Artigos Originais

A estética decolonial no ativismo de coletivos teresinenses

The decolonial aesthetics in the activism of Teresina collectives

La estética decolonial en el activismo de los colectivos de Teresina

Kary Emanuelle Reis Coimbra 1
Universidade Federal do Piauí (UFPI), Brasil

A estética decolonial no ativismo de coletivos teresinenses

Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 25, núm. 1, e25117309, 2023

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense

Recepción: 28 Mayo 2022

Aprobación: 24 Febrero 2023

Publicación: 19 Abril 2023

Resumo: Neste trabalho analisamos como a expressão estética de coletivos e coletivas da cidade de Teresina (Piauí) relaciona-se com o argumento decolonial, sobretudo a partir da produção dos/as intelectuais da Rede Modernidade-Colonialidade. Uma pesquisa de campo qualitativa foi realizada com formações coletivas teresinenses, a partir da apreensão de entrevistas com seus integrantes, em sessões de grupos focais; e da seleção de postagens em suas mídias sociais Facebook e Instagram. Os dados foram interpretados pelo método de Análise do Discurso Crítica, na vertente dialético-relacional faircloughiana. Os resultados evidenciaram que esses grupos representam uma importante face do ativismo contemporâneo, ao evocarem sensações e processos de percepção que dialogam com a diversidade. Nesse sentido, concluímos que o uso de vestimentas, artefatos e corporeidades/performances oferecem visibilidade a grupos socialmente excluídos pela lógica colonial-moderna, despertando sensações e percepções outras sobre a padronização e universalização de modos de ser e viver.

Palavras-chave: ação coletiva, coletivos, decolonialidade, transgressões estéticas.

Abstract: In this work we analyze how the aesthetic expression of collectives in the city of Teresina (Piaui, Brazil) is related to the decolonial argument, especially from the perspective of the intellectuals of Modernity-Coloniality Group. A qualitative field research was carried out with collective formations from Teresina, based on the apprehension of interviews with their members, in focus group sessions; and the selection of posts on their social media Facebook and Instagram. The data were interpreted by the method of Critical Discourse Analysis, in the Faircloughian dialectical-relational aspect. The results showed that these groups represent an important face of contemporary activism, as they evoke sensations and perception processes that dialogue with diversity. In this sense, we conclude that clothing, artifacts, and corporeities/performances are used to offer visibility to groups socially excluded by the colonial-modern logic, awakening other sensations and perceptions about the standardization and universalization of ways of being and living.

Keywords: collective action, collectives, decoloniality, aesthetical transgression.

Resumen: En este trabajo analizamos cómo la expresión estética de los colectivos en la ciudad de Teresina (Piauí, Brasil) se relaciona con el argumento decolonial, especialmente de la producción de los intelectuales de la Red Modernidad-Colonialidad. Se realizó una investigación de campo cualitativa con formaciones colectivas de Teresina, a partir de la aprehensión de entrevistas con sus integrantes, en sesiones de grupos focales; y la selección de publicaciones en sus redes sociales Facebook e Instagram. Los datos fueron interpretados por el método de Análisis Crítico del Discurso, en el aspecto dialéctico-relacional de Fairclough. Los resultados mostraron que estos grupos representan un rostro importante del activismo contemporáneo, ya que evocan sensaciones y procesos de percepción que dialogan con la diversidad. Así, concluimos que el uso de vestimentas, artefactos y corporeidades/performances ofrecen visibilidad a grupos socialmente excluidos por la lógica colonial-moderna, despertando otras sensaciones y percepciones sobre la estandarización y universalización de formas de ser y vivir.

Palabras clave: acción colectiva, colectivos, decolonialidad, transgresiones estéticas.

1 Introdução

São rápidas as mudanças no âmbito da prática social dos movimentos sociais, cujas teorizações nem sempre acompanham tal dinamismo. Fatores como globalização e informatização da sociedade contribuíram para a diversificação e complexificação de movimentos em diversos países, inclusive da América Latina e, nesse sentido, “muitas explicações paradigmáticas ou hegemônicas nos estudos da segunda metade do século XX necessitam de revisões ou atualizações face à emergência de novos sujeitos sociais, novas formas de organização e articulação de cenários políticos mais dinâmicos” (SCHERER-WARREN, 2018).

Mesmo diante dos avanços teóricos na análise dos movimentos sociais para a compreensão de expressões contemporâneas da ação coletiva, ainda persiste o desafio que se encontra no próprio limite epistêmico das teorias dos movimentos sociais, no que tange a uma abordagem decolonial. Como lembra Bringel (2011), as noções, as categorias e os conceitos da sociologia dos movimentos sociais erigidos nos anos 1960 constituem-se a partir de um contexto europeu e estadunidense, diferente do que se passava na América Latina, cujas lutas eram de caráter anticolonial e anti-imperialista.

Além de buscar responder se há lugar para movimentos sociais na teoria decolonial (CARVALHO, 2015), trabalhos sobre esses movimentos, nos últimos anos, vêm assumindo a perspectiva dos estudos pós-coloniais e da subalternidade, avançando para a perspectiva decolonial latino-americana. Surge nesse debate, a literatura latino-americana, incluindo a brasileira, dialogando com o questionamento da modernidade, na perspectiva decolonial. Nessa perspectiva, um possível caminho para a decolonização dos estudos sobre movimentos sociais da América Latina seria por meio da visibilização de estratégias desenvolvidas por eles na construção de um lugar próprio de enunciação (DAUER, 2020).

O lócus de enunciação teórico-empírico deste trabalho é na cidade de Teresina, capital do Piauí, região Nordeste do Brasil. Mesmo sendo a primeira capital planejada do Brasil imperial (SILVA, 2012), Teresina ainda persegue os ideais do que se considera modernidade, em sinonímia à ideia de progresso. Nesse sentido, a cidade encontra-se no campo de compreensão de um movimento de modernização, no âmbito da visão dominante de modernidade, como um “projeto inacabado” (LIMA, 2016, p. 18). Além de situar-se na periferia político-econômica do país, observamos que as ações e práticas interventivas de agrupamentos intitulados coletivos nesta cidade possuem características que se assemelham aos pressupostos da perspectiva decolonial, a começar pelas expressões estéticas de suas ações socioculturais.

Assim, dando materialidade empírica aos estudos sobre modernidade, colonialidade e decolonialidade no campo dos movimentos sociais, o objetivo deste trabalho concentra-se na observação da relação entre os aspectos estéticos da atuação de coletivos na cidade de Teresina (Piauí) e o argumento decolonial. A compreensão do campo teórico, epistemológico, ontológico e político da decolonialidade passa, antes, pela apreensão dos sentidos sobre colonialidade e sua inerente relação com a modernidade, como exposto na seção 2.

2 Da racionalidade colonial-moderna ao padrão sobre corpos e sentidos

O termo colonialidade foi cunhado por Aníbal Quijano. Segundo o intelectual peruano, a colonialidade é compreendida como um dos elementos constitutivos e específicos de um padrão mundial de poder, que é, necessariamente: colonial/moderno, capitalista e eurocentrado (QUIJANO, 2005, 2014). Quijano e Wallerstein (1992) definem a colonialidade como um sistema hierárquico mundial que gerou a continuidade de uma ordem não apenas na dimensão político-econômica entre os territórios, mas, sobretudo, na dimensão cultural – responsável pela própria manutenção desta lógica. Isso justifica o surgimento do processo de globalização enquanto uma lógica linear que se pretende universal em todo o mundo (MIGNOLO, 2017). Sem dúvida, a colonialidade foi engendrada a partir do colonialismo; sem este, ela não conseguiria ter sido imposta e enraizada na intersubjetividade do mundo por tanto tempo (QUIJANO, 2014). Desse modo, a colonialidade é, assim, constituinte da modernidade, representando seu lado mais escuro (MIGNOLO, 2017).

Segundo Quijano (2005, p. 117), o padrão mundial de poder colonial/moderno, capitalista e eurocentrado, ou simplesmente a colonialidade do poder, tem como um de seus eixos centrais a “ideia de raça” como um modo de impor legitimidade às relações de dominação, desde a invasão do continente denominado Americano. Os colonizadores criaram uma codificação por cor a partir de traços fenotípicos, assumindo-a como categoria racial. Chamaram a si mesmos de brancos. Desse período até os dias de hoje, povos não brancos, assim como seus sistemas culturais, passaram à condição de inferioridade na hierarquia sociocultural. A ideia de raça organizou papéis e lugares sociais, tornando-se o primeiro sistema de classificação social do mundo.

