Artigos Originais
Exercício da enfermagem em embarcações brasileiras
Nursing Practice on Vessels and Offshore Oil Rigs in Brazil
Exercício da enfermagem em embarcações brasileiras
Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 18, núm. 2, pp. 65-74, 2016
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
Recepción: 10 Abril 2015
Aprobación: 09 Octubre 2015
Resumo: This paper aims to describe the role, tasks and working conditions of Nursing personnel working on board of vessels and offshore platforms. This is also a descriptive and exploratory study carried out from March 2012 to June 2014, with the objective of describing and characterizing these professionals. Two types of Nursing professionals were found in the offshore market: maritime and offshore nurses. Profiles were described as well as their categories, functions and academic titles. There are more opportunities for professionals working on offshore platforms than in vessels. Some challengers were raised and some lack of onboard inspection by the Nursing Council were found.
Palavras-chave: Enfermagem Embarcada, Enfermagem Offshore, Enfermagem Aquaviária.
Abstract: Objetivou-se descrever o papel, tarefas e condições de trabalho dos profissionais de Enfermagem embarcados em navios e unidades offshore. Trata-se de um estudo de caráter descritivo e exploratório, cujas evidências foram coletadas de diversas fontes no período de março de 2012 a junho de 2014 com o objetivo de identificar e caracterizar o profissional de bordo. Foram identificados os profissionais de Enfermagem do Trabalho, sendo a especialidade Aquaviária, desempenhada em navios e a offshore, por sua vez exercida em plataformas em alto-mar. Foram descritos seus perfis, conceituadas suas categorias, funções e também as titulações exigidas, permitindo o entendimento dessas diferenças. Foram apontados alguns desafios para os profissionais das áreas, situando a necessidade da fiscalização do órgão de classe regional.
Keywords: Onboard Nursing, Offshore Nursing, Maritime Nursing.
1 Introdução
Nos dias de hoje, as empresas que desenvolvem atividades em alto-mar representam um montante importante no cenário econômico do país, levando a um aumento da oferta de empregos. Caso as previsões se confirmem, será um grande celeiro de empregos para o Brasil a descoberta da área de exploração em camadas mais profundas do solo marinho, como o Pré-Sal. Em decorrência dessa possível expansão, algumas leis, regulamentos, normas já dispõem sobre esses assuntos de modo específico, buscando adequar e normatizar o trabalho offshore no país (PENTEADO, 2011).
Marques (2014) estabelece estudos iniciais sobre o tema, quando sugere que, atualmente, existem diversas embarcações e plataformas envolvidas nos trabalhos de prospecção, produção e exploração de petróleo ao longo da costa brasileira. Além do enriquecimento tecnológico, trazem também o aquecimento do mercado de trabalho com a abertura constante de novas frentes de oportunidades ligadas diretamente com as unidades de perfuração e produção de petróleo ou com a navegação de apoio marítimo e transporte desse insumo.
Guedes (2011) também apresenta um estudo no qual estabelece que existem nas embarcações diferentes tipos de profissionais de enfermagem do trabalho prestando seus serviços, pois para cada tipo de embarcação se faz necessária uma titulação específica.
Carvalho (2010) estabelece que o exercício de Enfermagem no Brasil foi regulamentado em 1931, porém, somente no ano de 1955, foi aprovada a Lei do Exercício Profissional de Enfermagem e, somente em 1964, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro incluiu a disciplina de saúde ocupacional no curso de graduação em Enfermagem.
A Enfermagem do Trabalho é um ramo da enfermagem de saúde pública e, como tal, utiliza os mesmos métodos e técnicas empregadas para a promoção da saúde do trabalhador; proteção contra os riscos decorrentes de suas atividades laborais; proteção contra agentes químicos, físicos e biológicos e psicossociais; manutenção de sua saúde no mais alto grau de bem-estar físico e mental e recuperações de lesões, doenças ocupacionais ou não ocupacionais e sua reabilitação para o trabalho (CARVALHO, 2010).
No Brasil, a prática da Enfermagem de bordo é amparada pela Lei nº 7.498/86, que regulamenta o Exercício Profissional da Enfermagem. Nela, é estabelecido que sejam privativos do Enfermeiro a organização e direção da assistência direta ao paciente crítico e os cuidados onde sejam executadas atividades de maior complexidade técnica. Essa categoria profissional também encontra base de cunho legal para atuação nessa especialidade na Portaria do Gabinete do Ministro da Saúde 2.048 de 05/11/2002, a qual determina, entre outros pontos referentes à temática, a capacitação específica dos profissionais de transporte aeromédico, o que toca diretamente o atendimento para unidades marítimas (MONTEZELI, 2012).
