kW, da GD na região SE por classes de consumidores no período entre 2012 a 2017.
Então, em geral, verifica-se um aumento expressivo da GD na região SE em todas as seis classes de consumidores, principalmente a partir de 2015. Tais crescimentos podem ser explicados pelo cenário de elevação dos preços das tarifas de energia elétrica, uma vez que o valor da tarifa média com tributos (R$/MWh) influenciou na potência instalada entre os anos de 2012 e 2017 (Figura 11).
Na Figura 11, é mostrada a equação que mais se aproximou do conjunto de pontos representados no diagrama de dispersão, mostrando a variação entre essas duas variáveis, em que o R² foi igual a 0,6582 e p = 0,05 em um IC de 95%. Isso mostrou uma tendência de que os consumidores buscaram meios para reduzir os custos com eletricidade e encontraram na GD uma alternativa economicamente viável.
Outro fator para explicar o fenômeno de crescimento mostrado na Figura 10 está relacionado com a alteração da RN nº482/2012 pela RN 687/2015, reforçando as políticas de incentivo à GD. Com isso, ao final de 2017, a classe residencial deteve 9.060 instalações de sistemas de GD (81%) e 37.526,54 kW de potência (30,39%). Porém, a classe comercial contabilizou 1.439 instalações com instalada de 59.246,07 kW (47,55%) (Tabela 2).
Classe de Consumidor | Número de instalações | Potência instalada (kW) |
Residencial | 9.060 | 37.526,54 |
Comercial | 1.439 | 59.246,07 |
Industrial | 190 | 13.248,05 |
Rural | 398 | 11.386,43 |
Poder público | 72 | 1.704,21 |
Serviço público | 26 | 948,54 |
Iluminação pública | 1 | 2,00 |
Total | 11.186 | 124.061,84 |
Com resultados menos expressivos, encontram-se as classes industrial com 190 sistemas instalados e potência total de 13.248,05 kW e rural com 398 sistemas e 11.386,43 kW. Com ínfima participação na GD, encontram-se as classes de poder público, serviço público e iluminação pública, justamente classes de consumidores que, se a GD estivesse instalada, traria um benefício mais significativo para toda a sociedade tanto do ponto de vista econômico quanto ambiental.
As figuras 12 e 13 mostram a participação de cada estado em número de instalações e a potência instalada, em kW, respectivamente. Nelas, a energia solar fotovoltaica (ESFV) foi a fonte de energia mais instalada e com maior potência instalada. Observa-se também a participação, em potência instalada, das usinas termoelétricas (UTE)4, centrais geradoras hidroelétricas (CGH) e eólica.
Observa-se, então, que o estado de Minas Gerais obteve o maior número de sistemas instalados (4.788 instalações), seguido de São Paulo com 4.010 sistemas, Rio de Janeiro com 1.646 e, por último, o Espírito Santo com apenas 659 instalações no período pesquisado. Mas, em todos os estados, observa-se a maciça utilização de sistemas de ESFV em detrimento aos outros tipos de fontes de energia (Figura 12).
Logo, em relação à potência instalada por estado e tipo de fonte de energia utilizada (Figura 13), verifica-se, novamente, a prevalência da ESFV em todos os estados, em que Minas Gerais veio novamente em primeiro lugar com 41.354,63 kW, seguido por São Paulo com 24.413,56 kW, Rio de Janeiro com 10.374,14 kW e, por último, o Espírito Santo com 2.908,55 kW. Mas, em percentual, no Espírito Santo a ESFV assumiu 100% da GD do estado, em São Paulo a ESFV deteve 95,28%, em Minas Gerais foi de 52,065% e no Rio de Janeiro foi de 64,42%.