Para Fanon (1968, p. 29), o mundo colonial é um mundo dividido em dois e, portanto, “habitado por espécies diferentes”. Junto com a invenção do outro, distinto e inferiorizado ao ser europeu, justificava-se uma lógica binária que negava o reconhecimento das diferenças e, consequentemente, a multiplicidade e o hibridismo das formas e expressões de vida. Nessa lógica, a colonização estruturou e socializou o racismo, de modo que a população não branca foi marginalizada segundo traços fenotípicos, ocasionando desigualdades e preconceitos, a partir do pensamento etnocêntrico europeu (PASTI; OLIVEIRA JR., 2019). Isto é, “a conquista e colonização da América promoveu a hegemonia de uma cultura racista legitimadora do saqueio de nossos recursos naturais, a devastação de nossos territórios, o genocídio de nossos povos e a imposição de uma visão de mundo sobre as muitas existentes nessas terras” (KOROL, 2007, p. 233, tradução livre). Desse modo, “o racismo estabelece uma hierarquia racial e cultural que opõe a ‘superioridade’ branca ocidental à ‘inferioridade’ negro-africana” e indígena (GONZÁLEZ, 2020, p. 135).

Quijano (2005) frisa que a categoria raça não existia antes do colonialismo da América e, por isso se trata de uma ideia ou uma categoria mental, em suas palavras. De igual modo, Grosfoguel e Onesko (2021, p. 14) destacam que a lógica predominante na Europa não existia em outras partes do mundo, antes do processo de colonização: “[o] cristianismo não existia, o racismo não existia, em muitos lugares nem se quer existia a dominação patriarcal de caráter cristocêntrico, porque o que se globaliza é o patriarcado cristão”. E reforçam o argumento ao citar a obra La Invención de las Mujeres, da intelectual nigeriana Oyèrónkẹ Oyěwùmí: “um excelente texto que apresenta de forma concreta como o patriarcado não existia no norte da África antes da colonização europeia” (GROSFOGUEL; ONESKO, 2021, p. 14).

A propósito, a classificação da população mundial não ocorreu apenas em termos de raça, mas também de gênero, como destaca a argentina María Lugones. Segundo Lugones (2020, p. 56), Quijano não foi capaz de perceber “sua conformidade com o significado hegemônico de gênero”, desconsiderando a subalternização e invisibilização de mulheres colonizadas. A autora concebeu o que chama de sistema colonial-moderno de gênero, que representa o reconhecimento do gênero como uma imposição colonial constituinte da colonialidade do poder, assim como, em uma relação de mutualidade, a colonialidade do poder constituiu o gênero. Nesse sentido, “conceber o alcance do sistema de gênero do capitalismo eurocêntrico global é entender até que ponto o processo de redução do conceito de gênero à função de controle do sexo, seus recursos e produtos, constitui a dominação de gênero” (LUGONES, 2020, p. 72).

Assim como os lados iluminado e obscuro da modernidade (MIGNOLO, 2007), Lugones (2020) destaca os lados visível/iluminado e oculto/obscuro do sistema colonial-moderno de gênero. O lado visível/iluminado diz respeito ao padrão hegemônico que definiu e define o gênero e as relações de gênero ao longo da modernidade, padrão este que é representado pelo dimorfismo biológico, pela dicotomia homem/mulher, pela heterossexualidade e pelo patriarcado. O lado oculto/obscuro do sistema colonial-moderno de gênero representa a violência contra corpos não brancos, que foram reduzidos à animalidade, levados ao sexo forçado com colonizadores e à exploração laboral que, não raro, culminava em morte. Desse modo, o controle do trabalho de pessoas não brancas ocorreu, simultaneamente, pela racialização e pela atribuição de gênero.

Ainda no âmbito da colonialidade de gênero, trago as contribuições de Vergueiro (2015, 2016) sobre a ciscolonialidade, isto é, a imposição da cisgeneridade como norma sobre corpos e identidades de gênero – daí a utilização dos termos cisnormatividade e heteronormatividade. Para Vergueiro (2015, p. 46), o conceito de cisgeneridade, formulado a partir de vozes de “gêneros inconformes”, reflete a atribuição de identidade de gênero correspondente ao sexo atribuído no nascimento, portanto: identidade de gênero masculina a meninos/homens e identidade de gênero feminina a meninas/mulheres. Essas designações foram consideradas o padrão normativo da sociedade – padrão este que foi imposto por meio de dispositivos de poder e naturalizado em dimensões discursivas, binárias e permanentes (VERGUEIRO, 2015).

A organização do poder sobre a vida, baseada nas disciplinas do corpo e nas regulações da população (FOUCAULT, 1988) – sobretudo do povo – constitui o biopoder como elemento fundamental à lógica colonial, que, tomada como acumulação primitiva do capital, no sentido marxiano, guarda estreitas relações com a lógica capitalista. Em ambas as lógicas, o biopoder opera, como lembra Oliveira (2006, p. 31), “de forma a garantir uma inserção controlada dos corpos no aparelho de produção e um ajustamento dos fenômenos da população aos processos econômicos” e, assim, neutralizar as resistências ao poder por meio do enfraquecimento da força política dos indivíduos.

Como se vê, a partir da colonialidade do poder, a mundialização do processo de civilização ocidental moderno também produziu, progressivamente, a socialização dos/as colonizados/as, nos marcos da colonialidade do ser (MIGNOLO, 2010b; MALDONADO-TORRES, 2007); e do saber (MIGNOLO, 2010b), mediante a imposição de normas e condutas sociais, por meio de mecanismos pedagógicos. A lógica da colonialidade foi estabelecida em quatro âmbitos da experiência humana: 1) econômico, com a apropriação da terra, a exploração do trabalho e o controle das finanças; 2) político, a partir do controle de autoridade; 3) social, com o controle de gênero e sexualidade; e 4) epistêmico e subjetivo, mediante o controle do conhecimento e da subjetividade/intersubjetividade (MIGNOLO, 2007).

Dada a descoberta da “máscara da modernidade” e, consequentemente, da lógica da colonialidade, “surgem também projetos decoloniais, isto é, projetos que forjam futuros nos quais a modernidade/colonialidade será um mau momento na história da humanidade dos últimos quinhentos anos” (MIGNOLO, 2010a, p. 13; tradução minha1). Mais que uma opção epistêmica ou ontológica, o paradigma da decolonialidade surge de “uma necessidade ética e política para as ciências sociais latino-americanas” (CASTRO-GÓMEZ; GROSFOGUEL, 2007, p. 21). Esse processo de transformação, em curso na América Latina, é chamado de mirada ou giro decolonial. A radicalidade do giro decolonial latino-americano pode ser vista, desde o final dos anos 1990, na crítica à própria denúncia do imperialismo dos estudos culturais, pós-coloniais e subalternos, uma vez que essa denúncia não realiza uma ruptura adequada com o pensamento teórico eurocêntrico (MIGNOLO, 1998 apudBALLESTRIN, 2013).

Segundo Fanon (1968), se o contexto colonial cindiu o mundo em dois, o processo descolonial surge com a proposta de unificação a partir da extinção da lógica colonial. Desfazer o mundo colonial não significa uma confluência entre duas zonas após a abolição das fronteiras, mas “abolir uma zona, enterrá-la profundamente no solo ou expulsá-la do território” (FANON, 1968, p. 30). No nível da práxis, a resistência a essa cadeia de eventos relacionados surge dos/as próprios/as subalternos/as, ao reivindicarem seu direito de existir e viver de acordo com seus modos. Para Maldonado-Torres (2007, p. 160), são muitos os tipos de intervenção crítica dos/as colonizados/as, o que significa que “a orientação fundamental deste tipo de intervenção, e a atitude correspondente, referem-se ao espanto e ao grito da subjetividade viva e doadora diante da modernidade/colonialidade, isto é, a própria atitude descolonial”. Suscitando o ímpeto por formas de ser, estar e existir, modelos de resistência surgem progressivamente à revelia das imposições coloniais, violentamente implantadas. O decolonial representa, portanto, “um caminho de luta contínua no qual se pode identificar, visibilizar e estimular ‘lugares’ de exterioridade e construções alter-(n)ativas” (WALSH, 2017, p. 25; tradução minha2).

