DOSSIÊ TEMÁTICO: "RISCOS E DESASTRES SOCIOAMBIENTAIS"

Verde que vira marrom, reputação que vira lama: extrativismo mineral, desastres e as imagens do “invisível”

Green that turns brown, reputation that turns into mud: mineral extraction, disasters, and the images of the “invisible”

Verde que se vuelve marrón, reputación que se convierte en barro: extracción de minerales, desastres y las imágenes de lo “invisible”

Gabriela Scotto 1
UFF, Brasil

Verde que vira marrom, reputação que vira lama: extrativismo mineral, desastres e as imagens do “invisível”

Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 23, núm. 1, 2021

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense

Este documento é protegido por Copyright © 2021 pelos Autores.

Recepción: 03 Octubre 2020

Aprobación: 08 Marzo 2021

Resumo: As corporações mineradoras investem significativos recursos financeiros e humanos em propaganda e campanhas publicitárias veiculadas na televisão, na imprensa escrita e nas redes sociais. Com isto buscam não só propagar suas "boas" ações sociais e ambientais, como também divulgar a crença na mineração como uma atividade econômica sustentável e sem riscos. No artigo nos perguntamos pela força política que as imagens (fotografias, vídeos, memes etc.), veiculadas publicamente após os desastres provocados pela ruptura de barragens de rejeitos da mineração – como os ocorridos no Brasil em 2015 e 2019, têm para "sujar a reputação" de corporações mineradoras como, por exemplo, a Vale. Para responder essas questões recorremos ao conceito de políticas da invisibilidade e ao de potencial político das catástrofes formulados por Ulrich Beck. Concluímos que os grupos e movimentos críticos da mineração têm um papel fundamental no estabelecimento dos nexos causais entre o que aconteceu (o “presente” das imagens) e os processos sociais, econômicos e políticos (o “passado” das imagens) que antecederam aos desastres e os explicam.

Palavras-chave: Mineração, Corporações, Invisibilidade dos riscos, Imagens dos desastres, Crítica.

Abstract: Mining corporations invest significant financial and human resources in advertising and marketing campaigns on television, in the written press and on social media. By doing this, they not only propagate their "good" social and environmental actions, but also disseminate the belief in mining as a sustainable and risk-free economic activity. In the article we discuss the political strength presented by the images (photographs, videos, memes, etc.) broadcasted after the disasters caused by the rupture of mining dams, such as those that occurred in Brazil in 2015 and 2019, to soil the reputation of mining corporations such as Vale. To answer these questions, we resort to the concepts of invisibility policies and political potential of catastrophes formulated by Ulrich Beck. We conclude that critical mining groups and movements have a fundamental role in establishing causal links between what happened (the “present” of the images) and the social, economic and political processes (the “past” of the images) that preceded the disasters and explain them.

Keywords: Mining, Corporations, Invisibility of risks, Disaster images, Criticism.

Resumen: Las corporaciones mineras invierten importantes recursos financieros y humanos en publicidad y campañas publicitarias en televisión, diarios impresos y redes sociales. Con esto buscan no solo difundir sus "buenas" acciones sociales y ambientales, sino también estimular la creencia en la minería como una actividad económica sostenible y libre de riesgos. En el artículo nos preguntamos por la fuerza política que tienen las imágenes (fotografías, videos, memes, etc.), difundidas públicamente luego de los desastres provocados por la ruptura de presas de relaves mineros – como los que ocurrieron en Brasil en 2015 y 2019, para "ensuciar la reputación" de empresas mineras como Vale. Para responder a estas preguntas, recurrimos a los conceptos de políticas de invisibilidad y al de potencial político de las catástrofes, ambos formulado por Ulrich Beck. Concluimos que los grupos y movimientos críticos de la minería juegan un papel fundamental en el establecimiento de vínculos causales entre lo ocurrido (el “presente” de las imágenes) y los procesos sociales, económicos y políticos (el “pasado” de las imágenes) que precedieron a los desastres y explicarlos.

Palabras clave: Minería, Corporaciones, Invisibilidad de riesgos, Imágenes de desastres, Crítica.

1 Introdução



Mostrar um inferno não significa, está claro, dizer-nos algo sobre como retirar as pessoas do inferno, como amainar as chamas do inferno. Contudo, parece constituir um bem em si mesmo reconhecer, ampliar a consciência de quanto sofrimento causado pela crueldade humana existe no mundo que partilhamos com os outros.

Fuente: (Susan Sontag)

Em novembro de 2015, a barragem de rejeitos de mineração denominada Fundão, localizada no distrito de Bento Rodrigues, no município de Mariana (MG), rompeu-se, causando a morte de 19 pessoas e provocando um “tsunami” de lama que avançou sobre a bacia do rio Doce até chegar ao litoral capixaba, sendo considerado, até então, o maior desastre socioambiental do Brasil e do mundo.1 A empresa Samarco S.A. (controlada através de uma joint venture entre a Vale S.A. e a anglo-australiana BHP Billiton) é a responsável pela construção e administração da barragem.

Não completaram quatro anos quando, no dia 25 de janeiro de 2019, uma nova tragédia envolvendo mais uma barragem de rejeitos de minério ocorreu. A Barragem B1 da mina Córrego do Feijão, na localidade de Brumadinho (também Minas Gerais), operada pela Vale, se rompeu causando, segundo dados da Defesa Civil de Minas Gerais de fevereiro de 2020, 259 mortos e 11 desaparecidos. A lama-rejeito liberada pela ruptura da barragem, descrevem os pesquisadores da Expedição Minas de Lama que visitou os locais devastados pelo desastre: “desenhou um rastro de ruína no vale do Ribeirão Ferro-Carvão e se estendeu no curso do rio Paraopeba”, causando a destruição de estruturas administrativas da empresa, pousadas, pontes, casas, quintais, áreas de pastagens e cultivo de alimentos (FELIPPE et al., 2020).

As imagens, fotografias e filmagens da enxurrada de lama emergindo como lava de um vulcão em erupção aparentemente do nada, se arrastando rapidamente e arrasando tudo no seu caminho: pessoas, animais, prédio, carros e construções, árvores, foram amplamente exibidas na televisão, nos jornais e nas redes sociais (Figuras 1 e 2).2 As cenas mostravam a “lama tóxica” chegando aos rios, ao mar, além de vistas aéreas da devastação, das casas sem telhado, das vilas desertas. Depoimentos dos moradores chorando e relatando as perdas humanas e materiais, trazendo os depoimentos do sofrimento perante o desastre, o trabalho dos bombeiros resgatando animais e pessoas. Imagens da dor.

Animal na lama em Córrego do Feijão
Figura 1.
Animal na lama em Córrego do Feijão
Fonte: The Intercept Brasil. Disponível em: https://theintercept.com/2019/01/28/vale-sabia-problemas-barragem-brumadinho/.

Vista aérea de Bento Rodrigues
Figura 2.
Vista aérea de Bento Rodrigues
Fonte: G1, Globo. Disponível em: http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2015/11/rompimento-de-barragens-em-mariana-perguntas-e-respostas.html.

Assim como nos casos das fotografias de guerra e de outras imagens de sofrimento, analisadas por Susan Sontag no seu livro “Diante da dor dos outros” (SONTAG, 2003), as imagens (paradas e/ou em movimento) dos desastres sociais e ambientais produzidos pela mineração permitiram que “algo se tornasse real” para quem estava longe dos locais dos eventos. Como Sontag, quando se refere às imagens da guerra, podemos dizer que, para grande parte das pessoas, o conhecimento dos desastres sociais e ambientais esteve mediado pela “câmera”: câmeras de fotógrafos profissionais (fotojornalismo), câmeras (amadoras) de celulares, câmeras da própria empresa captando o instante da ruptura.