Marques (2014) discorre que em boa parte do mundo é comum encontrarmos Enfermeiros que trabalham em plataformas ou navios petrolíferos, principalmente no Reino Unido, Estados Unidos, Angola, Arábia Saudita, Índia e Brasil. Anualmente o número de Enfermeiros embarcados cresce acompanhando a demanda de mão de obra para esse setor. O tipo de trabalho e o perfil profissional requerido para essa atividade de saúde em alto-mar têm feito do Enfermeiro o personagem central das contratações na área de saúde offshore.
Segundo Carvalho (2010), o Enfermeiro do Trabalho é membro e líder da equipe de enfermagem do trabalho e presta apoio ao paciente em ambulatórios, em setores de trabalho e em domicílio, executando atividades relacionadas aos serviços de higiene, medicina e segurança do trabalho, integrando equipes de estudos. Compete-lhe também a coleta de dados de doenças ocupacionais, a realização de inquéritos sanitários, a coleta de dados estatísticos de morbidade e mortalidade de trabalhadores, e as etapas precedentes aos estudos epidemiológicos.
Quanto ao sistema de acesso à saúde em situações-problema dos trabalhadores embarcados, há uma enfermaria para atendimento de casos de menor complexidade ou de primeiros socorros, como suporte de emergências, um leito, equipamentos e medicamentos diversos. No entanto, nos casos de emergência grave, o enfermeiro aciona um serviço de resgate aéreo, que envia o helicóptero-ambulância de terapia intensiva, conforme estabelece a Norma da Autoridade Marítima nº 1 para Embarcações Empregadas em Navegação de Mar Aberto, emitida pela Diretoria de Portos e Costas em 25/10/2005.
Busca-se, neste estudo, o entendimento do problema de que tipo de profissional exerce a Enfermagem a bordo, tendo esse tipo de exercício profissional como objeto da pesquisa. O objetivo é expor a sua caracterização e apontar alguns desafios da profissão. A relevância e contribuições do estudo se dão pelo fato de haver poucas discussões sobre esse tema, e, consequentemente, um número reduzido de literaturas sobre Enfermagem Offshore e Aquaviária. Tal estudo irá possibilitar o entendimento e caracterização da Enfermagem de bordo no cenário atual do petróleo buscando explicar a realidade de trabalho que os profissionais de enfermagem executam no setor.
Neste artigo acadêmico, não serão abordadas as embarcações de apoio marítimo, já que a legislação atual não impõe a necessidade de um profissional de saúde a bordo.
2 Método
Trata-se de uma revisão bibliográfica, desenvolvida a partir de seleções de produções científicas veiculadas nas bases de dados SCIELO, LILACS, BIREME, bibliotecas virtuais de universidades federais e estaduais no estado do Rio de Janeiro e legislações brasileiras.
A pesquisa nos bancos de dados foi desenvolvida no período de março de 2012 a junho de 2014. Os critérios estabelecidos para busca da base de dados, através da ferramenta eletrônica do site, direcionou a pesquisa empírica dos textos científicos para os que mencionavam o trabalho offshore, enfermagem, perfil do profissional de enfermagem, embarcações, rotina do profissional de enfermagem em seu título, resumo ou referencial teórico. Eles estariam disponíveis em formato completo para leitura on-line, escritos em português e publicados entre os anos de 2002 e 2014, isto é, nos últimos 12 anos.
Desses trabalhos excluíram-se aqueles não pertinentes ao assunto, isto é, os que fugiam ao tema de interesse da pesquisa e os repetidos. Incluíram-se investigações científicas e publicações em português, assim como textos na íntegra e que respondiam aos objetivos da pesquisa.
Após a aquisição do material bibliográfico, realizou-se a leitura para identificar as informações e dados constantes no material levantado e estabelecer relações entre esse conjunto e o problema proposto, para em seguida analisar a consistência das informações qualitativas e quantitativas apresentadas pertinentes encontradas.
Ao final da análise, a bibliografia potencial constitui-se de textos, com as informações levantadas categorizadas e analisadas à luz da análise de conteúdo, emergindo, assim, as categorias do profissional aquaviário e do profissional offshore. Esses textos elencados estão referenciados no contexto e citados como Referências deste artigo.
