DOSSIÊ TEMÁTICO: “PENSAR E FAZER A CIDADE: EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL”

Parceria entre governo local e universidades: formação do Observatório da Cidade de Macaé no contexto de rede colaborativa interinstitucional e intersetorial

Network between local government and universities: the formation of the Macaé Observatory in the interinstitutional and intersectoral collaborative context

La alianza entre gobierno local y universidades: formación del Observatorio de la Ciudad de Macaé en el contexto de una red colaborativa interinstitucional e intersectorial

Giuliano Alves Borges e Silva 1
Universidade Federal Fluminense (UFF), Brasil
Scheila Ribeiro de Abreu e Silva 2
Observatório da Cidade de Macaé, Brasil
Inês Leoneza de Souza 3
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
Luana Silva Monteiro 4
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil

Parceria entre governo local e universidades: formação do Observatório da Cidade de Macaé no contexto de rede colaborativa interinstitucional e intersetorial

Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 22, núm. 3, 2020

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense

Este documento é protegido por Copyright © 2020 pelos Autores.

Recepción: 23 Noviembre 2020

Aprobación: 23 Noviembre 2020

Resumo: Um dos principais arranjos que visam garantir a integração social das Universidades se dá através de redes. No município de Macaé, interior do Estado do Rio de Janeiro, o governo local incentivou o potencial científico, com a cooperação entre as diversas Instituições de Ensino Superior (IES) localizadas na região, através da implementação do Observatório da Cidade de Macaé. Este artigo tem como objetivo discorrer acerca da criação de um núcleo de estudo e pesquisa interinstitucional e intersetorial, com espaços de análise e reflexão compartilhados. Para tanto, optou-se por uma pesquisa prática sobre a história do núcleo com fins de intervenção. Foi possível verificar que o compartilhamento de espaços físicos e a produção de conhecimento sobre diferentes pontos de vista ocorrem com embates políticos, ideológicos, de saberes variados, com possibilidade de avanços, por vezes inerentes ao próprio diálogo entre pessoas e instituições. Neste processo, percebeu-se a incorporação de diversos atores – gestores municipais, agentes públicos, docentes, estudantes, representantes de instituições privadas e da sociedade – dinamizando a produção e difusão de conhecimentos com ênfase em Macaé e na região.

Palavras-chave: Governo Local, Universidades, Cooperação, Observatório da Cidade de Macaé.

Abstract: One of the main arrangements that aim to guarantee the Universities social integration is through networks. In Macaé, a city in the interior of the Rio de Janeiro State, the local government encouraged the scientific potential with cooperation between the various Higher Education Institutions (HEIs) located in the region, through the implementation of the Macaé City Observatory. This article aims to discuss the creation of an interinstitutional and intersectoral study and research center, with shared spaces for analysis and reflection. For that were opted for a practical research on the history of the nucleus for the intervention purpose. It was possible to verify that the sharing of physical spaces and the production of knowledge about different points of view occur with political, ideological, varied knowledge clashes, with the possibility of advances, sometimes inherent in the dialogue between people and institutions. In this process, it was noticed the incorporation of several actors - municipal managers, public agents, professors, students, private institutions representatives and society - streamlining the production and dissemination of knowledge with an emphasis on Macaé and the region.

Keywords: Local Government, Universities, Cooperation, Macaé City Observatory.

Resumen: Uno de los principales arreglos que tienen como objetivo garantizar la integración social de las Universidades es a través de las redes. En el municipio de Macaé, en el interior del Estado de Río de Janeiro, el gobierno local impulsó el potencial científico con la cooperación entre las distintas Instituciones de Educación Superior (IES) ubicadas en la región, a través de la implementación del Observatorio de la Ciudad de Macaé. Este artículo tiene como objetivo discutir la creación de un centro de estudio e investigación interinstitucional e intersectorial, con espacios compartidos de análisis y reflexión. Para ello se optó por una investigación práctica sobre la historia del núcleo con fines de intervención. Se pudo constatar que el intercambio de espacios físicos y la producción de conocimiento sobre diferentes puntos de vista ocurren con choques políticos, ideológicos, de saberes variados, con posibilidad de avances, a veces inherentes al diálogo entre personas e instituciones. En este proceso, se notó la incorporación de varios actores - gestores municipales, agentes públicos, docentes, estudiantes, representantes de instituciones privadas y de la sociedad - dinamizando la producción y difusión del conocimiento con énfasis en Macaé y la región.

Palabras clave: Gobierno local, Universidades, Cooperación, Observatorio de la ciudad de Macaé.

1 Introdução

A articulação por valores de liberdade e políticas de equidade, assim como o entendimento das preferências coletivas por meio de ampla participação da sociedade nos assuntos públicos, tem estado cada vez mais associada aos governos locais (MACDOUGALL, 2001). Entretanto, a concretização de tais aspirações passa por inúmeros desafios, assim como a forma caótica pela qual os problemas e as soluções se apresentam em diferentes locais, levando a uma grande variedade de arranjos.

Um dos principais arranjos para garantir uma ampla participação institucional ocorre por intermédio de redes de parcerias e/ou de cooperação. Balestrin, Verschoore e Reyes-Junior (2010) enfatizam que a colaboração em rede passa a ser considerada uma das principais correntes do campo econômico-organizacional, também com ênfase em redes públicas de cooperação local (MALMEGRIN, 2010).

No município de Macaé, interior do Estado do Rio de Janeiro, o governo local, ao longo dos anos, incentivou a instalação de importantes universidades, a saber: Universidade Federal Fluminense (UFF); Faculdade Municipal Miguel Angelo da Silva Santos (FeMASS); Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Instituto Federal Fluminense (IFF). As três primeiras dividem parte de suas respectivas atividades no mesmo espaço físico, denotando um modelo de compartilhamento, raramente incentivado nas gestões públicas.