Neste artigo me pergunto pela capacidade que possui o que chamarei, inspirada em Sontag, a “iconografia dos desastres”3 de tornar visível o que, de outra forma, permaneceria invisível para uma considerável parcela da população: os riscos sociais e ambientais associados à mineração em grande escala e as inverdades contidas nas propagandas das empresas mineradoras. Como analisado em artigo anterior (SCOTTO, 2018), as grandes corporações mineradoras investem significativos recursos financeiros e humanos em propaganda e campanhas publicitárias veiculadas na televisão, na imprensa escrita e nas redes sociais. Com isto elas buscam não só propagar suas “boas ações” sociais e ambientais, como também divulgar a crença na importância da atividade da mineração no dia a dia das nossas vidas. Para isso mobilizam um conjunto de representações sociais, de símbolos e de valores alheios à atividade econômica propriamente dita, através dos quais as empresas se posicionam perante a sociedade como sujeitos morais, portadoras de visão de mundo e de valores.

No entanto, se, por um lado, o campo imagético das propagandas e campanhas publicitárias se abre como espaço privilegiado para as empresas construírem sua “boa imagem” e sua reputação corporativa, por outro, é este mesmo campo que agentes sociais críticos dos efeitos negativos da mineração em grande escala, como movimentos sociais, organizações não governamentais (ONGs), pesquisadores, jornalistas, cineastas e coletivos ambientalistas, escolhem para travar suas lutas sociais e “atacar” as empresas e suas práticas.4 Com a intenção de avançar nessa direção, neste artigo nos perguntamos pela força política que as imagens, veiculadas publicamente após os desastres ambientais como os ocorridos no Brasil (2015 e 2019), teriam para fortalecer a capacidade política e as lutas sociais dos críticos do modelo da mineração extrativista.

A partir de uma pesquisa baseada em revisão bibliográfica, análise documental (CELLARD, 2012) e análise de material iconográfico de circulação nas redes sociais (GRUZINSKI, 2006; SONTAG, 2003), assim como da participação em alguns dos eventos públicos promovidos pela Articulação Internacional de Atingidos e Atingidas pela Vale (AIAAV) sugerimos que a “visibilização” imagética dos desastres e a exposição visual (e audiovisual) de muitas das suas consequências negativas podem ser compreendidas em duas direções importantes: em primeiro lugar, ela expõe o lado “marrom” e “irresponsável” das empresas de mineração; em segundo, ela parece dar a razão, de uma forma trágica, aos seus críticos, contribuindo para reforçar as estratégias políticas tendentes a visibilizar os riscos e tragédias associados ao extrativismo mineral, como para nomear as empresas responsáveis (ver AIAAV, 2020; FELIPPE, 2020; VALE…, 2016; ZONTA; TROCATE, 2016, dentre outros). Nesse sentido, proponho pensar o potencial político da exposição e circulação da iconografia dos desastres da mineração à luz do conceito de “potencial político das catástrofes” formulado por Ulrich Beck no seu livro inacabado e póstumo “A metamorfose do mundo: Novos conceitos para uma nova realidade” (BECK, 2018).5

2 Estratégias corporativas, poder simbólico e narrativas audiovisuais

As corporações (ou grandes empresas multinacionais) são uma das instituições mais poderosas de nosso tempo. Elas organizam a maior parte do trabalho e do capital, dão a forma material do mundo moderno e são motores da chamada globalização econômica (KIRSCH, 2014). No que diz respeito ao setor extrativista mineral, é possível rastrear sua origem no modelo criado na Europa logo após a Primeira Guerra Mundial para garantir o abastecimento de petróleo aos países europeus. Tudo começou, segundo Alain Denault (2018), após as negociações entre França e o Reino Unido, permitindo que grandes grupos petroleiros constituíssem (nos recém-criados Iraque, Irã e Catar, dentre outros) “envelopes jurídicos” para dar segurança às empresas petroleiras que ali operavam. A partir dos diferentes cartéis que as empresas criaram, elas começaram a impor suas leis. Foi assim, ressalta Denault, que a partir do século XX “as corporações se constituem em entidades privadas e multinacionais que são soberanas no sentido de que a soberania consiste em poder tomar decisões, de fato, numa coletividade dada.” (DENAULT, 2018, p. 17). Não pretendo me alongar aqui na história das corporações, nem numa apresentação das suas características, no entanto me interessa destacar que – desde suas origens – essa nova forma de poder se exerce através de dispositivos que ultrapassam as estratégias de mercado. Em paralelo aos processos de liberalização econômica e de autonomização das empresas do controle do Estado, as corporações desenvolvem diversas estratégias.

Milanez et al. (2019) definem o conceito de estratégia corporativa como um repertório de ações coordenadas desempenhadas por um ou mais agentes que envolve o exercício do poder com o objetivo de: (1) aumentar a capacidade de ampliar ou capturar valor; (2) expandir o poder ou reduzir o poder de outros agentes; e/ou (3) modificar condições de enraizamento próprias e de outros agentes. Para o caso específico de corporações extrativistas os autores listam um repertório de seis estratégias: de mercado; financeira; institucional; relações de trabalho; social; e territorial. Outros autores como Acselrad (2018) e Pinto (2019) se referem ao conjunto de estratégias de “não mercado”, referindo-se mais especificamente às práticas de gestão empresarial “do social” ou às microtecnologias de poder para ao mesmo tempo “evitar rupturas de fluxos de mercadorias e materiais e legitimar no plano local o regime neoliberal que predomina no plano macroeconômico” (ACSELRAD, 2018, p. 33).

Como já exposto anteriormente (SCOTTO, 2016, 2017, 2018), considero que, para compreendermos os processos sociais em torno da mineração em grande escala, é fundamental prestar atenção à “agência” das empresas mineradoras em termos não econômicos (como agentes sociais ativos, presentes na cena política local, nacional e global). Concordamos com Pierre Bourdieu (1998, p. 9) quando afirma que:

Os ‘sistemas simbólicos’ – como instrumentos de conhecimento e comunicação -, só podem exercer um poder estruturante porque são estruturados. O poder simbólico é um poder de construção da realidade que tende a estabelecer uma ordem gnosiológica: o sentido imediato do mundo (e, em particular do mundo social).

Sendo assim, continua Bourdieu: “o poder simbólico como poder de constituir o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, de confirmar ou de transformar a visão do mundo e, deste modo, a ação sobre o mundo” (BOURDIEU, 1998, p. 14).

Levando em consideração essas perspectivas, que apontam para a relevância de olharmos para as estratégias corporativas simbólicas, comunicacionais, e sociais, identificamos um campo de práticas e representações construído em torno da chamada Responsabilidade Social Empresarial (RSE), no qual as empresas objetivam construir a crença na “mineração sustentável” e consolidar sua “reputação” e sua “imagem” corporativa de “empresa responsável” junto aos seus públicos (stakeholders), aspectos que cada vez mais se traduzem em valores de mercado.6 Foi guiada por essas preocupações que analisei os dispositivos imagéticos, em especial os audiovisuais, que compõem a chamada “propaganda institucional” (ou “corporativa”) de grandes empresas mineradoras (SCOTTO, 2018). Nessa ocasião, argumentei que a propaganda corporativa opera dois importantes deslocamentos semânticos e narrativos, que possibilitam a junção de termos e conceitos como “mineração”, “sustentável” e “cuidado com o meio ambiente” que, de outra forma, seriam excludentes: a) dissociação entre os minérios e a “Natureza”, e b) ocultamento da dimensão extrativista da mineração, criando para as empresas uma identidade associada à indústria “transformadora de natureza em cultura e civilização”.