3 Aspectos metodológicos

Neste trabalho, resultante de pesquisa de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Piauí (UFPI), apresentamos uma parte dos resultados obtidos a partir de uma investigação de campo qualitativa com coletivos ou coletivas juvenis na cidade de Teresina (PI), atuantes entre os anos de 2011 e 2021, selecionados nas mídias sociais virtuais Instagram e Facebook. Por tratar-se de uma fração específica da pesquisa3, relacionada aos aspectos estéticos desses agrupamentos, são apresentados aqui dados obtidos a partir de entrevistas, observação direta e pesquisa documental com quatro coletivos: Coletiva Lésbica Piauiense, Corpo Gordo Livre, Salve Rainha e Não é Não Piauí. No Quadro 1 está demonstrada a temática principal abordada por cada coletivo e o período de atuação – sendo este influenciado pela eclosão da pandemia de covid-19.

Quadro 1.
Campo de atuação e período de atuação dos coletivos estudados
COLETIVO/ATEMÁTICA PRINCIPALPERÍODO DE ATUAÇÃO
Corpo Gordo LivreCorpos gordos femininos2019 - 2020
Coletiva Lésbica PiauienseIdentidade de Gênero Sexualidade2019 - 2020
Não é Não (Piauí)Combate ao assédio Feminismos2020 - presente
Salve RainhaDireito à cidade Patrimônio Artes2014 - 2018
Fonte: Elaborado pela autora (2022)

A pesquisa foi submetida à avaliação e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com o Parecer consubstanciado nº 4.416.152, sendo os sujeitos abordados mediante Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em que autorizaram a divulgação e publicização ou não de seus nomes reais. As entrevistas foram realizadas em sessões de grupos focais com sete representantes desses agrupamentos. Em função da pandemia de covid-19, as sessões ocorreram por intermédio da plataforma virtual Google Meet. As falas foram transcritas literalmente, a fim de manter a fidelidade dos enunciadores. A pesquisa documental consistiu na seleção e observação de postagens desses agrupamentos nas mídias sociais virtuais Instagram e Facebook. A técnica da observação permitiu um olhar panorâmico para o objeto de estudo, a partir do cruzamento da análise documental e discursiva de publicações dos/as coletivos/as em suas páginas virtuais e das sessões de entrevistas coletivas. Tanto as entrevistas quanto postagens nas mídias sociais foram analisadas por meio do método de Análise Crítica do Discurso (ADC), a partir do modelo tridimensional (texto, prática discursiva e prática social) de Fairclough (2016).

Considerando o texto dentro da dimensão da linguagem, este pode apresentar-se de modo verbal (fala e escrita), não verbal (imagens, gestos, sons, comportamentos, etc.) ou misto. Os textos podem ser produzidos em distintas situações sociais, formais ou informais, sendo produtos de um processo e, também, um produto em si (MAGALHÃES; MARTINS; RESENDE, 2017). No modelo tridimensional faircloughiano, a dimensão do texto preocupa-se com a análise linguística de textos. A prática discursiva, mediadora do texto e da prática social, é a dimensão que diz respeito aos processos de produção, distribuição e consumo dos textos. Contribui para a reprodução ou transformação de identidades e relações sociais, sistemas de conhecimento e crenças na sociedade. O discurso como prática ideológica constitui, mantém ou modifica significações de mundo; como prática política, empenha-se no estabelecimento, manutenção ou transformação das relações de poder e das entidades coletivas (classes, blocos, comunidades, grupos) (RESENDE; RAMALHO, 2004).

4 Transcendências estéticas: a ação de coletivos e coletivas juvenis em Teresina

O campo estético mostrou-se um componente significativo no escopo de atuação dos coletivos estudados. A partir da análise das entrevistas, das postagens em suas mídias sociais virtuais e da observação/participação em suas ações, foi possível identificar três categorias principais de expressões estéticas acionadas pelos coletivos: uso de vestimentas, uso de artefatos e usos do corpo/performances.

No âmbito das colonialidades, a estética também foi incorporada pela racionalidade colonial-moderna, a partir da atribuição da arte como expressão de beleza e a da estética como filosofia da arte. Mignolo (2010a) pontua que a palavra estética deriva do termo grego aesthesis, que, etimologicamente significa sensação, processo de percepção. A partir do século XVII, o termo restringiu as sensações apenas ao âmbito do “belo”, dando origem aos conceitos de estética como teoria e arte como prática. Nesse sentido, o autor ressalta o papel da estética em práticas decoloniais. Seja na arte ou além dela, tais processos performativos representam “futuros decoloniais” que contribuem para a “decolonização da história e da crítica de arte, além da construção de uma aesthesis e subjetividade decoloniais” (MIGNOLO, 2010a, p. 25. tradução minha4). É o que Tlostanova (2011) chama de aesthesis trans-moderna, uma tática de libertação da estética dos mitos da modernidade ocidental. Isto é, considerando a estética para além da beleza e do belo, mas no amplo campo das sensações e percepções intersubjetivas.

4.1 Coletivo Salve Rainha

O termo coletivo foi e ainda é largamente utilizado no campo das Artes como referência a grupos de jovens artistas que se organizam em formato coletivo para desenvolver trabalhos artísticos fora de espaços institucionalizados/mercantilizados (ALBUQUERQUE, 2008). No Brasil, há registros de atividade de coletivos artísticos nas décadas de 1970 e 1980, muito embora um hiato arrefecesse as formações, que só reacenderiam nos anos de 1990 com a expansão do papel do/a artista dentro do circuito de arte, que deixou de atuar apenas na produção de obras e passa a se engajar em atividades como a discussão acerca do circuito brasileiro de arte, o agenciamento de exposições, a promoção de debates, o exercício do papel de crítico/a ou curador/a, o fomento de outras produções etc. (ALBUQUERQUE, 2008).

Na cidade de Teresina, um dos coletivos artísticos de atuação mais significativa foi o Coletivo Salve Rainha, ativo entre os anos de 2014 e 2018. A estética do Coletivo sempre esteve relacionada a elementos políticos, seja no uso de vestimentas, artefatos ou corpo/performance.

(01) […] ele [o coletivo] se propõe a fomentar debates em torno de Direitos Humanos. É um coletivo formado por pessoas diversas, então a gente levantava sim bandeiras e defendia essas bandeiras, fosse dentro do evento que a gente fazia, fosse numa entrevista que a gente fosse, na TV. E eu acho que isso também passa pela estética , né? Então, nunca houve uma tentativa de maquiar o que a gente era, quando a gente ia pra TV, por exemplo. As bichas iam de saia, iam maquiadas. E também é sobre coletividade, sobre mostrar que é possível, através da coletividade, né, tentar engajar nesse sentido de fazer as pessoas perceberem que se juntando pode reverberar (RENATA, SALVE RAINHA – grifos meus).

No texto (01), a integrante Renata ressalta que o Coletivo Salve Rainha é “formado por pessoas diversas”. Como tal, tem como propósito o “fomento ao debate” em torno da temática de “Direitos Humanos”, o que abrange diversas formas de expressão dos/as sujeitos/as, inclusive a estética. A enunciadora aciona o termo estética no sentido de sua origem etimológica grega, aesthesis, relacionado ao campo das sensações e processos de percepção (DUSSEL, 1997; MIGNOLO, 2010a). E utiliza o vocábulo “maquiar” em dois contextos complementares: ao tempo em que manifesta que os/as integrantes do Coletivo nunca pretenderam ocultar suas identidades (“nunca houve uma tentativa de maquiar o que a gente era”), a forma transparente com que se expressavam reverberava no próprio fato de integrantes homens utilizarem acessórios e vestimentas socialmente atribuídos ao sexo feminino, como maquiagem no rosto ou saias (“as bichas iam de saia, iam maquiadas”).

