DOSSIÊ TEMÁTICO: "RISCOS E DESASTRES SOCIOAMBIENTAIS"

Estratégias de enfrentamento dos riscos e desastres ambientais por meio da Política de Assistência Social

Strategies for preventing environmental risks and disasters through the Social Assistance Policy

Estrategias de prevención de riesgos y desastres ambientales basadas en la Política de Asistencia Social

Luana Fernandes dos Santos Azeredo 1
Brasil

Estratégias de enfrentamento dos riscos e desastres ambientais por meio da Política de Assistência Social

Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 23, núm. 1, 2021

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense

Este documento é protegido por Copyright © 2021 pelos Autores.

Recepción: 02 Octubre 2020

Aprobación: 02 Marzo 2021

Resumo: Este artigo traz reflexões sobre a atuação da Política de Assistência Social em contextos de desastres ambientais – temática notadamente fundamental para o debate na atualidade. Para tanto, partimos de pesquisa bibliográfica e documental buscando compreender a atuação dessa Política frente aos desastres, considerando sua instituição em uma sociedade fundada na lógica específica de acumulação capitalista. Identificamos que a resposta da Política de Assistência Social aos desastres ambientais ainda tem se dado de modo focalizado, pautada na lógica emergencial, desconsiderando a processualidade da produção dos desastres, bem como os elementos da estrutura social que os fomentam. Considerando isso, destacamos o papel estratégico que o setor da Vigilância Socioassistencial possui, demonstrando a importância da atuação profissional em meio a esses cenários, bem como sinalizando estratégias para tanto. Como esse setor atua diretamente com a produção de conhecimento acerca da realidade, desenvolvemos uma argumentação explicitando a relevância dessa atuação em ações de prevenção aos riscos e desastres ambientais.

Palavras-chave: Capitalismo, Desastre Ambiental, Assistência Social, Vigilância Socioassistencial.

Abstract: This article reflects on the performance of the Social Assistance Policy in contexts of environmental disasters - a notably fundamental theme to the debate today. To do so, we started with bibliographic and documentary research seeking to understand the performance of this Policy in relation to disasters, considering its institution in a society founded on the specific logic of capitalist accumulation. We identified that the Social Assistance Policy's response to environmental disasters has still been focused, based on emergency logic, disregarding the procedurality of the production of disasters, as well as the elements of the social structure that foster them. Considering this, we highlight the strategic function of the Social-Assistance Surveillance sector, demonstrating the importance of professional performance in the midst of these scenarios, as well as signaling strategies for this. As this sector works directly with the production of knowledge about reality, we have developed an argument explaining the relevance of this performance in actions to prevent environmental risks and disasters.

Keywords: Capitalism, Environmental Disaster, Social Assistance, Social-Assistance Surveillance.

Resumen: Este artículo trae reflexiones sobre el desempeño de la Política de Asistencia Social en contextos de desastres ambientales, un tema notablemente fundamental para el debate actual. Para ello partimos de una investigación bibliográfica y documental tratando de comprender el desempeño de esta Política frente a los desastres, considerando su institución en una sociedad fundada en la lógica específica de la acumulación capitalista. Identificamos que la respuesta de la Política de Asistencia Social a los desastres ambientales aún se ha enfocado, con base en la lógica de la emergencia, desconociendo la procedimentalidad de la producción de los desastres, así como los elementos de la estructura social que los propician. Teniendo esto en cuenta, destacamos el rol estratégico que tiene el sector de Vigilancia Asistencial, demostrando la importancia del desempeño profesional en medio de estos escenarios, así como señalando estrategias para ello. Como este sector trabaja directamente con la producción de conocimiento sobre la realidad, hemos desarrollado un argumento explicando la relevancia de este desempeño en acciones de prevención de riesgos y desastres ambientales.

Palabras clave: Capitalismo, Desastre Ambiental, Asistencia Social, Vigilancia Socio-Asistencial.

1 Introdução

O conteúdo tratado neste artigo versa sobre a compreensão do papel da Política de Assistência Social em contexto de desastre ambiental, considerando as peculiaridades da lógica de acumulação capitalista sobre esses elementos.

O objetivo é problematizar como tem se dado o trabalho de enfrentamento a esses fenômenos. Nesse sentido, destacamos um setor chave da referida Política (Vigilância Socioassistencial), como importante estratégia para a ação de prevenção dos riscos e desastres.

Partimos do pressuposto que esses fenômenos não são naturais, mas social e historicamente construídos, representando uma das faces das crises desencadeadas pelo sistema capitalista. A Política de Assistência Social representa um dos braços do Estado na contenção das demandas geradas por esses fenômenos, e possui ainda uma ação pautada pela emergência e não pela prevenção da concretização do risco.

2 Metodologia

O desenvolvimento deste trabalho se deu a partir de dois modelos de pesquisa, a saber: a documental, segundo a qual a “fonte de coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes primárias” (MARCONI, LAKATOS, 2003, p. 174); e a pesquisa bibliográfica que se baseia em fontes secundárias e “abrange toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo” (MARCONI, LAKATOS, 2003, p. 183). Também colaborou nessa produção a vivência da autora como profissional atuante em contexto de desastre ambiental via Política de Assistência Social e Núcleo de Pesquisa Acadêmico.

3 Resultados

3.1 Desastres Ambientais: reflexões iniciais

Iniciamos este texto com uma síntese do debate conceitual sobre os desastres, principalmente considerando os discursos negacionistas emergentes, os quais se opõem, por exemplo, à realidade do aquecimento global, ou mesmo da pandemia da Covid-19. Consequentemente, as ações necessárias para o real enfrentamento dessas questões permanecem à margem da esfera de decisão política. Portanto, é imprescindível nos estudos sobre desastres ambientais um posicionamento claro acerca do que eles são.

A partir de uma primeira aproximação com o fenômeno, podemos reconhecê-lo enquanto evento da natureza que sempre assolou a humanidade e envolve elementos como água, terra e ar, por exemplo. Quando em interação ou dinâmica extrema, tais elementos causam desastres como as inundações, movimentações de terra, furacões, dentre outros. À primeira vista, portanto, tais são as determinações mais superficiais desse tipo de fenômeno, o qual apenas se constitui enquanto desastre caso pessoas sejam atingidas. Logo, uma chuva forte que cai sobre o mar não é um desastre, porém, se essa mesma chuva cai sobre a cidade causando inundação, isso configura um desastre (GESTÃO…, 2012).

Diversos estudos1 tentam formular uma definição para o que são os desastres, contudo ainda hoje não há um consenso quanto a isso. Não cabe neste momento uma análise aprofundada sobre as distintas vertentes de análise sobre os desastres, porém, para uma melhor contextualização da perspectiva que tem nos orientado, podemos avançar um pouco mais na compreensão dessa definição.

Diversas esferas do conhecimento têm se debruçado sobre a tarefa de compreender o que são os desastres, destacando-se as áreas do Direito dos Desastres e Sociologia dos Desastres. Na esfera do direito existem diversos tratados entre países objetivando regulamentar de alguma forma a ação perante esses fenômenos. Criou-se, então, uma base de entendimento internacional sobre os mesmos, cujos elementos principais versam sobre: ser um evento natural ou influenciado pelo ser humano; produz riscos e danos tanto às pessoas, quanto às propriedades e meio ambiente (VIEIRA, 2017).

Segundo o Inter-Agency Standing Committee - IASC2, por exemplo, os desastres podem ser considerados “consequências de eventos desencadeados por riscos naturais que sobrecarregam a capacidade de resposta local e afetam seriamente o desenvolvimento social e econômico de uma região” (p. 2008, p. 5, tradução e grifo da autora).

Já a Organização das Nações Unidas compreende os desastres como uma

séria interrupção no funcionamento de uma comunidade ou sociedade que ocasiona uma grande quantidade de mortes da mesma forma que perdas e impactos materiais, econômicos e ambientais que excedem a capacidade da comunidade ou sociedade afetada de fazer frente à situação mediante o uso de seus próprios recursos (UNISDR, 2009, p. 13-14, tradução da autora).

Normativamente, no Brasil os desastres foram definidos pelo Ministério da Integração Nacional como

resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um cenário vulnerável, causando grave perturbação ao funcionamento de uma comunidade ou sociedade envolvendo extensivas perdas e danos humanos, materiais, econômicos ou ambientais, que excede a sua capacidade de lidar com o problema usando meios próprios (BRASIL, 2012, p. 1).

Há, inclusive, a Classificação e Codificação Brasileira de Desastres (COBRADE)3, a qual divide os desastres em duas categorias: desastres naturais e desastres tecnológicos. Tais definições, no entanto, abstêm fatores qualitativos significativos desses fenômenos, afastando-se de uma visão totalizadora, ontológica dos mesmos. Não conseguem evidenciar, por exemplo, o papel que a estrutura e dinâmica social exercem nesse contexto. Isso tem contribuído para a manutenção de uma racionalidade na qual os desastres são tidos enquanto eventos naturais e inevitáveis, recaindo a culpa sobre os atingidos, os quais, em contexto de inundação por exemplo, são tidos como “teimosos” (VALENCIO, 2009) que insistem em habitar em locais de risco.

Por muito tempo perdurou a visão do desastre enquanto evento “natural” e é somente a partir da década de 1970 que se iniciam os estudos nas ciências sociais voltados para análises mais amplas a respeito do conceito, levando em consideração aspectos sociais (GILBERT, 1995)4.

Nesse sentido, o desastre passa a ter outra via de interpretação considerando a dinâmica e estrutura social como fatores importantes nesse processo, afastando-se da visão empiricista e buscando a compreensão dos reais e mais elementares determinantes desses fenômenos.

Essa perspectiva de análise ganha espaço a partir do campo de conhecimento denominado Sociologia dos Desastres, o qual põe em evidência o papel que agentes sociais como o Estado, a sociedade e o setor privado exercem no processo de construção e intensificação dos desastres ambientais.