A seguir, proponho abordar analiticamente as estratégias corporativas implementadas pelas empresas de mineração em torno do campo social da RSE e da produção publicitária de imagens e narrativas audiovisuais como “políticas da invisibilidade”, conceito também proposto por Ulrich Beck (2018), do capitalismo extrativista.

3 A “invisibilidade” do extrativismo mineral e de seus rejeitos



Sobreviver e decidir sob condições de desconhecimento e inconsciência não é uma problemática fictícia, mas a verdadeira problemática existencial do início do século XXI, em todos os níveis de tomada de decisão, em famílias e em organizações nacionais e internacionais.

Fuente: (Ulrich Beck)

Assim como os riscos tecnológicos da modernidade analisados por Ulrich Beck no seu famoso trabalho sobre a Sociedade do Risco (BECK, 2011), para a grande maioria da população, os riscos da mineração extrativista são invisíveis.

Ulrich Beck (2011) ressalta que uma das características dos “riscos civilizatórios” (resultado de um nível mais avançado do desenvolvimento das forças produtivas como, por exemplo, a radioatividade) é a de se subtraírem a percepção; eles não são percebidos pelos sentidos, não “atacam o nariz ou os olhos” como ocorria com os “fétidos vapores e gases tóxicos” do rio Tâmisa, no século XIX (BECK, 2011, p. 27). Da mesma forma, e sem pretender entrar na identificação sobre qual tipo de risco se aplica ao extrativismo mineral, afirmamos que os riscos dessa atividade compartilham com os riscos civilizatórios o fato de serem “invisíveis”.

Como podemos inferir a partir dos depoimentos citados a seguir, algumas pessoas, incluindo moradores dos locais afetados como a moradora de Itabira que fala no filme documentário “O Amigo do Rei” (D´ELIA, 2019), declaram que não sabiam do risco de rompimento. Cabe observar que, no caso de uma importante quantidade de minas a céu aberto, as cavas da extração e as barragens de rejeitos não são visíveis para a população vizinha, por estarem no topo de morros e montanhas, e sem acesso público.

Eu moro aqui desde os 16 anos, estou com 63, eu não sabia de barragens assim desse tipo; fiquei sabendo e passei a me preocupar com isso depois do acontecimento lá em Mariana e vi que é perigoso. Nós temos aqui uma barragem que é três vezes maior… então se a população não se interessa de saber, não vai ficar sabendo. Se aquilo lá romper, não vai ser só minha vila, vão ser várias que vão ficar detonadas. (Moradora de Itabira, em D´ELIA, 2019).

Em outro trecho do referido filme-documentário O Amigo do Rei (D´ELIA, 2019), outra moradora entrevistada acrescenta: “…e a gente pensava que se caso fosse acontecer, ia passar um barrinho, a gente ia lavar a casa e continuar na casa”. Assim como para essas moradoras, para uma parte importante da população, o que se conhece das empresas mineradoras e suas atividades não inclui os riscos associados à possibilidade (não rara) de rupturas de barragens de rejeitos. Se, por um lado, as empresas invisibilizam suas cavas e suas barragens de rejeitos, por outro, elas se fazem visíveis nas “comunidades onde atuam” através das suas ações de RSE, dos seus funcionários com uniforme da empresa, das camionetes etc. (SCOTTO, 2013, 2016).

O relatório “Vale de lama” (VALE…, 2016), resultado de uma “inspeção em Mariana após o rompimento da barragem de rejeitos do Fundão”, apresenta numerosos depoimentos de moradores e moradoras, na direção apontada. Transcrevemos um deles, por considerá-lo particularmente ilustrativo. Durante entrevista com uma moradora, descreve o relatório, uma sirene tocou; quando perguntada pelo entrevistador o que lhe fora explicado sobre a sirene, ela respondeu:

É, hoje tivemos uma notícia que tem uma barragem. Tem um trole lá filmando, aí diz que esta barragem tem três metros de trinca. Aí a Samarco desmente diz que não tem, e o bombeiro confirmou que tem. Então a gente está sem saber em quem acreditar. Mas o bombeiro deu uma entrevista hoje e disse que tem. Eles dizem que estão dando manutenção, mas sei lá se eles vão dar manutenção igual estavam dando na outra que estourou? Aí em vez de estourar uma, estourou duas. Eu não acredito em mais nada que eles falam. Vamos torcer que tudo dê certo para a gente. (VALE…, 2016).

Como mencionado acima, as corporações mineradoras constroem sua reputação de “responsáveis e sustentáveis” a partir de estratégias corporativas (RSE e campanhas de comunicação corporativa) que, de forma direta ou indireta, ocultam os riscos social e ambiental associados à dimensão extrativista e predatória da atividade.

3.1 Políticas da invisibilidade

Inspirada, mais uma vez, nas reflexões de Ulrich Beck, sugiro pensar a invisibilidade dos riscos relacionados ao extrativismo mineral como uma invisibilidade “fabricada”. Em “Para onde vai o poder? Política da invisibilidade”, um dos capítulos integrantes do livro A metamorfose do mundo: Novos conceitos para uma nova realidade, Beck (2018) dirige sua mirada para os processos de fabricação da invisibilidade: “Para analisar as novas paisagens das relações de definição, é útil introduzir um dualismo diagnóstico do tempo entre uma invisibilidade natural (“dada”) de riscos altamente civilizacionais e uma invisibilidade fabricada (política da invisibilidade).” (BECK, 2018).

Por “relações de definição” Beck se refere aos recursos e ao poder dos agentes (especialistas, Estados, indústrias, organizações nacionais e internacionais), aos padrões, regras e capacidades que determinam a construção social e a avaliação do que é um risco global e do que não é. Entre eles estão a política da invisibilidade, os padrões de prova e os padrões de compensação. Até que ponto, se pergunta o sociólogo, “os riscos imperceptíveis (como radiação nuclear e mudança climática) podem ser tornados publicamente invisíveis e inobserváveis? Em que medida a política da invisibilidade produz uma situação de ignorância do risco existencial?” (BECK, 2018). Um dos exemplos paradigmáticos das políticas de invisibilidade que Beck menciona é o da indústria de tabaco, onde riscos imperceptíveis se tornam continuamente invisíveis pelas indústrias que os produzem, que por sua vez são auxiliadas por órgãos administrativos que não as regulam.7 A indústria do tabaco, continua Beck, “trabalhou abjetamente para tornar os efeitos do fumo sobre a saúde publicamente invisíveis” (BECK, 2018).8

Mas, se em alguns casos, as políticas de invisibilização dos riscos demandam caras campanhas publicitárias e investimentos em ações de RSE, em outros, a opção mais eficaz pode ser não fazer nada:

No processo de fabricação da invisibilidade – isto é, na política da invisibilidade –, a invisibilidade natural pode ser instrumentalizada. Não fazer nada ativamente é a estratégia política mais barata, eficaz e poderosa para “simular” a controlabilidade de riscos incontroláveis e catástrofes indefinidas, como radiação e mudança climática. (BECK, 2018).

