Artigos de revisão
Avaliação da educação: o caso do IDEB
Education assessment: the case of IDEB
Avaliação da educação: o caso do IDEB
Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 18, núm. 2, pp. 165-178, 2016
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
Recepción: 27 Marzo 2015
Aprobación: 16 Junio 2015
Resumo: O texto discute sobre a importância da avaliação nas políticas sociais, com destaque na educação básica. Para isso, o trabalho se divide em três partes: a primeira aborda a política educacional brasileira, sua organização e legislação; a segunda é sobre a importância da avaliação de políticas sociais; e, no terceiro item, é analisado o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), que é a principal forma de avaliação da educação básica. Dessa forma, pretende-se problematizar e refletir sobre o papel das políticas de avaliação e se o IDEB vem sendo efetivo na busca da melhoria da qualidade da educação básica.
Palavras-chave: Política Pública, Educação, Avaliação.
Abstract: The paper discusses the importance of assessment in social policies, especially in basic education. The work is divided into three parts: the first deals with the Brazilian educational policy, its organization and legislation; the second is about the importance of evaluating social policies; and the third is an analysis of IDEB (Basic Education Development Index) - the main form of assessment of basic education. Thus, we intend to discuss and reflect on the role of assessment policies, and whether IDEB has been effective in the pursuit of improving the quality of basic education.
Keywords: Public Policy, Education, Evaluation.
1 Introdução
A partir da Constituição de 1988, a educação no Brasil consegue alcançar seu caráter democrático e universal, sendo obrigatoriedade do Estado a garantia do acesso ao ensino fundamental e se efetivando enquanto uma política social de fato. Além das várias inovações no que condiz a legislações educacionais, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e o Plano Nacional da Educação (PNE), iniciou-se não só na educação como em outras áreas a necessidade de se avaliar as políticas sociais, para se obter noções reais de como vêm se moldando as políticas públicas, propiciando observar erros e acertos com o objetivo de levá-las à melhor situação possível.
No campo da Educação, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) se mostra na atualidade como a principal forma de avaliar a educação básica, servindo de base para a tomada de várias decisões dentro do campo educacional. Assim, haja vista a necessidade de se diagnosticar de forma precisa a realidade educacional, para uma intervenção de qualidade, pretende-se neste artigo fazer uma breve discussão sobre as políticas de avaliação na política educacional, tentando problematizar sua efetividade no que condiz à melhoria na qualidade da educação básica.
Dessa forma, o artigo se divide em três seções. A primeira delas estuda a política educacional brasileira, observando sua organização e legislação; a segunda seção estuda a importância da avaliação de políticas sociais e a terceira analisa o papel do IDEB como instrumento de avaliação da educação básica.
2 Política educacional: o direito irrevogável
O direito à educação é amplamente reconhecido em diversos países e já consagrado enquanto um direito universal, descrito no Artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos do Homem; no Artigo XII da Declaração Americana dos Direitos e Deveres da Humanidade (1948); Artigos 13 e 14 do Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966); Artigos 28 e 29 da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989). Em todos esses artigos é enfatizada a educação como direito de todos indiscriminadamente, principalmente o acesso ao ensino fundamental.
De acordo com Marshall (1967), a educação é um direito que subsidia todos os outros direitos fundamentais descritos pelo autor, que são os direitos civis, políticos e sociais. Dessa forma,
[...] a assunção da educação como direito social, sua magnitude e importância são assim reconhecidos por envolver todas as dimensões do ser humano: o singulus, o civis e o socius. O singulus por pertencer ao indivíduo enquanto ele próprio, o civis por envolver a participação política nos destinos de sua comunidade e o socius por significar a igualdade e participação na repartição dos bens sociais de modo equânime e justo. (CURY, 2012, p.151).
Dessa forma, a educação se materializa na sociedade capitalista como um direito que deve ser proporcionado pelo Estado e possibilita a ampliação de outros direitos e desenvolvimento integral dos países que os aplicam.