Nesse sentido, além de revelar aspectos subjetivos dos sujeitos, a estética no uso de vestimentas e artefatos também implica a forma como a coletividade é por ela afetada. Representa, assim, uma estética transgressora à norma que designou as vestes em termos de gênero, portanto uma estética decolonial, uma estética dos afetos. Segundo Rodrigues e Brandão (2014, p. 681), “a estética decolonial se insurge como um contrapoder, um ato de resistência que visa à formação de subjetividades decoloniais”. Como frisa Dussel (1997), isso representa a superação da estética como teoria subjetiva atrelada à vivência sensível do belo, implicando, pois, algo mais amplo e profundo. No âmbito dessa amplitude, a estética dos afetos “trata de questões que abrangem a vida como um todo e se pauta em conceitos relacionados ao modo como somos afetados sensivelmente pelo mundo” (BEDORE; BECARRI, 2017, p. 487).

Os integrantes do Salve Rainha participaram de um programa de TV de uma emissora local, em 2016, todos/as usando camisetas exclusivas do Coletivo e saia (Figura 1). Na fotografia, à direita, está Francisco das Chagas Júnior, um dos fundadores do Salve Rainha.

Integrantes do Coletivo Salve Rainha em Programa de TV (2016)
Figura 1.
Integrantes do Coletivo Salve Rainha em Programa de TV (2016)
Fonte: Instagram do Coletivo Salve Rainha (@salverainhacafe)

(02) […] porque o legal que eu acho no Salve Rainha é a produção artística, né? Porque o pessoal que tava produzindo muitas vezes não expunha os seus trabalhos, muitos eram artistas, mas não expunham os seus trabalhos, mas a simples produção já era artística, né? Porque tinha a questão dos ensaios, né, que faziam aqueles ensaios fotográficos, colocavam na Internet, parecia um teatro de imagens, assim e tal. Então tem toda essa pegada da produção artística [...] Eu achava massa que no Salve Rainha sempre no final do ensaio, né – que era a temporada, tinha os ensaios, né, os “Domingos”. Aí no final de cada domingo, bem no finalzinho, tinha uma foto coletiva, “pah” – que dificilmente eu participava porque eu já tava tão exausto e queria ir embora, ́né? Aí tinha a foto coletiva que era postada lá. Então assim: andar junto, se vestir… tinha uma parada de estilo mesmo… porque eu achava o Salve Rainha interessante porque quando eu andava lá parecia um desfile de moda, todo mundo com o estilo muito autêntico, muito empoderado, sabe? Então tinha essa questão, a galera lá que compõe o Coletivo, muitos andavam de saia, né? Uma androginia assim… então tinha um… era bem visível mesmo, né, que era parte ali […] (ALEX, SALVE RAINHA – grifos meus).

(03) Então, eu acho que dentro desse entendimento de estética e de linguagem que foi construído pelo Salve, acho que uma palavra sempre resumiu muito a nossa proposta do estético, que é o esquisito. Se tá esquisito, se tá estranho, é porque combina. Tá tudo ótimo, tá perfeito! Então quanto mais esquisito tiver, mas a gente consegue se identificar e ficar confortável e deixar outras pessoas confortáveis, né? Acho que o Júnior foi uma das primeiras bichas a tá usando saia na rua, e tranquilamente. Então, depois que essa bicha fez isso muitos outros homens se sentiram confortáveis, apesar de tudo, né? Apesar de… tipo assim, de levar a saia dentro da bolsa e vestir só no Salve Rainha porque ainda não conseguia se sentir 100% confortável pra sair de casa assim. E que isso envolve tantas outras coisas que nós sabemos, né? Mas passou por muitos processos pra que isso fosse ok, né? Acho que a coroa também tem esse símbolo da rainha que o coletivo carrega, de coroar, de saber celebrar e respeitar essa rainha que é a cidade, né? Eu acho que tem muito dos Orixás também, né? Afinal é a rainha das águas que rege o Coletivo, né? Ela é a mãe do Coletivo. O grito também, né? Aquele grito rasgado que todos fazem – que não vou fazer agora porque não vou acordar meus vizinhos mesmo, então [risos]. A cabeça de boi também, né, que eu acho que é o símbolo da resistência do Coletivo. Então, são elementos que sempre nos acompanharam e que a gente faz questão que se mantenham porque a gente constrói, né, um visual em cima disso, que foi feito na base de muito estudo, de muita luta, né, sabedoria ancestral, a gente respeita muito isso (CAMILA, SALVE RAINHA – grifos meus).

Como frisado pela integrante Camila (03), “o Júnior foi uma das primeiras bichas a tá usando saia na rua, e tranquilamente”, algo que encorajou outros homens a utilizarem essa vestimenta, ainda que, em função da violência, o uso se restringisse a lugares que oferecessem maior segurança e conforto, como os eventos do Coletivo (“Apesar de… levar a saia dentro da bolsa e vestir só no Salve Rainha”). Ao adotar uma “estética do esquisito”, o Coletivo oferecia maiores possibilidades de gerar identificação e conforto não apenas para seus/suas integrantes, mas também para “outras pessoas”. Como lembra Alex (02), outro integrante do Coletivo, essa proposta estética era bastante perceptível desde os “ensaios fotográficos” que o Salve Rainha realizava para a divulgação das temporadas, uma “produção artística”, que, em seus termos, representava um “teatro de imagens”. Alex utiliza as seleções lexicais “uma parada de estilo” e “parecia um desfile de moda” para caracterizar a estética do Coletivo durante a realização dos eventos. Já os léxicos “autêntico”, “empoderado” e “androginia” fazem referência às contravenções da norma social quanto à utilização de vestimentas, principalmente a partir de uma classificação binária de gênero.

A propósito da dimensão estética nas expressões artísticas do Salve Rainha, recordamos as considerações de Dussel (1997) sobre a relação entre estética e ser e a função desveladora dos/as artistas, que, por meio de sua intuição e inspiração, conseguem distanciar-se do estado das coisas, da conformidade do status quo, e revelar aquilo que se encontrava oculto. Para o autor, a missão do artista é compreender o ser em um mundo que, necessariamente, é cultural e histórico, visto que “o artista é muito mais que um imitador e sua missão é muito mais elevada e humana do que a mera expressão da beleza, principalmente quando é entendida apenas como experiência subjetiva” (DUSSEL, 1994, p. 291; tradução minha5).

Uma das características fundamentais que dão substancialidade aos coletivos artísticos é a sua atuação questionadora acerca do que se define como arte, ao utilizarem-se do estético como meio, e não como fim, em espaços não institucionalizados e, portanto, não mercantilizados. Desse modo, é comum que as ações desses grupos ocorram em comunidades periféricas e/ou nas mídias independentes, cuja plateia constitui-se de pessoas comuns, no cotidiano. Como tal, “se diluem em atos efêmeros, inefáveis, ou pontuais e marcantes, de acordo com a filosofia própria de cada grupo, mas que supostamente questionam todo um circuito instituído de exposição-público-mercado” (ROSAS, 2006, p. 29). Ultrapassam a simples conotação de plateias, em práticas de intervenções coletivas, instalações e processos mais diretamente interativos. Assim, os coletivos de artistas “expressam uma postura crítica frente ao sistema das artes, atuando de forma propositiva em relação a ele” (ALBUQUERQUE, 2008, p. 78).

O ensaio fotográfico de agosto de 2016 realizado para a divulgação da Bienal do Coletivo, que ocorreu em setembro do mesmo ano, está ilustrado na Figura 2. Ensaios fotográficos produzidos para as temporadas do Salve Rainha representavam, simultaneamente, um instrumento de ação e uma expressão estética que combinava o uso de vestimentas e de corpo/performance.

Ensaio fotográfico para divulgação da Bienal do Coletivo Salve Rainha (2016)
Figura 2.
Ensaio fotográfico para divulgação da Bienal do Coletivo Salve Rainha (2016)
Fonte: Facebook do Coletivo Salve Rainha (@salverainhacafe)

A propósito da divisão binário-sexista da sociedade, também impressa no vestuário, as narrativas comuns sobre o uso de saia por integrantes homens do Coletivo explicitam o caráter transgressor do fato de homens utilizarem roupas e/ou acessórios atribuídos como femininos. Como enfatizado por Lugones (2020), o sistema colonial-moderno de gênero foi fundamentado a partir de uma construção social-discursiva em torno do homem (branco-burguês), que historicamente foi detentor das esferas da autoridade coletiva, da produção de conhecimento e do controle dos meios de produção. Nesse sentido, o uso de vestimentas atribuídas como femininas, por homens, significa a desobediência à inviolável normatividade patriarcal constitutiva da masculinidade padrão.

