Artigos Originais

O desafio da permanência estudantil no contexto das ações afirmativas: o caso da Universidade Federal da Bahia

The challenge of student permanence in the context of affirmative action: the case of Federal University of Bahia

El desafío de la permanencia estudiantil en el contexto de la acción afirmativa: el caso de la Universidad Federal de Bahía

Edilza Sotero 1
Universidade Federal da Bahia (UFBA), Brasil

O desafio da permanência estudantil no contexto das ações afirmativas: o caso da Universidade Federal da Bahia

Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 24, núm. 3, 2022

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense

Este documento é protegido por Copyright © 2022 pelos autores.

Recepción: 09 Mayo 2022

Aprobación: 01 Noviembre 2022

Resumo: O presente artigo analisa a permanência estudantil no contexto das ações afirmativas em instituições de ensino superior, a partir do caso da Universidade Federal da Bahia. A permanência de estudantes no ensino superior é um assunto ainda pouco explorado no campo de pesquisa sobre ações afirmativas no Brasil. As políticas de permanência, especialmente no âmbito da assistência estudantil, foram ampliadas em paralelo ao estabelecimento de políticas de ações afirmativas nas universidades e, em especial, após a promulgação da Lei 12.711 (BRASIL, 2012). A pesquisa teve como base a análise documental de ações e programas do governo federal relacionados à política nacional de assistência estudantil, e de documentos institucionais da UFBA. Partindo de uma breve contextualização das ações afirmativas no Brasil e da emergência da política de assistência estudantil, a pesquisa se dedica a analisar o caso da Universidade Federal da Bahia, evidenciando as políticas de ações afirmativas e de assistência estudantil da instituição, assim como o perfil discente. Entre os resultados da pesquisa, destaca-se o dimensionamento dos impactos da política de permanência, contribuindo para o debate sobre a importância da permanência estudantil para a promoção da justiça social.

Palavras-chave: Ações afirmativas, Permanência, Ensino Superior, Assistência estudantil.

Abstract: This article analyzes student permanence in the context of affirmative action in higher education, based on the case of Federal University of Bahia. The permanence of students in higher education is an absent theme in the field of research on affirmative action in Brazil. Permanence policy, regarding to student assistance, gained relevance in parallel to the establishment of affirmative action policies in public universities and, in particular, after the enactment of Law 12.711 (BRASIL, 2012). The research was based on documental analysis of actions and programs of the federal government of the national policy of student assistance and UFBA’s institutional documents. Starting with a brief contextualization of affirmative action in Brazil and the emergence of student assistance policies, the research is dedicated to analyzing the case of the Federal University of Bahia, highlighting the institution's affirmative action program and student assistance policies, as well as the students’ socioeconomic profiles. Among the research results, the dimensioning of the impacts of the permanence policy stands out in order to measure the impacts of the permanence policy, therefore contributing to the debate about the importance of student permanence for promotion of social justice.

Keywords: Affirmative action, Permanence, Higher education, Student assistance.

Resumen: Este artículo analiza la permanencia de los estudiantes en el contexto de la acción afirmativa en las instituciones de enseñanza superior, a partir del caso de la Universidad Federal de Bahía. La permanencia de los estudiantes de cuota en la educación superior es un tema aún poco explorado en el campo de la investigación sobre acción afirmativa en Brasil. La política de permanencia, en lo que respecta a la asistencia a los estudiantes, ganó relevancia en paralelo al establecimiento de políticas de acción afirmativa en las universidades públicas y, en especial, después de la promulgación de la Ley 12.711 (BRASIL, 2012). La investigación se basó en el análisis documental de acciones y programas del gobierno federal relativo a la política nacional de asistencia a los estudiantes y documentos institucionales de la UFBA. A partir de una breve contextualización de las acciones afirmativas en Brasil y el surgimiento de las políticas de asistencia a los estudiantes, la investigación se dedica a analizar el caso de la Universidad Federal de Bahía, destacando el programa de acción afirmativa y las políticas de asistencia a los estudiantes de la institución, así como el perfil discente. Entre los resultados de la investigación se destaca el dimensionamiento de los impactos de la política de permanencia, contribuyendo así al debate sobre la importancia de la permanencia estudiantil para la promoción de la justicia social.

Palabras clave: Acciones afirmativas, Permanencia, Enseñanza superior, Asistencia estudiantil.

1 Introdução

As políticas públicas de ação afirmativa para acesso diferenciado no ensino superior promoveram uma mudança de grande amplitude, com impactos não somente no acesso e permanência de estudantes, mas também na configuração dos currículos e do corpo docente das instituições. Essas transformações resultantes das políticas de ações afirmativas, contudo, devem ser compreendidas no conjunto das políticas públicas educacionais voltadas para o ensino superior, iniciadas ainda no início do século XXI, ainda primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Dessa forma, o recente processo de ampliação do acesso ao ensino superior foi diversificado e compreendeu ações na rede privada de ensino - como o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), e na rede pública, com medidas efetivadas em diferentes redes e instituições de ensino (HERINGER, 2014; SANTOS, 2009; SOTERO, 2011). Na rede federal de ensino, as políticas afirmativas foram acompanhadas de outras políticas voltadas para ampliação do acesso e diversificação de vagas, cursos e instituições, a exemplo da criação de cursos à distância na Universidade Aberta do Brasil (UAB), em 2005, e da instituição do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades (REUNI), em 2007, assim como a estruturação do Sistema de Seleção Unificada (SISU), em 2010.