A educação, organizada sob a forma de política pública, se constituiu em uma das práticas sociais mais amplamente disseminadas de internacionalização dos valores hegemônicos na sociedade capitalista. A partir das lutas sociais, em especial da classe trabalhadora pelo reconhecimento de seus direitos sociais, tornou-se também condição importante nos processos de produção de uma consciência própria, autônoma, por parte desta própria classe e de suas frações. (ALMEIDA, 2011, p.12).
No Brasil, a intensificação dos direitos, regulamentados enquanto políticas sociais de caráter universal, teve como marco a década de 1980, que foi quando o país se redemocratizou, após vários anos de ditadura militar, e promulgou em 1988 uma nova Constituição, denominada “constituição cidadã” (DAGNINO, 2004). Assim, foram iniciadas de fato as políticas sociais de modo universal e democrático. No que tange à educação, foram intensificadas as políticas de democratização do acesso ao nível fundamental.
A Constituição Federal de 1988 definiu instrumentos de participação da sociedade civil no controle da gestão das políticas sociais, estabeleceu mecanismos de participação e implementação destas políticas, apontou canais para o exercício da democracia participativa, por meio de decisões diretas como o plebiscito, referendo e de projetos de iniciativa popular. Nesta perspectiva, a Carta Constitucional instituiu a criação de conselhos integrados por representantes dos diversos segmentos da sociedade civil para colaborar na implementação, execução e controle das políticas sociais. (PIANA, 2009, p.42).
A partir da Constituição de 1988, a educação é tida como direito político e civil e reconhecida como o primeiro dos direitos, como explicitado no artigo 6.º Esse reconhecimento, enquanto primogênito dos direitos no ordenamento jurídico, expressa o caráter essencial que a educação tem em relação ao ser humano, sendo um “fator indispensável da vida social”; posteriormente a educação básica foi ampliada enquanto investimento e dever do Estado brasileiro, abrangendo a faixa etária de 4 a 17 anos (CURY, 2012). Assim:
A proclamação da educação como direito foi se incorporando ao discurso dominante e, progressivamente, foi sendo também consagrada na ordenação legal, culminando com o disposto na Seção I [Da Educação], integrante do Capítulo III [Da Educação, da Cultura e do Desporto] do Título VIII [Da Ordem Social] da Constituição Federal vigente, promulgada em 5 de Outubro de 1988 [VITA, op. cit., p.182-184]. E o primeiro dispositivo dessa Seção, o artigo 205, proclama a educação como direito de todos e dever do Estado e da família. Não bastasse a clareza desse enunciado, a norma é reforçada pelos parágrafos 1º e 2º do artigo 208, os quais estabelecem que “o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo” [§1º] e que “o não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente” [§2º] (SAVIANI, 2013, p.746).
Dessa forma, a educação que é, de forma consensual, entendida como o meio de alcançar outros direitos, de consolidar a cidadania e desenvolver o país em vários aspectos, como o político, econômico e social, se torna de suma obrigatoriedade do Estado, no que concerne a sua oferta, acesso e qualidade. Assim, não basta criar escolas, universalizar a educação de forma sucateada, ela deve ser de excelência, impactando de forma efetiva na vida dos sujeitos.
A Seção I do Capítulo III “Da Educação, da Cultura e do Desporto”, seção específica sobre a educação na Constituição de 1988, detém como princípios:
[...] igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais, valorização dos profissionais do ensino, garantindo, na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com o piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, assegurado regime jurídico único para todas as instituições mantidas pela União; gestão democrática do ensino público, na forma da lei e garantia de padrão qualidade. (Art.206, incisos I a VII apud SAVIANI, 2013, p.752-753)
A decretação da Constituição de 1988, que também foi denominada de Constituição Cidadã1, trouxe importantes conquistas no que condiz à educação, se diferenciando das constituições anteriores, principalmente sobre a elevação do direito à educação como direito público subjetivo, regulamentando e dando subsídios para a efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente2, que preside os demais direitos sobre as crianças e adolescentes (FERRARO, 2008), e a nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB), ratificada em 1996.