A partir desses contrausos, portanto, integrantes do Salve Rainha realizavam uma transgressão estética por meio de seus corpos/performances e do uso de vestimentas não apenas contestando a ordem social colonial-moderna, mas também demonstrando, nas palavras de Renata (01), “que é possível, através da coletividade”, apresentar e experienciar modos outros de ser e viver no mundo. Refletindo a partir de Lugones (2019), enquanto a modernidade nega princípios ontológicos distintos àqueles por ela impostos, transgressões como esta representam a resistência à colonialidade de gênero – que se realiza na práxis coletiva de vivências compartilhadas. A autora reforça que a colonialidade de gênero ainda está bastante incrustada em nosso cotidiano devido à constante renovação da construção social que impõe a internalização da dicotomia homens/mulheres e suas normas. Para o enfrentamento dessa lógica ela propõe a decolonização de gêneros, isto é, “transformar uma crítica da opressão de gênero – racializada, colonial, capitalista e heterossexista – em uma mudança viva da sociedade; colocar o teórico no meio das pessoas em um entendimento histórico, humano, subjetivo/intersubjetivo da relação oprimir-resistir na intersecção de sistemas complexos de opressão” (LUGONES, 2019, p. 363).

Além de expressões estéticas a partir de vestimentas e corpo/performance, Camila (06) também destaca o uso de alguns artefatos que expressam a estética do Coletivo, como a “coroa”, a “cabeça de boi” e os “Orixás”. A coroa é um símbolo que compõe o logotipo do Salve Rainha, representando o ato de “coroar, de saber celebrar e respeitar essa rainha que é a cidade”. Na Figura 3, o logotipo do coletivo apresenta seu nome em letras maiúsculas, deixando explícita a relevância da mensagem. A coroa, ornamento que representa soberania ou nobreza, é o elemento simbólico de destaque. A partir de uma metáfora, Teresina é a rainha coroada.

Logotipo do Salve Rainha
Figura 3.
Logotipo do Salve Rainha
Fonte: Facebook do Coletivo Salve Rainha (@salverainhacafe)

Carcaças de cabeças de boi, tidas como “o símbolo da resistência do Coletivo”, eram utilizadas em ensaios fotográficos, em exposições ou em artes gráficas publicadas nas mídias sociais do Salve Rainha. O uso do artefato também expressa regionalismo, tendo em vista a representatividade do boi, no Piauí, nos âmbitos histórico e econômico, em razão da expansão dos domínios de fazendas de gado no período de colonização do Estado; e no âmbito cultural, a partir do surgimento da manifestação folclórica Bumba-Meu-Boi.6

Na Figura 4 estão ilustrados, da direita para a esquerda, cartazes de divulgação das temporadas de setembro de 2015 e de maio de 2016. Em ambos, é possível visualizar ensaios fotográficos em que integrantes homens do Coletivo estão usando saias e carcaças de cabeça de boi usadas em sua composição, explicitando expressões estéticas no uso de vestimentas e artefatos. Além de elementos regionais, o Coletivo também demonstrava sua diversidade em termos religiosos ao utilizar a representação de “Orixás”, especificamente Iemanjá, em suas artes gráficas ou durante os eventos, como o domingo intitulado “Rainha das Águas”.

Divulgação de temporadas do Coletivo Salve Rainha (2015 e 2016) – ensaios fotográficos e carcaças de cabeça de boi
Figura 4.
Divulgação de temporadas do Coletivo Salve Rainha (2015 e 2016) – ensaios fotográficos e carcaças de cabeça de boi
Fonte: Facebook do Coletivo Salve Rainha (@salverainhacafe)

4.2 Coletiva Lésbica Piauiense

Além de coletivos no campo das artes, agrupamentos de outros campos, temáticas e pautas passaram a utilizar esse termo em sua nomenclatura. Foram surgindo, assim, coletivos urbanos, culturais, educativos, negros, feministas, apenas para citar alguns. A expansão de agrupamentos intitulados “coletivos” é fenômeno de observação de vários pesquisadores/as no Brasil, em diferentes campos do conhecimento, sobretudo nas áreas de Artes, Arquitetura e Urbanismo, História, Antropologia, Sociologia e Ciência Política. A temática tem sido estudada em diversas regiões em busca do entendimento sobre a “participação da sociedade civil no processo de mudança dos usos dos espaços públicos através do fortalecimento dos valores civis e do empoderamento da comunidade” (HORI, 2017, p. 5). Entre os distintos agrupamentos coletivos existentes na cidade de Teresina, muitos estão organizados em torno de pautas relacionadas a marcadores sociais da diferença, como gênero e/ou raça (PEREZ, 2017), com atuação tanto a partir da ocupação de espaços físicos quanto por intermédio de suas mídias sociais digitais (COIMBRA; MORAIS, 2020).

No amplo repertório de suas ações e intervenções, chama a atenção os modos de apresentação desses grupos, incluindo aí seus modos de enunciação, como no caso da Coletiva Lésbica Piauiense.

(04) Então, eu acho que primeiro é dizer que a gente usa o termo coletiva, no feminino, pra quebrar essa coisa de que todas as palavras são no masculino, e é uma coletiva de mulheres lésbicas. Então a gente resolveu que usar no feminino, mesmo que a palavra, teoricamente, não exista, né. Era, tipo, mostrar isso, né, que a gente tá ali, em grupo de mulheres (…) é sobre pautar aquilo que poderia ser pessoal, mas que, na verdade, não é só pessoal, é de todo mundo (LUARA, COLETIVA LÉSBICA PIAUIENSE – grifos meus).

No texto (04), a idealizadora da Coletiva, Luara, utiliza o léxico “primeiro” para definir a prioridade na contextualização dessa nomenclatura como elemento fundamental para compreender as argumentações posteriores em relação ao grupo de que faz parte. A intencionalidade empregada no neologismo “coletiva”, expresso “no feminino”, denota, como diz Fiorin (2009, p. 149), “a natureza intrinsecamente política da linguagem e de suas manifestações, as línguas”. A lógica patriarcal, que, entre as várias dimensões do cotidiano, também foi implantada na língua portuguesa, não raro secundariza ou mesmo anula mulheres e pessoas não binárias. Assim, “quebrar” a norma da língua já é, em si, uma ação contestatória. E se, “teoricamente”, o vocábulo não é reconhecido pela norma padrão, o implícito pressuposto é que no âmbito prático ela – a coletiva – existe. Em Teresina, outras organizações coletivas autointitulam-se no feminino, como a Coletiva Batuque Feminista, a Coletiva Enefar e a Katias Coletivas; além de apresentações em linguagem não binária (Coletive CORPOBixa).

Gohn (2007) ressalta que mulheres lideram a quantidade de ações coletivas no Brasil. Além dos movimentos feministas, as mulheres também são o maior quantitativo em movimentos populares por melhores condições de vida e trabalho; por reconhecimento de direitos sociais, políticos e culturais; e, ainda, na participação em redes e fóruns transversais, inclusive internacionais. A própria generalização de sujeitos em ação como atores sociais e políticos despreza a realidade da participação de mulheres, deixando-as “encobertas pelo véu da denominação de um gênero masculino” e, nesse sentido, é preciso visibilizar as “atrizes dos movimentos sociais” e suas demandas, amplas e específicas (GOHN, 2007, p. 65, grifo meu), visibilização essa que deve considerar os distintos atravessamentos que heterogeneízam os movimentos de mulheres, como cor/raça, classe, gênero, orientação sexual e corpo.

Expressões estéticas de corpo/performance e com a utilização e artefatos também são encontradas na Coletiva Lésbica Piauiense.