Mesmo com tal avanço, ainda perduram discursos diversos acerca do que são os desastres. Segundo Valencio (2014), isso se expressa a partir de um conflito entre duas teorias: a teoria dos hazards e a teoria dos desastres.

A teoria dos hazards enfatiza uma abordagem geográfica, na qual os mecanismos físicos, a distribuição temporal e espacial e dinâmica de eclosão dos eventos físicos têm maior peso, enquanto a teoria dos desastres, construída desde uma abordagem sociológica, enfatiza as considerações sobre a organização social complexa e o comportamento coletivo. (VALENCIO, 2014, p. 3632).

O desastre, então, pode ser considerado um fenômeno natural, resultante exclusivo de fatores físicos que ocorre em um dado momento específico. As fortes chuvas, por exemplo, podem causar inundações e/ou alagamentos nas cidades, produzindo danos diversos. Uma vez que as águas baixam, os atingidos iniciam as ações necessárias para o retorno à rotina cotidiana. O desastre, por essa perspectiva, é compreendido enquanto o momento no qual a população estava sendo afetada pelas águas e finda-se com o cessar desse cenário. A chuva é reconhecida, e até noticiada, como o elemento fomentador da crise do desastre denominado como “natural”.

Por outro lado, entendemos o desastre enquanto um fenômeno constituído por elementos ambientais e sociais em interação, cuja construção se dá ao longo de um processo e não espontaneamente em apenas um dado momento no tempo. Retomando o exemplo anterior, por essa outra perspectiva a chuva passa a ser compreendida enquanto o elemento deflagrador da crise dos desastres, ou seja, o agente desencadeador do ápice do processo. O desastre, todavia, não se restringe apenas ao momento no qual as águas afetam a população, mas se expressa em um processo constituído por três cenários: o pré-desastre (momento no qual o risco passa a existir), a crise do desastre (quando o risco é materializado), e a continuação do desastre (quando o momento mais crítico passa, porém ainda se mantém uma ruptura com o modo de vida anterior).

Os desastres por essa ótica, portanto, são concebidos a partir da interação entre elementos da natureza (como as fortes chuvas) e a dinâmica das relações sociais que, na sociedade capitalista, assume valores, normas e relações de produção que levam a humanidade a um rompimento metabólico com a natureza (MARX, 2017).

Nesse sentido, consideramos que o mais adequado não seria referir-se aos desastres como “naturais”, posto que contribui para dificultar uma problematização crítica a respeito do fenômeno. Tal expressão por si só já traz uma conotação de que esses fenômenos são fruto de uma “lei natural” que rege a vida em sociedade, escondendo seus reais determinantes. Entendemos que

naturais podem ser as chuvas, as secas, as erupções vulcânicas, porém, estas e outras manifestações da natureza somente se transformam em desastres quando se entrelaçam com determinadas condições de vida, de moradia, de saúde, em suma, de precariedade exacerbada pelas taxas de desigualdade encontradas na sociedade. Ainda que muitos destes processos venham à tona a partir da dimensão física, os mesmos são, essencialmente, de outra ordem. É no processo de tecitura cotidiana que vão se moldando os rostos das reais vítimas dos desastres, em sua imensa maioria pobres e não brancos, que assistem suas moradias precárias serem arrastadas pelas chuvas incessantes, que relembram seus parentes soterrados pela lama e pelos escombros, que constatam a contaminação de seus meios de sobrevivência por produtos tóxicos, enfim, que experimentam uma série de violações que vão muito além do momento do impacto (DUTRA, 2018, p. 34-35).

Em outras palavras, a produção e/ou intensificação dos processos de desastres se dão a partir das relações sociais, influenciadas também pelo ambiente, o que implica o reconhecimento de elementos não apenas naturais nesse processo, mas principalmente antrópicos, notadamente delineados na sociedade capitalista pela lógica de acumulação do capital.

A fim de diferenciar nossa perspectiva, portanto, trataremos os desastres neste trabalho como “desastres ambientais”, visto que os compreendemos como socialmente determinados, ou seja, são determinados pelas condições postas pelo capital para sua autorreprodução.

Em concordância, Vieira sinaliza que os

desafios enfrentados com relação aos desastres na atualidade demonstram que a responsabilidade humana não pode ser separada dos fatores puramente ambientais para se conceituar um evento calamitoso. O ser humano influencia de tal modo o ambiente, que não há como definir um desastre como puramente natural ou como puramente ocasionado por suas mãos. […] A interação do indivíduo com seu meio, os arranjos sociais institucionais que permitem os seres humanos alterarem o ambiente físico em busca de sustento e abrigo, o grau de resposta que a sociedade dará às consequências dessas atitudes, tudo representa elementos que moldam a evolução do desastre. (VIEIRA, 2017, p. 37, 71).

Para fins de definição, portanto, compreendemos os desastres ambientais enquanto a “concretização do risco, isto é, uma interação deletéria entre um evento natural ou tecnológico e a organização social, que coloca em disrupção as rotinas de um dado lugar e gera elevados custos (temporais, materiais e psicossociais) de reabilitação e reconstrução. “(VALENCIO et al., 2005, p. 163-164).

A seguir, trataremos do debate sobre a função da Política de Assistência Social em contexto de desastre, destacando a importância do trabalho da Vigilância Socioassistencial por meio da produção de conhecimento.

3.2 A Vigilância Socioassistencial como estratégia para o desenvolvimento do trabalho preventivo em contextos de desastres ambientais

A Vigilância Socioassistencial pode ser compreendida concomitantemente enquanto um objetivo, um instrumento e uma função da Política de Assistência Social. De acordo com a Lei n. 12.435 de 6 de julho de 2011, que altera a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) (BRASIL, 2011), ela se expressa enquanto um objetivo, analisando “territorialmente a capacidade protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, de vitimizações e danos”. Também é um “instrumento das proteções da assistência social que identifica e previne as situações de risco e vulnerabilidade social e seus agravos no território” (BRASIL, 2011).

Já o artigo 87 da Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social de 2012 (NOBSUAS), apresenta a Vigilância Socioassistencial como uma das funções da Assistência Social, devendo realizar-se

por intermédio da produção, sistematização, análise e disseminação de informações territorializadas, e trata:

I – das situações de vulnerabilidade e risco que incidem sobre famílias e indivíduos e dos eventos de violação de direitos em determinados territórios;

II – do tipo, volume e padrões de qualidade dos serviços ofertados pela rede socioassistencial. (BRASIL, 2012, p. 40).

Para tanto, deve fornecer informações sistematizadas que

I - contribuam para que as equipes dos serviços socioassistenciais avaliem sua própria atuação;

II - ampliem o conhecimento das equipes dos serviços socioassistenciais sobre as características da população e do território de forma a melhor atender às necessidades e demandas existentes;

III - proporcionem o planejamento e a execução das ações de busca ativa que assegurem a oferta de serviços e benefícios às famílias e indivíduos mais vulneráveis, superando a atuação pautada exclusivamente pela demanda espontânea. (BRASIL, 2012, p. 41).

O termo “vigilância” pode gerar interpretações equivocadas, portanto é importante salientar que não cabe a esse setor uma postura fiscalizadora/punitiva, mas um trabalho direcionado à identificação das vulnerabilidades e riscos sociais existentes nos territórios, bem como a capacidade de atendimento dos serviços a essas demandas, objetivando a partir desse conhecimento melhor subsidiar os técnicos e gestores na planificação das suas ações e tomadas de decisão. Nesse sentido, é função da Vigilância Socioassistencial “saber onde estão e quantos são os que demandam por proteção social e qual é a capacidade dos equipamentos e serviços para suprir suas necessidades” (SILVA, 2015, p. 3), o que é fundamental para se evitar o agravamento de determinadas situações, bem como prevenir outras.

O trabalho desse setor está diretamente vinculado, portanto, às expressões da questão social como a pobreza, a baixa escolaridade, o deficit habitacional, dentre outras. Tais expressões se apresentam como elementos que contribuem para a produção e intensificação dos processos de desastres ambientais. Tomando como exemplo a pobreza, identificamos que tem se expressado enquanto fator que se destaca em meio aos principais grupos atingidos por esses fenômenos.

Dados da CEPAL5 (2002) apontam que a ocorrência de desastres e pobreza reforçam-se mutuamente, indicando que em 1998, 95% das mortes por desastres ambientais aconteceram nos países pobres. Esses dados enfatizam a ideia de que, independentemente do lugar do planeta, os pobres são sempre as principais vítimas de catástrofes naturais. (SANTOS, 2012, p. 28).

Reforçando essa reflexão, o Escritório das Nações Unidas para Redução do Risco de Desastres afirma que “ao longo dos 20 anos, 90% das 1,35 milhão de pessoas que morreram em mais de 7 mil desastres são de países de baixa e média renda” (UNISDR, 2016, não paginado). Olhando para além dos números podemos compreender que antes da materialização do momento mais crítico do desastre existe um processo sendo construído a partir de elementos como a exploração entre classes, a expropriação de direitos e o adensamento da dependência entre países, que corroboram demasiadamente para a constituição de vulnerabilidades sociais. Essa vulnerabilidade não se refere aos sujeitos, às suas capacidades físicas, psicológicas ou biológicas, mas são as condições de vida que se tornam vulneráveis, dificultando o enfrentamento das crises dos desastres. Compreende-se, assim, que as vulnerabilidades possuem dimensões diversas como econômica, social, política, educacional, ecológica, dentre outras (DUTRA et al., 2011).

Como exemplificação podemos citar os territórios que possuem uma conformação específica favorecedora do risco, como lixões aterrados, beiras de rios ou encostas. Tal contexto relacionado com o alto custo para aquisição de uma habitação adequada, e à elevada precarização do mundo do trabalho, leva indivíduos e famílias inteiras a recorrerem a essas áreas – ainda não valorizadas pelo mercado – como alternativa para construção de suas casas6, enfrentando fenômenos como as inundações e movimentações de massa.