Em uma cidade marcada pela presença de indeléveis instituições, havia, notadamente, uma distorção entre o potencial científico e a quantidade de pesquisas com ênfase em Macaé. Não se trata, aqui, de uma pressão produtivista acrítica, ao contrário, trata-se de um paradigma cultural e humanista de que a academia pode contribuir para o desenvolvimento da sociedade que a cerca, respeitando o valor da liberdade acadêmica (SOUZA-SANTOS, 2005).

Com o intuito de assegurar a autonomia das instituições, mas ao mesmo tempo, de reunir e incentivar pesquisas com escopo em Macaé e região, o governo local, por meio da Secretaria Adjunta de Ensino Superior da Secretaria Municipal de Educação, consubstanciou a rede interinstitucional e intersetorial, sob o título de Observatório da Cidade de Macaé, reunindo agentes públicos de universidades, instituições privadas de ensino, gestão pública municipal e instituições parceiras, (MACAÉ, 2018b).

Como a característica dessa confluência institucional é única, justifica-se um estudo em profundidade de caráter exploratório. A reunião de fatores históricos, culturais, produtivos e educacionais mobiliza o interesse acadêmico sobre o tema. Em especial, ao apresentar o pano de fundo teórico que congrega redes de cooperação, focada em articulação do governo local com uma discussão etimológica sobre o papel das universidades. A apresentação empírica da referida experiência pode contribuir para enriquecer tais assuntos.

Além da justificativa social apresentada, observa-se também uma lacuna acadêmica para o desenvolvimento deste trabalho. A formação e o desenvolvimento de redes de cooperação entre universidades e empresas constituem um objeto de estudo bastante explorado pela literatura, como pode ser observado em Mascarenhas, Ferreira e Marques (2018). Entretanto, apenas uma pesquisa encontrada observa o papel do governo local na formação de redes de cooperação entre universidades. O artigo de Lundberg e Andresen (2012) examina a interação entre universidades, empresas e governos locais no contexto sueco e descobriu que a interação entre os agentes ajuda no compartilhamento de recursos, aumentando o potencial de inovação, fomentando a participação de outros agentes. Mesmo este estudo não trata o papel do governo local como o agente que integra a rede de cooperação, evidenciando a necessidade de estudos dessa natureza.

Sendo assim, pretende-se responder aos seguintes questionamentos: Como se deu o processo de institucionalização do Observatório da Cidade de Macaé? Quais as características dessa distinta rede colaborativa?

O objetivo geral que orienta este artigo consiste em discorrer acerca da criação de um núcleo de estudo e pesquisa interinstitucional e intersetorial, em que os espaços de análise e reflexão compartilhados têm possibilitado maior compreensão da realidade local pela ampliação dos espaços de disseminação do conhecimento.

Para tanto, optou-se por uma pesquisa prática, ou seja, ligada à práxis – prática histórica em termos de conhecimento científico para fins explícitos de intervenção –, o que claramente culmina em uma reflexão sobre o futuro do próprio Observatório. Conforme Baffi (2002), esse tipo de pesquisa não esconde a ligação entre os autores com o objetivo de estudo, preservando o rigor metodológico característico de pesquisas científicas. Com efeito, em todas as sessões do trabalho explicitam-se preceitos teóricos, observação e reflexões críticas.

Além dessa introdução, a estrutura do artigo apresenta outras cinco seções. No item 2, compreende-se o sentido da Universidade no contexto ocidental contemporâneo para delimitar as características do espaço de produção e difusão do conhecimento. O tópico 3 aborda as características teóricas das redes de cooperação, aliando o contexto institucional prático, enquanto a seção 4 aprofunda a parte observacional. A etapa 5 interliga os tópicos anteriores ao apresentar um breve relato sobre as Instituições de Ensino Superior com sede em Macaé, de modo a relacionar o papel do núcleo no âmbito interinstitucional, demarcando eventos e períodos da recente história da rede de cooperação. Por fim, apresentam-se as considerações finais incorporadas de uma reflexão sobre o futuro do Observatório da Cidade de Macaé.

2 O papel e o sentido da Universidade

Compreender o papel da universidade para a sociedade perpassa, primeiramente, ter em mente o verdadeiro significado dessa palavra, buscando assim resgatar a essência da sua criação. Como citado por Portella (1984, p. 103), “[…] as palavras seguem o ciclo vital de todo o ser vivo: nascem, desenvolvem-se e morrem […] é no embrião das palavras, pelo linguista chamado de raiz, que se encontram os verdadeiros gens […]”. Assim, a palavra universidade – “totalidade” – provém do latim universitas, sendo formada pelos seguintes elementos: uni (um só, único, central) + vers (voltado para) + (i) dade (pluralidade de objetos) (PORTELLA, 1984).

Nessa linha etimológica, o dicionário da língua portuguesa traz o significado de universidade como sendo: “instituição de ensino superior que compreende um conjunto de faculdades ou escolas para a especialização profissional e científica, e tem por função precípua garantir a conservação e o progresso nos diversos ramos do conhecimento, pelo ensino e pela pesquisa” (FERREIRA, 1993). No Brasil, outra definição apresentada está disponível na Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional, Lei 9394/96, que destaca as universidades como “[…] instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano […]” (BRASIL,1996).

As universidades modernas, como são entendidas na atualidade ocidental, tiveram a sua origem na idade média na Europa, como por exemplo, as universidades de Paris, Bolonha, Cambridge, Oxford, Lisboa (Coimbra) e Salamanca. Destaca-se que o desenvolvimento das universidades coincide com a alavancagem das atividades econômicas e sociais nas cidades, sendo esse processo vivenciado até os dias atuais (CARVALHO, 1989; ÉSTHER, 2007).

Salienta-se uma defasagem de 400 anos em relação à Europa para a criação das universidades no Continente Americano (século XVI). No Brasil, essa lacuna foi ainda mais expressiva, conquistando a sua primeira universidade no século XX, mediante a criação da Universidade da Amazônia - Manaus (1909), Universidade Federal do Paraná - Curitiba (1912) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (1920). Cabe sinalizar que a Universidade de São Paulo (1934) foi a primeira universidade a ter sua criação pautada no tripé ensino-pesquisa-extensão (HUMEREZ; JANKEVICIUS, 2015).