A LDB de 1996 foi organizada e fundamentada com o objetivo de embasar, no campo empírico, o funcionamento da política educacional escolar, e também teve suas iniciais discussões nos anos 1980 com ampla participação de movimentos sociais, de professores e pensadores da educação. Porém o início dos anos 1990, época de implementação da nova Constituição também foi o início de uma nova conjuntura econômica mundial que incidiu sobre o Brasil, denominada de Neoliberalismo, que tem como objetivos diminuir os gastos e a intervenção estatal (SHIROMA et al., 2004).
Nesse contexto, a LDB, que vinha sendo formada de forma democrática, perto da sua ratificação, foi trocada por uma outra LDB produzida sem diálogo, a partir de “conciliações ocultas” (FERNANDES, 1991), em consonância com as diretrizes neoliberais em curso no país, sendo promulgada em 1996 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso.
Mesmo com a sombria formulação da LDB, ela continuou trazendo elementos importantes na implementação da Política Educacional, como o reconhecimento de direito de todos e dever do Estado, e o propósito da educação básica em “[...] desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhes meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores” (BRASIL, 1996, p.1).
Desse modo, a educação deve propiciar a cidadania efetiva, o empoderamento e a melhoria da qualidade de vida de todos os indivíduos, a partir de uma oferta de qualidade pelo setor público. Porém, os índices de qualidade da educação básica se mostram ainda muito insuficientes (INEP, 2014), sendo frequentes os noticiários sobre as dificuldades enfrentadas pelas escolas públicas em relação ao IDEB.
Diante disso, torna-se necessária discussão de formas de regulação da política educacional, que vem sendo evidenciada pelas políticas de avaliação, com o intuito de propiciar o diagnóstico e apontamentos para a melhoria da política educacional como também em outras áreas das políticas sociais.
3 Avaliação de políticas sociais
A avaliação de políticas sociais é de suma importância para a melhor implantação e desenvolvimento das intervenções. As políticas sociais que visam à qualidade necessitam da discussão e elaboração de políticas de avaliação.
A avaliação utiliza-se de métodos e técnicas da pesquisa social (DESLANDES, 1997), mas seu objetivo é diferente, pois é uma atividade que se baseia em realizar julgamentos e aferições de uma determinada intervenção, para respaldar tomadas de decisão do programa ou projeto. Aguilar e Ander-Egg (1994) dizem que avaliação é um tipo de “pesquisa social aplicada”. Já a pesquisa é um processo sistemático de construção de conhecimento, que tem como meta principal a geração de novos conhecimentos.
De acordo com Terra (1989, p.17), avaliação é algo que “pressupõe um conjunto de procedimentos técnicos destinados à verificação dos resultados de uma determinada ação” (TERRA, 1989, p. 17). Ela é vista como instrumento a ser utilizado para se averiguar, com maior certeza, os rumos e resultados de uma intervenção. De tal modo a avaliação em projetos sociais vem trazer bases sólidas para uma intervenção eficaz, contribuindo na vida dos sujeitos sociais, em variadas áreas.
O tema sobre avaliação de políticas sociais começou a se expandir a partir de 1960 nos Estados Unidos. No Brasil iniciou nos anos de 1980, época em que os movimentos sociais passam a se organizar melhor pela luta dos direitos sociais universais, equânimes, construindo uma maior criticidade (tanto na América Latina, quanto no Brasil) sobre a investida de dinheiro público e a falta de direcionamento dos programas sociais. Esses movimentos acabaram por desembocar em questionamentos, estudos e implementação da avaliação dentro das políticas sociais (SILVA, 2001).
A avaliação tem a característica de julgar, atribuir valor à determinada intervenção e projeto (MIOTO; NOGUEIRA, 2007, p. 296). Prates (2010) também contribui dizendo ser uma “atividade sistemática, planejada e dirigida”, cujo propósito é produzir informações que sejam importantes e aptas para “fundamentar juízo sobre o mérito do programa ou atividade, buscando comprovar extensão e grau de resultados” (p.5). Nesse sentido, a avaliação auxilia na tomada de decisões sobre o percurso do projeto/ programa, a partir de subsídios concretos.
O termo avaliação etimologicamente significa valor, esforço de apreciar efeitos reais, determinando o que é bom ou ruim, como juízo, não pode neutro, nem exterior às relações de poder, logo tem caráter eminentemente político exigindo postura de objetivação e independência. [...] avaliar em sentido lato significa estimar mérito, estabelecer juízo pautado em critérios. (PRATES, 2010, p. 5).