A pandemia da Covid-19 expressa mais um exemplo dessa vulnerabilidade. Também considerada um desastre7, a pandemia acaba sendo agravada pela ausência de condições das famílias de baixa renda manterem-se em isolamento social em decorrência das condições de trabalho (pois não podem parar), ou pelas condições da moradia – segundo a pesquisadora Marta Arretche, isso se dá pois “idosos e portadores de doenças crônicas convivem com os outros membros da família e até com outras famílias, em espaços apertados, muitas vezes dormindo no mesmo quarto”. (ARANTES, 2020, não paginado).

A partir de processos como esses, desdobram-se outros contextos de vulnerabilidade social ao enfrentamento das crises dos desastres, que se expressarão não somente no dito momento da crise, mas podem se estender para além dele. A título de exemplo, em contexto de inundações, muitos desses indivíduos e famílias poderão não retornar para as antigas residências por estarem condenadas, ou, no caso da pandemia, muitos deixarão de trabalhar para cuidar dos familiares enfermos ou das crianças que por enquanto não podem estar em creches ou escolas.

Isso nos apresenta um duplo movimento que merece destaque. O contexto de vida vulnerável vivenciado por essas pessoas acaba levando-as a serem as mais atingidas pelos desastres, ao mesmo tempo que os desastres aprofundam o contexto de vida vulnerável. Trata-se de um ciclo que demonstra não estar sendo interrompido, a julgar pelos dados de recorrência desses fenômenos, tanto em tipo, quanto em localidade – ou seja, os mesmos tipos de desastres ocorrem repetidas vezes nos mesmos lugares.

Podemos observar essa questão a partir do conteúdo exposto no Atlas Brasileiro de Desastres Naturais, referente ao período de 1991 a 2012, o qual analisa diversos tipos de fenômenos por região. Ao pegarmos as inundações8 na região sudeste brasileira como exemplo, podemos observar que se trata de um dos mais recorrentes tipos de desastres ambientais, superado apenas pelas enxurradas. Ao contrário dessas, as inundações por serem graduais, e ocorrerem com certa periodicidade, possuem maiores condições de previsibilidade, o que confere um peso maior às ações preventivas que impeçam a concretização do risco. Ao menos é o que se espera, todavia os dados informam o contrário como veremos a seguir.

Os gráficos 1 e 2 apontam para duas questões importantes. A primeira refere-se ao aumento anual das ocorrências de inundações no Estado do Rio de Janeiro (Gráfico 1), e a segunda o período de maior incidência desse fenômeno.

Frequência anual de desastres por inundações no Estado do Rio de Janeiro, no período de 1991 a 2012
Gráfico 1.
Frequência anual de desastres por inundações no Estado do Rio de Janeiro, no período de 1991 a 2012
Fonte: ATLAS… (2013)

Frequência mensal de desastres por inundações no Estado do Rio de Janeiro, no período de 1991 a 2012
Gráfico 2.
Frequência mensal de desastres por inundações no Estado do Rio de Janeiro, no período de 1991 a 2012
Fonte: ATLAS… (2013)

O Gráfico 1 nos remete à questão da recorrência do fenômeno e sua intensificação. O Gráfico 2 demonstra uma delimitação temporal dos períodos mais suscetíveis às inundações – início e final do ano. Tais elementos levantam o seguinte questionamento: se são as inundações previsíveis; já se sabe em quais períodos mais ocorrem; e por serem recorrentes deduz-se que já se construiu conhecimento e experiência suficientes para lidar com o problema, por que os casos continuam sendo registrados todo ano e, além disso, têm se intensificado?

Essa realidade não é somente brasileira, mas é constatada a partir de dados mundiais.

No total, o EM-DAT registrou uma média de 335 desastres relacionados ao clima por ano entre 2005 e 2014, um aumento de 14% de 1995-2004 e quase o dobro do nível registrado durante 1985-1994. Embora os cientistas não consigam calcular qual porcentagem desse aumento é devido às mudanças climáticas, as previsões de mais condições climáticas extremas no futuro quase certamente significam que iremos testemunhar uma tendência de aumento contínuo em desastres relacionados ao clima nas próximas décadas (CRED, UNISDR, 2015, p. 5, tradução da autora).

Como citado anteriormente, as condições vulneráveis de vida incidem diretamente nesse processo. Em relação aos danos causados pelas inundações no Rio de Janeiro entre 1991 e 2012, as habitações foram as mais atingidas em termos materiais, tanto em relação à destruição, quanto à danificação (Gráfico 3).

Danos materiais causados por desastres de inundações no Estado do Rio de Janeiro, no período de 1991 a 2012
Gráfico 3.
Danos materiais causados por desastres de inundações no Estado do Rio de Janeiro, no período de 1991 a 2012
Fonte: ATLAS… (2013)

Logo, o lar que é um dos principais lugares onde se reproduz a vida, e que já pode apresentar diversas precariedades físicas e ambientais, vulnerabiliza-se ainda mais a cada inundação. E é exatamente esse um dos principais campos de atuação da Vigilância Socioassistencial.

Ao analisarmos esse campo de atuação e seu potencial de produção de conhecimento, é possível perceber a relação intrínseca que possui com as ações de prevenção dos riscos e desastres ambientais. Quando se fala nesse trabalho de prevenção, usualmente nosso pensamento é direcionado às ações da Defesa Civil, instituição com forte marca de atuação nesses contextos. Todavia, destacamos neste trabalho a possibilidade do fortalecimento da prevenção a partir da Vigilância Socioassistencial. Para tanto, alguns elementos tornam-se essenciais para que isso ocorra:

  1. a) Guarda, sistematização e análise dos dados de forma coerente e disciplinada – O cotidiano de trabalho em um setor como a Vigilância Socioassistencial é marcado por um montante diverso e considerável de dados dos programas, projetos e serviços socioassistenciais. Para além da necessidade de uma visão consciente e planejada de organização desses dados, está talvez o que seja mais laborioso requerendo grande esforço intelectual: o olhar para além dos números e a transformação deles em conhecimento transformador da realidade.

Não basta, portanto, a produção de extensos e bem diagramados relatórios se deles não se pode absorver o que é necessário para problematizar a realidade e buscar mudanças. Os números por si só, organizados em tabelas por exemplo, nada mais são que informações. Posso informar que 75% da população de determinado território não possui o ensino médio completo. Todavia, qual o perfil dessa população? Gênero, faixa etária, cor? Trabalham? Por que não concluíram o ensino médio? Como se apresenta a rede escolar naquele território? Há demanda reprimida por vaga? Se sim, possui alguma relação com essa realidade? Existe alguma ação voltada para o enfrentamento dessa condição? A vida dessas pessoas tem sido impactada de alguma forma por esse motivo?

Enfim, são diversas questões que podem ser formuladas a partir de um simples número e representam o que realmente importa para a gestão da política pública. Trata-se de uma real análise dos números buscando a interpretação efetiva dos riscos e vulnerabilidades existentes nos territórios, e que requerem respostas do poder público.

  1. b) Devida estruturação do setor – A já referida Lei no 12.435 (BRASIL, 2011) informa que a gestão das ações da Assistência Social se dará a partir de um sistema descentralizado e participativo, a saber, o Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Dentre diversos objetivos provenientes dessa organização está assegurar a Vigilância Socioassistencial. A NOB-SUAS em seu artigo 90 informa ainda que a “União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem instituir a área da Vigilância Socioassistencial diretamente vinculada aos órgãos gestores da política de assistência social, dispondo de recursos de incentivo à gestão para sua estruturação e manutenção” (BRASIL, 2012, p. 41).

Todavia, os dados apontam para uma realidade ainda distante do que se preconiza, e isso pode ser verificado por meio da sistematização das respostas do CENSO SUAS 2018 e 2019. Uma das questões colocadas aos municípios foi se a Vigilância Socioassistencial (inclusive áreas de monitoramento e avaliação) faz parte da estrutura do órgão gestor. O resultado obtido está descrito no Quadro 1.

Quadro 1.
Respostas dos municípios brasileiros sobre estrutura da Vigilância Socioassistencial
BrasilMunicípios que responderamNão constituídaSim, de maneira informalSim, na estrutura formal do órgão gestor
Ano 20185539175320561730
Ano 20195489172020261743
Rio de JaneiroMunicípios que responderamNão constituídaSim, de maneira informalSim, na estrutura formal do órgão gestor
Ano 201892224327
Ano 201992223733
Fonte: CENSO SUAS 2018 e 2019 (BRASIL, 2018; BRASIL, 2019). Dados sistematizados pela autora.

Tanto em 2018 quanto em 2019 o número de municípios com o setor formalmente instituído não alcança nem 33%. Falando especificamente do Rio de Janeiro, esse percentual tem uma pequena elevação de um ano para o outro, todavia não chega a ultrapassar os 36%. Isso significa que a maior parte do Brasil não possui um setor de Vigilância Socioassistencial na estrutura formal do órgão gestor.

É preciso que o poder público estruture os setores de Vigilância Socioassistencial a fim de que possam efetivamente desempenharem seu papel. Nesse sentido, é fundamental, por exemplo: a formação de equipes a partir de um perfil técnico e não por indicação política; com profissionais que saibam atuar com coleta, sistematização e análise de dados utilizando ferramentas informacionais necessárias para tanto; a oferta de equipamentos como computadores e softwares indispensáveis para a maior agilidade e confiabilidade no manuseio dos dados, bem como para sua guarda com segurança; e o investimento em capacitações continuadas, o que, consequentemente, refletirá na qualificação do trabalho desenvolvido.

  1. c) Transformação da concepção que se tem sobre esse trabalho - Por ser um trabalho voltado para monitoramento e avaliação da política, muitos profissionais não o compreendem da forma adequada, mantendo-se por vezes a ideia de fiscalização e punição – mentalidade, essa presente tanto em equipes da Vigilância, quanto em meio a profissionais dos demais serviços.