De acordo com Sampaio (1991, p. 8), a universidade visa “[…] abrigar a ciência, os cientistas e as humanidades em geral e promover a pesquisa”. Para atender às necessidades e demandas sociais, as universidades desenvolvem suas atividades pautadas no ensino, pesquisa e extensão, contribuindo, assim, para a sua missão no sentido mais amplo: a transformação da sociedade (ROCHA, 2014; SLEUTJES, 1999), oportunizando a geração de novos conhecimentos e sua disseminação, e colaborando para o fortalecimento das vertentes que compõem o conhecimento (diálogo com a sociedade, produção e socialização) (VIRGINIO, 2006).

O tripé de sustentação da universidade foi instituído formalmente com a Constituição Federal de 1988 (Artigo 207), que estabeleceu que “as universidades […] obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. Esses três pilares compõem a dialética de uma universidade viva (SLEUTJES, 1999).

A indissociabilidade é fundamental para a qualidade da produção universitária, como citado por Moita e Andrade (2009). Se a universidade focar no ensino e na extensão conseguirá ter um olhar para os problemas da sociedade, contudo necessitará da pesquisa para que seja desenvolvido o conhecimento científico. Caso deixe a extensão de lado e coloque seus esforços no ensino e na pesquisa, alcança uma alavancagem no meio tecnológico, mas deixa de atingir o propósito do conhecimento científico, o de dialogar com as demandas da sociedade. E, sendo o ensino deixado em segundo plano, assola a formação acadêmica. Para que sua missão seja alcançada, o ensino, a pesquisa e a extensão devem permanecer unidos pelo princípio da indissociabilidade, no qual um não existe sem a presença do outro (GONÇALVES, 2015).

Assim, as universidades buscam estreitar as relações do conteúdo científico para a construção de ações que possam contribuir, de forma expressiva, para o desenvolvimento social e tecnológico e o crescimento econômico. No atual cenário de globalização, em que o mundo está cada vez mais competitivo e com mudanças cada vez mais aceleradas em todos os setores, vem à tona a importância cada vez maior da aproximação da universidade com as demandas da sociedade. Porém, cabe destacar que, para manter o papel das universidades nesse cenário, são requeridos investimentos permanentes em pesquisa e desenvolvimento (ROCHA, 2014; UNESCO, 2017).

Nesse contexto, as universidades têm o desafio de cumprir um papel perante a sociedade, zelando pela autonomia, para que continue sendo um espaço de reflexões, problematizações, trocas e construção do conhecimento; oferecendo um ensino de qualidade e buscando sempre a equidade, a fim de que todos tenham igual oportunidade de acesso e permanência ao ensino superior. A universidade pode, assim, ser uma propulsora para o desenvolvimento em um mundo marcado pela volatilidade, complexidade, pelas incertezas, e ambiguidades. Por fim, cabe destacar que, para que a universidade possa contribuir com o verdadeiro desenvolvimento da sociedade, é fundamental que esta tenha a sua atuação articulada em espaço de relações com governo e setores sociais.

3 Consolidação das parcerias através das redes de cooperação

O Observatório da Cidade de Macaé, conforme a portaria que o fundou, é caracterizado como uma “rede interinstitucional que reúne agentes públicos de universidades, instituições privadas de ensino, gestão pública municipal e instituições parceiras” (MACAÉ, 2018b). Essa definição, mesmo sendo direta, é passível de um maior aprofundamento tanto nos termos empregados como nos valores dele emergentes, o que, por sua vez, possibilita uma melhor compreensão do que se trata o observatório e como decorreu seu processo de institucionalização junto à comunidade acadêmica, ao poder público municipal e às diversas organizações de caráter local e regional.

O primeiro ponto – e com base em referências de Ciências Sociais Aplicadas – a ser analisado é o de redes que, segundo Inojosa (1998, p. 1-2), é uma:

[…] parceria voluntária para a realização de um propósito comum. Implica, nesse sentido, a existência de entes autônomos que, movidos por uma ideia abraçada coletivamente, livremente e mantendo sua própria identidade, articulam-se para realizar objetivos comuns (INOJOSA, 1998, p. 1-2).

A Secretaria Adjunta de Ensino Superior, fundadora do observatório em questão, foi, à época, o nó inicial a partir do qual se articulou uma série de organizações, principalmente instituições de ensino/pesquisa/extensão, com o objetivo comum de “…analisar as transformações em curso na cidade de Macaé, promovendo uma avaliação contínua e sistemática da conjuntura social e econômica em que o município se insere” (MACAÉ, 2018b).

Morfologicamente, esse observatório aparenta se configurar como uma rede invertida, na qual o conhecimento circula livremente de nó. para nó, ou, caso definido pelo modelo instituído, sendo mediado pelo nó central. Essa centralização tem fins de consolidar os fluxos e agir como um repositório para o que é produzido pela coletividade da rede (MALMEGRIN, 2010). Utilizou-se acima o termo “aparenta” em razão de não se verificar, no presente caso, uma das características das redes invertidas – a centralização dos recursos para a operação da rede – por parte do nó central. Tão intensos são o grau de autonomia das organizações participantes e a distribuição de recursos que o nó central se apresenta essencialmente como um articulador dos recursos empregados e participantes envolvidos para a consecução dos objetivos comuns definidos e, adicionalmente, como um repositório do que é discutido/produzido. Ademais, sua centralidade mantém a funcionalidade de concentrar a execução de atividades administrativas, conferindo aos demais nós disponibilidade para a concentração de suas ações para o estudo do município e região em seus diversos aspectos.

Seguindo sobre referenciais para a classificação de redes organizacionais, Malmegrin (2010) apresenta uma série de variáveis que permitem não somente a análise de sua morfologia mas também um entendimento holístico dos fundamentos nos quais essa rede se apoia. Esta é guiada essencialmente por uma racionalidade instrumental ou substantiva? O engajamento é voluntário ou definido pelo nó central ou por elementos externos? Seus princípios buscam a solidariedade e a cooperação ou a eficácia/eficiência? E é através dessas perguntas que identificamos os valores emergentes dessa organização.