Aliada à crise hidroenergética do período, outros fatores contribuíram para o crescimento significativo da ESFV na região SE, a saber:
o potencial de irradiação solar da região SE (aproximadamente metade do estado de Minas Gerais tem radiação solar entre 5,5 a 6 kWh/m².dia e a outra parte do estado entre 4,5 e 5 kWh/m².dia; São Paulo, em sua maioria, tem valores de radiação solar variando entre 4 e 5,5 kWh/m².dia, todavia o norte do estado tem radiação solar entre 5,5 e 6 kWh/m².dia; já os estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo têm radiação variando entre 4 e 5 kWh/m².dia) (NREL, 2016);
o potencial para implantação física dos sistemas de ESFV em telhados tanto de residências como de estabelecimentos comerciais (BALFOUR; SHAW; NESH, 2016; VILLALVA, 2015);
o estímulo dado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), mediante o Convênio ICMS nº 16 de 22 de abril de 2015 que autorizou a concessão de isenção do ICMS para a energia excedente produzida na GD sob regência RN 482/2012 (BRASIL, 2016b);
a Lei 13.169 de 6 de outubro de 2015 que no seu Art. 8º que extinguiu os encargos tributários sobre a energia elétrica excedente injetada na rede de distribuição de eletricidade por meio da GD (BRASIL, 2018b);
a alteração da RN 482/2012 pela RN 687/2015 da ANEEL, diminuindo a burocracia para homologação dos sistemas e incorporando outras modalidades de GD além da geração na própria unidade consumidora (BRASIL, 2016c);
a redução gradativa nos preços dos equipamentos que compõem os sistemas de energia solar fotovoltaica (módulos fotovoltaicos, estrutura de fixação dos módulos, inversores, etc.). Como exemplo, pode-se destacar o preço, em US$/W, dos módulos fotovoltaicos tipo policristalino de silício. Esses módulos, em 2012, custavam cerca de US$0,80/W e ao final de 2017 o mesmo passou a custar US$0,20/W (ENERGIA…, 2019).
Entretanto, além da ESFV, destacam-se as CGHs e UTEs nos estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Em Minas Gerais, a CGH se destacou como segunda fonte de energia para GD e assumiu uma potência de 26.710 kW (33,67%) seguida da UTE com 11.363,88 kW (14,31%). Já no Rio de Janeiro, as UTEs assumiram uma potência instalada de 3.627,68 kW (22,53%) enquanto as CGHs tiveram uma potência de 2.100 kW (13,04%). Em São Paulo, a participação das outras fontes de energia além da ESFV foi inexpressiva.
Os resultados supracitados expuseram a discrepância na utilização das fontes de energia até o ano de 2017, uma vez que os estados têm potenciais que poderiam ser mais bem utilizados, tais como: eólico, biomassa a partir de resíduos urbanos e agrícolas (sólido, líquido e gasoso) e, hídrica (principalmente nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo).
5 Considerações finais
Assim, a crise hidroenergética instalada no Brasil a partir de 2012 ocasionou impactos socioeconômicos e ambientais. Com relação aos impactos socioeconômicos, a crise acarretou o aumento no custo da energia elétrica para todas as classes de consumidores, sendo que na região SE as classes residencial e comercial sofreram os maiores reajustes. Na questão ambiental, a crise hidroenergética contribuiu no aumento das emissões do CO2eq. nos estados da região SE do Brasil.
Com isso, os consumidores buscaram na GD por meio de FRE uma alternativa economicamente viável para diminuição dos custos com energia elétrica. Sendo, a ESFV a fonte de energia mais utilizada na GD em todos os estados independentemente da classe de consumidores, uma vez que fatores relacionados ao potencial solar da região e políticas públicas de âmbito nacional contribuíram para tal crescimento.
A pesquisa, também, mostrou que as classes residencial e comercial foram as que obtiveram o maior número de instalações e potência instalada de GD por ESFV, posto que ela tem uma facilidade de implementação nesses tipos de consumidores da ESFV se comparada às outras fontes de energia, por exemplo a eólica.
Entretanto, no período estudado, observou-se que as classes do poder público, serviço público e iluminação pública ficaram aquém em participação na GD, porém essas classes têm considerável potencial para implantação física de sistemas de GD, contribuindo como: exemplo para os demais consumidores; aumento da eficiência dos prédios e serviços públicos; reduzindo os custos para as administrações públicas e consequentemente, os cidadãos; além de reduzir as emissões CO2eq..
Com isso, a pesquisa apontou que o crescimento da GD por ESFV na região SE deu-se a partir da crise hidroenergética instaurada no país e, paralelamente, políticas públicas de domínio nacional de incentivo a essa forma de geração de eletricidade. A crise proporcionou um novo aprendizado para os consumidores em termos de busca por alternativas protetivas contra os aumentos das tarifas de eletricidade durante a variação do ciclo hidrológico.
Agradecimentos
Os autores desta pesquisa agradecem o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Referências
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Notas
Notas de autor