A afirmação de Beck poderia ser corroborada com os depoimentos tais como os apresentados a seguir. Segundo matéria realizada pelo jornal The Intercept Brasil, durante uma conversa com o engenheiro que assinou o estudo de impacto de Brumadinho como responsável técnico, ao ser questionado sobre a ausência das informações na versão divulgada ao público geral em 2017, ele teria respondido que “não foi por omissão, mas porque não cabia mesmo”. O engenheiro justificou assim: “A população não ia entender porcaria nenhuma” (COSTA, 2019).9

Ou através do depoimento apresentado no filme-documentário O amigo do Rei (D´ELIA, 2019) pelo “historiador e gestor de emergências”, Randal Fonseca, quando descreve de forma crítica a postura das empresas:

… e se vejo que aquela vila está no meio, eu tenho que proteger a vila ou eu tenho que tirar a vila… mas tirar a vila? Fazer diques? Então você está denunciando que barragens é um negócio perigoso… imagina a confusão das pessoas na rua dizendo que barragens é um negócio perigoso porque podem matá-las! Eles na ignorância vão viver tranquilas. (Gestor de emergências, em: D´ELIA, 2019)

“Tranquilas”, acrescento, até que uma barragem de rejeitos se rompa.

4 O potencial político das catástrofes da mineração

As poderosas imagens da “lama tóxica” que se espalharam pelos meios de comunicação e pelas redes sociais transformaram, de forma irrecusável, o risco invisível em visível. Na desigual luta pela definição dos riscos da mineração, elas deram força e poder de verdade e evidência aos críticos da mineração e às suas denúncias, antes tidas por “catastrofistas” e “politizadas”. As responsabilidades diretas das empresas mineradoras envolvidas nas catástrofes causadas pela ruptura de barragens de rejeitos, como as de Mariana (2015) e Brumadinho (2019) passam a ser percebidas e socialmente reconhecidas.10 Irrompe, assim, de forma trágica, o que Beck denominou de “potencial político das catástrofes”:

Os riscos socialmente reconhecidos (como no caso das discussões sobre desmatamento) “contêm um peculiar ingrediente político explosivo: aquilo que até há pouco era tido por apolítico torna-se político – o combate às “causas” no próprio processo de industrialização” (2011, p. 28) (…) Emerge assim na sociedade de risco, em pequenos e grandes saltos – em alarmes de níveis intoleráveis de poluição, em casos de acidentes tóxicos etc. – o potencial político das catástrofes. (BECK, 2011, p. 28-29)

4.1 O poder de visibilização da iconografia dos desastres

O que a iconografia dos desastres produzida pelas rupturas de barragens de rejeitos põe em evidência? Se as grandes corporações da mineração, como a Vale, produzem suas imagens e suas narrativas sobre a “mineração sustentável” (onde não se mostram as imensas cavas a céu aberto, nem os rejeitos da mineração e nas quais o “verde da natureza” e a “alegria das comunidades parceiras” prevalecem (SCOTTO, 2018), em contrapartida, nas fotos e imagens audiovisuais – sejam profissionais ou amadoras – dos desastres de Mariana e Brumadinho, a cor marrom da lama e o sofrimento de pessoas e animais, imperam. Essas duas iconografias se chocam de forma contundente. A iconografia dos desastres expõe os impactos negativos sociais e ambientais da mineração em grande escala. Levanta suspeitas sobre a veracidade das propagandas e do discurso verde da “mineração sustentável”, tão cuidadosamente produzidos pelas corporações da mineração.

No entanto, a exposição em jornais de grande circulação e noticiários da TV das imagens da dor e do sofrimento provocados pelas rupturas das barragens, embora tenha um papel fundamental na visibilização do lado “marrom” da mineração e criem sentimentos de empatia com suas vítimas, não necessariamente permite identificar espontaneamente as causas e processos que levaram ao desastre, nem os responsáveis. As imagens capturam e comunicam o “presente” do desastre. Caberá aos críticos da mineração um papel fundamental no estabelecimento dos nexos causais entre o que aconteceu (o “presente” das imagens) e os processos sociais, econômicos e políticos (o “passado” das imagens) que antecederam aos desastres e os explicam. Caberá aos críticos da mineração transformar a empatia com as vítimas em indignação, solidariedade e mobilização política.

Encontramos um exemplo disso em uma nota da Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale S.A. escrita e publicada um mês depois do Desastre Socioambiental de Mariana, encabeçada pelo hashtag #NãoFoiAcidente. Após declarar que o rompimento da Barragem de Rejeitos do Fundão, na cidade de Mariana (MG), foi um “crime” provocado pela empresa Samarco S.A., joint venture das mineradoras BHP Billiton Ltda e da Vale S.A., o texto postula a relação de causalidade entre a lama (acompanhada na nota com uma foto de uma casa destruída e coberta de lama), o “crime” e a ausência de um plano de emergência que poderia ter evitado a tragédia:

O percurso da lama persistiu com intensidade, atingindo o Rio Doce e todos os municípios cortados por ele entre os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, até chegar ao Oceano Atlântico, a 700 km de distância. Cerca de 8 milhões de toneladas de peixes contaminados e mortos já foram retiradas do rio. Todo este cenário de destruição comprova a ausência de um plano de emergência efetivo da Samarco com o objetivo de conter o alastramento da lama de rejeitos e o assessoramento das populações do entorno. (AIAAV, 2015).

Antes de encerrar a nota com as “exigências” e o pedido de “Justiça para as vítimas do desastre ambiental da Vale e da BHP!” a nota afirma:

Um mês após a tragédia, a Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale S.A. reafirma que este não é um caso isolado e sim mais uma tragédia do setor da mineração. Ao longo dos anos, temos denunciado muitas tragédias provocadas pela mineração da Vale S.A. sobre a vida de comunidades tradicionais, quilombolas, indígenas, camponesas e de populações urbanas empobrecidas. (AIAAV, 2015).

Na Nota da AIAAV identificamos a presença iconográfica dos desastres, mas são também as legendas das imagens e o conteúdo da nota os que transformam imagens de desastre em imagens de tragédia e de crime. Essa afirmação, que não poderei desenvolver aqui, dialoga com o postulado da Susan Sontag de que uma fotografia não fala por sim mesma:

Para um judeu israelense, uma foto de uma criança estraçalhada no atentado contra a pizzaria Sbarro no centro de Jerusalém é, antes de tudo, uma foto de uma criança judia morta por um militante suicida palestino. Para um palestino, uma foto de uma criança estraçalhada pelo tiro de um tanque em Gaza é, antes de tudo, uma foto de uma criança palestina morta pela máquina de guerra israelense. Para o militante, a identidade é tudo. E todas as fotos esperam sua vez de serem explicadas ou deturpadas por suas legendas.

O campo iconográfico, entendido como parte das ações táticas de comunicação e de contrapropaganda da AIAAV, se configura como um campo de batalha fundamental nas estratégias políticas do movimento. Neste sentido, focar no uso que os críticos da mineração fazem das imagens, tanto como produtores de contra imagens, como “iconoclastas”,11 destruidores das imagens produzidas pelas empresas implica pensar no campo imagético na sua dimensão política capaz de atacar e desconstruir um dos bens mais preciosos das corporações: “sua reputação” (Ver Nota de Rodapé 6).