O crescimento do ingresso de estudantes no ensino superior impulsionado por políticas públicas, especialmente considerando o sistema de reserva de vagas, teve como resultado uma alteração no quadro do perfil discente universitário. Nas duas últimas décadas, a presença de estudantes oriundos de escolas públicas, assim como negros, indígenas e quilombolas alcançou um crescimento sem precedentes1, gerando demandas por políticas de permanência estudantil. Como respostas às demandas, o governo federal criou, em 2007, o Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES). Com o intuito de garantir recursos e desenvolver ações para a permanência de estudantes de graduação em cursos presenciais de Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), o programa foi institucionalizado no formato de lei, por um decreto do presidente da república, em 2010. As ações subsidiadas pelo PNAES articulavam ensino, pesquisa e extensão, assim como no apoio a estudantes, com foco na diminuição da repetência e evasão. A partir da criação do PNAES, as IFES passaram a reorganizar e ampliar sua política interna de assistência estudantil.

Ainda que a criação de políticas públicas seja importante para a permanência de estudantes, o debate sobre o assunto não se resume a elas. Como explica Dyane Brito Reis Santos (2009), a permanência está relacionada tanto a uma dimensão material quanto a uma dimensão simbólica. A autora define permanência material como os elementos que determinam as “condições objetivas de existência do estudante na universidade” e permanência simbólica como as “possibilidades que os estudantes têm de vivenciar a universidade, identificar-se com o grupo dos demais estudantes, ser reconhecido por eles e, portanto, pertencer ao grupo” (SANTOS, 2009, p. 23). Dessa forma, a permanência (material e simbólica) pode ser analisada a partir de sua configuração como política pública, mas também configura um conjunto de estratégias de indivíduos e grupos organizados no interior das instituições.

O interesse acadêmico sobre assistência estudantil e o debate da permanência no ensino superior é relativamente recente. Estudos que traçam um histórico das publicações sobre o tema apontam que a permanência passou a ser tema de investigações a partir de 2004. Uma análise das pesquisas e publicações, revela que o interesse acadêmico sobre o tema está relacionado à expansão de oferta de vagas e ao crescimento da educação superior no Brasil. O volume de pesquisas sobre a temática cresceu ainda mais após 2012, especialmente em função da aprovação da Lei 12.711, conhecida como Lei de Cotas (MACIEL; CUNHA JUNIOR; LIMA, 2019).

Apesar da relação entre a política de assistência estudantil, as ações afirmativas e a permanência de estudantes no ensino superior, ainda há uma lacuna de estudos analisando essas dimensões de forma articulada. O presente artigo busca contribuir para a diminuição dessa lacuna, com uma análise sobre permanência estudantil no contexto das ações afirmativas em instituições de ensino superior, a partir do caso da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O estudo sobre o perfil discente no contexto das ações afirmativas, permite compreender os efeitos da política na mudança do perfil discente e os impactos no aumento da demanda por políticas de assistência estudantil, como forma de garantia da permanência na universidade.

Para responder às demandas propostas pelo estudo, foi empregada a análise documental das ações e programas que tiveram impacto de forma direta ou indireta no estabelecimento de uma política nacional de assistência estudantil para toda a rede das IFES, com recorte entre os anos de 2007 e 2015. Em relação ao estudo de caso da UFBA, os documentos analisados foram resoluções, programas, planos e outros documentos e dados produzidos por órgãos internos da universidade.

O trabalho está dividido em quatro partes: na primeira, apresenta-se um breve histórico das políticas de ações afirmativas no Brasil; na segunda, trata da emergência de uma política nacional de assistência estudantil voltadas para as IFES; a terceira seção apresenta o histórico de adoção de políticas de ações afirmativas na UFBA e ampliação da assistência estudantil nas últimas décadas, relacionando ao perfil discente e às demandas por assistência estudantil na universidade. Ao final, realiza-se uma síntese dos principais elementos abordados no artigo, de forma a contribuir para o debate de avaliação das ações afirmativas no Brasil, após 10 anos da aprovação da Lei de Cotas, defendendo que a agenda de pesquisa sobre as ações afirmativas deve considerar a permanência de estudantes no ensino superior como um dos temas centrais.

2 Ações Afirmativas no ensino superior

O acesso e a permanência de grupos historicamente sub-representados no ensino superior brasileiro são assuntos que integram o debate público desde a última metade da década de 1990. Na esfera pública, os atores em relevo no debate sobre as ações afirmativas eram representantes do movimento negro, com destaque para aqueles pertencentes a organizações como cursinhos pré-vestibulares2; bem como acadêmicos interessados na formação de opinião pública e no desenvolvimento de pesquisas e produção científica; e agentes do poder público, responsáveis pelo fomento e elaboração de políticas públicas.

Um marco importante para inserção das ações afirmativas na agenda política brasileira foi A Terceira Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância, que ficou conhecida como a “Conferência de Durban”, na África do Sul, em 2001, com atuação significativa de lideranças do movimento negro brasileiro3. Durante a Conferência, o governo brasileiro se comprometeu em promover ações afirmativas voltadas para o combate de desigualdades raciais no país (FERES JÚNIOR et al., 2018; SILVA, 2006).

No âmbito legislativo, a partir de 1999 deu-se início à tramitação do PL 73 (BRASIL, 1999), que visava à reserva de vagas nas universidades públicas para alunos provenientes da rede pública, sendo que 20% dessas vagas deveriam ser destinadas preferencialmente para alunos negros. O PL 73 foi obstruído na Câmara dos Deputados. Somente em 2008, iniciou a tramitação do PL 180 (BRASIL, 2008), que deu origem à Lei 12.711 (BRASIL, 2012). O projeto tratava especificamente do ingresso nas universidades e instituições federais de ensino técnico de nível médio, prevendo a reserva de, no mínimo, 50% das vagas das IFES para estudantes oriundos do ensino médio em escolas públicas, reserva de 50% para estudantes com renda per capita de até um salário mínimo e meio, e para autodeclarados pretos, pardos e indígenas, na mesma proporção da população da unidade da federação, segundo os dados censitários do IBGE.