A partir do momento em que a avaliação subsidia ações mais concretas, que correspondem de fato à proposta articulada, resultando em ações de excelência à população dirigida, podemos dizer que a principal beneficiada com as avaliações dentro de projetos sociais é a população, são os cidadãos em geral. Haja vista que ela é a principal interessada na ratificação das políticas sociais sérias e comprometidas com a primazia da sua implementação, tanto na perspectiva de receptoras, como de investidoras, pois o dinheiro que se utiliza para tal é público.
No que tange à educação, a avaliação é uma área que ganha cada vez mais destaque, pois é um instrumento que propicia a segurança nas decisões, e as transformações são ocasionadas com determinada prática, haja vista que materializa erros e acertos (GENTILINI, 2012).
A avaliação pode acontecer antes ou depois da execução do projeto, se caracterizando por ser avaliação ex ante (antes da ação), e ex post (posterior à ação). Como dizem Mioto e Nogueira (2007, p. 296), pode também ser chamada de “avaliação de processos ou de impacto”. De acordo com Mioto e Nogueira (2007, p. 298, apud COHEN; FRANCO, 1993, p. 108):
Os tipos de avaliação mais usados podem ser classificados em função do momento de sua realização e dos objetivos que se espera da mesma. A avaliação ex-ante precede a implantação, é realizada ao começar o projeto, antecipando fatores considerados no processo decisório [...] A segunda ocorre quando o projeto já está em execução ou já está concluído e as decisões são dotadas tendo como base os resultados efetivamente alcançados.
A proposta de avaliação vem com o intuito de compreender a eficácia, eficiência e efetividade dos projetos e programas sociais. Conforme Cohen e Franco (1993), a eficácia corresponde à proporção em que se alcançam os objetivos e metas do projeto em um determinado período de tempo, sendo assim a eficácia remete ao tempo gasto para a realização dos objetivos. A eficiência é o conceito de que o básico é minimizar os custos, ou seja, um projeto é eficiente quando gasta igual ao orçamento planejado ou menos que esse orçamento. A efetividade se organiza na relação entre os resultados e os objetivos e possui duas vertentes que são a medida do impacto e o grau de alcance dos objetivos. A efetividade se esbarra como sinônimo de impacto e vem para averiguar se houve alguma mudança na realidade inserida com o projeto e, se o problema que se propôs a resolver, foi ou não solucionado.
É importante lembrar que — independentemente do status da área e do tipo de estudo implementado o objetivo precípuo da avaliação dos programas sociais é aprimorar sua capacidade de oferecer adequada atenção aos cidadãos. [...] a avaliação é parte essencial da formulação e implementação dos programas sociais, contribuindo para o seu aperfeiçoamento. (FARIA, 2005, p. 48).
As avaliações, principalmente no âmbito da educação, vêm sofrendo crítica por parte de alguns autores por não estarem contribuindo de fato para a melhoria da qualidade educacional. Parente (2012) relata que avaliações como o IDEB e o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) vêm acontecendo de forma mecânica e padronizada, só servindo à lógica performática e gerencialista que vem sendo implantada pela ótica neoliberal à educação, valorizando apenas a eficácia e a eficiência das ações. De acordo com o autor, as avaliações educacionais como vêm se moldando:
[...] põem a todo instante em cheque a competência do professor, vinculando-a aos resultados obtidos por meio de testes que, supostamente, avaliam a qualidade da intervenção pedagógica e, consequentemente, da aprendizagem dos alunos. (PARENTE, 2012, p.80).
Assim, as avaliações não vêm levando em consideração as especificidades de cada realidade, exaltando somente dados estatísticos, o que propicia a competitividade e individualidade dos professores e da rede educacional como um todo. Portanto as avaliações na visão de Parente (2012) só servem para regular e responsabilizar escolas, alunos e professores.
Emília Maria da Trindade Prestes (2012) diz que as avaliações podem levar a dois lados, que são: o de controle, performatividade, pura responsabilização e controle dos avaliados, de forma a não levantar formas de superação efetivas de intervenção social; ou, podem sim, contribuir para a melhoria e qualidade das políticas sociais.