Esse contexto acaba criando um distanciamento e, por consequência, a não apropriação desse trabalho por parte de todos que compõem o SUAS. É essencial, portanto, ultrapassar esse limite e apreender esse espaço como sendo coletivo, reconhecendo que o conhecimento só se produz de modo qualificado se o trabalho também for bem desempenhado desde a coleta de dados nas diversas unidades de atendimento.

Em outras palavras, a função da Vigilância Socioassistencial não cabe apenas a uma equipe denominada com tal nomenclatura, mas é transversal às atividades cotidianas de todos os profissionais do SUAS e, portanto, a produção de conhecimento, proveniente da contribuição de cada um em sua responsabilidade, acaba sendo uma ação coletiva. Ação essa que deve gerar frutos que retornarão a essas unidades em forma de resposta às demandas.

  1. d) Reconhecimento do papel do SUAS nos contextos de desastres ambientais – Destaca-se a relevância de se reconhecer a responsabilidade do SUAS para além das ações pautadas apenas na resposta à crise e não à sua prevenção. Esse movimento tem se mostrado urgente a fim de que a Assistência Social, em suas diversas particularidades municipais, assuma seu lugar de agente que deve ocupar-se “de prover proteção à vida, reduzir danos, prevenir a incidência de riscos sociais, independente de contribuição prévia […]” (BRASIL, 2012, p. 16), deslocando do lugar de ente passivo que permanece no aguardo da chamada de emergência, para agente ativo, propositivo, que com base nos diagnósticos socioterritoriais antecipa-se à ocorrência das crises dos desastres, ação essa que se dá a partir, principalmente, da vontade política, e do conhecimento do

cotidiano da vida das famílias, a partir das condições concretas do lugar onde elas vivem e não só as médias estatísticas ou números gerais, responsabilizando-se pela identificação dos “territórios de incidência” de riscos no âmbito da cidade, do Estado, do país, para que a Assistência Social desenvolva política de prevenção e monitoramento de riscos. (BRASIL, 2005, p. 93).

Percebe-se que o “risco” é elemento bastante presente nos documentos que orientam o funcionamento da Assistência Social. Isso se deve ao fato de que nessa política o risco é um dos conceitos-chaves que possibilitam a análise da relação entre necessidade e demanda por proteção social, bem como as respostas públicas por meio da oferta de serviços e benefícios (FARIAS, 2013). Trazemos aqui a exposição de Farias, pois representa a ideia que parte do Governo Federal. Segundo o autor,

a operacionalização do conceito risco exige a definição do conjunto de eventos em relação aos quais lhe compete diretamente desenvolver esforços de prevenção ou de enfrentamento para redução de seus agravos. Em relação a tais eventos é necessário desenvolver estudos que permitam algum tipo de mensuração da sua probabilidade de ocorrência ou de identificação de sua iminência, além de realizar o monitoramento de suas incidências. (FARIAS, 2013, não paginado).

Até aqui concordamos em termos com o autor, posto que compreendemos que a Assistência Social não deve permanecer no campo da redução dos agravos (como ele coloca), mas deve avançar para a busca do seu cessar. Continuando com sua abordagem sobre a citação acima, o autor faz uma afirmação complexa. Diz ele que a

Vigilância Socioassistencial não pode ficar adstrita a este escopo pois é extremamente importante reunir informações e análises relativas aos “riscos sociais” (inclusive socioambientais) em sentido amplo, visto que estes tendem a se remeter a situações de vulnerabilidade que desencadeiam efeitos sobre a necessidade/demanda por assistência social, ainda que o enfrentamento ou prevenção das causas não esteja na esfera de competência desta política. Como exemplo disso, pode-se citar o risco (e a incidência) do desemprego; as questões de segurança pública e violência urbana; os riscos socioambientais relacionados a desabamentos e enchentes etc. (FARIAS, 2013, não paginado).

Realmente identificamos a necessidade da Política de Assistência Social trabalhar um olhar mais global sobre a identificação dos riscos, uma vez que a sua percepção ainda está muito associada somente ao rompimento dos vínculos familiares, por exemplo. Todavia, ao se tratar de desastres ambientais, o risco ultrapassa essa perspectiva, inscrevendo-se na precarização radical das condições de vida como já vimos, ou, infelizmente, concretizando-se enquanto um risco de morte.

Não obstante, o autor aponta que a ampliação do olhar sobre os riscos está relacionada a situações que podem gerar demandas para a Assistência Social, citando, inclusive, o exemplo de desastres como desabamentos e enchentes. Ainda coloca que o enfrentamento ou prevenção dessas situações não estão no âmbito de ação da Assistência Social. A grande problemática dessa fala está no fato de não se analisarem os desastres em suas raízes, deixando de compreendê-los enquanto socialmente determinados, a partir de um processo entremeado por elementos diretamente ligados à política em questão.

Tal realidade também foi constatada por Siena. Segundo a autora uma

das explicações para o não aparecimento do grupo de afetados por desastres na PNAS foi dada por uma técnica do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) nas discussões da Mesa Redonda “Sistemas Públicos de Proteção Social (MDS)”9 . Na ocasião, a referida técnica foi indagada a respeito da não problematização na PNAS dos grupos sociais mais vulneráveis às intempéries cotidianas e que são recorrentemente afetados pelos danos dos desastres. Apesar de afirmar a preocupação do Ministério com o tema, como resposta a técnica enfatizou que os atendimentos aos afetados pelos desastres são considerados emergenciais e a PNAS está preocupada com o atendimento permanente (SIENA, 2012, p. 7-8).

Não causa espanto, portanto, a cultura da ação emergencial (e não preventiva) que ainda é hegemônica na Assistência Social, mesmo se tendo conhecimento de que as vulnerabilidades sociais são construções históricas e, portanto, requerem ações permanentes para seu enfrentamento. São marcas de uma assistência emergencial que nasceu com essa política e ainda ocupa espaço nas ações contemporâneas.

Essa realidade também está expressa nas normativas, como a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, a qual define o SUAS a partir de uma organização por níveis de complexidade. No nível dos Serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade consta a prestação do Serviço de Proteção em Situações de Calamidades Públicas e de Emergências, com a seguinte descrição:

O serviço promove apoio e proteção à população atingida por situações de emergência e calamidade pública, com a oferta de alojamentos provisórios, atenções e provisões materiais, conforme as necessidades detectadas. Assegura a realização de articulações e a participação em ações conjuntas de caráter intersetorial para a minimização dos danos ocasionados e o provimento das necessidades verificadas. (BRASIL, 2009, p. 57).

O período de funcionamento do serviço está descrito da seguinte forma: “Na ocorrência das situações de emergência e de calamidades públicas, mediante a mobilização de equipe de prontidão escalonada pelo regime de plantão, a ser acionada em qualquer horário e dia da semana”. (BRASIL, 2009, p. 58).

Pode-se observar que o trabalho preventivo contra a concretização do risco é inexistente nas orientações da própria política, confirmando-se pelo público-alvo (população já atingida), e pela forma de funcionamento do serviço (em momentos emergenciais). Isso se deve em razão do serviço desenvolvido nesse nível de complexidade estar direcionado para os contextos em que se há, como o próprio nome diz, maior complexidade.

Caberia, portanto, ao nível da Proteção Social Básica (PSB) o trabalho de prevenção. Nesse nível de serviço os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) representam a porta de entrada para a política. Segundo Brasil (2009) é

por meio do CRAS que a proteção social se territorializa e se aproxima da população, reconhecendo a existência das desigualdades sociais intra-urbanas. É ali que as políticas sociais agem em rede para a redução das desigualdades, quando apóiam a prevenção e mitigam situações de vulnerabilidade e risco social, bem como quando identificam e estimulam as potencialidades locais, modificando a qualidade de vida das famílias que vivem nessas localidades (BRASIL 2009, p. 14-15).

Logo, o trabalho de prevenção aos riscos está claramente delimitado à PSB, o que requer conhecimento sobre o território de atuação, a produção de um olhar global sobre os riscos, e a problematização de paradigmas que tentam naturalizar tais riscos, como no caso dos desastres ambientais. Para tanto, o trabalho em articulação com a Vigilância Socioassistencial torna-se fundamental, já que uma “das formas de conhecer o território é dispor de informações e dados socioeconômico-culturais, de forma a orientar a ação preventiva” (BRASIL, 2009, p. 33-34). A territorialização é um trabalho de responsabilidade desse setor, e representa “o reconhecimento da presença de múltiplos fatores sociais e econômicos que levam o indivíduo e a família a uma situação de vulnerabilidade ou risco social. É no território que é operado o princípio da prevenção na política de Assistência Social”. (BRASIL, 2009, 33-34).

Esse padrão de ação baseada na emergência não se restringe apenas à Assistência Social, mas expressa-se na política municipal como um todo. O perfil dos municípios brasileiros elaborado pelo IBGE (2018) apresenta dados alarmantes que indicam a ausência de planejamento para se lidar com os contextos de desastres (Gráfico 4).

Percentual de municípios por instrumento de planejamento – Brasil, 2013-2017
Gráfico 4.
Percentual de municípios por instrumento de planejamento – Brasil, 2013-2017

(1) Enchentes ou inundações graduais, ou enxurradas ou inundações bruscas. (2) Escorregamentos ou deslizamentos de encostas.

Fonte: IBGE (2017)

Os dados revelam uma realidade vivida pelos profissionais e população atingida a cada desastre. A maioria dos municípios brasileiros não possuem instrumento de planejamento e gestão de risco, o que indica uma prática efetivamente pautada em ações emergenciais e sem orientações claras definidas previamente. Em relação à existência de Plano Diretor que contemple a prevenção de enchentes (um dos fenômenos mais recorrentes no Brasil), apenas 23,5% afirmaram possuir no ano de 2017. Sabemos que por mais que esses dados representem uma realidade já difícil, o panorama é ainda pior, posto que não se pode descartar os casos em que a lei permanece apenas no papel, ou seja, há instrumento de planejamento, porém não é posto em prática.