(05) Com relação à estética do coletivo… no nosso caso, eu creio que não exista uma específica porque a gente tem que se adaptar a todos os públicos, né? Como a gente tem esses dois movimentos, a gente vê uma maior liberdade estética nas reuniões abertas ao público, que a gente faz no Parque da Cidadania, por exemplo. Que aí a gente vê uma expressão corporal mais específica das meninas que participam, né, questão de tatuagens, corte de cabelo, que aí a gente até se identifica, né, com elas. E também a questão da não performance de feminilidade, como eu já falei, que é também uma questão bem pertinente nas nossas discussões porque você vai ver lésbicas que performam e as que não performam, e aí são duas discussões diferentes e ambos os públicos participam das nossas reuniões. Já nas escolas é um contexto mais… como é que eu posso dizer, é um contexto mais formal que a gente não tem essa liberdade estética, a gente tem que se portar como a gestão permite que a gente se porte. Por exemplo, quando eu fui fazer a palestra eu fui da forma que eu dou aula todo dia. Eu não posso me dar a liberdade de me portar como eu me porto na reunião no Parque da Cidadania, por exemplo. É totalmente diferente. Até porque a gente tá sendo supervisionado, querendo ou não, a Secretaria de Educação sempre manda alguém pra supervisionar palestra e pra depois nos questionar sobre alguns pontos, né […] (CAJUÍNA, COLETIVA LÉSBICA PIAUIENSE – grifos meus).

No texto (05), a integrante Cajuína apresenta um interdiscurso que contrapõe liberdade versus restrição quanto à expressão estética de corpo/performance de mulheres lésbicas. No primeiro caso, cita que as reuniões da Coletiva Lésbica Piauiense constituem espaços que oferecem “uma maior liberdade estética”, em que tatuagens ou determinados cortes de cabelo ou qualquer expressão estética relacionada à “não performance da feminilidade” não são tratados com ojeriza. Por outro lado, a seleção lexical “a gente tem que se adaptar” deixa explícito que há uma imposição no âmbito social que condiciona e restringe os modos de expressão em determinados lugares e/ou no trato com determinados públicos. É o caso das escolas, espaços onde, como frisa Cajuína, “a gente não tem essa liberdade estética”. As seleções lexicais “é um contexto mais formal”, “a gente tem que se portar como a gestão permite” e “a gente tá sendo supervisionado” expressam o rigor e a vigilância como elementos organizadores do comportamento social, características fundamentais do ambiente escolar moderno como uma instituição disciplinar (FOUCAULT, 1999).

(06) A gente tinha uma estética de reunião, de ser encontrada, né. Porque, tipo assim, como a gente faz reunião em locais abertos, como por exemplo o Parque da Cidadania ou… a gente já fez também lá no Esperança Garcia, mas muitas no Parque da Cidadania, e aí a gente sempre tinha uma bandeira LGBT bem grande pra que a gente fosse facilmente identificadas ali como sendo a reunião. Porque a bandeira lésbica, tem duas bandeiras, nem todo mundo consegue identificar e aí como é um processo ainda de reconhecimento, né, a gente prefere usar a bandeira LGBT, que essa todo mundo conhece, né, é facilmente identificada. E aí também chamava pessoas que, às vezes, tão passando, mulheres tão passando e aí veem a bandeira, acontecia muito, e perguntavam “o que vocês tão fazendo aí, o que é?”, e aí se aproximavam da reunião pra participar […] (LUARA, COLETIVA LÉSBICA PIAUIENSE – grifos meus).

A fotografia de reunião da Coletiva com a utilização da bandeira colorida está ilustrada na Figura 5. A utilização de “uma bandeira LGBT bem grande” é um artefato que também expressa esteticamente a identidade da Coletiva Lésbica Piauiense e que funciona como instrumento de comunicação com os públicos sobre a localização das reuniões (“ser encontrada”). Luara (03) ressalta que, por se tratar de “um processo ainda de reconhecimento”, nem todas as pessoas saberiam identificar a bandeira com o machado – que, inclusive, faz parte do logotipo da Coletiva – e, desse modo, a utilização da bandeira colorida facilita esse reconhecimento, já que, segundo ela, “essa todo mundo conhece”.

No logotipo apresentado na Figura 6, o nome da coletiva é apresentado em letras maiúsculas, direcionando a atenção para a palavra “LÉSBICA”, disposta em uma fonte maior que as demais e em negrito. Acima do título, vê-se a figura de um machado de lâmina dupla denominado labrys, um instrumento utilizado por Amazonas há 7.000/6.500 anos antes de Cristo (LABRYS…, 2019), simbolizando a força e a resistência do movimento lésbico. O pano de fundo da imagem é a cor roxa ou lilás, que representa a luta feminista.

Reunião da Coletiva Lésbica Piauiense com bandeira LGBT
Figura 5.
Reunião da Coletiva Lésbica Piauiense com bandeira LGBT
Fonte: Instagram da Coletiva Lésbica Piauiense (@coletivalesbicapi)

Logotipo da Coletiva Lésbica Piauiense
Figura 6.
Logotipo da Coletiva Lésbica Piauiense
Fonte: Instagram da Coletiva Lésbica Piauiense (@coletivalesbicapi)

4.3 Coletivo Não é Não

Também atuando com temáticas relacionadas a corpo e feminismos, o Coletivo Não é Não surgiu em 2017, no contexto do carnaval de rua do Rio de Janeiro. Após episódios de assédio, um grupo de amigas organizou o Coletivo, que nos anos seguintes teve a aderência de mulheres de outros Estados, chegando ao Piauí em 2020. A principal ação do Coletivo consiste na distribuição gratuita de tatuagens temporárias em mulheres que participam de carnavais de rua. Na Figura 7, duas mulheres exibem as tatuagens distribuídas pelo Coletivo Não é Não.

Postagens relacionadas ao combate ao assédio promovido pelo Coletivo Não é Não
Figura 7.
Postagens relacionadas ao combate ao assédio promovido pelo Coletivo Não é Não
Fonte: Facebook do Coletivo Não é Não (@tatuagensnaoenao)

(07) Em questão de linguagem, é mais o falar mesmo, fora o carnaval, que no carnaval a gente utiliza o nosso corpo também, de transformar nosso corpo em outdoor, mas fora isso a gente utiliza bastante a fala mesmo, o falar, e as redes sociais também, como mais informativo (RACHEL, NÃO É NÃO PIAUÍ – grifos meus).

Combinando a estética relacionada à vestimenta e corpo/performance, a integrante Rachel (07), do Coletivo Não é Não Piauí, ressalta o corpo como um instrumento político, sendo o principal veículo de ação do Coletivo Não é Não no Carnaval, com a distribuição das tatuagens temporárias (“transformar nosso corpo em outdoor”). Em paralelo, o Coletivo atua ativamente nas “redes sociais” – principalmente durante a pandemia, com as medidas sanitárias de isolamento social e a suspensão das festas carnavalescas – problematizando sobre diversas temáticas relacionadas à gênero e sexualidade, de forma interseccional. Na Figura 7, as postagens do Coletivo são compostas de frases que combatem discursos machistas e misóginos: à esquerda, a frase “e a culpa não era minha, nem onde estava nem o que vestia” contrapõe-se ao discurso de culpabilização de mulheres vítimas de estupro em função da roupa que vestiam ou do local que frequentavam; à direita, a frase “lugar de mulher é onde ela quiser” contrapõe-se a discursos normatizadores que limitam as funções das mulheres a atividades do lar, como determinado em expressões como “lugar de mulher é na cozinha” ou “mulher no volante, perigo constante”.

Partindo dessa concepção sobre corpo político, no texto (08), a embaixadora do Não é Não no Piauí, Luana, relata sobre uma ação local do Coletivo, durante o Carnaval de 2020, que ficou conhecida como “bundaço”.