A adesão à rede, de caráter voluntário, é pautada não por um compromisso de geração de informações e análises, mas, sim, com valores de transformação social, econômica e ambiental do município e seu entorno. Seu papel excede a simples geração e conversão de dados em informações para o suporte decisório, mas também engloba o entendimento de como e por que as questões relacionadas à cidade emergem, além de articular práticas efetivas de transformação numa via de mão-dupla com o poder público – estimulando que este não apenas receba conhecimento como também se engaje em sua produção.

Muitas dessas características estão relacionadas com o próprio modelo de observatórios. Com vistas a aumentar nossa compreensão das possibilidades do governo local na articulação de redes de cooperação junto a instituições de ensino e organizações da sociedade civil, um breve referencial sobre o que são observatórios urbanos (nos quais o Observatório de Macaé se classifica) e qual a sua proposta é útil para entender os lócus onde a articulação dessa rede teve seu principal meio e como isso contribui para seu processo de institucionalização.

3.1 Observatórios urbanos

O termo “Observatórios Urbanos” surge em estudos acadêmicos sobre as experiências estadunidenses na década de 1960. Essas organizações se difundiram e ganharam relevância, tornando-se, inclusive, ponto de destaque para a Organização das Nações Unidas (ONU), que promove uma rede de informações e de capacitação no tema (Global Urban Observatory Network - GUO).

De acordo com a definição da ONU - Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (UN-HABITAT), tais organizações podem ser agências governamentais, centros de pesquisa ou instituições educacionais (GUO, 2015). Cabe ressaltar que, apesar de possuir seu núcleo no governo municipal, o caso analisado no presente trabalho, possui seus conselhos deliberativos compostos por membros de universidades públicas (federais, estaduais e municipal) e privadas assim como por órgãos de planejamento e de pesquisa do município, abarcando as três modalidades descritas dentro de sua própria estrutura de governança.

Ainda com base nas orientações da ONU, os observatórios compartilham os objetivos de: criar sistemas sustentáveis de monitoramento para dar suporte ao planejamento e à gestão locais, interligando dados às políticas públicas; fortalecer capacidades locais de desenvolvimento e uso de indicadores com dados desagregados para o município e suas sub-regiões e; promover a propriedade local desse sistema de indicadores, assim como a cultura de monitoramento e avaliação da localidade (GUO, 2015). Estes podem variar de focos municipais, regionais (como o observatório em questão) para até continentais (como a Rede Europeia de Observação para o Desenvolvimento Territorial e Coesão ESPON).

Independentemente da classificação quanto à abrangência ou à temática abordada pelos observatórios, essas instituições articulam diversas tensões entre elementos da sua rede, buscando facilitar o fluxo de informações, conhecimentos, pessoas e recursos entre elas, além de serem, em si próprias, locais de encontro de todos esses elementos. Naturalmente, o que é “observado”, por que e como são questões idiossincráticas e contextuais (WASHBOURNE et al., 2019).

Entre outros focos, tais organizações atuam no intercâmbio entre a academia e o desenvolvimento de políticas públicas. Com o intuito de alcançar estratégias adequadas para atender às demandas urbanas com maior equidade e sustentabilidade, é necessário diagnosticar características da cidade, bem como potencializar as capacidades locais (SATTERTHWAITE, 2017).

Na instituição de suas redes de cooperação, o observatório urbano deve encontrar formas de gerar conhecimento, incluindo não somente a coleta e estruturação de dados como também sua análise e difusão. E, nesse mister, deve ter atenção aos diferentes propósitos, estruturas e culturas das distintas organizações/instituições que pertençam à rede (SIMON et al., 2016).

4 Perspectivas para um trabalho em rede em Macaé

A proposta de parceria em Rede como forma de organização dos serviços se faz por meio de participação de gestores e seus colaboradores através de instituições de ensino superior com campus na região, especialmente na esfera pública de segmentos do ensino e serviço do Observatório da Cidade de Macaé.

O termo “observatório” tem sido cada vez mais abordado em discursos por políticos, jornalistas e pesquisadores sociais da Europa e da América Latina. Além das administrações públicas locais, regionais e nacionais, organizações de caráter supranacional – como a União Europeia e o Mercosul –, sindicatos, instituições acadêmicas e fundações vêm criando observatórios de diversos tipos com o objetivo de monitorar de forma sistemática o funcionamento de um setor ou temáticas específicas (ALBORNOZ; HERSCHMANN, 2006).

A proposta de implantação e implementação do Observatório da cidade de Macaé através da criação do Núcleo de Estudos e Pesquisa pela Prefeitura pode ser considerada um arranjo organizativo com fins de propiciar acesso adequado às informações e auxiliar na tomada decisão.

É uma proposta desenhada pelos membros do conselho consultivo envolvendo três momentos, desdobrados e caracterizados como: 1) de concepção teórico-conceitual, momento este em andamento para elaboração deste artigo em busca de tipificar o modelo de desenho para esse tipo de organização; 2) de difusão pública dessa proposta, em andamento desde 2017; e 3) entidade ou órgão parceiro na criação da instituição como Núcleo de pesquisa denominado Observatório da Cidade de Macaé.

Em consonância com as necessidades e demandas predominantemente significativas para a população e sociedade organizada nesses territórios, essa integração entre gestão pública e instituições impulsiona parcerias importantes, possibilitando a concretização de estudos e práticas no ensino e serviço do município e região. Não por acaso, ele nasce para fortalecimento do trabalho em rede dos segmentos essenciais representados para a sua consolidação.

Além de, como estratégia de trabalho, interagir com vários e diferentes segmentos da cidade e região, o trabalho realizado pelo Observatório potencializa a capilaridade das temáticas e discussões para diversos servidores públicos (inclusive com a participação de alguns destes no próprio desenvolvimento de pesquisas), e representantes da sociedade civil (Figura 1). Tal intento dificilmente seria alcançado em outro tipo de arranjo organizacional, já que a mera disposição territorial não propiciava uma integração estratégica de pesquisas com enfoque local.