Nos primeiros anos do século XXI também houve intensa atuação do Ministério da Educação na promoção de políticas de combate ao racismo e promoção da equidade racial na educação. Em relação ao ensino superior, o Programa de Ações Afirmativas para a População Negra nas Instituições Federais e Estaduais de Educação Superior (Uniafro), foi criado em 2005, em parceria com Secretaria de Educação Superior (SESu) e a Secretaria de Alfabetização, Educação Continuada e Diversidade (SECAD). O programa tinha entre seus objetivos o fortalecimento institucional por meio de Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (NEABs), ou grupos correlatos, nas Instituições Públicas de Ensino Superior, para produção e divulgação de conhecimento; incentivo a iniciativas voltadas para promover acesso e permanência de estudantes negros no ensino superior; e desenvolvimento de cursos de formação para profissionais da educação.

Em paralelo às tentativas de aprovação de uma lei para institucionalizar as ações afirmativas em nível nacional, diferentes IES criaram, de forma isolada e utilizando critérios variados, programas e ações visando ao acesso diferenciado ao ensino superior. O critério mais utilizado foi o de reserva de vagas, ou cotas. Ainda que parte das instituições tenha optado pelo sistema de bonificação (HERINGER; FERREIRA, 2009). O perfil dos beneficiários da política também atendia a diferentes critérios, com centralidade para fatores de ordem sociais (como escola pública ou renda), raciais, ou ainda sociorraciais (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013). As primeiras universidades do país a adotar o sistema de cotas no seu processo seletivo foram as Universidades Estaduais do Rio de Janeiro, a Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro e a Universidade do Estado da Bahia, entre os anos de 2001 e 2002, o modelo adotado foi a reserva de 40% das vagas nos vestibulares para alunos negros e oriundos da escola pública. Entre as IFES, a primeira universidade a adotar cotas para negros e indígenas foi a Universidade de Brasília, em 2004. A Universidade Federal da Bahia criou seu programa de ações afirmativas no ano seguinte, em 20054.

Em agosto de 2012, a Lei 12.711 (BRASIL, 2012) foi sancionada garantindo a reserva de 50% das vagas, nas 59 Universidades Federais e 38 Institutos Federais de Educação, em cursos de graduação para estudantes oriundos de escolas públicas, atendendo ao perfil demográfico de pretos e pardos dos territórios de referência. Naquele momento, cerca de 60 IES já adotavam algum tipo de ação afirmativa para ingresso. A lei foi aprovada poucos meses depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) estabelecer jurisprudência ao declarar a constitucionalidade das cotas raciais nas universidades públicas do país, rejeitando uma ação movida em 2010, que demandava a extinção de programas de ações afirmativas5.

A comparação entre o efeito das políticas de ações afirmativas empreendidas de forma autônoma pelas IFES e o modelo adotado para as instituições após a Lei de Cotas, revela o aumento da presença dos cotistas matriculados em cursos de graduação nos últimos anos (FERNANDES, 2021).

A Lei de Cotas, configurada como uma política nacional a ser aplicada nas IFES, precisou considerar a diversidade e o princípio da autonomia que rege as instituições, além disso, foi necessário considerar as medidas que deveriam ser tomadas a partir de sua aprovação. Assim como no caso da política de ações afirmativas, outras ações no campo da educação superior foram estabelecidas ganhando um formato de política de abrangência nacional no mesmo contexto. Uma das políticas em relevo é a de assistência estudantil, visto que, assim como as ações afirmativas, está associada à expansão do ensino, resultante do intenso crescimento na oferta de vagas. Na rede federal de ensino, a expansão é resultado do crescimento de vagas, cursos e de instituições de ensino, acompanhando um movimento de interiorização, aumentando a demanda por mais ações para garantir a permanência de estudantes, como apresentado na seção a seguir.

3 A emergência da Política Nacional de Assistência Estudantil

A assistência estudantil voltada para estudantes do ensino superior data do surgimento do ensino universitário no Brasil. Até 2007, quando se estrutura a proposta do Programa Nacional de Assistência Estudantil, a assistência estudantil se configurava por ações restritas a instituições de ensino, geralmente desenvolvidas de forma pontual e não integradas em um programa orientado e coordenado de ações. Considerando a atuação do governo federal na estruturação da assistência estudantil nas IFES, destacava-se carência de recursos e falta de planejamento estratégico no desenvolvimento de ações e programas.

Associada aos contextos socioeconômico e político, a atenção dada à assistência estudantil assumiu variados formatos. Kowalski (2012) sugeriu a divisão da história da assistência estudantil no ensino superior em três fases: 1) a primeira compreendendo o período de criação das instituições universitárias até o processo de democratização após o fim da ditadura militar; 2) a segunda fase é marcada pelo avanço dos debates, que promoveram a entrada da assistência estudantil na agenda política, com a elaboração de projetos de lei, sinalizando o modelo que seria posteriormente adotado; 3) a terceira fase é a da formulação da política nacional, com a definição da política e de ações financiadas e coordenadas pelo governo federal e implementadas pelas IFES. O processo de expansão e reestruturação da rede federal de ensino superior está relacionado ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI). A proposta do REUNI orientava ações com objetivo de ampliar a educação superior, por meio da redução das taxas de evasão, ocupação de vagas ociosas, reestruturação pedagógica e curricular, além da ampliação de acesso e permanência via políticas de inclusão e de assistência estudantil6.

Entre os atores sociais que se destacaram no processo de formulação da política nacional de assistência estudantil estão o movimento estudantil, especialmente suas organizações de representação, articulado com o Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace). O Fonaprace teve atuação significativa na produção de dados sobre perfil socioeconômico dos estudantes das IFES com pesquisas realizadas nos anos de 1997 e 2004, subsidiando a formulação do projeto que resultou na Portaria Normativa nº 39 do MEC, instituindo o PNAES e publicada em dezembro de 2007 (BRASIL, 2007a)7.