Neste artigo acadêmico, não serão abordadas as embarcações de apoio marítimo, já que a legislação atual não impõe a necessidade de um profissional de saúde a bordo.
3 Resultados e discussão
Atualmente, no Brasil, a indústria offshore congrega cerca de 1.040 profissionais da Enfermagem, sendo que 63,5% deles estão diretamente focados em plataformas, navios petrolíferos, navios rebocadores e outras unidades offshore; e 26,5% estão em base de apoio dando suporte e realizando a supervisão dos demais. Pode-se imaginar a amplitude de ofertas futuras de empregos, haja vista que a tendência é que até o ano de 2020 esses números dobrem em decorrência da expansão do setor offshore ligado à exploração do pré-sal (MARQUES, 2014).
No país, diversos profissionais de saúde, como Médicos, Enfermeiros e Técnicos de Enfermagem trabalham embarcados. Entre eles, o maior número de profissionais são os de Enfermagem, com cerca de 86,8% de todo o contingente de saúde, segundo estatísticas realizadas pela equipe da Enfermagem Offshore. A maior parte dos médicos permaneceu em terra coordenando os serviços de assistência, através de setores de monitoramento com alta tecnologia para pronto atendimento, utilizando até mesmo recursos de videoconferência e deslocamento via helicóptero até a unidade petrolífera caso necessário (MARQUES, 2014).
As empresas realizam suas contratações baseadas na Consolidação das Leis do Trabalho. Outras selecionam por contrato de trabalho temporário, bem característico de empresas de navios, preestabelecidos com duração que varia de três a doze meses, renováveis por igual ou diferente período, já outras terceirizam esse serviço através de outras empresas especializadas (FERREIRA, 2010).
Num passado mais recente, a grande maioria dos profissionais de saúde que trabalhavam embarcados era de técnicos de Enfermagem. Posteriormente, devido à suposta pouca preparação desses profissionais frente aos novos cenários na prestação de serviço a bordo, foram substituídos pelos profissionais da classe médica. No entanto, as coisas não ocorreram como planejadas devido às dificuldades de adaptação e aceitação de muitos médicos em realizar os serviços burocráticos impostos a eles, aliado com outras questões legais e normativas (AMORIM et al., 2013). Desta forma, aos poucos eles foram sendo substituídos por Enfermeiros de nível superior. Com o passar dos anos, o Enfermeiro vem tomando o seu espaço no setor, tornando-se parte relevante de todo um contexto sistêmico e logístico nas unidades marítimas, no entanto, em algumas empresas, ainda se encontram médicos embarcados (AMORIM et al., 2013).
Diante deste contexto, ressalta-se que toda embarcação ou plataforma, para exercer operação segura deverá ser guarnecida por um número mínimo de tripulantes, associado a uma distribuição de funções específicas, denominada tripulação de segurança. A configuração dessa tripulação difere da tripulação de lotação, que é o número máximo de pessoas autorizadas a embarcar, incluindo tripulação de segurança, demais tripulantes, passageiros e profissionais não tripulantes. Conforme a Norma da Autoridade Marítima nº 1 para Embarcações Empregadas em Navegação de Mar Aberto, emitida pela Diretoria de Portos e Costas em 25/10/2005, o seu número depende de seu porte e sua automação e sua limitação em função da capacidade de promover meios de abandono em situações emergenciais. Esse mesmo documento, por sua vez, aponta que embarcações móveis ou fixas, tais como Navios-Sonda, FPSO (Floating Production, Storage and Offloading) e FSU (Floating Storage Unity), quando em viagem (mesmo que rebocadas), com duração maior que 12 horas, deverão apresentar uma tripulação mínima essencial de segurança de tripulantes, com a obrigatoriedade de um Enfermeiro ou Auxiliar de Saúde (ASA) embarcado nesse conjunto.
De acordo com Marques (2014), a Enfermagem Offshore é a tradução do termo inglês Offshore Nursing. Definindo assim o grupo de profissionais de Enfermagem que trabalham na prestação da assistência de Enfermagem em unidades de área de exploração e produção de petróleo e gás natural em alto-mar, reconhecida como a 44.ª especialidade pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), por meio da Resolução 389, de 18 de outubro de 2011 (MARQUES, 2014). Além disto, esse assunto já é pauta de discussão em Câmaras Técnicas do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (COREN-RJ) para garantir o exercício da profissão a partir de um processo de fiscalização (MENDES et al., 2014).