Membros do observatório se reúnem com integrantes da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico
Figura 1.
Membros do observatório se reúnem com integrantes da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico
Fonte: Dados primários da pesquisa, registros do Observatório

A rede de cooperação proporciona espaços para discussões e trocas de saberes para além dos muros da universidade. Traz, nesse caminho, parceiros e atores fundamentais para o processo de mudança na sociedade, com base em dados, traduzido em informações relevantes e pertinentes para os setores da sociedade, que, diante dos conceitos apresentados sobre o sentido da universidade, transformam a sociedade com vistas a uma condição mais justa, humana e fraterna.

Para responder a como se deu a institucionalização do Observatório, deve-se pensar em como concebe o agrupamento das instituições representadas; o envolvimento e compromisso assumido com o trabalho de olhar para as demandas e ofertas de ensino e serviços nessa cidade e região; os mecanismos de funcionamento e articulação entre as instituições e seus representantes, bem como, considerar os aspectos políticos, sociais e de sobrevivência dos indivíduos, objeto central de acompanhamento e observação contínua dos impactos a serem mensurados e qualificados pelos membros do observatório.

O desafio do trabalho no Observatório é de observação e análise, não tanto o de denunciar ou criticar (o que é também uma possibilidade legítima), mas o de orientar com o fim de elaborar ideias e propostas que contribuam para o aperfeiçoamento das políticas de algum setor e/ou que promovam o desenvolvimento do conjunto das indústrias culturais locais/nacionais, sempre tendo como parâmetro os interesses coletivos e não somente os interesses de um setor específico.

Consolidar e adensar nessa perspectiva corrobora o futuro do Observatório da Cidade de Macaé como espaço democrático e crítico das coisas e causa de interesse público.

5 O contexto do Observatório da Cidade de Macaé

A criação do observatório da cidade de Macaé vem responder a uma diversidade de interesses e de questões presentes no contexto do município e da região. Por um lado, encontram-se as instituições de ensino e pesquisa, constituindo uma estrutura sólida, com uma esfera de atuação legítima e um importante papel social no desenvolvimento na esfera local.

Por outro, está a sociedade, com suas demandas, conflitos, problemas e questões que demandam respostas. Por fim, acha-se o estado, com suas exigências de planejamento e gestão, a fim de atender às demandas da sociedade. O grande desafio é a definição e o compartilhamento de objetivos afins e a criação de um sistema de monitoramento sustentável que dê suporte e apoio à gestão da cidade e insira a sociedade no contexto de discussão, do ponto de vista técnico e científico, das questões que perpassam a vida na cidade.

5.1 As instituições de ensino e pesquisa na cidade de Macaé e região

Macaé, cidade do interior do estado do Rio de Janeiro, tem sua trajetória marcada por um desenvolvimento, nos recentes anos, de grande impacto à sua vida política, econômica e social, alterando com rigor as características então peculiares de uma cidade do interior fluminense historicamente voltada às atividades agrícolas, da pesca e ao turismo de lazer.

A chegada ao seu território da indústria de exploração e produção de óleo e gás natural ocasionou um forte impacto, podendo ser destacado o acentuado crescimento populacional para ocupar os milhares de postos de trabalho abertos pela operação e produção da maior petrolífera do país, a Petrobrás. Conforme Silva e Faria (2012, p. 119), “o fluxo migratório que atingiu o município de Macaé foi de grande impacto no que se refere ao aumento populacional do município que, desde a década de 70, cresceu na ordem de 315,8%”. Com postos de trabalho exigentes de qualificação, a cidade atraiu milhares de profissionais, assim como suas famílias, mas também milhares de pessoas com baixa qualificação em busca de oportunidades (SILVA; FARIA, 2012).

Paralelo ao crescimento de grandes espaços urbanos, o crescimento desordenado ocorreu com a formação de uma periferia com aglomerados subnormais. Junto a isso, o impacto cultural com a circulação de pessoas vindas de tantos lugares, inclusive de fora do país, ocorreu frente a um crescimento desordenado, com impactos nos modos de habitar e viver a cidade.

Ao longo de mais de 40 anos de atividade no município, o processo de produção e exploração de óleo e gás da Bacia de Campos trouxe um patrimônio único e de destaque para a cidade e região: aqui circula um capital de conhecimento tecnológico único, que tem consolidado toda a atividade voltada à indústria de exploração e produção em águas profundas.

A construção do grande complexo industrial da Petrobrás trouxe, sem dúvida, grande desenvolvimento para a região, diante do quadro de estagnação econômica que se encontrava a região norte-fluminense, em decorrência da decadência da indústria sulcroalcooleira. Mas, associado a esse desenvolvimento, a cidade viu crescer a favelização, a violência, o desemprego, a informalidade, a chegada de empresas de bandeiras estrangeiras, a transformação do seu espaço urbano, antes composto de ruas estreitas e pequeno comércio. Um desenvolvimento que ocasionou profundas transformações econômicas e sociais, situado no contexto de uma nova forma produtiva de energia (SILVA; FARIA, 2012, p. 112).

É nesse cenário que as instituições de ensino e pesquisa, contando atualmente com quatro importantes universidades (Universidade Federal Fluminense – UFF; Instituto Federal Fluminense – IFFLUMINENSE; Universidade Estadual do Norte Fluminense Professor Darcy Ribeiro – UENF e Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ), uma instituição de ensino superior pública municipal (Faculdade Professor Miguel Ângelo da Silva Santos - FEMASS); uma universidade particular (Universidade Estácio de Sá) e diversas instituições de ensino superior privadas (como exemplo a Faculdade Salesiana Maria Auxiliadora - FSMA) têm desenvolvido suas atividades voltadas ao ensino, à pesquisa e à extensão.

Importante destacar que também a região foi acentuadamente beneficiada com a chegada de tantas instituições de ensino, como a Universidade Candido Mendes – UCAM, e com a interiorização de universidades, como a Universidade Federal Fluminense – UFF e o Instituto Federal Fluminense.