(08) O Bundaço foi uma ideia minha, nossa, ali dentro do Coletivo, aqui em Teresina, muito de reparar aquilo que falei pra vocês da diferença entre o carnaval de rua daqui e o carnaval de rua em São Paulo, no Rio, que as meninas vão seminuas, assim, né? E aqui notei muito esse pudor, né, muito, uma coisa muito é… um tabu danado sobre mostrar o corpo – o que não faz o menor sentido porque o calor danado dessa cidade e as meninas saem na rua toda vestida, assim, em pleno carnaval. Aí eu percebi isso nas vozes das próprias voluntárias do Coletivo, que havia esse desejo, essa vontade de sair de body, sair de biquíni, mas que elas não se sentiam seguras. Então, assim, isso só reforçou a necessidade da nossa ação, né, no carnaval. Quando eu percebi que a maioria não ia, não era por vergonha do próprio corpo ou por tabu, era por medo, sabe? E é muito comum na fala delas assim: “ah em Salvador eu fui de body, em Teresina eu não tenho coragem”. Então, assim, o que muda de uma cidade pra outra que você não consegue usar a mesma roupa, sabe? E aí eu combinei um dia que foi muito, assim, quase que de brincadeira que surgiu, sabe, que em uma das reuniões eu disse “pois vamos fazer um combinado aqui: no bloquinho do dia oito, lá na praça, vai todo mundo de body, de bunda de fora”. Aí todo mundo “ah, se vocês forem eu vou”. Então foi uma coisa quase que… deu pra perceber que era uma coisa de se sentir acompanhada, né, assim, de “ah, se vocês forem eu também me sinto à vontade de ir e aí a gente fica junto e a gente se protege”. E aí achei que poderia transformar isso em um ato simbólico contra toda essa opressão, né, que as meninas não vão de maiô por achar que chegar lá o cara vai passar a mão na bunda dela porque ela tá de maiô. E aí eu disse “não, vamo e ainda vamo colar o Não é Não na bunda que é para a mensagem ficar ainda mais clara, se não se tocar, vamo desenhar aqui pra eles verem”. E aí foi bem bacana porque a imprensa repercutiu, né? Eu mandei release pros portais e aí eles fotografaram e foi capa de jornal e tudo. Mas não foi só coisa boa também, assim. Eu achei a repercussão muito boa, eu até enquadrei o jornal, eu tenho aqui e tudo, mas a gente também foi muito criticada. Assim, no Instagram lá do Jornal O Dia, que postou, choveu comentários, assim, de caras falando “ah, que pouca vergonha!” ou fazendo comentários não solicitados sobre o nosso corpo, né? E outros comentários também nas redes sociais, no Twitter, principalmente, de meninas – de meninas também! – dizendo assim: “ah, e esse movimento Não é Não aí é sério mesmo? Ele é político ou ele é só bunda de fora?”, como se bunda de fora também não fosse político, né?! Então, tem muito isso… é engraçado porque vem elogio e crítica na mesma proporção e vem de todos os lados, né? Mas faz parte também, foi bem legal a experiência (LUANA, NÃO É NÃO PIAUÍ – grifos meus).

Segundo Luana, o “bundaço” tinha como objetivo contestar o “pudor” e o “tabu” sobre os corpos de mulheres no uso de roupas como “bodys” ou “biquínis” em blocos carnavalescos de Teresina. Luana explicita que, apesar do “desejo” de uso dessas vestimentas, as garotas do Coletivo compartilharam “que não se sentiam seguras”, temendo serem assediadas (“não era por vergonha do próprio corpo ou por tabu, era por medo, sabe?”). A segurança surgiu da proposta de uso coletivo das vestimentas e de permanecerem juntas durante o evento (“se sentir acompanhada; a gente se protege”). Por serem roupas que deixavam a bunda à mostra, a iniciativa ficou conhecida como “Bundaço” e representou um “ato simbólico contra toda essa opressão” sobre os corpos femininos, levantando provocações e ressignificações em torno “de um corpo construído historicamente, alvo e efeito de artefatos culturais e pedagógicos para um corpo político” (COLLING; ACOM, 2019, p. 129).

Embora a ação tenha repercutido na mídia local7, chegando a virar “capa de jornal”, Luana destaca que “não foi só coisa boa; a gente também foi muito criticada.” O ato recebeu críticas tanto de homens quanto de mulheres, que questionaram a seriedade do projeto pelo fato de as integrantes do Coletivo não vestirem ou performarem aquilo para o qual corpos femininos foram normativamente estruturados para vestir ou performar (“esse movimento Não é Não aí é sério mesmo? Ele é político ou ele é só bunda de fora?”). Isso demonstra que práticas decoloniais não passam despercebidas aos olhos atentos e vigilantes de grupos que reproduzem as normas e os padrões hegemônicos da colonialidade-modernidade, isto é, práticas decoloniais não emergem sem a contestação de grupos reacionários.

A propósito, o SlutWalk ou Marcha das Vadias representa uma das manifestações feministas contemporâneas mais significativas no campo da liberdade de escolha de mulheres em combate ao discurso que culpabiliza suas vestimentas e comportamentos como justificativas para abusos e violências sexuais. Como frisam Colling e Acom (2019, p. 136), “a ideia de que as roupas femininas têm alguma influência sobre elas serem estupradas é uma concepção errada e moralmente equivocada” e, nesse sentido, no campo das lutas sociais contra estas violências, manifestações como o “Bundaço” demonstram que não apenas o corpo, mas, especificamente, a bunda é política, sim. A Figura 8 ilustra fotografia de integrantes do Coletivo Não é Não Piauí durante o ato “Bundaço”.

Integrantes do Coletivo Não é Não Piauí em “Bundaço” no Carnaval de 2020
Figura 8.
Integrantes do Coletivo Não é Não Piauí em “Bundaço” no Carnaval de 2020
Fonte: https://cidadeverde.com/noticias/318454/campanha-distribui-tattoos-e-combate-importunacao-sexual-nos-bloquinhos

4.4 Coletivo Corpo Gordo Livre

Expressões estéticas de corpo/performance também estão presentes no Coletivo Corpo Gordo Livre, surgido em Teresina, no ano de 2019, com o objetivo de problematizar questões relacionadas ao corpo gordo, especificamente de mulheres. O texto (09) apresenta narrativa de Anna, idealizadora do Coletivo.

(09) Mas, no geral, ele [o Coletivo] foi criado pra gente conseguir falar sobre o nosso corpo, pra gente desmistificar o nosso corpo. Na verdade a história, o nome Corpo Gordo Livre, a gente frisa o gordo porque por muito tempo, na minha cabeça, e creio que na cabeça de todo mundo, o gordo foi visto como uma palavra pejorativa, é uma palavra… é um xingamento, nunca foi visto como um ideal de beleza, exceto na era renascentista, mas, hoje em dia, sempre foi visto como um sujo, um corpo desumanizado e é por isso que a gente tá na luta pra poder desmistificar esse corpo, é… e também sobre a nossa acessibilidade porque não vem só a estética […] foi criado justamente pra gente falar sobre acessibilidade desse corpo, principalmente na nossa cidade porque eu tô falando a nível de Teresina, né, porque eu moro em Teresina, nós moramos em Teresina, nosso coletivo, só que é muito difícil a gente chegar até esse ponto de falar sobre acessibilidade, de buscar algo, de melhorar algo pra gente (ANNA, CORPO GORDO LIVRE – grifos meus).

No texto (09), Anna aciona a palavra “estética” em seu sentido moderno, relacionado ao campo da beleza, ao tempo em que destaca que a ação do Coletivo Corpo Gordo livre contesta o padrão estabelecido na modernidade-colonialidade, apontando que o corpo gordo “nunca foi visto como um ideal de beleza”. A enunciadora relata, ainda, que o nome do coletivo tem o objetivo de enfatizar o corpo gordo (“a gente frisa o corpo gordo”) como uma forma de enfrentar a violência histórica que o atravessa, como explicitado nas seleções lexicais “uma palavra pejorativa”, “xingamento”, “sujo” e “desumanizado”. O vocábulo “livre” reivindica a libertação desses corpos em relação aos/às seus/suas opressores/as.

Para além de uma violência normativa no campo da estética (“não vem só a estética”), violências acontecem, ainda, na dimensão do trânsito de corpos gordos e, portanto, de acessibilidade (“acessibilidade desse corpo”). A partir desses trechos, o implícito pressuposto é que, enquanto corpos magros circulam livremente, corpos gordos “não cabem” nos espaços públicos da cidade e, diante da negação de sua existência, ou permanecem presos no âmbito do privado ou oferecem resistência (“buscar algo, de melhorar algo pra gente”).

O corpo gordo enquanto “palavra pejorativa” é visualizado pela adoção, no Brasil, do termo estrangeiro plus size como uma forma de eufemizar a palavra “gordo/a”. Segundo Aires (2019), o plus size foi criado pelo capitalismo como nicho mercadológico da moda, aparecendo como único “lugar” onde o corpo gordo cabe. Nesse sentido, se até determinado momento o corpo gordo foi excluído do consumo relacionado a um estilo de vida saudável, a criação da moda plus size também trouxe para esses corpos a lógica do consumo e as estratégias de biopoder relacionadas ao mercado. E, ao estar inserido no mercado, esse corpo é, portanto, “controlado, organizado e tipificado por normas semelhantes àquelas que ordenam o mercado de moda tradicional” (AIRES, 2019, p. 139).