A portaria do MEC foi convertida em decreto presidencial em 2010. A institucionalização do PNAES contribuiu para criar nas IFES a obrigatoriedade da destinação de recursos no cumprimento das ações previstas no decreto. O documento que instituiu o PNAES elencou as ações do programa: moradia estudantil; alimentação; transporte; atenção à saúde; inclusão digital; cultura; esporte; creche; apoio pedagógico; e acesso, participação e aprendizagem de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades e superdotação8. Segundo estabelecido no decreto, as ações do programa buscavam “viabilizar a igualdade de oportunidades, contribuir para a melhoria do desempenho acadêmico e agir, preventivamente, nas situações de retenção e evasão decorrentes da insuficiência de condições financeiras” (BRASIL, 2010).

Após seu estabelecimento, o PNAES passou a coordenar os recursos para financiamento da assistência estudantil nas IFES. Em seu primeiro ano, o programa disponibilizou R$125,3 milhões de reais. O investimento cresceu consideravelmente nos anos seguintes, chegando a mais de R$600 milhões de reais, em 2013. De acordo com o PNAES, a distribuição do recurso entre as instituições deveria seguir critérios relacionados ao Índice de Desenvolvimento Humano dos municípios onde a instituição estivesse localizada e o número de estudantes matriculados. Cada instituição ficaria responsável por executar as ações, obedecendo o estabelecido no regramento do programa, e selecionar os estudantes beneficiários com base em seu perfil socioeconômico.

O crescimento da política de assistência social na primeira década do século XXI ocorreu em paralelo ao processo de implementação das políticas de ações afirmativas pelas Instituições de Ensino Superior brasileiras. Em sua concepção, o PNAES não inclui critérios raciais, como indica o artigo 5º do decreto 7.234 “serão atendidos no âmbito do PNAES prioritariamente estudantes oriundos da rede pública de educação básica ou com renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio” (BRASIL, 2010). Mesmo sem inserir o viés racial, o documento não impedia que as instituições pudessem introduzir outros critérios na seleção dos estudantes beneficiários das políticas.

Depois do PNAES, outro momento de destaque do investimento do governo federal foi a criação do Programa Nacional Bolsa Permanência, em 2013. O Programa foi desenhado para atender prioritariamente estudantes indígenas, quilombolas e de baixa renda matriculados em cursos de graduação em universidades federais. A Portaria Nº 389, que institucionalizou o programa, elencou entre seus objetivos:

I - viabilizar a permanência, no curso de graduação, de estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica, em especial os indígenas e quilombolas;

II - reduzir custos de manutenção de vagas ociosas em decorrência de evasão estudantil;

III - promover a democratização do acesso ao ensino superior, por meio da adoção de ações complementares de promoção do desempenho acadêmico (BRASIL, 2013).

Antes de estabelecer o Programa Bolsa Permanência, o MEC desenvolveu programas de menor alcance, como o Conexões de Saberes, criado em 2004, no âmbito da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação – SECAD/MEC. O Conexões de Saberes foi desenvolvido entre os anos de 2004 e 2008, alcançando 33 universidades federais. Entre os objetivos do programa estava a realização de estudos e pesquisas que apoiassem a formulação de uma política nacional para acesso e permanência de estudantes de origem popular no ensino superior (SILVA; AVENDAÑO; CARVALHO, 2008).

Após a institucionalização da política de assistência estudantil, o tema passou a ser abordado de forma mais consistente nos documentos oficiais sobre o ensino superior, exemplo disso é o texto do Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado em 2014. No PNE, a política de permanência está referenciada no conjunto de ações projetadas para o ensino superior, estabelecendo para o período de 2014 a 2024 a estratégia de:

[Ensino Superior] ampliar as políticas de inclusão e de assistência estudantil dirigidas aos(às) estudantes de instituições públicas, bolsistas de instituições privadas de educação superior e beneficiários do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), de que trata a Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, na educação superior, de modo a reduzir as desigualdades étnico-raciais e ampliar as taxas de acesso e permanência na educação superior de estudantes egressos escola pública, afrodescendentes e indígenas e de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, de forma a apoiar seu sucesso acadêmico (BRASIL, 2014b, grifo nosso, on-line).

A formulação da meta do PNE de 2014 apresentou uma mudança significativa em relação ao PNE anterior, aprovado em 2001, com metas para o período de 2001 a 2011. Em relação ao ensino universitário e à assistência estudantil, o documento incluía apenas o objetivo de “estimular a adoção, pelas instituições públicas, de programas de assistência estudantil, tais como bolsa trabalho ou outros destinados a apoiar os estudantes carentes que demonstrem bom desempenho acadêmico.” (BRASIL, 2001).

A análise das ações, programas e legislação, revela que o processo de institucionalização da política nacional de assistência estudantil demorou cerca de sete anos. As primeiras ações, em 2007, garantiram um desenho para a política, além de estabelecer dotação orçamentária específica para a assistência. Nos anos seguintes, ações articuladas entre o governo federal e as IFES permitiram a ampliação da política. Em certas universidades, como na UFBA, a ampliação da assistência estudantil passou a enfocar o atendimento a estudantes de grupos vulnerabilizados socialmente, associando a política de assistência estudantil à política de ações afirmativas. Após quase uma década de crescimento, a assistência estudantil passou a ter uma queda de investimentos a partir de 2015. Nos últimos anos, as IFES convivem com cortes (ou ameaças de cortes) orçamentários, sendo comum o apelo e a denúncia à sociedade para a inviabilidade da gestão das instituições e pagamento de despesas como água, luz e limpeza. Os cortes também ameaçam os recursos voltados para a permanência de estudantes. A redução do orçamento das IFES aprofundou o desafio para a gestão dos programas e ações nas universidades, cujas políticas foram profundamente impactadas pelo investimento do governo federal na primeira década deste século.

4 Políticas de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil: o caso da UFBA

A UFBA foi fundada em 1946 e reorganizada em 1968, sendo à época a primeira universidade federal e a única instituição de ensino superior na cidade de Salvador. Até o começo de 1980, havia em Salvador apenas duas universidades: a UFBA e a Universidade Católica (UCSAL), instituição privada, de caráter confessional (BOAVENTURA, 2009).