A partir das reflexões aqui postas podemos compreender que há muito a se debater sobre as possibilidades de atuação preventiva sobre os desastres ambientais a partir da Assistência Social, destacando-se o trabalho da Vigilância Socioassistencial como estratégico para tanto. Nesse sentido, salientamos a seguir algumas estratégias importantes voltadas aos desastres ambientais que podem ser desenvolvidas por esse setor.

  1. 1) O investimento na formação profissional mostra-se como um dos pilares desse trabalho. Apesar da Assistência Social possuir um histórico considerável de atuação em desastres, pouco se discute sobre eles, e somente na atualidade têm se produzido mais estudos e pesquisas relacionando os desastres à essa política, no Brasil.

Logo, a produção de eventos científicos na área, bem como a participação em eventos de outras áreas do conhecimento (como congressos, cursos e oficinas), é uma estratégia importante para acessar um debate diferenciado sobre os desastres ambientais e que pode ainda não possuir corpo denso na área da Assistência Social. Esse tipo de ação pode colaborar, por exemplo, para a produção de indicadores de análise municipal, estadual ou federal, assim como para a ampliação da troca de experiências e saberes.

  1. 2) Ao reconhecer que os desastres não são naturais, possuem previsibilidade e são entremeados por diversos determinantes, fica explícita a necessidade de identificação dos diversos agentes que devem se responsabilizar por fornecerem alguma resposta nesses contextos, considerando as esferas da prevenção, resposta e recuperação. Esse primeiro reconhecimento é fundamental para se ter uma visão mais ampla das demandas e de quem precisa estar envolvimento nas tomadas de decisões ao longo de todo o processo.

Nesse aspecto, a formação de comissões intersetoriais de estudo, planejamento e ação nos municípios representa um avanço para o trabalho em contexto de desastres ambientais, contribuindo para que o foco das ações saia da esfera emergencial e se amplie para a prevenção e recuperação, o que envolve setores diversos como Infraestrutura, Habitação, Educação, Saúde, Defesa Civil, Segurança, Assistência Social, dentre outros.

  1. 3) O terceiro elemento pauta-se na produção de conhecimento sobre a realidade e, principalmente, no seu registro oficial, objetivando a criação de memória e um meio para que as ações ligadas aos desastres estejam efetivamente na agenda política. Assim, destaca-se a relevância de um olhar mais crítico na produção e atualização dos diagnósticos socioterritoriais, de modo que os desastres sejam contemplados com o devido peso, e não apenas como um apêndice.

Tais diagnóstico são fundamentais, por exemplo, para a produção de Planos Municipais, como o Plano Municipal de Assistência Social e o Plano Diretor, ou até para compor novas ideias como um Plano Municipal de Enfrentamento aos Riscos e Desastres. Entende-se que para esse enfrentamento não basta a exposição da problemática em Planos, visto que para sua concretização vários fatores acabam sendo implicados, como a própria vontade política. Por saber disso, e das dificuldades em se transformar estruturas de trabalho consolidadas historicamente, consideramos que esse debate posto em documentos oficiais, como os citados, já representa um avanço – lembremos que toda ação pública antes de ser efetivada passa pelo confronto político de ideias e interesses.

  1. 4) O último elemento está relacionado a uma mudança na rotina de trabalho da Vigilância Socioassistencial. Como já dito, o setor atua diariamente com diversos dados. Todavia, o distanciamento da realidade de onde provém esses dados, com predomínio de um trabalho entre quatro paredes, contribui para fragilizar uma análise que requer densidade.

Em outras palavras, o trabalho de campo possibilita a apreensão de elementos importantes para a interpretação dos dados e proposição de respostas de forma mais consciente. Logo, a organização da rotina profissional de modo a comportar a ação para além das paredes, possibilita o acesso a reflexões, informações e vivências que os números não podem oferecer.

Para uma visualização mais sintética das estratégias tratadas anteriormente, as organizamos a seguir como indicativos de caminhos oportunos de se percorrer para o desenvolvimento do trabalho da Vigilância Socioassistencial em contexto de desastre ambiental:

4 Discussão

4.1 A influência dos desastres ambientais na sociedade capitalista sobre a Política de Assistência Social

É fato que os desastres ambientais não se originam a partir do sistema capitalista, mas já eram considerados fontes de insegurança social nas sociedades que precederam tal sistema. Pode-se identificar, por exemplo, registro de inundações, terremotos e epidemias. A origem de tais fenômenos era atribuída a uma força divina que os utilizavam como meio de castigo da humanidade por sua iniquidade (BOCCACCIO, 1991).

Ainda hoje essa mentalidade produz efeitos, porém em menor grau, em razão de outras vertentes de pensamento assumirem importante papel na produção de conhecimento. Constatamos, a esse respeito, a existência de outros tipos de interpretações como a ocorrência dos desastres por falta de infraestrutura, por força da própria natureza ou pela vulnerabilidade social.

A partir do desenvolvimento da sociedade capitalista, entretanto, identifica-se que esses fenômenos vêm ganhado proporções maiores, tornando-se mais intensos, recorrentes e globais (IPCC, 2012, 2013). Os estudos10 demonstram que essa transformação é resultante da lógica de funcionamento do sistema capitalista, a qual se mostra, desde sua origem, como produtora e reprodutora de desigualdades11, tendo um modelo de desenvolvimento incompatível com os direitos humanos, assim como com a preservação do planeta, posto que a necessidade constante de obtenção de cada vez mais lucro intensifica e radicaliza a competitividade destruindo qualquer barreira que venha limitar a voracidade do capital em se expandir.

O International Geosphere-Biosphere Programme reconhece que o mundo entrou em uma época denominada de Antropoceno, datada a partir do século XVIII, e que mais recentemente ganhou forte impulso. Essa periodização não é por acaso, mas representa o início de uma relação diferenciada entre ser o humano e o ambiente, sendo marcada pelo aumento das concentrações globais de dióxido de carbono e metano (IGBP, 2004).

Até a revolução industrial, os seres humanos e suas atividades exerceram uma força insignificante na dinâmica do sistema terrestre. Hoje, a humanidade começou a igualar e até exceder a natureza em termos de mudança da biosfera e de afetar outras facetas do funcionamento do sistema terrestre. A magnitude e o ritmo da mudança induzida pelo homem são sem precedentes. A velocidade dessas mudanças é da ordem de décadas a séculos, e não do ritmo de séculos a milênios de mudanças comparáveis ​​na dinâmica natural do sistema terrestre […] A industrialização levou a uma considerável poluição do ar e da água associada à extração, produção, consumo e descarte de mercadorias. Nos últimos três séculos, a quantidade de terra usada para a agricultura aumentou cinco vezes. Além disso, grandes áreas foram perdidas devido à degradação, por exemplo, à erosão do solo, contaminação química e salinização. (IGBP, 2004, não paginado).

Partimos, portanto, do pressuposto de que os desastres ambientais não são fenômenos naturais e exclusivos da sociedade capitalista, mas uma das diversas faces das crises desencadeadas pela lógica de acumulação desse sistema. Esses fenômenos são determinados por elementos próprios das relações sociais capitalistas, relações essas conformadas por um modelo de produção baseado na exploração do ser humano (por meio do trabalho) e da natureza (por meio do esgotamento dos recursos) (ADOUE, 2020a), como meios de manutenção da sua lógica de funcionamento, a qual se fundamenta na busca constante pela valorização do capital.

Segundo Adoue, na atualidade somos

testemunhas da implantação de um novo modelo de acumulação do capital que se articula pela integração de todos os territórios do planeta a cadeias de acumulação. Numa ponta dessas cadeias, fundos de investimento que concentram capital. Eles não estão dispostos a correr qualquer risco de não obter uma taxa de lucro bem acima da média. Na outra ponta, os territórios, com as energias vitais mercantilizadas. No meio, empresas de diferente tipo e tamanho, que são elos descartáveis quando não garantem lucro a quem comanda a cadeia. (ADOUE, 2020b, não paginado).

Os efeitos da primazia do lucro têm colocado por vezes a população mundial em um contexto de desastre ambiental, uma vez que determinados processos são construídos de modo a atingir qualquer lugar do planeta – como a atual pandemia da Covid-19 –, como também tem produzido processos de desastres ambientais que mesmo a crise sendo interrompida hoje, levarão anos até que seus efeitos sejam sanados (SEDREZ, 2019), implicando, portanto, uma questão de justiça ambiental, a qual põe em evidência uma problemática intergeracional.

Esse movimento pela constante expansão do sistema demonstra-se tão forte que as barreiras emergentes necessariamente precisam ser convertidas de algum modo em meios de valorização do capital (GONÇALVES, 2018), assim como já ocorre com os desastres ambientais, a partir, por exemplo, dos empréstimos concedidos para os constantes processos de reconstrução; dos recorrentemente decretos de estado de calamidade pública, o que facilita o acesso a recursos do Fundo Público; ou até mesmo por meio do crescimento do setor de seguros.

Rodas (2019) afirma que os desastres ambientais têm sido um dos elementos fomentadores da busca por seguros D&O (directors and officers). Segundo o CNseg4 (2019), podemos identificar o movimento do capital para este campo que ainda possui espaço a ser mercantilizado.

O site Asia Insurance Review publicou matéria informando que mais de 80% das pessoas afetadas por desastres naturais vivem nos países em desenvolvimento da Ásia. Segundo o presidente da CNseg, Marcio Coriolano, “a carência de proteção securitária, seja por razões de desconhecimento, renda, educação, confiança, ausência de oferta ou qualquer outro motivo, expõe as populações de todos os países a riscos, principalmente os que envolvem catástrofes naturais, provocadas pelas mudanças climáticas. Portanto, o setor de seguros deve atuar soluções assertivas que promovam maior conhecimento e acessibilidade dos seguros”. (CNSEG, 2019, não paginado).