As contribuições dessas instituições ao desenvolvimento do município têm sido incontáveis, desde a extensa produção acadêmica desenvolvida à formação de milhares de estudantes vindos de várias partes do país. A criação de institutos, centros de pesquisa e núcleos de estudo tem favorecido a circulação de um conhecimento altamente especializado, com produções acadêmicas essenciais para o avanço da ciência, do conhecimento e do desenvolvimento tecnológico.

5.2 “A geografia do conhecimento”

Nesse contexto de desenvolvimento econômico, a história das universidades e a da cidade de Macaé caminham juntas. A instalação de universidades e instituições de ensino e pesquisa estão ligadas, entre outras questões, ao seu desenvolvimento urbano e regional, especialmente por se tratar de uma cidade de médio porte. Diferentemente das grandes cidades, em cidades médias as universidades fazem a diferença onde se localizam, sendo visíveis suas influências nas esferas políticas, econômica e cultural (WUSTEN, 1998). A localização geográfica das universidades majoritariamente no centro urbano da cidade, favorece a percepção de constituição de uma “cidade universitária”, considerando que o forte poder agregador dos campus situados em espaços tão próximos possibilita o efeito relacional que a própria dinâmica das instituições favorece: a de produção de conhecimento universal, com conexões com o mundo no qual se situam e convivem. A instalação dos campi universitários em Macaé situa-se como a visão de localização definida por Haila (2008), de estar incorporada como parte da cidade, reunindo professores e estudantes com o seu cotidiano.

Em Macaé a chegada da primeira Universidade Federal (UFF, em 1992) foi acompanhada da criação de uma fundação educacional, a Fundação Educacional de Macaé – FUNEMAC, pela Lei Municipal nº 1.369, de 17 de novembro de 1992.

A ideia de gestão do ensino superior numa cidade de médio porte foi sequenciada pela criação da Secretaria Adjunta de Ensino Superior, considerando que o impacto que a universidade apresenta demanda estratégicas de gestão específicas. As articulações, os encontros, os debates, os enfrentamentos de conflitos e as resoluções de problemas referentes ao ensino superior no município ocorrem considerando a universidade enquanto parte da cidade, mesclando suas estruturas, seus docentes e estudantes com o próprio cotidiano.

A articulação entre a cidade e a “cidade universitária” demanda um intenso diálogo, considerando a identidade característica e peculiar de cada uma delas, apesar de existirem num mesmo espaço territorial: “(…) em cidades médias e pequenas onde se instalam campi universitários (em função das características do processo de produção do espaço na esfera destas cidades) existem ou coexistem duas cidades “diferentes” que não caminham completamente juntas (BAUMGARTNER, 2014, p. 100).”

Nesta cidade, as instituições públicas de ensino superior mantêm uma forte dependência da gestão municipal na manutenção de suas atividades. Importa destacar que, num único campus administrado diretamente pela gestão pública coexistem três instituições de ensino distintas nas suas esferas: duas instituições federais (UFF e UFRJ), uma instituição de ensino municipal (FEMASS). Há também, na esfera municipal, um Colégio de Aplicação de nível médio, um Centro de Formação Docente e um centro de idiomas, além de laboratórios, como o de matemática e o de robótica, entre outros.

Pessoas das mais diferentes idades e esferas de atuação: estudantes de ensino fundamental, ensino médio, ensino superior, docentes da Educação Básica e do Ensino Superior convivem nesse espaço, que conta, além disso, com uma forte presença da comunidade, que participa de cursos, palestras e seminários oferecidos. A estrutura – o espaço oferecido pelas salas de aula, auditórios e laboratórios –, entre outros espaços, favorece essa ampla circulação.

A natureza dos cursos de graduação e pós-graduação oferecidos, vinculados às atividades econômicas da cidade e região, assim como as atividades de pesquisa e extensão, apontam para a importância do aspecto educacional para o desenvolvimento do município.

Importante destacar também a presença de alunos e professores nos equipamentos públicos do município por meio dos estágios e das aulas de campo, e na residência, entre outras ações desenvolvidas. A relação das atividades de ensino, pesquisa e extensão com a realidade local proporciona um olhar reflexivo e problematizador acerca das políticas públicas vigentes, além de uma aproximação tanto com os agentes da gestão e com os servidores públicos, quanto com os habitantes da cidade.

5.3 O nascimento do Observatório da Cidade de Macaé

Em 2015, Macaé (e região) inicia uma dura transição frente ao processo de crise econômica até então incompreendida. O nascimento do observatório naquele contexto favoreceu uma aproximação ainda maior da gestão pública municipal com as instituições de ensino presentes em seu território e também na região. A necessidade de resposta aos anseios, questionamentos e apontamentos possíveis que a gestão pública, a academia e a sociedade faziam, possibilitou a estruturação de uma rede de cooperação, estando concebida no seu projeto original de criação (MACAÉ, 2017) a constituição de um Núcleo de Estudo e Pesquisa — Observatório da Cidade.

Propõe-se que o Núcleo de Estudo e Pesquisa—Observatório da Cidade, seja composto por uma coordenação geral, que contará com uma equipe multidisciplinar (servidores municipais e funcionários municipais), enquanto uma ação demandada diretamente pelo Gabinete do Prefeito, compondo as atribuições determinadas pela legislação vigente da Administração Municipal. Tal equipe terá como atribuição principal articular agentes governamentais, pesquisadores e instituições de Universidades e Faculdades sediadas no município, além de instituições diversas, na criação e fomento de uma rede de informações e conhecimentos sobre a cidade, além da produção de um acervo bibliográfico composto de artigos, relatórios, livro, seminários, entre outros produtos (MACAÉ, 2017, p. 3).

O convite à participação dos pesquisadores no grupo de trabalho ocorreu de forma assistemática, havendo sido realizados contatos com as instituições e pesquisadores da cidade e região para apresentação da proposta, e estabelecido, com os que se dispuseram ao engajamento, um termo de cooperação acadêmica e participação em projeto, de forma voluntária.