No início do século XXI, quando a UFBA passou a adotar ações afirmativas para ingresso de estudantes em cursos de graduação, a instituição já estava consolidada no contexto universitário acadêmico brasileiro. Em relação às ações afirmativas para ingresso de estudantes em cursos de graduação na UFBA, podem ser identificados dois momentos: inicialmente, no período de 2005 a 2012, a execução do programa elaborado de forma autônoma pela universidade; a partir de 2013, a adesão ao modelo de ações afirmativas estabelecido pela Lei de Cotas. No segundo momento, destaca-se ainda a institucionalização da heteroidentificação racial, a partir de 20199.

Jocélio Teles dos Santos e Delcele Mascarenhas Queiroz (2006, 2012) apresentam a situação interna da UFBA e a conjuntura nacional e internacional que ajudam a explicar o processo de adoção da política de cotas na universidade em 2005. Pesquisas conduzidas na universidade desde o final dos anos 1990 revelaram que o padrão de desigualdades no ingresso à universidade resultava na sub-representação de estudantes de escolas públicas e entre pretos e pardos, comparados com a presença desses grupos na população do estado. Nos cursos de maior concorrência ou alto prestígio, a sub-representação se tornava mais aguda10.

[…] a exclusão social ocorre muito anteriormente ao momento de ingresso na universidade, fazendo com que a composição social e racial/étnica do grupo de postulantes ao ingresso na UFBA seja bastante diferente do perfil sócio-demográfico da população baiana.

Por esse motivo, qualquer Programa de Ações Afirmativas sério e que pretenda obter resultados concretos não pode, por um lado, ser pautado pela restauração de proporções demográficas gerais nem pode, por outro lado, ser genérico e difuso. (ALMEIDA FILHO et al., 2005, p. 14).

O catalisador para a elaboração da proposta de ações afirmativas da UFBA foi uma demanda do movimento estudantil à Reitoria, em 2002. No mesmo ano foi criado o Comitê Pró-Cotas, coordenado pelo professor Ubiratan Castro de Araújo, então diretor do Centro de Estudos Afro-Orientais (Ceao), composto por representantes da comunidade universitária e dos movimentos sociais11.

A UFBA aprovou seu programa de ação afirmativa em maio de 2004, passando a ser introduzido no exame vestibular a partir de 2005. O modelo aprovado pela universidade foi de cotas sociorraciais, na reserva de 45% das vagas em seu exame vestibular anual para estudantes que tivessem cursado todo o ensino médio, e pelo menos uma série do ensino fundamental, em escolas públicas, sendo que destas, 36,65% destinadas, preferencialmente, para estudantes negros, 2% para indígenas e 6,45% sem recorte racial (UFBA, 2004b)12.

Nos anos seguintes ao estabelecimento da política de ações afirmativas para ingresso na UFBA, verificou-se um aumento da presença de estudantes autodeclarados pretos e pardos na universidade (Gráfico 1).

Distribuição percentual dos candidatos selecionados por cor e raça (2003 - 2012)
Gráfico 1.
Distribuição percentual dos candidatos selecionados por cor e raça (2003 - 2012)
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da Pró-Reitoria de Planejamento e Orçamento (PROPLAN) - Demanda Social / Questionário Socioeconômico (UFBA, s. d.).

No caso da UFBA, pesquisas realizadas também revelaram que o efeito das ações afirmativas foi mais intenso em cursos de alta concorrência e alto prestígio, como Medicina, Direito, Engenharias, Odontologia, entre outros. (SANTOS; QUEIROZ, 2012; FERNANDES, 2022).

Após 2012, quando passou a adotar a Lei de Cotas, a UFBA seguiu o padrão das demais universidades brasileiras, houve ainda aumento da presença de cotistas a partir de 2012, inclusive em cursos de alto prestígio e concorrência (FERNANDES, 2022).

O perfil majoritário de estudantes da UFBA após as cotas é de estudantes do sexo feminino, da cor negra (em sua maioria pardas), com idade abaixo dos 23 anos13. Sobre o desempenho, Caio Silva concluiu, em uma pesquisa analisando os dados de estudantes de 2005 a 2019, que o rendimento acadêmico de cotistas é melhor do que os não cotistas. A análise de rendimento foi realizada comparando as notas de entrada com as notas finais de cotistas e não cotistas. Os cotistas elevam a pontuação em relação à nota de entrada, enquanto os não cotistas têm as notas diminuídas, quando comparadas com as notas de entrada (SILVA, 2021).

Além de ações voltadas para o ingresso, o programa que estabeleceu ações afirmativas na UFBA, em 2004, foi elaborado em mais três eixos: preparação, permanência e pós-permanência. A inclusão da permanência no programa da UFBA foi um diferencial da universidade. Segundo Sousa e Portes (2011), entre as 38 IFES que tinham elaborado propostas de políticas/ações afirmativas, em 2009, apenas 26% delas mencionaram permanência ou assistência estudantil nos documentos. No caso da UFBA havia não somente a menção, mas um plano estruturado para promover ações de permanência, que esbarrava, porém, em restrições orçamentárias.

As ações para permanência de estudantes na UFBA contemplavam

ampliar o número de bolsas estudantis oferecidas pela UFBA; montar um sistema de acompanhamento acadêmico (tutoria) dos estudantes nos cursos em que se identifique necessidade e viabilidade; oferta dos cursos em turno único; ampliação da oferta de cursos noturnos; reforçar a política de assistência estudantil - residência, alimentação, transporte etc. contemplar, nos programas de assistência estudantil, um mínimo de 30% de estudantes negros. (UFBA, 2004a, n.p.)