Em que pese essa colonização dos corpos pelo consumo, não podemos ignorar a emergência de movimentos que oferecem uma crítica à ordem do discurso (FOUCAULT, 1996). Nessa mirada, Rangel (2018) ressalta o ativismo gordo como uma estratégia de enfrentamento a práticas e discursos que violentam e invisibilizam esses corpos. Entre suas pautas estão a luta contra a patologização e a defesa à acessibilidade e representatividade de corpos gordos. Já suas práticas ativistas envolvem os campos de música, ilustração, dança, literatura, cinema, fotografia, teatro, moda, redes sociais e produção acadêmica, entre outros. No caso do Coletivo Corpo Livre, a realização de ensaios fotográficos (Figura 9) surge como uma dessas estratégias de enfrentamento à norma colonial-moderna sobre os corpos.

Ensaio fotográfico do Coletivo Corpo Gordo Livre
Figura 9.
Ensaio fotográfico do Coletivo Corpo Gordo Livre
Fonte: Instagram do Coletivo Corpo Gordo Livre (@corpogordolivreof)

(10) E geralmente nas nossas palestras, a nossa identidade visual somos nós, sabe. Na última palestra que a gente fez eu me lembro de terem me pedido pra colocar imagens do nosso ensaio fotográfico. Porque eu acho que esses ensaios que são feitos pelo Coletivo, eles dão um gás nas pessoas, elas começam a nos olhar e a olhar elas mesmas com outros olhos porque eu acho que tudo é representatividade, né. E aí elas começam a enxergar na gente algo que elas possam se enxergar um dia (ANNA, CORPO GORDO LIVRE – grifos meus).

No texto (10), a seleção lexical “nossa identidade visual somos nós” reafirma a centralidade do corpo gordo na ação social do Coletivo Corpo Gordo Livre. A realização de “ensaios fotográficos” com integrantes do Coletivo subverte o padrão normativo imposto que relaciona e limita a ideia de beleza feminina a corpos magros. A ação possui significativa representação interna, ao trabalhar a autoestima e autoconfiança dessas mulheres; e externa – no nível macrossocial –, ao desterritorializar espaços (físicos e simbólicos) historicamente atribuídos a pessoas de corpos magros, como a beleza (“dão um gás nas pessoas”). O poder de influência da ação estabelece-se no diálogo intersubjetivo do Coletivo com mulheres gordas para que, por meio de uma “representatividade, [elas] comecem a enxergar” a possibilidade de transgressão da normatividade colonial-moderna sobre os corpos, ao “olhar elas mesmas com outros olhos.”

5 Considerações finais

A chamada crise da modernidade passou a ser um dos pontos de inflexão e conceito chave para a compreensão da ação coletiva contemporânea. Com isso, além de saírem da retaguarda e passarem a ocupar o lugar central na análise da transformação social, ao longo do tempo, movimentos articularam-se não apenas para questionar e expor os limites da lógica moderna, como também para, a partir de suas práticas, oferecer alternativas a ela (FLÓREZ-FLÓREZ, 2005, 2007). Outro elemento que passou a ser questionado neste período diz respeito à globalização, surgindo, assim, atores críticos da modernidade globalizada. E não apenas atores, no masculino, mas também atrizes, evidenciando tanto a importância de mulheres à frente de movimentos, como a crítica ao patriarcado, prevalente, inclusive, no campo da linguagem, como tem demonstrado o surgimento de agrupamentos com flexores no feminino (coletiva) ou em linguagem não binária (coletive).

Para Mota Neto (2016), um aspecto fundamental dentro do pensamento decolonial é o próprio locus enuntiationis a partir de onde sujeitos produzem teorias, proferem seus discursos e criticam a colonialidade. Esse lugar é caracterizado pelo caráter de exterioridade de sujeitos, grupos e populações periféricos, que representa sua condição de subalternizados, portanto, ocultados, negados, oprimidos e condenados pela modernidade-colonialidade. E, ao situarem-se no exterior, “tais sujeitos/grupos/populações podem revelar a colonialidade escondida pela retórica salvacionista da modernidade e mobilizar a articulação de forças/ideias decoloniais” (MOTA NETO, 2016, p. 149).

A decolonialidade representa uma perspectiva epistêmica, ontológica e política que contesta a racionalidade eurocêntrica que universalizou padrões de ser e estar no mundo. Na estética, a colonialidade operou na ressemantização do termo, reduzindo a atribuição de sensações e processos de percepção ao sentido de beleza. Os resultados da pesquisa evidenciaram que a dimensão estética dos/as coletivos/as tem centralidade nas ações dos coletivos, principalmente ao compreendermos o termo em seu sentido original, que, para além do âmbito do belo, está relacionado aos processos de atribuição de sensações e percepções (MIGNOLO, 2010a; DUSSEL, 1997), oferecendo, por meio de performances, vestimentas e artefatos, visibilidade a sujeitos e práticas sociais ocultados, silenciados, marginalizados e excluídos.

A ação de coletivos e coletivas em Teresina demonstra que homens usando saia, mulheres com a bunda à mostra, mulheres que não performam feminilidades e corpos gordos protagonizando ensaios fotográficos consistem representações que reafirmam o corpo como instrumento político – ações essas que não ocorrem sem a contestação de reacionários/as, na tentativa de manter os pilares da estrutura que favorece seus privilégios; e consolidam coletivos e coletivas teresinenses como articulações juvenis transgressoras do padrão de poder hegemônico colonial-moderno, visibilizando formas outras de ser e viver em coletividade.

Referências

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Notas

1 Texto original: Surgen también proyectos decoloniales, esto es, proyectos que forjan futuros un los cuales la modernidad/colonialidad será un mal momento en la historia de la humanidad de los últimos quinientos años.
2 Texto original: […] un camino de lucha continuo en el cual se puede identificar, visibilizar y alentar “lugares” de exterioridad y construcciones alter-(n)ativas.
3 A tese, intitulada Pedagogias decoloniais em ações culturais de coletivos e coletivas juvenis de Teresina, é fruto de pesquisa com sete coletivos e coletivas atuantes na cidade de Teresina, em que foram entrevistados onze sujeitos, ao todo. Entre os diversos tópicos abordados no roteiro semiestruturado, a temática da estética apresentou-se de modo mais incidente nos quatro coletivos abordados neste artigo, motivo pelo qual os demais agrupamentos e participantes da pesquisa não aparecem.
4 Texto original: […] decolonización de la historia y de la crítica de arte, hacia la construcción de aesthesis y subjetividades decoloniales.
5 Texto original: El artista es mucho más que un imitador y su misión es mucho más alta y humana que la mera expresión de la belleza, sobre todo cuando ésta se entiende como mera vivencia subjetiva.
6 Para conhecer sobre a lenda do Bumba-meu-boi, ver: https://www.geleiatotal.com.br/2018/03/15/bumba-meu-boi/; e sobre a festa do Bumba-meu-boi como objeto de estudo, ver Pedrazani (2010) e Ferreira (2016).

Notas de autor

1 Doutora em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Docente no Curso de Graduação em Administração da Universidade Federal do Piauí (UFPI) RJ – Teresina/PI – Brasil. E-mail: karycoimbra@ufpi.edu.br.

Información adicional

COMO CITAR (ABNT): COIMBRA, K. E. R. A estética decolonial no ativismo de coletivos teresinenses. Vértices (Campos dos Goitacazes), v. 25, n. 1, e25117309, 2023. DOI: https://doi.org/10.19180/1809-2667.v25n12023.17309. Disponível em: https://essentiaeditora.iff.edu.br/index.php/vertices/article/view/17309.

COMO CITAR (APA): Coimbra, K. E. R. (2023). A estética decolonial no ativismo de coletivos teresinenses. Vértices (Campos dos Goitacazes), 25(1), e25117309. https://doi.org/10.19180/1809-2667.v25n12023.17309.

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