No convite de adesão ao Núcleo de Estudo e Pesquisa” constam os seguintes termos:

Diante de um contexto que se configura como um grande desafio à gestão municipal, de compreender os impactos sociais, econômicos e urbanos decorrentes da retrogressão do processo de industrialização da Cadeia Produtiva de Petróleo e Gás - ocorrida mais acentuadamente nos três últimos anos - torna-se pertinente a institucionalização de um núcleo de estudo e pesquisa que venha a produzir informações e conhecimentos, reunindo agentes governamentais, pesquisadores das Universidades e Faculdades sediadas no município, assim como instituições diversas. (MACAÉ, 2018b, p. 1).

Nesse processo de trabalho, conseguiu-se reunir cerca de 80 profissionais, entre eles representantes das universidades sediadas na cidade e região, servidores municipais, instituições parceiras e sociedade civil, todos com o perfil de desenvolvimento de pesquisa acadêmica.

Como primeiro resultado desse engajamento, em 26 de junho de 2019, ocorreu o lançamento do livro “Macaé, do caos ao conhecimento” (Figura 2), composto de 34 artigos multidisciplinares, desenvolvido por 68 pesquisadores, na Feira Brasil Offshore, onde estiveram presentes:

[…] reitores da Universidade Federal Fluminense (UFF), Antonio Claudio Lucas da Nóbrega; do Instituto Federal Fluminense (IFF), Jefferson Manhães de Azevedo; da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), Luiz Passoni; do vice-reitor eleito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Carlos Frederico Leão Rocha; e do vice-diretor do Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade (Nupem/UFRJ), Francisco Esteves. Também participaram representantes da Universidade Candido Mendes, Faculdade Salesiana Maria Auxiliadora (FFMA), Faculdade Municipal Miguel Ângelo da Silva Santos (FeMASS) e Isecensa de Campos dos Goytacazes (LIVRO..., 2019).

Membros do observatório, reitores das instituições de ensino, membros do poder público e representantes da sociedade civil no lançamento do livro “Macaé, do caos ao conhecimento” - Feira Brasil Offshore, 2019
Figura 2.
Membros do observatório, reitores das instituições de ensino, membros do poder público e representantes da sociedade civil no lançamento do livro “Macaé, do caos ao conhecimento” - Feira Brasil Offshore, 2019
Fonte: Dados primários da pesquisa, registros do Observatório

5.4 A constituição dos seus conselhos

A institucionalização do observatório enquanto rede interinstitucional e intersetorial foi perseguido ao longo de todo o processo. A finalidade de acompanhar o desenvolvimento do município nas suas variadas dimensões foi trilhado a partir da criação do Conselho Acadêmico de Gestão e Conselho Editorial. Junto aos membros participantes do Núcleo de Estudo e Pesquisa foi discutida a minuta de formato para o Observatório da Cidade de Macaé. A partir daí foi feito um convite de adesão voluntária para constituição dos dois conselhos.

Estando constituídos os conselhos, foram publicados pela Secretaria Adjunta de Ensino Superior, dispostos na página oficial da Prefeitura de Macaé, o texto de institucionalização do Observatório e as portarias oficializando seus membros (Conselho Acadêmico de Gestão – Portaria 002/2019; Conselho editorial – Portaria 003/2019).

Importante destacar a forte presença das instituições participantes dos Conselhos: Universidade Federal Fluminense – UFF; Instituto Federal Fluminense – IFFLUMINENSE; Universidade Estadual do Norte Fluminense Professor Darcy Ribeiro – UENF; Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ; Faculdade Professor Miguel Ângelo da Silva Santos – FEMASS; Universidade Cândido Mendes – UCAM; Rede Petros. Também, a participação de servidores municipais das seguintes pastas: Secretaria Municipal Adjunta de Planejamento; Secretaria Municipal Adjunta de Turismo; Secretaria Municipal Adjunta de Patrimônio/Planejamento Estratégico; Secretaria Municipal Adjunta de Desenvolvimento Social; Secretaria de Educação.

5.5 Os eventos e produções acadêmicas interinstitucionais e intersetoriais

Ao longo do processo de estudo, reflexões e análises, foi deliberada pelo Conselho Acadêmico de gestão a realização de seminários com o objetivo de proporcionar uma reflexão aprofundada, com a presença de participantes das diversas esferas, seguindo uma metodologia aberta, que permitisse novas ideias e perspectivas para os participantes nos diversos ramos do conhecimento.

Assim, o título dos dois seminários realizados, “Olhares Acadêmicos sobre Macaé”, teve o intuito provocativo de publicizar, ampliar e democratizar debates usualmente restritos ao ambiente acadêmico, com vistas à inclusão, nos debates, de membros da gestão pública e pessoas da sociedade em geral.

O I Seminário “Olhares Acadêmicos sobre Macaé” teve como intuito congregar a gestão pública, os pesquisadores e a sociedade em geral em torno da discussão ainda inicial acerca da temática central que mobilizou essa grande equipe de trabalho: “Macaé: processos de reconstrução econômica e social no cenário de reconfiguração da cadeia de Petróleo e gás”. Este foi um importante momento de escuta e diálogo com a comunidade acadêmica: destacar a significativa participação das instituições de ensino envolvidas no projeto.

O evento aconteceu no dia 11/12/2018, no auditório da UFRJ- Macaé (Campus da Cidade Universitária), com a realização de três painéis: Cenários da economia do petróleo: inserção e perspectivas para o município; Reestruturação produtiva: novos arranjos urbanos; Transformações na vida na cidade: rupturas, continuidades e resiliência. Neste momento, consolidou-se o processo de elaboração e desenvolvimento das pesquisas voltadas à compreensão dos impactos sociais, econômicos e urbanos decorrentes da retrogressão do processo de industrialização da Cadeia Produtiva de Petróleo e Gás.