A dificuldade de financiamento para estruturar a política de permanência da UFBA foi abordada no programa de ações afirmativas de 2004, indicando a necessidade de ampliar recursos de que a universidade não dispunha para apoiar o ingresso e permanência de estudantes negros e pobres (UFBA, 2004a). Ainda sem definir como se daria a ampliação dos recursos, a UFBA processou a reestruturação de sua política de assistência estudantil, com a criação da Pró-reitoria de Assistência Estudantil, em 2006, que passou a ser nomeada de Pró-reitoria de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil (PROAE), a partir de 2009.

Quando os recursos do PNAES começaram a ser liberados, em 2008, a UFBA ampliou a capacidade de desenvolver sua política de assistência estudantil14. Outro fator relevante foi a reestruturação da gestão na universidade, resultando em um reordenamento das instâncias administrativas (CUNHA, 2017). Após a implementação da política de ações afirmativas e institucionalização da assistência estudantil, o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) passou a incorporar ações, perfazendo finalidades, objetivos e metas, voltadas para a melhoria dessas políticas na instituição. As duas esferas (ações afirmativas e assistência estudantil) se entrecruzam na política de permanência da UFBA, como inserido no PDI 2018-2022:

O PDI buscou ampliar o investimento nas políticas afirmativas, tanto em recursos financeiros quanto em auxílios concedidos. Várias modalidades de auxílios, bolsas e a oferta de serviços, como Restaurante Universitário, Creche e Residência, formam uma infraestrutura fundamental para a permanência de um público que sem isso não poderia se manter na Universidade. Um dos efeitos do avanço das políticas afirmativas, desde a implantação da política de cotas na Graduação, foi alterar, substancialmente, a composição social do corpo discente da UFBA (UFBA, 2017, p. 55).

As atribuições da PROAE cresceram com o influxo de recursos do PNAES, permitindo que a Pró-reitoria passasse a concentrar ações e programas que antes estavam distribuídos por diferentes órgãos da universidade15. A partir de 2013, a PROAE passou a contar com a Coordenação de Programas de Assistência a Estudantes e a Coordenação de Ações Afirmativas, Educação e Diversidade. A partir das coordenações são organizados ações, programas e serviços da PROAE, como bolsas e vagas de moradia estudantil, auxílio alimentação, creche, transporte, atenção à saúde, atendimento psicológico, inclusão digital, apoio a atividades de esporte e lazer, bolsas acadêmicas, apoio pedagógico e suporte à aprendizagem de estudantes com deficiência16.

O crescimento do empenho de recursos e a diversificação de ações pode ser acompanhado na Tabela 1, partindo de uma política concentrada em moradia e alimentação e nos anos seguintes ampliando o escopo de ações. Um exemplo da diversificação é a criação do Programa Permanecer, que concede bolsas para estudantes de cursos de graduação para a iniciação em ensino, pesquisa e extensão. Para acessar as bolsas, os estudantes devem estar cadastrados na PROAE, tendo passado por um processo de comprovação da situação de vulnerabilidade socioeconômica.

Tabela 1.
Auxílios, bolsas e serviços de assistência estudantil da UFBA
Benefícios200412008201322017201920202021
Residência Universitária e Auxílio Moradia5044069081.7102.0271.7201.565
Auxílio Alimentação2191.1038553.0222.8212.690
Auxílio Transporte658729938689450
Auxílio Saúde42059447723427
Bolsa Programa Permanecer/UFBA5677501.0771.002679808
Bolsa Permanência/MEC822866779541
Auxílio Emergencial para estudantes durante a pandemia covid-192.6812.963
Outros auxílios, bolsas e serviços3.6141.948851681
Total5041.1923.8399.40110.28010.4549.725
Fonte: Elaboração própria, baseada em dados da PROPLAN/UFBA (UFBA, s. d.).1 Em 2004, os auxílios alimentação e moradia eram específicos para estudantes que residiam na moradia estudantil da UFBA.2 A partir de 2013, os dados da PROPLAN passaram as bolsas de auxílio moradia e residência.

O total de ações no âmbito da assistência estudantil não pode ser traduzido em número de estudantes atendidos pela PROAE, visto que cada estudante pode acessar diferentes serviços e auxílios, de acordo com as necessidades apresentadas. Apesar do crescimento, dados de pesquisas sobre a assistência estudantil na UFBA demonstram que o alcance das ações é limitado. Segundo dados da V Pesquisa Nacional de Perfil dos Graduandos das IFES17, realizada em 2018, apenas 27% dos estudantes de graduação na UFBA tinha acessado alguma ação da PROAE (FONAPRACE, 2019).

Sobre as dificuldades em acessar a assistência estudantil na UFBA, uma pesquisa realizada com estudantes cotistas do curso de Administração da universidade revelou que a maioria não tem cadastro na PROAE por não conhecer o órgão e suas ações, por falta de orientação sobre o procedimento ou por dificuldades em reunir a documentação comprobatória necessária (GUSMÃO, 2018).

Em pesquisa realizada com estudantes da UFBA em 202118, verificou-se o mesmo padrão de respostas. A dificuldade em realizar o cadastro aparece entre os principais problemas citados por discentes para acessar a PROAE, incluindo a falta de orientação sobre o procedimento ou as dificuldades em reunir a documentação comprobatória necessária.

Ainda em relação ao total de ações de assistência estudantil na UFBA, houve uma diminuição entre os anos de 2019 e 2020, que pode ser explicada por dois fatores principais: o primeiro fator está relacionado à paralisação das atividades da universidade em março de 2020, devido à pandemia de covid-19, e o retorno das aulas no formato remoto no mês de setembro do mesmo ano; o segundo fator a ser considerado é a redução orçamentária para despesas discricionárias, incluindo gastos com assistência estudantil19.