No Brasil, já se pode encontrar colocações públicas sobre o aumento do mercado de seguros pelos constantes desastres ambientais vivenciados. Em entrevista à Revista Exame, Adelson Cunha, então presidente da Comissão de Riscos Patrimoniais da FenSeg (Federação Nacional de Seguros Gerais), afirmou que

acredita que a população ainda não se deu conta que aqui há riscos de alagamento e inundação, mas a situação vivida pelo Rio de Janeiro deve mudar esta ideia. De acordo com Cunha, a tendência é o número de pessoas que passem a fazer seguros contra desastres naturais deve aumentar. “A partir do momento que se começa a ter a percepção de que se pode ser atingido, as pessoas vão atrás de uma forma de se proteger”, explicou. Cunha apontou ainda que há uma possibilidade de os seguros na área atingida pelas enxurradas no Rio de Janeiro passarem a pagar mais caro para segurar seus bens. “Estaria mentindo se dissesse que não haveria mudança ali. Uma seguradora nada mais é do que uma administradora do recurso do segurado, e se o local traz mais riscos pro cidadão, pode existir uma mudança de taxa. É possível e provável”, ponderou Cunha. (ARAUJO, 2011, não paginado).

Ou seja, a lógica do mercado não é a de problematizar os determinantes das expressões da questão social, mas, tão somente, identificar as oportunidades de investimento e valorização de capital – além da disseminação do discurso de convencimento de que estar segurado é a atitude mais sensata a se ter.

Outra reflexão que também pode ser feita a partir da fala anterior é que o desastre ambiental tem se tornado meio de expropriação da classe trabalhadora (devido às perdas materiais e imateriais que sofre), mas também meio de expropriação pela tomada de parte da sua renda pela necessidade que os sujeitos assumem de estarem segurados – situação, na verdade, que deveria ser obrigação do Estado a partir, por exemplo, da formulação de políticas habitacionais, de organização territorial e de saneamento eficazes, visto os altos impostos que já são pagos para tanto.

A inexistência de “faixa limite” ao avanço da lógica predatória desse sistema já colocou o mundo em um estado de alerta, e os discursos que outrora chamavam a atenção para a urgência em se fazer algo pensando nas gerações futuras, hoje concebem que as consequências desse processo já começaram a atingir nossa própria geração. Já vivenciamos a intensificação da crise estrutural do capital, a qual se expressa principalmente quando a

dimensão civilizatória se esgota e o sistema se revela como barbárie, torna-se bárbaro. Este é o estágio atual da ordem do capital. A barbárie capitalista é omnilateral e polifacética – e é ubíqua: contém-se no arsenal termo-nuclear que pode aniquilar repentinamente todas as formas de vida sobre o planeta tanto quanto na lenta e cotidiana contaminação/destruição dos recursos hídricos, que pode igualmente inviabilizar a vida sobre a terra. (NETTO, 2012, p. 220).

O autor ainda explica que o exaurimento das condições civilizatórias do capitalismo “deve-se a que o estágio atual da produção capitalista é necessariamente destrutivo” (p. 202), apresentando diversos fenômenos que demonstram tal esgotamento, como a “financeirização especulativa e parasitária do tardo capitalismo e sua economia do desperdício e da obsolescência programada, passando pelas tentativas de centralização monopolista da biodiversidade e pelos crimes ambientais e alcançando a esfera da cultura.” (NETTO, 2012, p. 218).

Com a defesa neoliberal do Estado mínimo por parte dos organismos multilaterais e alguns governos, as respostas aos efeitos dessa crise são cada vez menos incisivas sobre as reais necessidades da população, fragilizando sobremaneira as condições de vida das famílias e indivíduos com menor renda, sendo esses os que sofrem com expressões da Questão Social cada vez mais destrutivas, sendo os desastres ambientais parte delas.

Prova disso é que os desastres ambientais têm se intensificado no mundo, principalmente a partir da década de 1970 (Gráfico 5).

Registros de desastres no mundo, no período de 1900 a 2013
Gráfico 5.
Registros de desastres no mundo, no período de 1900 a 2013
Fonte: Carmo e Anazawa (2014) - EM-DAT

É possível visualizar o início desse aumento especialmente entre as décadas de 1960 e 1970, tomando proporções cada vez mais crescentes nos anos seguintes. Trata-se exatamente do início do período crítico da crise estrutural capitalista, momento a partir do qual se pode perceber o avanço predatório sobre o trabalhador (a partir da política neoliberal), mas também sobre a natureza.

Segundo Barbosa (2018), o capitalismo possui contradições próprias que resultam em crises. No Brasil, pode-se destacar a década de 1970 como momento em que as bases do sistema capitalista são fortemente abaladas, passando os intelectuais a utilizarem a expressão “crise estrutural”, “porque envolve medularmente as condições da acumulação de capital, em descompasso” (BARBOSA, 2018, p. 250).

Por exigência imanente para aumentar a composição orgânica do capital visando o aumento de produtividade, provoca-se a queda da taxa média de lucro, que pode ser sustada por contra-tendências, mas havendo perda de eficácia dessas iniciativas de retenção, evidencia-se a crise de superprodução, estimulando o capital dinheiro a migrar para a especulação financeira, até que novo boom produtivo se mostre rentável. O cerne desse descompasso está situado fundamentalmente na contradição da mercadoria, na medida em que o dinheiro ganhou às vezes de mediador das relações sociais, das trocas entre produtores particulares […] a ordem está se defrontando com seus limites intrínsecos e as saídas apresentadas são contingenciais e não alavancam a produtividade. […] A saída das grandes corporações foi acionar contra-tendências, dividindo a conta com os trabalhadores, ao diminuir sua renda e elevar a desigualdade com a agenda neoliberal (BARBOSA, 2018, p. 248, 250 e 252).

A autora ainda explica que essa tendência à queda da taxa de lucro está relacionada a uma impotência própria à dinâmica do sistema. Segundo Barbosa (2018), a economia capitalista produziu excedentes de capital a tal ponto que sua absorção se tornou um grande limite ao próprio sistema, comprometendo a elevação da taxa média de lucro, elemento este apontado como determinante para o processo de acumulação de capital a partir dos anos de 1970.

[…] a ordem está se defrontando com seus limites intrínsecos e as saídas apresentadas são contingenciais e não alavancam a produtividade. […] A saída das grandes corporações foi acionar contra-tendências, dividindo a conta com os trabalhadores, ao diminuir sua renda e elevar a desigualdade com a agenda neoliberal” (BARBOSA, 2018, p. 250 e 252).

Trata-se, assim, de uma crise pela falta das condições para realização do valor criado, ou seja, a impossibilidade de se “vender o que se produziu e de utilizar o potencial produtivo que se gerou. Ao atingir essas barreiras, o valor aumentado não consegue mais ser realizado” (GONÇALVES, 2018, p. 111). Como explica Mészáros (2009), uma crise de disfunção entre as três dimensões fundamentais do sistema capitalista – produção, consumo e circulação/realização.

É incontestável a magnitude da crise estrutural do capital e os limites que ele busca transpor na tentativa de recompor sua lucratividade, tendo como bússola o ideário neoliberal, avançando com uma lógica cada vez mais predatória que se materializa enquanto propriamente uma política de Estado para fazer frente à corrida pelo “progresso” – o que nos coloca um outro questionamento se são os desastres impedimentos ao avanço capitalista, meio de valorização de capital ou os dois.

Por isso, entendemos que o processo de acumulação primitiva de capital

não pode ser entendido apenas como um período histórico pré-capitalista, mas sim, deve ser compreendido como um processo que se atualiza em diferentes períodos históricos do desenvolvimento capitalista para submeter a natureza à lógica de acumulação e circulação do capital. Desse modo, se há fome, desastres naturais e guerras por recursos naturais, este processo tem origem não nos limites da natureza e numa suposta vingança na humanidade, mas é sim, reflexos da contradição entre natureza e capital (NUNES; SCHERER, 2017, p. 9).

Trata-se, portanto, de movimentos que o capital necessita fazer para garantir sua sobrevivência, impossíveis, todavia, sem a intervenção estatal. Pela dinâmica desse sistema ser altamente produtora de desigualdades sociais, requer algum nível de resposta a essas demandas, contudo de modo que não venha limitar a expansão do capital. Nesse sentido, as Políticas Sociais, especificamente aqui a Política de Assistência Social, se apresenta como uma dessas respostas ao enfrentamento das expressões da Questão Social, atuando principalmente na reprodução da força de trabalho e garantia do consumo (BOSCHETTI, 2015).

Conforme a crise do capital se agudiza, a conta acaba sendo repassada para as classes economicamente mais vulneráveis, expressando-se, por exemplo, no contínuo desmonte da Seguridade Social (CASTILHO; LEMOS; GOMES, 2017), cuja materialidade se dá a partir de elementos como: cortes dos recursos, ausência das condições materiais para o trabalho, desregulamentação dos direitos, precarização na formação profissional, aumento de demanda desproporcional ao quadro de profissionais, dentre outros (BOSCHETTI, 2015).

É nesse cenário que os profissionais são chamados a atuarem. É nítida a direção que o Estado coloca à execução da Política de Assistência Social, direção essa que precisa estar de acordo com os interesses do capital, ligada, portanto, a um projeto societário que não almeja a universalização dos direitos sociais e enfrentamento das desigualdades sociais.

Gasparotto et al. (2014) explicam que as Políticas Sociais acabam sendo submetidas à lógica do mercado, ficando resumidas em ações focalizadas e paliativas, forçando, assim, que as famílias e sociedade assumam a responsabilidade por um problema criado pelo próprio Estado.

O debate sobre os desastres ambientais está, portanto, intrinsecamente relacionado a esse processo histórico de produção e intensificação das desigualdades sociais, às respostas públicas a esses processos, assim como ao modo como esse sistema tem se expandido.

Os processos que se dão entre o Estado e a sociedade, produzindo desigualdades, determinam formas desiguais também em outras esferas. “Os indivíduos são postos em condições desiguais do ponto de vista ambiental porque são desiguais em outros planos” (VARGAS, 2006, p. 60). Portanto, há uma “associação entre ‘risco’ e ‘desigualdade’ […]” há “diversidade social na construção do risco, assim como a presença de uma lógica política a orientar a distribuição desigual dos riscos” (VARGAS, 2006, p. 59).