De acordo com Campos (2007), a Organização Internacional do Trabalho, órgão das Nações Unidas, pode ser vista como uma organização referencial voltada para a proteção à saúde e assistência médica dos trabalhadores marítimos. Com caráter introdutório e de importante repercussão internacional, essa convenção determinou a criação de várias leis, normas, decretos de ministérios e agências governamentais brasileiras visando à proteção da saúde do trabalhador Aquaviário em geral. Pode-se identificar, como, por exemplo, a partir da convenção da OIT emitida em 1987, a criação de uma resolução 17 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) buscando alinhamento para essa questão.
Diante disso, uma das legislações pertinentes ao estudo consiste na Norma Regulamentadora-30 (NR30) do Ministério do Trabalho e Emprego a qual tem o objetivo de regulamentar e proteger as condições de saúde e segurança dos trabalhadores aquaviários. Observa-se certa ênfase no Programa de Controle de Medicina e Saúde Ocupacional (PCMSO), em conexão com a Norma Regulamentadora 07 (NR07). Porém, ela determina a formação do Grupo de Segurança e Saúde do trabalho a bordo dos Navios Mercantes (GSSTB), ou seja, reconhece a necessidade de se manter um grupo de tripulantes capazes de realizar ações compatíveis com o PCMSO. Já em relação à fiscalização de embarcações e plataformas, a Marinha do Brasil é a responsável pelo cumprimento das Normas de Autoridade Marítima.
Sabe-se que, atualmente, incorre-se em uma confusão quando se trata da Enfermagem Offshore e da Enfermagem Aquaviária. Haja vista que existem peculiaridades, pois a Enfermagem Offshore é diferente da Enfermagem Aquaviária em alguns aspectos, embora as duas sejam desenvolvidas no ambiente aquático (NORSUL, 2010).
A legislação define que para ser Enfermeiro Aquaviário é necessária a certificação emitida pela Marinha do Brasil, através do Curso de Formação de Aquaviário. No entanto, para ser Enfermeiro Offshore não há a obrigatoriedade normativa de ser propriamente Aquaviário. Desta forma, Marques (2012) estabelece que, para ser Enfermeiro Offshore não é necessário ser Aquaviário, mas para ele poder atuar como tal, necessita fazer um curso de formação para a categoria. Todos os profissionais de Enfermagem que trabalham em plataformas de petróleo, tais como aqueles que trabalham em terra (onshore), nos setores administrativos, de supervisão, de recursos humanos e que estejam envolvidos diretamente nas operações offshore são enfermeiros offshore e enfermeiros do Trabalho (NORSUL, 2010).
Portanto, o Enfermeiro Aquaviário é todo aquele com habilitação certificada pela autoridade marítima para operar embarcações em caráter profissional. Na navegação de Longo Curso é obrigatório o embarque de um Enfermeiro (ENF) ou Auxiliar de Saúde (ASA), que possua o curso de Primeiros Socorros reconhecido pela Diretoria de Portos e Costas (DPC), tendo como função principal cuidar da saúde da tripulação, sem a obrigatoriedade da especialização em enfermagem do trabalho. A NR-30 coloca hierarquicamente o profissional de saúde do navio sob as ordens do Comandante da tripulação. Apesar da consolidação do GSSTB, as decisões e determinações são feitas em caráter coletivo, porém o Comandante tem total autonomia para modificar as resoluções propostas pelo grupo, inclusive as determinadas pelo GSSTB e do próprio profissional de saúde.
Os Enfermeiros Aquaviários possuem outros tipos de escalas, pois os mesmos, por possuírem o curso da Marinha do Brasil, podem ficar a bordo por longos períodos e, inclusive, realizar longas viagens a bordo de embarcações de transporte de carga, cunho turístico, entre outros. Por se tratar de uma atividade em regime de confinamento, apresenta situações peculiares, já que eles passam grande período de dias em um espaço limitado, que não permite um deslocamento após o trabalho, como o dos trabalhadores da área da Saúde em hospitais, clínicas e outros consultórios (MARQUES, 2014). Na navegação de Cabotagem, o embarque do Enfermeiro ou Auxiliar de Saúde é exigido em viagens maiores que 48 horas para embarcações de passageiros e em maiores que 72 horas, para as que transportam somente carga.