5 Considerações Finais

O estabelecimento das políticas de ações afirmativas acompanhou a ampliação das políticas voltadas para permanência de estudantes no ensino superior. Essas políticas buscam combater as desigualdades no nível de ensino, que têm entre os efeitos mais comuns a evasão, o impacto no desempenho acadêmico e o aumento no tempo médio de permanência nos cursos. Outros efeitos estão relacionados à fruição da universidade, envolvendo a participação em atividades de ensino, pesquisa e extensão, eventos culturais e esportivos.

Ao longo deste artigo, argumentamos que a simultaneidade entre os processos de expansão da política de permanência e de institucionalização das políticas de ações afirmativas no Brasil não aconteceu por acaso. As duas políticas estão intimamente relacionadas ao histórico de ampliação das vagas e diversificação do acesso ao ensino superior. Com base na análise que perfaz os últimos 20 anos de políticas públicas federais para a educação superior, pode-se ainda afirmar que as duas políticas são complementares e, por isso, não devem ser desassociadas.

O caso da UFBA, que instituiu em um mesmo programa a política de acesso e de permanência, permite perceber que o planejamento das ações afirmativas nas dimensões que envolvem acesso e permanência precisam ser planejados de forma coordenada.

O atual contexto de crise e corte de verbas para financiamento do ensino superior tem se revelado um dos maiores desafios para manutenção da política de permanência, acompanhado por demandas crescentes por ações no campo da assistência estudantil. O corte de verbas que atingiu a UFBA e o conjunto das IFES nos últimos anos impactou as ações voltadas para a permanência estudantil, que passaram a sofrer sucessivas reduções, colocando em risco a abrangência da política e o número de estudantes atendidos.

Em um momento de aprofundamento das desigualdades sociais, resultado da pandemia de covid-19 com repercussão em nível global, o debate sobre permanência na universidade ganha caráter de urgência. A redução de investimentos na assistência estudantil é preocupante, pois coloca em risco a permanência dos estudantes nas universidades, fragilizando também toda a rede de políticas que garantiram a ampliação do sistema de ensino superior no Brasil.