Se a realidade não é dada, mas uma arena de luta entre interesses distintos, é preciso compreender o direcionamento que vem sendo dado pelo Estado/Capital às políticas como um todo, objetivando a construção das estratégias cotidianas de confronto a essa lógica. Estratégias essas que passam inevitavelmente pela organização em coletivos diversos, mas também precisam encontrar lugar no cotidiano de trabalho, especificamente nas ações de resposta às demandas.

É nessa perspectiva que tratamos neste trabalho da possibilidade de a Vigilância Socioassistencial ampliar seu foco de atuação, desvencilhando-se das amarras institucionais e ideológicas representadas, por exemplo, pelos discursos que afastam a problematização das expressões da Questão Social, o que, consequentemente, limita a ação profissional a determinadas demandas. A resposta da Assistência Social aos desastres tem se dado de modo focalizado, pautada na lógica emergencial, e desconsiderando a processualidade da produção dos desastres, bem como os elementos da estrutura social que os fomentam.

Buscando contribuir para o enfrentamento desse modus operandi, demonstramos neste trabalho um pouco do potencial que a Vigilância Socioassistencial possui em relação à produção de informações e conhecimentos sobre determinada realidade. Um potencial que necessita urgentemente ser mais apropriado pelos profissionais que integram o SUAS, e receber maior atenção por parte do poder público, tanto em termos de recursos (financeiros, materiais e humanos), quanto de acionamento para tomada de decisão.

Destacamos aqui o perfil diferenciado do trabalho desse setor, posto que pode oferecer grande contribuição ao enfrentamento dos riscos e desastres ambientais, uma vez que, como já citado, cabe aos profissionais dessa área a observação sistemática da realidade, a realização de levantamentos, estudos e diagnósticos socioterritoriais no âmbito da Assistência Social.

Trata-se de um trabalho especificamente voltado para esse tipo de produção, expressando, assim, uma oportunidade de avanço e qualificação do trabalho desenvolvido por essa política. Todavia, as muitas dificuldades já tratadas aqui podem impedir esse movimento, transformando o setor em um mero organizador de números em formulários e planilhas.

5 Considerações finais

Vivemos em uma sociedade onde a produção de riqueza excede sobremaneira a qualquer outra sociedade precedente; o avanço tecnológico permite ao ser humano realizar estudos com as menores partículas existentes na terra, ao mesmo tempo que o leva a fazer cálculos incríveis, como o provável tamanho do universo; a ciência caminha para avanços como, por exemplo, a possibilidade de viver fora da terra ou até gerar vida fora de um útero.

Apesar de tudo isso, continuamos a acompanhar pelos noticiários as águas que ano após ano tomam as cidades, destroem casas e soterram vidas. Acompanhamos os constantes focos de incêndio que não cessam nas florestas. Vivenciamos, inclusive, muito próximo a todos nós, uma economia incapaz de ser planificada a fim de combater uma pandemia mortal, e que explicitamente põe uma hierarquia entra a vida e o lucro.

A problematização desses elementos é imprescindível para a compreensão da realidade e entendimento que as Políticas Sociais são, em parte, um braço estatal para a manutenção das condições de reprodução capitalista. Logo, não há motivo para se esperar que tudo que provenha desse meio esteja vinculado à proposta de construção de uma sociedade justa. Nesse sentido, é fundamental a realização da crítica profissional acerca das orientações postas institucionalmente, bem como sobre os paradigmas sobre a atuação profissional – trabalho preventivo X trabalho emergencial, por exemplo.

É comum se ouvir ainda de alguns profissionais que a atuação em contexto de desastre não cabe à Assistência Social, todavia, por tudo que aqui foi apresentado, defendemos exatamente o contrário. Há muito ainda a se estudar e atuar e a experiência relatada aqui vem para demonstrar que com planejamento e vontade política se pode avançar para um trabalho mais qualificado e realmente voltado para a responsabilidade que cabe à Vigilância Socioassistencial.

É preciso contrapor o discurso hegemônico, construindo um outro pautado na produção científica que esteja efetivamente ligada aos determinantes materiais da vida. Não se trata de aprendermos a conviver com os desastres, pois são “naturais”, mas de desmistificar essas ideias, pois não são os desastres que põem as pessoas em situação de vulnerabilidade ou risco, mas por estarem em contexto mais vulnerável são as mais atingidas por esses fenômenos.

Cabe, portanto, aos profissionais ocupantes desses espaços ampliarem o horizonte de interpretação da realidade, buscarem articulação com estudiosos da área e produzirem estratégias que extrapolam os limites colocados política e institucionalmente. As normativas existem para orientar o fazer profissional, porém não são estanques. São produzidas por homens e mulheres a partir de dada realidade e requerem um movimento de atualização mediante o avanço intelectual e político das ações públicas.

Referências

ADOUE, S. B. Questão agrária no Brasil, expropriação social e espoliação da natureza. Curso: Crise Ambiental, Capitalismo e Socialismo. Aula 2. [S. l.: s. n.], 2020a. 1 vídeo (8 min). Publicado pelo Canal Contrapoder. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=puIVhqlK-d8. Acesso em: set. 2020.

ADOUE, S. B. O novo modelo de acumulação do capital e América Latina. Contrapoder, 2020b. Disponível em: https://contrapoder.net/artigo/o-novo-modelo-de-acumulacao-do-capital-e-america-latina/. Acesso em: set. 2020.

AMARAL, F.G. et al. Déficit habitacional: cálculo do coeficiente de concentração relativa para o Brasil entre 2007 a 2012. Revista Espacios, Caracas, v. 41, n. 10, 2020.

ARANTES, J. T. Déficit habitacional é obstáculo para isolamento vertical, dizem pesquisadores. São Paulo: Agência FAPESP, 2020. Disponível em: https://agencia.fapesp.br/deficit-habitacional-e-obstaculo-para-isolamento-vertical-dizem-pesquisadores/32874/. Acesso em: set. 2020.

ARAÚJO, C. Os desastres naturais mudam o perfil dos seguros no Brasil? Revista Exame, 2011. Disponível em: https://exame.abril.com.br/brasil/os-desastres-naturais-mudam-o-perfil-dos-seguros-no-brasil/. Acesso em: jan. 2020.

ATLAS brasileiro de desastres naturais: 1991 a 2012. 2. ed. Florianópolis: UFSC, CEPED, 2013.

AZEREDO, L. F. S.; PEREIRA, T. D. Colapso do capital e a pandemia como desastre ambiental. PerCursos, Florianópolis, v. 21, n. 46, p. 136-161, maio/ago. 2020.

BARBOSA, R. N. C. Questão Social, Crise do Capital e Formação Profissional: desafios ao Serviço Social na contemporaneidade. Socied. em Deb., Pelotas, v. 24, n. 2, p. 245-272, maio/ago. 2018.

BOCCACCIO, G. Decamerão. São Paulo: Círculo do Livro, 1991.

BOSCHETTI, I. S. A assistência no capitalismo contemporâneo e tensões no trabalho de assistentes sociais. In: JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS, 7., 2015, São Luís/Maranhão, Cidade Universitária da UFMA. Anais […].

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Norma Operacional Básica. NOB, SUAS. Brasília, 2005.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Norma Operacional Básica da Assistência Social. Brasília, 2012.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Brasília, 2014.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. SUAS. Sistema Único de Assistência Social. Assistência Social Cadernos, Brasília, 2009. Disponível em: http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Consolidacao_Suas.pdf. Acesso em: set. 2020.

BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Secretaria Nacional de Defesa Civil. Classificação e Codificação Brasileira de Desastres. COBRADE. Brasília, 2012.

BRASIL. Ministério da Cidadania. CENSO SUAS 2018: Gestão Municipal. Brasília, 2018.

BRASIL. Ministério da Cidadania. CENSO SUAS 2019: Gestão Municipal. Brasília, 2019.

BRASIL. Lei n.º 12.435, de 6 de julho de 2011. Altera a Lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social. Diário Oficial da União, Seção 1, p. 1, 2011.

CARMO, R. L.; ANAZAWA, T. M. Mortalidade por desastres no Brasil: o que mostram os dados. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 9, Sept. 2014.

CASTILHO, D. R.; LEMOS, E. L. S.; GOMES, V. L. B. Crise do capital e desmonte da Seguridade Social: desafios (im)postos ao Serviço Social. Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 130, p. 447-466, set./dez. 2017.

CENTRE FOR RESEARCH ON THE EPIDEMIOLOGY OF DISASTERS. CRED; THE UNITED NATIONS OFFICE FOR DISASTER RISK REDUCTION. UNISDR. The Human Cost of Weather Related Disasters 1995-2015. Brussels,Geneva: CRED, UNISDR, 2015.

CNSEG. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS EMPRESAS DE SEGUROS GERAIS, PREVIDÊNCIA PRIVADA E VIDA, SAÚDE SUPLEMENTAR E CAPITALIZAÇÃO. Mais de 80% das pessoas afetadas por desastres naturais vivem nos países em desenvolvimento da Ásia. 2019. Disponível em: http://cnseg.org.br/noticias/mais-de-80-das-pessoas-afetadas-por-desastres-naturais-vivem-nos-paises-em-desenvolvimento-da-asia.html. Acesso em: fev. 2020.

DUTRA, A. S. Gestão de desastres e Serviço Social: o trabalho de assistentes sociais junto aos órgãos municipais de proteção e defesa civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018.

DUTRA, R. C. et al. Indicadores de vulnerabilidade global: proposta metodológica para estudos e mapeamentos de risco em área de encosta. Revista Com Ciência Ambiental, São Paulo, ano 6, n. 39, p. 400-409, 2011.

FARIAS, L. O. A construção da Vigilância Socioassistencial no SUAS. Brasília: MDS, Departamento de Gestão do SUAS, Secretaria Nacional de Assistência Social, 2013.