O Enfermeiro Aquaviário, na verdade, não se difere muito em relação às funções a bordo, sendo seu único e importante diferencial o fato de ser concedida a possibilidade de maior permanência a bordo, onde, em muitos casos, sua escala de trabalho pode chegar a meses (AMORIM et al., 2013). Ao mesmo tempo, é o único profissional de saúde num turno diário de 12 horas, com mais 12 horas em sobreaviso para atendimentos emergenciais, bem como executa e avalia programas de prevenções de acidentes de trabalho e de doenças profissionais ou não profissionais, fazendo análise da fadiga, dos fatores de insalubridade, dos riscos e das condições de trabalho para propiciar a preservação de integridade física e mental do trabalhador (AMORIM et al., 2013). Por essa possível exposição constante ao trabalho, esse profissional tende a ser exposto a um estágio de esgotamento e sintomas como ansiedade e depressão, que pode ser diagnosticado como Síndrome de Burn Out (OLIVEIRA et al., 2014). A NR 30 está voltada à saúde dos trabalhadores de outras categorias e ao cuidado com o meio ambiente, omitindo-se as ações voltadas para prevenção e promoção de saúde dos profissionais de Enfermagem Aquaviários.
A Enfermagem Offshore tem como foco a assistência e promoção da saúde ocupacional dos trabalhadores offshore, executando e avaliando programas de prevenções de acidentes de trabalho, bem como prestando assistência de emergência e urgência em situações de sinistro (AMORIM, 2013). Muitos profissionais são oriundos de outras áreas da enfermagem, tais como Emergência, Unidade de Terapia Intensiva e Enfermagem do Trabalho. E isso ocorre devido ao tipo de atividade desenvolvida por esses profissionais, com a necessidade de conhecimentos e habilidades específicas para se prestar assistência a possíveis lesões graves decorrentes das operações complexas (LUCAS, 2010).
Os profissionais da Enfermagem Offshore executam funções ligadas à área de saúde e muitas atividades de caráter administrativas. Entre elas destacam-se: atendimento ambulatorial e de primeiros socorros, manutenção dos registros médicos, comunicação com o setor médico responsável em terra sempre que necessário, o controle do estoque de materiais e medicamentos, inspeção de higiene da embarcação com ênfase na alimentação, realização de treinamento de primeiros socorros e palestras semanais de saúde e a supervisão da equipe de hotelaria. Pela falta de legislação específica, nesta área, muitos profissionais realizam atividades que não estariam ligadas às suas habilidades e competências técnicas desenvolvidas durante sua formação profissional (MARQUES, 2014).
Em algumas unidades petrolíferas, o Enfermeiro possui a função de elaborar, diariamente, o chamado POB (People on board ou Person on board), lista de pessoal a bordo da embarcação. Assim como realizar briefing de segurança daqueles que chegam e vão embora, bem como o controle da lista de passageiros aéreos e a alocação de pessoas nas baleeiras. Essas práticas desagradavam tantos os médicos no passado, como os Enfermeiros atualmente (LUCAS, 2010).
A boa relação Enfermeiro-Tripulação é de extrema importância, já que, em muitos casos, ele será único profissional de saúde a bordo. Esses profissionais devem possuir um perfil bastante interativo com os demais tripulantes, para se gerar relações de confiança e respeito, pois tende também em lidar com todas as situações ligadas à saúde de um modo mais amplo (FERREIRA, 2010).
Os profissionais de Enfermagem Offshore atualmente exercem turnos de 12 horas de trabalho diárias, em dois tipos de escalas e/ou regime de revezamento de embarque: escala 14x14, em que o Enfermeiro permanece um período de 14 dias embarcado e outro período de 14 dias de folga; e a escala 14x21 em que o Enfermeiro permanece um período de 14 dias embarcado e outro período de 21 dias de folga.
Guedes (2011) discorre que existe por parte de muitas empresas o requisito para se contratar profissionais que falem outra língua, de preferência o inglês. Isto ocorre, já que existe uma característica comum na grande maioria das empresas, elas são estrangeiras, e possuem profissionais de diversas nacionalidades envolvidos nas operações a bordo.
A possibilidade de um atendimento de emergência de grande proporção e/ ou gravidade é uma realidade bastante possível para o Enfermeiro Offshore, já que as operações envolvidas na exploração de petróleo e gás possuem o maior grau de periculosidade descrito pelo Ministério do Trabalho (GUEDES, 2011).