5 Imagens e estratégias políticas de “visibilização”: o caso da Articulação Internacional de Atingidos e Atingidas pela Vale (AIAAV)

Em meados de abril de 2010 se realizou, no Rio de Janeiro, o “I Encontro Internacional dos Atingidos pela Vale”, que contou com o apoio e a participação de numerosas organizações e movimentos sociais brasileiros, latino-americanos e de outros continentes. O objetivo do encontro foi o de nuclear no debate e na ação organizações sociais dos cinco continentes afetados pela ação da companhia mineradora, em especial coletivos do Canadá, Chile, Argentina, Guatemala, Peru e Moçambique, além do Brasil. Mais de 160 participantes de 80 organizações e movimentos sociais e sindicais dos diversos países representados intercambiaram experiências e debateram sobre suas ações contra os efeitos dos empreendimentos da Vale:

Este encontro visa a articular e consolidar uma rede de movimentos sociais, organizações e centrais sindicais de diversos países, incluindo populações, comunidades e trabalhadores(as) atingidos negativamente nas suas formas de vidas e nos seus direitos pela forma de atuação da Vale, capaz de implementar estratégias coletivas de enfrentamento a empresa em escala global. Ao longo dos últimos anos, inúmeras experiências mostraram que, para enfrentar os impactos e as violações causadas pela Vale, é necessária articulação global. (AIAAV, 2010).

Dentre as diversas atividades que marcaram o nascimento público da AIAAV no I Encontro,12 me interessa destacar o lançamento de um dossiê dos impactos e violações da Vale no mundo (AIAAV, 2010) com a capa apresentando o que, até hoje, é a marca visual identitária da articulação.

Capa do Dossiê
Figura 3.
Capa do Dossiê
Fonte: AIAAV (2010)

A ampulheta de areia transformando as cores verdes e amarelas (com tons e formas que nos lembram o logo da Vale) em areia vermelha, vermelho-sangue, areia-minério-de-ferro-vermelho-sangue, símbolos das violações da empresa no mundo. Desconstrução imagética absoluta e radical do logo da Vale, da sua marca icônica. Iconoclastia simbólica que, como mostrarei uma pouco mais à frente, irá influenciar um número muito significativo de contraimagens que circularam nas redes sociais após os desastres de Mariana e de Brumadinho. É essa clara noção da importância do poder simbólico e político da “contrapropaganda”, como forma de luta e denúncia, o que orienta muitas das ações da AIAAV.

Outdoor afixado no centro do Rio de Janeiro
Figura 4.
Outdoor afixado no centro do Rio de Janeiro
Fonte: AIAAV (2010)

Esse outdoor foi afixado no dia da abertura do I Encontro, na avenida Presidente Vargas, no Rio de Janeiro. Na página web da AIAAV ele aparece exibido após o cabeçalho “Contrapropaganda no Rio de Janeiro” e seguido do seguinte texto:

Na manhã do hoje (12/4), um outdoor bem diferente passou a ocupar espaço na Avenida Presidente Vargas, uma das mais movimentadas da capital carioca. Nele, uma mensagem provocativa: “trabalhadores explorados, famílias despejadas, natureza destruída. Isso vale?”. Para nós, que integramos I Encontro Internacional dos Atingidos pela Vale, a resposta é não. Essa contrapropaganda faz frente à visão massivamente veiculada pela empresa, que mostra funcionários sorridentes, trabalhando a serviço do “progresso” do país. Mas esse progresso serve a quem? É promovido a custo de quê? (Página web da AIAAV)13

Se, como afirmamos, seguindo a proposta de Ulrich Beck, é possível falar de políticas de invisibilização dos riscos, associadas às estratégias das empresas de mineração, por sua vez, podemos identificar como “políticas de visibilização” as ações que movimentos críticos, como a AIAAV, adotam como peça-chave do seu fazer político. Dez anos depois do I Encontro, em 2020, a AIAAV lança a publicação “Acionistas críticos: os 10 anos de atuação da articulação internacional dos atingidos e atingidas pela Vale” (AIAAV, 2020). Logo na capa da publicação, a iconografia dos desastres:

 Capa da publicação “Acionistas Críticos”
Figura 5.
Capa da publicação “Acionistas Críticos”
Fonte: AIAAV (2020)

Ao apresentar os objetivos da “tática do ativismo dos acionistas críticos”14 os autores do trabalho explicam:

É extremamente importante, portanto, que essa tática seja considerada, dentro desta perspectiva, como uma ação que pode fortalecer e dar visibilidade às condições de violação de direitos e à má gestão empresarial em situações particulares. Tal tática somada e articulada a outros importantes instrumentos de luta política, jurídica e de pressão popular é capaz de canalizar a mobilização dos atores impactados e da sociedade, tais como ações jurídicas – individuais e coletivas, contra as empresas, pressão política pela realização de audiências públicas, abertura de inquéritos com o apoio dos operadores judiciários, dentre outros exemplos. (AIAAV, 2020, p. 30, grifos nossos).

Dentre as outras ações paralelas capazes de serem interpretadas como políticas de visibilização, destacamos a elaboração e lançamento dos “relatórios de insustentabilidade ou relatório sombra” como peças que objetivam desconstruir os Relatórios de Sustentabilidade da Vale; o “Prêmio de pior empresa do mundo”;15 ocupação da rua com atos, grafites, cartazes; as chamadas “peças de comunicação”, que claramente se constroem como contrapropaganda.

5.1 Iconoclastias de um ícone corporativo

Movimentos sociais, ONGs, pesquisadores, cineastas, jornalistas e outros atores sociais críticos da mineração se manifestam na esfera pública – nem sempre com muita visibilidade – denunciando e contestando a suposta “sustentabilidade” da mineração à grande escala. Mas se eles nem sempre parecem ser bem-sucedidos nas suas táticas de denúncia e mobilização, eles podem contar a seu favor” com a (infeliz) ajuda dos desastres sociais e ambientais causados pela mineração. Nesse contexto, os desastres são concebidos aqui como ativadores da crítica social, “desocultadores” da insustentabilidade da atividade mineradora em grande escala e, por conseguinte, abordados analiticamente no seu potencial político de produtores de disputa pública e de contestação social.

Após o desastre de Brumadinho, em janeiro de 2019, as redes sociais (Instagram e Facebook) foram invadidas, sob hashtags como de #somotodosatingidos, #valeassassina, #nãofoiacidente, por imagens16 que parecem reproduzir, ou se inspirar ao menos, no ato iconoclasta proposto pela AIAAV ao desconstruir o logo da Vale e criar, a partir desse ato quase antropofágico, sua própria identidade.

Imagens que circularam nas redes após o desastre de Brumadinho (2019)
Figura 6.
Imagens que circularam nas redes após o desastre de Brumadinho (2019)
Fonte: Instagram e Facebook

Para uma corporação como a Vale, antes Companhia Vale do Rio Doce, que em novembro de 2007 resolveu mudar o seu nome e a sua logomarca “com o intuito de reposicionar a companhia no mercado de uma maneira mais compatível com o status de uma empresa multinacional” e que, para isso, conforme Patrício (2009), teria investido cerca de US$ 50 milhões para alterar todos os logotipos e nomes da empresa ao redor do mundo, ver sua logomarca “suja de lama” e de sangue, não deve deixar de ter um efeito. Mais ainda quando as principais agências de classificação de risco pioram a sua avaliação sobre a empresa e os “analistas de risco” admitem: “O impacto do acidente para a reputação da Vale, no entanto, ainda não foi totalmente mensurado. Na terça-feira, manifestantes foram até a sede da empresa no Rio de Janeiro para protestar contra o acidente. Indício de que o caminho para uma eventual recuperação será longo.” (MELO; GERBELLI, 2019).