FONTES, V. Catástrofe ambiental e a lógica capitalista. [S. l.: s. n.], 2020a. 1 vídeo. Publicado pela TV Boitempo, 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=qBGvo3felYc. Acesso em: jan. 2020.

GASPAROTTO, G. P. et al. O ideário neoliberal: a submissão das políticas sociais aos interesses econômicos. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE DEMANDAS SOCIAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA, 11., MOSTRA DE TRABALHOS JURÍDICOS CIENTIFICOS, 7., 2014, Santa Cruz do Sul, RS, 2014. Anais […].

GESTÃO de riscos de desastres. Florianópolis: CEPED, UFSC, 2012.

GILBERT, C. Studying disaster: a review of the main conceptual tools. International Journal of Mass Emergencies and Disasters, v. 13, n. 3, p. 231-240, 1995.

GONÇALVES, G. L. Valor, expropriação e direito: sobre a forma e a violência jurídica na acumulação do capital. In: BOSCHETTI, I. (org.). Expropriação e direitos do capitalismo. São Paulo: Cortez, 2018.

IASC. INTER-AGENCY STANDING COMMITTEE. Human Rights and Natural Disasters: Operational Guidelines and Field Manual on Human Rights Protection in Situations of Natural Disaster. Washington: IASC, 2008.

IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Perfil dos Municípios Brasileiros - 2017. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Rio de Janeiro: IBGE, 2017.

IGBP. INTERNATIONAL GEOSPHERE-BIOSPHERE PROGRAMME. Antropoceno, 2004. Disponível em: www.igbp.net/globalchange/anthropocene.4.1b8ae20512db692f2a680009238.html. Acesso em: jun. 2020.

IPCC. INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Managing the risks of extreme events and disasters to advance climate change adaptation: Special report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. Cambridge, Reino Unido: Nueva York, NY: Cambridge University Press, 2012.

IPCC. INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Resumen para responsables de políticas. In: Cambio Climático 2013: Bases físicas. Contribución del Grupo de trabajo I al Quinto Informe de Evaluación del Grupo Intergubernamental de Expertos sobre el Cambio Climático. Cambridge, Reino Unido: Nueva York, NY: Cambridge University Press, 2013.

MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed. São Paulo: Atlas 2003.

MARX, K. O Capital. Crítica da economia política. São Paulo: Boitempo, 2017. v.3.

MÉSZÁROS, I. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. São Paulo: Boitempo, 2009.

NETTO, J. P. Capitalismo e barbárie contemporânea. Argumentum, v. 4, n. 1, p. 202-222, 2012.

NUNES, C. F.; SCHERER, G. A. A relação entre natureza e capital: reflexões a partir da discussão da Propriedade Privada da Terra. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE SERVIÇO SOCIAL, TRABALHO E POLÍTICAS SOCIAIS, 2., 2017, Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina, 2017. Anais […].

RODAS, S. Operações e desastres ambientais aumentam procura por seguro para executivos. 2019. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-out-19/operacoes-pf-aumentam-procura-seguro-executivos. Acesso em: fev. 2020.

SANTOS, R. Gestão de Desastres e Política de Assistência Social: estudo de caso de Blumenau, SC. 2012. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-graduação em Sociologia Política, Universidade Federal de Santa Catarina, 2012.

SEDREZ, L. F. O clima faz história: atores e conceitos em disputa nas negociações climáticas. In.: SEDREZ, L. F. Desastres e mudanças climáticas: construindo uma agenda. Rio de Janeiro: Colégio Brasileiro de Altos Estudos, 2019.

SIENA, M. A. Política de Assistência Social em Cenário de Desastres Relacionados às Chuvas. In: SEMINÁRIO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS, 3., 2012, São Carlos, UFSCAR. Anais […].

SILVA, T. G. M. A Vigilância Socioassistencial na Política de Assistência Social: desafios conceituais e operacionais. In: JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS, 7., 2015, São Luís, MA. Anais […].

UNISDR. THE UNITED NATIONS OFFICE FOR DISASTER RISK REDUCTION; CRED. CENTER FOR RESEARCH ON THE EPIDEMIOLOGY OF DISASTERS. Poverty & Death: disaster mortality 1996-2015. New York: UNISDR, 2016.

UNISDR. UNITED NATIONS INTERNATIONAL STRATEGY FOR DISASTER REDUCTION. Estrategia Internacional para la Reducción de Desastres de Las Naciones Unidas. Terminologia de reducción de riesgo de desastres. 2009. Disponível em: https://www.unisdr.org/files/7817_UNISDRTerminologySpanish.pdf. Acesso em: jun. 2020.

VALENCIO, N. Da ‘área de risco’ ao abrigo temporário: uma análise dos conflitos subjacentes a uma territorialidade precária. In: VALENCIO, N. et al. (org.). Sociologia dos Desastres: Construção, interfaces e perspectivas. São Carlos: RiMa Editora, 2009.

VALENCIO, N. Desastres no Brasil: a face hídrica do antidesenvolvimento. In: VALENCIO, N.; SIENA, M. (org.). Sociologia dos desastres: Construção, interfaces e perspectivas. São Carlos: RiMa Editora, 2014. v. 4.

VALENCIO, N. et al. Chuvas no Brasil: representações e práticas sociais. Política e Sociedade, Santa Catarina, n. 7, 2005.

VARGAS, M. A. R. A construção social da moradia de risco: a experiência de Juiz de Fora (MG). Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 8, n. 1, maio 2006.

VIEIRA, L. R. A emergência das catástrofes ambientais e os direitos humanos. Tese (Doutorado em Direito) - Universidade Federal de Santa Catarina, 2017.

WOOD, E. M. A origem do capitalismo. Tradução: Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2001.

Notas

1 KREPS, G. A. Future directions in disaster research: the role of taxonomy. International Mass Emergencies and Disasters, v. 7, n. 3, p. 215-241, Nov. 1989.

FRITZ, C. E. Disasters. In: MERTON, R. K.; NISBET, R. (eds.). Social problems. New York: Harcourt Brace & World, 1961.

OLIVER-SMITH, A. What is a disaster? Anthropological perspectives on a persistent question. In: OLIVER-SMITH, A.; HOFFMAN, S. M. (ed.). The angry earth: disaster in anthropological perspective. New York: Routledge, 1999.

2 O IASC é um fórum de coordenação humanitária pertencente às Nações Unidas.
4 GILBERT, C. Studying disaster: a review of the main conceptual tools. International Journal of Mass Emergencies and Disasters, v. 13, n. 3, p. 231-240, 1995.
5 CEPAL.COMISIÓN ECONÓMICA PARA AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE. Vulnerabilidad sociodemográfica: viejos y nuevos riesgos para comunidades, hogares y personas. Santiago de Chile: LC/G 2170, 2002.
6 Amaral et al. (2020) apontam que o deficit habitacional no Brasil é predominante entre as populações com faixa de renda de até 3 salários mínimos, sendo superior a 70% entre 2007 e 2012.
7 O modelo de desenvolvimento capitalista contribui para a construção/intensificação de processos de desastres ambientais, dentre os quais se incluem as epidemias/pandemias. A esse respeito, uma das chaves de análise encontra-se na organização de uma nova forma social fomentadora de cenários propícios à proliferação de doenças, a partir, por exemplo, da destruição das florestas, da criação de animais com base no confinamento, e da aglomeração residencial urbana em condições precárias e insalubres. Portanto, “as epidemias possuem caráter socialmente constitutivo como desastres ambientais. É nesse sentido que ponderamos que a pandemia da COVID-19 não é a causa das mazelas atuais, tampouco personifica a crise em si, mas consiste em uma das expressões do desenvolvimento nessa forma social” (AZEREDO; PEREIRA, 2020, p. 153).
8 De acordo com a obra ATLAS… (2013, p. 115), a inundação está relacionada “à cheia e ao extravasamento dos rios, que ocorrem com certa periodicidade e de forma paulatina e previsível”.
9 A Mesa-Redonda “Sistemas Públicos de Proteção Social (MDS)” ocorreu no 34º Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais/ANPOCS, na cidade de Caxambu/MG, em outubro de 2010.
10 FOLADORI, G. Limites do desenvolvimento sustentável. Campinas: Unicamp, 2001.

HARVEY, D. Os limites do capital. São Paulo: Boitempo, 2013.

MARX, K. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da crítica da economia política. São Paulo: Boitempo, 2011.

KOVEL, J. The Enemy of Nature: The End of Capitalism or the End of the World? London: Zed Books, 2007.

MARQUES, L. Capitalismo e colapso ambiental. Campinas: Unicamp, 2015.

MÉSZÁROS, I. A crise estrutural do capital. São Paulo: Boitempo, 2009.

SWEEZY, P. M. Teoria do Desenvolvimento Capitalista. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1973.

11 A partir do cercamento dos campos, por exemplo, destruindo os direitos consuetudinários (WOOD, 2001).

Notas de autor

1 Assistente Social formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestre em Serviço Social e Desenvolvimento Regional pela UFF Niterói. Doutoranda em Serviço Social (Bolsista CAPES) na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) – Rio de Janeiro/RJ – Brasil. E-mail: luana.fernandes.rr@gmail.com.

Información adicional

COMO CITAR (ABNT): AZEREDO, L. F. S. Estratégias de enfrentamento dos riscos e desastres ambientais por meio da Política de Assistência Social. Vértices (Campos dos Goitacazes), v. 23, n. 1, p. 151-179, 2021. DOI: https://doi.org/10.19180/1809-2667.v23n12021p151-179. Disponível em: https://www.essentiaeditora.iff.edu.br/index.php/vertices/article/view/15889.

COMO CITAR (APA): Azeredo, L. F. S. (2021). Estratégias de enfrentamento dos riscos e desastres ambientais por meio da Política de Assistência Social. Vértices (Campos dos Goitacazes), 23(1), 151-179. https://doi.org/10.19180/1809-2667.v23n12021p151-179.

HTML generado a partir de XML-JATS4R por