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Notas

1 Em 2019, o IBGE divulgou o informativo “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, indicando que estudantes negros (pretos e pardos) eram maioria percentual (50,3% em 2018) entre estudantes de instituições públicas de ensino superior. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf.
2 Os cursos pré-vestibulares comunitários emergiram como um fenômeno social na década de 1980, como uma alternativa utilizada para suprir as carências escolares dos estudantes que desejavam ingressar no ensino superior via exame vestibular, principalmente aqueles que não tinham recursos para custear um curso preparatório particular.
3 A reivindicação por mais acesso à educação faz parte da luta histórica do movimento (DOMINGUES, 2007; SANTOS, 2005). A atuação do movimento negro em prol da implementação das ações afirmativas no Brasil foi relevante, especialmente a partir da década de 1990. Em 1995, foi realizada a Marcha Zumbi dos Palmares: contra o racismo pela cidadania e a vida, com demandas por políticas de ações afirmativas. Em julho de 1996, o governo brasileiro respondeu às demandas promovendo pela primeira vez uma discussão específica sobre ações afirmativas, no Seminário Internacional sobre “Multiculturalismo e Racismo: o papel da ação afirmativa nos estados democráticos contemporâneos”. O seminário contou com a presença de pesquisadores, políticos e representantes de movimentos sociais, em especial do movimento negro.
4 Até 2005 quando a UFBA lançou seu programa de ações afirmativas, as IES a adotarem ações afirmativas foram: UnB, UFPR, UFBA, Ufal, UFSP, UFPA, UFRN, Uerj, Uneb, UEMG, UEMS, UEL, Unicamp e Unemat (SANTOS; QUEIROZ, 2006). Sousa e Portes (2011) realizaram uma pesquisa sobre as IFES e a adoção de políticas de ações afirmativas. Das 59 universidades federais existentes à época, 64% adotavam políticas ou ações afirmativas, e 36% não adotavam (dados referentes ao ano de 2009). Entre todas as IES públicas, o número das que utilizavam alguma forma de ações afirmativas para ingresso chegou a 79, antes do estabelecimento da Lei 12.711, em 2012.
5 A petição inicial da (ADPF) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, n. 186 foi apresentada pelo partido Democratas ao STF. Na ação, o partido alegava que as políticas feriam preceitos fundamentais da Constituição Federal, a exemplo do princípio da não discriminação, do repúdio ao racismo, bem como a dignidade da pessoa humana (ALENCASTRO, 2011).
6 Decreto no 6.096, de 24 de abril de 2007 (BRASIL, 2007b), que instituiu o REUNI, estabeleceu “o objetivo de criar condições para a ampliação do acesso e permanência na educação superior, no nível de graduação, pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais”, por meio da “ampliação de políticas de inclusão e de assistência estudantil”.
7 O Fonaprace foi criado em 1987 ligado à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES), reúne pró-reitores, sub-reitores, decanos ou responsáveis pelos assuntos comunitários e estudantis das instituições de ensino superior públicas do Brasil. As pesquisas do Fonaprace abordam, além de perfil socioeconômico, temas relacionados à permanência, desempenho acadêmico, acesso à cultura, lazer e esporte, entre outros (KOWALSKI, 2012).
8 Apesar da abrangência de ações, o modelo de assistência estudantil brasileiro concentra recursos no pagamento de auxílios financeiros (bolsas) alimentação e moradia (NASCIMENTO, 2013).
9 As ações afirmativas na universidade também incluem cursos de pós-graduação e concursos para servidores técnico-administrativos e docentes. A UFBA introduziu cotas na pós-graduação em 2017, seguindo o modelo de reserva de 30% das vagas para candidatos negros (pretos e pardos) e uma vaga para candidatos quilombolas, indígenas, pessoas com deficiência e trans (transgêneros, transexuais e travestis), por curso. Desde 2014, a universidade é obrigada a cumprir a Lei 12.990 (BRASIL, 2014b), que determina a reserva de 20% das vagas para pretos e pardos em concursos públicos no âmbito da administração pública federal.
10 Santos e Queiroz (2006, 2012) apresentaram dados da participação de estudantes de escolas públicas na UFBA nos anos anteriores à implementação da política de cotas. Em 2003 e 2004 os estudantes selecionados no vestibular oriundos de escolas públicas estavam na faixa dos 35%. Quando analisados especificamente os cursos de maior concorrência, o percentual variava de 10% e 25%. Em relação ao quesito cor/raça, a participação de estudantes negros cresceu em 19,2 pontos, passando de 55,4%, em 2003, para 74,6%, em 2005.
11 O Comitê contava com representantes do Coletivo de Estudantes Negros Universitários da Bahia (Cenunba), o Centro de Orientação e Estudo Quilombo (Coequilombo)/Plataforma, o DCE da UFBA, o Instituto Cultural Steve Biko, o Movimento de Apoio e Respeito à Vida (Marv/Itinga), o Pré-vestibular Negros e Carentes na Universidade, o Movimento Negro Unificado (MNU), o Projeto Axé e o Quilombo Asantewa – curso pré-vestibular para mulheres negras. (SANTOS; QUEIROZ, 2006)
12 O sistema adotado pela UFBA em 2004 contava com as seguintes categorias: Categoria A: candidatos de escolas públicas que se declararam pretos ou pardos; Categoria B: candidatos de escolas públicas de qualquer etnia ou cor; Categoria C: sem cotas, candidatos de escolas particulares que se declararam negros ou pardos; Categoria D: candidatos de escolas públicas que se declararam índios; Categoria E: sem cotas, todos os candidatos independentes de etnia ou cor; Categoria F: candidatos de escolas públicas aldeados ou quilombolas. Se as vagas destinadas às categorias A e B não forem preenchidas, elas devem ser destinadas para a categoria C. Permanecendo incompletas, elas devem ser preenchidas por candidatos da categoria E, ou seja, a categoria A é subconjunto de B, que é subconjunto de E. O mesmo ocorre para a categoria D, que se não tiver completado todas as vagas devem ser transferidas para a categoria E (UFBA, 2004a).
13 Sobre o perfil dos estudantes da UFBA, ver Silva (2021). Resultados semelhantes foram alcançados na pesquisa “O desafio da permanência estudantil no contexto das ações afirmativas brasileiras: o caso da Universidade Federal da Bahia”. A pesquisa foi realizada em 2021 com estudantes da UFBA, via Google Forms. Responderam ao questionário 620 estudantes dos diversos cursos de graduação da universidade. De acordo com a pesquisa, o perfil majoritário de estudantes da UFBA possuía as seguintes características: mulher cis (67,3%), cor preta (41,1%), proveniente de escola pública (61,1%) e com renda pessoal de até 1 salário mínimo (43,4%) (SOTERO, 2021).
14 A ampliação e diversificação de ações da política de assistência estudantil da UFBA podem ser percebidas também nos recursos empregados pela universidade para essa finalidade. Segundo dados da Pró-Reitoria de Planejamento e Orçamento, em 2007, o orçamento da UFBA indicou despesas de R$638.866 com assistência estudantil, já em 2018 o valor foi de R$33.492.370.
15 No caso da UFBA, os recursos do REUNI permitiram uma significativa reestruturação e também permitiram a expansão de vagas e de cursos. Em 2000, a UFBA tinha cadastrados 55 cursos de Graduação, com 3.745 vagas anuais para novos estudantes, 43 cursos de mestrado e 18 doutorados. Em 2019, a universidade ofertava 7.521 vagas anualmente em 106 cursos de graduação, contava com 69 Mestrados Acadêmicos, 15 Mestrados Profissionais e 58 Doutorados.
16 A partir de 2019, o órgão também passou a organizar o processo de heteroidentificação racial no ingresso de estudantes e servidores via políticas de ações afirmativas.
17 A pesquisa foi realizada pelo Fonaprace e Andifes. Na UFBA, a amostra foi de 5.774 estudantes de graduação, do total de 38,6 mil estudantes que frequentavam a universidade na época (FONAPRACE, 2019).
18 Dados da pesquisa “O desafio da permanência estudantil no contexto das ações afirmativas brasileiras: o caso da Universidade Federal da Bahia”.
19 O corte no orçamento atinge o conjunto das IFES, resultante da redução no orçamento do MEC. Os cortes no orçamento justificaram a readequação da política na UFBA. Ver a notícia “Corte orçamentário obriga Proae a readequar política de concessão de benefícios”. Disponível em: https://www.ufba.br/ufba_em_pauta/corte-orcamentario-obriga-proae-readequar-politica-de-concessao-de-beneficios; “Orçamento que nós temos hoje é inferior ao de 2010', diz reitor da Ufba após corte de R$ 30 milhões”. Disponível em: https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2021/05/19/ufba-tem-corte-de-r-30-milhoes-em-relacao-ao-orcamento-de-2020-valor-e-o-menor-em-11-anos.ghtml.

Notas de autor

1 Pós-Doutora pela Brown University. Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Professora Adjunta no Departamento de Educação I da Universidade Federal da Bahia (UFBA) – Salvador/BA – Brasil. E-mail: edilzasotero@yahoo.com.br.

Información adicional

COMO CITAR (ABNT): SOTERO, E. O desafio da permanência estudantil no contexto das ações afirmativas: o caso da Universidade Federal da Bahia. Vértices (Campos dos Goitacazes), v. 24, n. 3, p. 725-743, 2022. DOI: https://doi.org/10.19180/1809-2667.v24n32022p725-743. Disponível em: https://essentiaeditora.iff.edu.br/index.php/vertices/article/view/17160.

COMO CITAR (APA): Sotero, E. (2022). O desafio da permanência estudantil no contexto das ações afirmativas: o caso da Universidade Federal da Bahia. Vértices (Campos dos Goitacazes), 24(3), 725-743. https://doi.org/10.19180/1809-2667.v24n32022p725-743.

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