6 Considerações finais

Postulamos que a iconografia dos desastres, apropriada pelos críticos da mineração extrativista em grande escala, e transformada em elemento político de visibilização dos impactos da mineração extrativista, apontam a contradizer e desarticular – apesar das tentativas de "deslocamento" do capital – as narrativas da mineração sustentável, “tornando visível o invisível”: a insustentabilidade do extrativismo mineral e os riscos da atividade. Tal movimento forçaria as corporações a, como salienta Stuart Kirsch, “adaptar-se à pressão dos seus críticos.” (KIRSCH, 2014). O potencial político dos desastres encontra-se, também, na evidenciação da dimensão “enganosa” da iconografia produzida pelas empresas e das narrativas da mineração sustentável como dispositivos de invisibilização dos riscos sociais e ambientais da mineração.

Logo após o desastre, a empresa Samarco tentou, por meio da exibição de uma peça publicitária, “melhorar sua imagem” diante da sociedade. Em comercial que começou a ser veiculado na televisão, em horário nobre, uns meses após o desastre, a companhia tenta sensibilizar as pessoas utilizando funcionários da empresa para, de forma “humanizada”, mostrar “o outro lado” e os supostos esforços que vinha desempenhando para recuperar a água do Rio Doce e amenizar os impactos causados pelo “mar de lama” que invadiu Minas Gerais e Espírito Santo. No entanto, o efeito da peça, ao menos na internet, parece ter sido completamente o contrário do esperado. Nas redes sociais, “revoltados, internautas questionaram como uma empresa que teve os bens bloqueados pela Justiça e que se recusou a pagar indenizações aos atingidos pela tragédia gasta recursos com um comercial em horário nobre.” (SAMARCO…, 2016). O comercial teve que ser retirado do ar.

Tal situação se assemelha ao exemplo da morte dos bosques, analisado por Beck (2011, p. 37): para o sociólogo, quando o desmatamento passa a ser percebido e reconhecido socialmente como efeito da industrialização, quando se reconhece – como consequência da crítica pública – que as causas não são locais, o problema se transforma em um problema duradouro que requer soluções políticas. Beck acrescenta que, mesmo quando essa pressão pública é rechaçada, a “confiança” dos consumidores precisará ser reconquistada e reassegurada por meio de grandes e caras campanhas publicitárias: “Para onde quer que aponte o holofote que rastreia causas, irrompe o fogo, por assim dizer e obriga aos ‘bombeiros argumentativos’ jogarem seus jatos de ‘contra interpretações’” (BECK, 2011, p. 38).

Não temos condições, nem foi o objetivo deste artigo, mensurar nem avaliar o potencial político das catástrofes da mineração de produzir mudanças concretas nas formas de “operação” do extrativismo mineral em grande escala. Ao que tudo indica, ele tem uma capacidade de regeneração econômica à prova de trágicos desastres, como é possível inferir a partir da recuperação, após um ano de Brumadinho, do valor de mercado da Vale e da melhoria na sua “saúde financeira” (LAPORTA, 2020).

Não entanto, gostaria de encerrar este trabalho com uma reflexão da AIAAV sobre sua própria atuação ao longo destes 10 anos:

Dessa forma, percebe-se que a atuação de acionistas críticos nas assembleias gerais enquanto estratégia de pressão às empresas é complexa e os resultados podem ser lentos e difíceis de mensurar. No entanto, ela se configura como uma forma positiva de atuação, se a considerarmos como mais um espaço de pressão e denúncia das violações cometidas por grandes empresas em diversos territórios. Assim, mesmo que a prática não altere imediatamente a vida das atingidas e atingidos pelas atividades de uma dada empresa, insiste-se em sua realização por se entender que esta é uma oportunidade para dar visibilidade às arbitrariedades que são aprovadas em assembleias e apresentar uma contra narrativa ao discurso oficial da empresa. (AIAAV, 2020, p. 31, grifo nosso).

As palavras da citação acima nos remetem de volta à epígrafe de Susan Sontag com que abrimos este artigo. Sontag nos diz:” Mostrar um inferno não significa, está claro, dizer-nos algo sobre como retirar as pessoas do inferno” (SONTAG, 2003). Da mesma forma, podemos dizer que a exibição das imagens sobre os desastres, produzidos pelas rupturas das barragens, não nos dizem nada sobre como retirar “atingidas e atingidos” do inferno marrom produzido pela lama. Mas quando, como argumentamos neste artigo, essas imagens são produzidas e/ou ressignificadas politicamente pelos críticos da mineração extrativista em grande escala, elas adquirem uma poderosa dimensão de desinvisibilização da responsabilidade das empresas.

Sobre o que dizem as imagens das atrocidades da guerra, continua Sontag: “é isto o que seres humanos são capazes de fazer – e ainda por cima voluntariamente, com entusiasmo, fazendo-se passar por virtuosos. Não esqueçam.”. Da mesma forma, a iconografia dos desastres, exposta constantemente pelos críticos da mineração a cada aniversário das tragédias nos diz: “é isto o que as grandes empresas da mineração a grande escala são capazes de fazer. Não esqueçam.”.

Referências

ACSELRAD, H. Políticas territoriais, empresas e comunidades. Rio de Janeiro: Garamond, 2018.

AIAAV. Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale. Dossiê dos impactos e violações da Vale no mundo. 2010. Versão preliminar. Disponível em: https://atingidospelavale.files.wordpress.com/2010/04/dossie_versaoweb.pdf. Acesso em: 20 jul. 2020.

AIAAV. Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale. Nota da Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale S.A.: 1 mês do Desastre Socioambiental de Mariana. 2015. Disponível em: https://medium.com/@pacsinstituto/mariana-n%C3%A3o-foi-acidente-525e772996bc#.ofqjk04b9. Acesso em: 12 jun. 2020.

AIAAV. Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale. Acionistas críticos: os 10 anos de atuação da articulação internacional dos atingidos e atingidas pela Vale. 2020. Disponível em: https://atingidospelavale.files.wordpress.com/2020/04/relatorio_acionistas_criticos_completo.pdf. Acesso em: 18 ago. 2020.

BECK, U. Sociedade de risco: ruma a uma outra modernidade. São Paulo: Editora 34, 2011.

BECK, U. A metamorfose do mundo: Novos conceitos para uma nova realidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2018. Edição do Kindle.

BOLTANSKI, L.; CHIAPELLO, E. O novo espírito do capitalismo. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009.

BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998.

CELLARD, A. A análise documental. In: POUPART, J. et al. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012. p. 295-316.

COSTA, B. Vale sabia de problemas na barragem e omitiu os riscos em documento público. Jornal The Intercept Brasil, 28 jan. 2019. Disponível em: https://theintercept.com/2019/01/28/vale-sabia-problemas-barragem-brumadinho/. Acesso em: 10 mar. 2020.

D´ELIA, A. O Amigo do Rei. Brasil: [s.n.], 2019. Filme documentário ficção, 142`.