O II Seminário “Olhares Acadêmicos sobre Macaé”, seguindo a mesma linha metodológica, ocorreu em dois dias extensos de trabalho. Nos dias 12 e 13 de 2019, também no auditório da UFRJ – Macaé (Campus da Cidade Universitária), foram realizados painéis com os seguintes temas: Saúde e Assistência Social: Desafios e Perspectivas, A Cidade na Crise Contemporânea do Petróleo; Educação e Desenvolvimento Local, O evento contou ainda com o lançamento de livros de pesquisadores de instituições locais. Ao longo do processo de trabalho, o observatório da Cidade de Macaé também marcou presença em eventos realizados pelas universidades, com divulgação do trabalho realizado e das obras publicadas.

Ao longo da trajetória vivenciada, foi desenvolvido um acervo editorial composto do livro “Macaé, do caso ao conhecimento”; um dossiê temático em parceria com a revista Vértices – Essentia Editora IFFluminense, desenvolvendo a temática “ “Pensar e fazer a cidade: educação e desenvolvimento local”; uma edição especial da revista Estudos de Administração e Sociedade – UFF, com o tema central .Desenvolvimento Sustentável: perspectivas para Macaé”; o Miniguia com orientações básicas para escolhas alimentares adequadas; e “Alimentando o seu bebê”, produzido por pesquisadores da UFRJ e publicado em parceria com o Observatório e o Boletim Ciência Macaé, que, em 2020, publicou três números voltados à temática central “Enfrentamento ao Covid-19”.

6 Considerações finais

Este artigo, que trouxe como proposta “discorrer acerca da criação de um núcleo de estudo e pesquisa interinstitucional e intersetorial, onde os espaços de análise e reflexão compartilhados têm possibilitado um maior conhecimento da realidade local pela ampliação dos espaços de disseminação do conhecimento”, demarca um aspecto inovador de parceria entre universidades e o poder local, raramente encontrado.

Pode-se, com a criação do Observatório da Cidade trilhar uma iniciativa de trabalho em rede, já sinalizado por autores e pesquisadores de áreas diversas, como uma saída para o futuro não só do planeta, como da humanidade. Morin (2000) já discutia sobre a necessidade de compreensão mútua entre os seres humanos, quer próximos, quer estranhos, como algo vital para as relações humanas saírem dum estado de incompreensão.

Faz-se presente nesse modelo organizacional a desconstrução de paradigmas estruturais e a ampliação da necessidade de reelaboração de pensamentos hierárquicos em torno do conhecimento. O Exercício do diálogo ocupa lugar fundamental nessa experiência em construção, porém com avanços já perceptíveis, seja nas produções oriundas de equipes multidisciplinares, seja na utilização dos dados produzidos no âmbito universitário para a elaboração de políticas públicas.

Entretanto, o compartilhamento de espaços físicos e a produção de conhecimento sobre vieses diferentes, na maior parte das vezes, não se dá sem tensão. Observam-se tais embates políticos, ideológicos e de saberes variados como possibilidade de avanços, por vezes inerentes ao próprio diálogo entre pessoas e instituições diferentes. Para Morin (2000, p. 38), “o conhecimento pertinente deve enfrentar a complexidade. Complexus significa que foi tecido junto; de fato, há complexidade quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo […]”. É esse o desafio construtivo que vem sendo tecido pelo Observatório da Cidade.

Acredita-se, com este artigo, contribuir para reflexões, elaboração de políticas públicas futuras mais consistentes e, ainda, servir como modelo estrutural, de gestão humana e pedagógica para outros municípios e estados, além de abrir outras janelas para o compartilhamento do conhecimento científico não só com a comunidade acadêmica, mas também com a sociedade como um todo.

6.1 Um olhar para si mesmo: reflexão sobre os novos desafios

A parceria colaborativa interinstitucional e intersetorial no contexto do Observatório da Cidade de Macaé, envolvendo o governo municipal e as universidades, tanto as situadas no município quanto nos municípios circunvizinhos, consolidou-se entre 2017 e 2020, constituindo-se em uma sequência de eventos que carecem de estudo e reflexão.

Nesse processo, percebeu-se a incorporação de diversos atores, entre os quais se destacam gestores municipais, agentes públicos, docentes, estudantes e representantes de instituições privadas e da sociedade em geral, cada um com suas características próprias, nas quais se insere uma ampla e variada possibilidade de trabalho e esferas de atuação, o que enriquece a rede.

Para que esse processo se consolide, passando a uma prática real implementada nas atividades diárias das diferentes instituições, há um longo caminho a ser percorrido. É certo que as diferenças de objetivos e cognições entre os atores envolvidos apontam para que a colaboração entre a academia e profissionais em geral tenda a encontrar vários problemas dadas as diversas lógicas institucionais e objetivos de ação.

O caminho de reflexão indicado nesse processo aponta para a compreensão dos limites e possibilidades que tal parceria colaborativa possibilita, buscando compreender a sinergia e a complementaridade para que as políticas públicas possam obter melhores resultados.

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Notas de autor

1 Doutor em Administração pela Universidade de São Paulo (USP). Professor do Programa de Mestrado em Administração (PPGAd) da Universidade Federal Fluminense (UFF) e do Instituto de Ciências da Sociedade de Macaé (ICM/UFF) – Macaé/RJ – Brasil. E-mail: giulianoalves@id.uff.br.
2 Mestra em Políticas Sociais pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (2013). Coordenadora do Observatório da Cidade de Macaé, na Secretaria Adjunta de Ensino Superior da Prefeitura de Macaé/RJ – Brasil. E-mail: abreu.scheila@gmail.com.
3 Doutora em Enfermagem pela Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro (EEAN/ UFRJ). Professora Adjunta III em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro/Campus UFRJ - Macaé Professor Aloísio Teixeira, Macaé/RJ - Brasil. Email: ines.leoneza@gmail.com.
4 Doutora em Ciências Nutricionais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora Adjunto do curso de Nutrição da Universidade Federal do Rio de Janeiro/Campus UFRJ - Macaé Professor Aloísio Teixeira - Macaé/RJ – Brasil. Email: luananutrir@gmail.com.
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