Desta forma, por ter essa característica, o Enfermeiro deve ser capaz de lidar com situações extremas, desenvolver habilidades científicas e técnicas que serão sempre colocadas em prática e serão os pontos primordiais em situações de ferimentos, paradas cardíacas, amputações, queimaduras, envenenamento por gás e vítimas de explosões (GUEDES, 2011). Em geral, as normas de regulamentação da área marítima e offshore, já definem algumas questões referentes à assistência da tripulação de navios e plataformas, porém no que se refere à saúde específica do trabalhador de Enfermagem, ainda não se encontram dispositivos relacionados a esse caso. Também as questões de saúde referentes à saúde do trabalhador de Enfermagem Aquaviário, especificamente, são menos cogitadas e, por isso, faz-se necessário um grande aprofundamento teórico e pesquisas sobre esses profissionais em navios e plataformas de petróleo (CAMPOS, 2007).
4 Considerações finais
O estudo mostra que existem dois perfis de profissionais de Enfermagem a bordo: o que trabalha em meio offshore, denominado Enfermeiro Offshore; e o que desempenha suas funções a bordo de navios, denominado Aquaviário.
Nota-se um crescimento do exercício da Enfermagem na área marítima e offshore de forma rápida e eficiente, possibilitando-se uma nova forma de se exercer a profissão. Diante de todo esse contexto, observa-se uma abertura desse mercado de trabalho, que se encontra diretamente ligada à necessidade de mão de obra especializada. Naturalmente, acarretando um aumento do interesse dos trabalhadores para essa área, em particular atraídos por propostas de empresas do setor que oferecem excelentes condições salariais.
Observa-se ainda que, na atualidade, para ingressar no ramo offshore ou aquaviário, o enfermeiro necessita somente da conclusão do curso de graduação, em instituto reconhecido pelo Ministério da Educação, Documentação emitida pelo Ministério da Marinha e do registro expedido pelos conselhos regionais de Enfermagem.
Quando a Enfermagem é realizada embarcada, a atenção à saúde e ao bem-estar dos que estão a bordo, dá-se na relação dialógica e internacional do profissional de saúde com a necessidade de perfis e competências específicas. No entanto, não basta treinamento e respaldo legal para a garantia de uma atuação eficaz e eficiente desse profissional na especialidade em questão.
Em relação aos dois tipos de profissionais embarcados, parece que o Enfermeiro Aquaviário permanece ainda restrito em sua formação e desenvolvimento ao que é exigido pela Marinha do Brasil. Por outro lado, a profissão exercida na área offshore vem conseguindo um espaço de destaque, apontando a necessidade que novos cursos de formação e especialização de nível superior sejam criados, ou mesmo, os atuais tenham a revisão necessária para a devida adequação a essa demanda.
Esse profissional já deve se preocupar com o domínio do idioma inglês para melhor poder desempenhar a sua função, bem como para uma melhor remuneração. Contudo, o estudo indica que as tarefas desempenhadas pelo profissional a bordo estariam além do que um escopo tradicional indica, o que parece mostrar a necessidade de uma presença mais efetiva dos órgãos de classe na proteção do seu profissional.
O COREN-RJ parece que toma a vanguarda de se preocupar com a fiscalização da profissão no meio offshore, porém não há evidências de uma efetividade dessa ação. O que se verifica é que acaba sendo deixada a preocupação com a execução da profissão, muitas vezes a partir das fiscalizações existentes pela Marinha do Brasil e/ ou inspeção promovida pelas próprias empresas que são as proprietárias da unidade offshore. Em ambos os casos, em geral, apenas é conferida a documentação obrigatória para o exercício da profissão. Ao mesmo tempo, essa fiscalização de um órgão de classe poderia ser um fator contribuinte para verificação das tarefas e responsabilidades impostas ao profissional, bem como as condições de trabalho a bordo, auxiliando na percepção para casos de burn out dos profissionais embarcados.
Assim, sob o foco desta pesquisa, ao identificar, caracterizar e difundir atividades e condições de ações desempenhadas pelo profissional de Enfermagem e seu contexto de trabalho a bordo de Unidades Offshore e Navios, espera-se oferecer subsídios para a reflexão crítica sobre uma das práticas da profissão e maiores esclarecimentos sobre o trabalho exercido, sua legislação e relevância no mercado de trabalho brasileiro atual já que existem poucos referenciais bibliográficos sobre o assunto.
Referências
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Notas de autor