DENEAULT, A. As empresas multinacionais. Um novo poder soberano inscrito na ordem das coisas. In: ACSELRAD, H (org.). Políticas territoriais, empresas e comunidades. Rio de Janeiro: Garamond, 2018. p. 13–32.

FELIPPE, M. F. et al. Minas de lama: relatório da expedição geográfica no vale do rio Paraopeba. Juiz de Fora, MG: UFJF, 2020.

GRUZINSKI, S. A guerra das imagens: de Cristóvão Colombo a Blade Runner (1492-2019). São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

JOY, M. Porque amamos cachorros, comemos porcos e vestimos vacas: uma introdução ao carnismo: o sistema de crenças que nos faz comer alguns animais e outros não. São Paulo: Cultrix, 2014. Edição Kindle.

KIRSCH, S. Mining Capitalism: The Relationship between Corporations and Their Critics. Oakland, California: University of California Press, 2014.

LAPORTA, T. 1 ano de Brumadinho: Vale recupera valor, mas ainda carrega estigma da tragédia. InvestNews, 24 jan. 2020. Disponível em: https://investnews.com.br/negocios/1-ano-de-brumadinho-vale-recupera-valor-mas-ainda-carrega-estigma-da-tragedia/. Acesso em: 15 mar. 2020.

MELO, L.; GERBELLI, L. G. Vale tem perda bilionária e enfrenta crise de imagem com tragédia em Brumadinho. G1, Globo, 3 fev. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/02/03/vale-tem-perda-bilionaria-e-enfrenta-crise-de-imagem-com-tragedia-em-brumadinho.ghtml. Acesso em: 20 jan. 2020.

MILANEZ, B. et al. Buscando Conexões para o Desastre: Poder e Estratégia na Rede Global de Produção da Vale. Internext, Revista Eletrônica de Negócios Internacionais, v. 14, n. 3, p. 265-285, 2019. DOI: http://dx.doi.org/10.18568/internext.v14i3.561.

MILANEZ, B.; LOSEKANN, C. (org.) Desastre no Vale do Rio Doce: antecedentes, impactos e ações sobre a destruição. Rio de Janeiro: Folio Digital, Letra e Imagem, 2016.

PATRÍCIO, T. Análise da Imagem Corporativa Empresa: Vale. 2009. Disponível em https://administradores.com.br/producao-academica/analise-da-imagem-cooporativa-empresa-vale. Acesso em: 8 mar. 2020.

PINTO, R. G. Conflitos ambientais, corporações e as políticas do risco. Rio de Janeiro, RJ: Garamond, 2019.

SAMARCO tenta melhorar imagem com comercial e internautas se revoltam. Fórum, Blogs, Segunda Tela, 16 fev. 2016. Disponível em: https://revistaforum.com.br/blogs/segundatela/samarco-tenta-melhorar-imagem-com-comercial-e-internautas-se-revoltam/. Acesso em: 15 jan. 2020.

SCOTTO, G. O novo espírito da mineração: o "desenvolvimento sustentável e a mineração responsável" como prática discursiva e modelo para a ação empresarial: O caso das empresas mineradoras em São João da Barra, RJ. Relatório Final (Projeto APQ1) – FAPERJ, Rio de Janeiro, ago. 2013.

SCOTTO, G. Discursos globais e produção social do local: o desenvolvimento sustentável e a mineração responsável como prática discursiva e modelo para a ação empresarial. In: LOPES, J. R. et al. (org.). Políticas culturais e ambientais no Brasil: da normatividade às agências coletivas. Porto Alegre: CirKula, 2016. p. 125-146.

SCOTTO, G. Sobre mineração, sustentabilidade e alquimia: algumas reflexões sobre os paradoxos da mineração sustentável. Petróleo, royalties e região, Ano XV, n. 58, 2017.

SCOTTO, G. Narrativas contemporâneas na propaganda corporativa das empresas mineradoras transnacionais: elementos para a análise do 'espírito' da mineração. Cuadernos del Instituto Nacional de Antropología y Pensamiento Latinoamericano, v. 27, p. 37-54, 2018.

SONTAG, S. Diante da dor dos outros. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. Edição Kindle.

VALE vence o Public Eye Awards, prêmio de pior empresa do mundo. Justiça Global, Rio de Janeiro, 2012. Disponível em: http://www.global.org.br/blog/vale-vence-o-public-eye-awards-premio-de-pior-empresa-do-mundo/. Acesso em: 16 fev. 2020.

VALE da lama: relatório de inspeção em Mariana após o rompimento da barragem de rejeitos do Fundão. Justiça Global, Rio de Janeiro, jan. 2016. Disponível em: http://www.global.org.br/wp-content/uploads/2016/03/Vale-de-Lama-Justi--a-Global.pdf. Acesso em 28 fev. 2021.

VANCE, P. S.; ANGELO, C. F. Reputação Corporativa: uma revisão teórica. Revista de Gestão, v. 14, n. 4, p. 93-108, 2007. Disponível em: http://www.spell.org.br/documentos/ver/27613/reputacao-corporativa--uma-revisao-teorica. Acesso em 15 jan.2020.

WANDERLEY, L. et al. Avaliação dos antecedentes econômicos, sociais e institucionais do rompimento da barragem de rejeito da Samarco/Vale/BHP em Mariana (MG). In: MILANEZ, B.; LOSEKANN, C. (org.) Desastre no Vale do Rio Doce: antecedentes, impactos e ações sobre a destruição. Rio de Janeiro: Folio Digital, Letra e Imagem, 2016.

ZONTA, M.; TROCATE, C. (org.). Antes fosse mais leve a carga: reflexões sobre o desastre da Samarco/Vale/BHP Billiton. Marabá, PA: Editoral iGuana, 2016.

Notas

1 Conforme dados sistematizados por Wanderley, Mansur e Pinto (WANDERLEY et al., 2016), o rompimento de barragem do Fundão, com 54 milhões de m3, causou 19 mortes, desalojou mais de 600 famílias em Mariana e Barra Longa, interrompendo o abastecimento de água em várias cidades; e alcançou o mar no Espírito Santo, com efeitos devastadores sobre a fauna e a flora fluvial e marinha. Esse teria sido o maior desastre (ao menos no período compreendido entre 1915 e 2015) envolvendo barragens de rejeito de mineração do mundo, levando em consideração o volume de rejeito liberado (cerca de 60 milhões de m3), a distância percorrida pela lama (mais de 600 km até chegar à foz do Rio Doce) e os prejuízos estimados (US$ 5,2 bilhões, ou R$ 20 bilhões, baseado no valor estipulado pelo governo federal) (MILANEZ; LOSEKANN, 2016).
2 No caso de Brumadinho, as câmeras de segurança da própria empresa filmaram o preciso instante do rompimento da barragem com a enxurrada de lama emergindo do morro e arrastando tudo no seu caminho. Ver Record TV Minas: https://youtu.be/xEeJFds2ARA.
3 Nos inspiramos na expressão de Sontag quando se refere à “iconografia do sofrimento” (SONTAG, 2003).
4 Para uma análise aprofundada e minuciosa sobre as relações entre as corporações mineradoras e seus críticos, ver o trabalho de Stuart Kirsch, Mining Capitalism. The Relationship between Corporations and their Critics (KIRSCH, 2014).
5 Beck se encontrava escrevendo o livro em 2015, quando faleceu de um infarto. O livro foi publicado postumamente, em 2016. Nesta obra, Ulrich Beck propõe como desafio abordar a metamorfose do mundo contemporâneo marcado pelo “que foi impensável ontem e é real e possível hoje” e tentar compreender por que não compreendemos mais o mundo. Algumas das metamorfoses às quais Beck alude no seu Prefácio remetem a eventos “insanos” recentes tais como: “a queda do Muro de Berlim, os ataques terroristas de 11 de setembro, a mudança climática catastrófica no mundo todo, o desastre do reator de Fukushima e as crises financeiras e do euro, até as ameaças à liberdade pela vigilância totalitária na era da comunicação digital trazidas à luz por Edward Snowden.” (BECK, 2018, Prefácio).
6 Conforme Vance e Ângelo (2007) não há uma única definição para o termo “reputação corporativa”. Será somente a partir da década de 90 quando, segundo os autores, estabeleceu-se o debate sobre sua definição e sobre a forma mais adequada de mensuração da reputação corporativa de uma organização. Dentre as diferentes acepções que Vance e Ângelo identificam, eu destacaria a de Argenti e Forman (2002 apudVANCE; ÂNGELO, 2007, p. 95) que definem a reputação corporativa a partir dos conceitos de identidade corporativa e de imagem corporativa: “a reputação de uma organização depende da identidade da organização, da coerência estabelecida entre as imagens percebidas pelos diferentes grupos que se relacionam com a empresa (stakeholders) e também do alinhamento entre a identidade e a imagem percebida”.
7 Outros exemplos são o da indústria química fazendo uma campanha contra o reconhecimento dos efeitos dos pesticidas para a saúde e o meio ambiente. Por sua vez, Melanie Joy (2014) se pergunta pelo que faz comermos alguns animais como vacas e porcos – criados em cativeiro, em condições brutais – sem nenhuma culpa nem repulsa aparente. Ela designa como carnismo o sistema de crenças invisível que está por trás do fato de comer animais sem pensar no que, e por que estamos fazendo. “A indústria se esforça ao máximo para impedir que o público descubra como vivem os animais que estão sendo preparados para o abate”. Por isso, continua Joy, “a indústria veicula campanhas publicitárias dizendo que ‘os melhores queijos vêm de vacas felizes’, mostrando imagens de vacas pastando satisfeitas em belas pastagens.” (op. cit.).
8 Mas para Beck este é ao mesmo tempo um exemplo histórico para a política da metamorfose: “ao longo de prolongadas batalhas nacionais e globais, o poder e a política da invisibilidade foram superados e transformados numa política de visibilidade, demonstrando que mesmo as indústrias mais poderosas podem se render e ser forçadas a reconhecer o risco do fumo para a saúde de grandes partes da população.” (BECK, 2018). Ainda é cedo para dizer se, para o caso da mineração, extrativista em grande escala haverá uma metamorfose similar, mas não perdemos as esperanças.
9 Sobre risco social corporativo e cálculo dos riscos no capitalismo (riscos políticos). Ver também Pinto (2019).
10 Cabe mencionar que, conforme Wanderley et al. (2016), antes da ruptura da barragem da Samarco, em 2015, houve mais sete desastres envolvendo barragens de mineração em Minas Gerais (op. cit., p.74).
11 A guerra das imagens, afirma Gruzinski (2006), talvez seja um dos acontecimentos maiores do fim do século XX. Ela abrange lutas pelo poder, tem implicações sociais e culturais cujo alcance atual e futuro, ele já prognostica lucidamente em 1990, data da edição original do seu livro, ainda somos um tanto incapazes de avaliar (op. cit. p.14). No entanto, continua Gruzinski, não é a primeira vez que a imagem “agita os espíritos, alimenta a reflexão e atiça conflitos no mundo ocidental e mediterrâneo.” O que ele denomina “teologia do ícone” ocupou um lugar eminente no pensamento teológico ocidental e no século VIII desencadeou ásperas discussões entre iconoclastas e iconodualistas sobre o culto religioso às imagens. O Iconoclastia é o nome dado ao membro do movimento de contestação à veneração de ícones religiosos, termo que significa literalmente “quebrador de imagem” e tem origem no grego eikon (ícone ou imagem) e klastein (quebrar). Disputa que será retomada, de forma violenta, no século XVI no contexto dos embates entre a Reforma Protestante e a Contrarreforma Católica.
12 Além do Encontro, vários eventos e atividades pautaram as atividades da articulação em 2010: dentre eles, a greve de um ano inteiro no Canadá dos trabalhadores canadenses da Vale Inco; a participação em várias assembleias de acionistas da empresa expressando as críticas das comunidades; a divulgação do Dossiê dos Impactos e Violações da Vale no mundo, a atuação da Federação Internacional dos Direitos Humanos em pesquisa das violações de direitos em dois casos de Açailândia/MA e ação penal interposta contra dois diretores da siderúrgica CSA no Rio de Janeiro.
14 O ativismo dos acionistas, conforme o uso que a AIAAV faz dele, é compreendido como “a tentativa de influenciar práticas e políticas corporativas por meio do uso de direitos dos acionistas. Estes, por sua vez, utilizam-se de técnicas como a participação em assembleias gerais anuais, o envio de cartas e resoluções e o contato com outros investidores e a administração da empresa para pressionar por mudanças na corporação.” (AIAAV, 2020, p. 8).
15 Em 2012 a mineradora brasileira Vale foi eleita a pior corporação do mundo no Public Eye Awards, conhecido como o “Nobel” da vergonha corporativa mundial. Criado em 2000, o Public Eye é concedido anualmente à empresa vencedora, escolhida por voto popular em função de problemas ambientais, sociais e trabalhistas, durante o Fórum Econômico Mundial, na cidade suíça de Davos (VALE…, 2012).
16 Agradeço muito aqui aos integrantes do GEPPIR – Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Imagens, Poder e Representações / UFF com quem, ao longo do segundo semestre de 2019, trocamos muitas ideias sobre a dimensão iconoclasta das imagens e memes que circularam pós o desastre de Brumadinho. Bruno Santos Azevedo, Gabriel Bon Rabello, Gabriel Roza e Lage, Ives da Silva Duque Pereira, Joice de Carvalho Silva, Karine de Gouvêa Pessoa, Nicolle Marie da Cruz Vassou, e Rômulo Resende Machado contribuíram muito, também, na coleta de um número significativo de imagens.

Notas de autor

1 Doutora em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Museu Nacional | UFRJ (PPGAS/MN/UFRJ). Professora associada do Departamento de Ciências Sociais do Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da UFF (Campos dos Goytacazes) e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento regional, ambiente e políticas públicas (PPGDAP/UFF) – Campos dos Goytacazes/RJ – Brasil. E-mail: gabriela.scotto@gmail.com.

Información adicional

COMO CITAR (ABNT): SCOTTO, G. Verde que vira marrom, reputação que vira lama: extrativismo mineral, desastres e as imagens do “invisível”. Vértices (Campos dos Goitacazes), v. 23, n. 1, p. 213-233, 2021. DOI: https://doi.org/10.19180/1809-2667.v23n12021p213-233. Disponível em: https://www.essentiaeditora.iff.edu.br/index.php/vertices/article/view/15893.

COMO CITAR (APA): Scotto, G. (2021). Verde que vira marrom, reputação que vira lama: extrativismo mineral, desastres e as imagens do “invisível”. Vértices (Campos dos Goitacazes), 23(1), 213-233. https://doi.org/10.19180/1809-2667.v23n12021p213-233.

HTML generado a partir de XML-JATS4R por