No que tange ao aperfeiçoamento e desenvolvimento das políticas e projetos sociais à população atendida, as avaliações não devem se restringir a números e observações de gestores. A participação dos usuários das políticas é de suma importância, no sentido de ampliar e desenvolver juntos as políticas sociais de maneira efetiva à população. Sobre isso, Prestes (2012) relata que:
[...] como já entendia Bourdieu (1998) há quase vinte anos, que os atuais teóricos e seus avaliadores inventem formas de comunicação, destinem parte do seu tempo e de sua energia para dialogar com os avaliados, formulem linguagens e formas de expressão que promovam discussões coletivas sobre os resultados da avaliação, inventem um novo estado de espírito, novas formas de expressão e de linguagem e estabeleçam com os avaliados diálogos por meio dos quais seja possível abrir novos caminhos em busca de novos conhecimentos e de novas sociabilidades.
Assim, a busca pela melhor gestão e organização da política educacional é algo garantido em lei, que deve ser colocado em prática de forma emergencial. Nesse sentido, a avaliação da educação é algo primordial. Porém, qualquer forma de avaliação que privilegie somente os segmentos de eficiência e eficácia não é a ideal.
Na atualidade, o IDEB é um dos principais métodos de avaliação da educação, tendo servido de base para grandes e importantes decisões sobre o rumo da educação básica. Dessa forma, é de extrema necessidade a análise da sua organização, para refletirmos sobre sua real contribuição para a educação.
4 O Índíce de Desenvolvimento da Educação: sua organização e reflexão
O IDEB foi instituído em 2007 pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) visando medir a qualidade educacional do ensino básico no Brasil, permitindo saber o desempenho de cada uma das escolas brasileiras de ensino básico. Sobre isso, Castro (2009) informa que:
O Ideb reúne num só indicador dois conceitos importantes para a qualidade da educação: fluxo escolar e desempenho dos alunos nas avaliações. Seu cálculo baseia-se nos dados de aprovação escolar, apurados no Censo Escolar, e nas médias de desempenho obtidas nas avaliações nacionais: o Saeb, para as unidades da federação e o país; e a Prova Brasil, para os municípios. O novo indicador considera dois fatores que interferem na qualidade da educação: as taxas de aprovação, aferidas pelo Censo Escolar; e as médias de desempenho medidas pelo Saeb e pela Prova Brasil. A combinação entre fluxo e aprendizagem resulta em uma média que varia de 0 a 10. (Id, p.11).
O IDEB vem se caracterizando como o principal instrumento de avaliação básica. A partir de uma escala de 0 (zero) a 10 (dez), condensa dois conceitos: a aprovação e a média de desempenho dos estudantes nas disciplinas de português e matemática. Os índices de aprovação são apreendidos e calculados a partir do Censo Escolar, e as médias de desempenho, pelas provas avaliativas que o INEP promove, chamadas de Prova Brasil.
De acordo com o INEP3, o IDEB é o indicador estatístico que tem o objetivo de melhorar a qualidade educacional brasileira, possibilitando o diagnóstico e atualização da situação escolar em todos os âmbitos, estabelecendo metas para melhoria, tanto individuais quanto intermediárias.
O IDEB tem como metas a evolução da educação básica a partir dos índices estatísticos e atingir o mesmo patamar dos países que fazem parte da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Dessa forma, pretende-se sair da média nacional obtida em 2005 que foi de 3,8 e atingir a média 6,0 em 2022.
Freitas (2007) faz críticas à forma como o IDEB vem se moldando, pois em sua opinião o índice não promove a melhoria efetiva da educação para a sociedade, e sim obtém dados de forma padronizada e mecânica, na necessidade de se obter somente resultados estatísticos, que para o autor só atendem às propostas liberais de responsabilização e privatização do ensino público. Araújo (2007, p.4) também contribui dizendo que:
[...] o IDEB é mais um instrumento regulatório do que um definidor de critérios para uma melhor aplicação dos recursos da União visando alterar indicadores educacionais. O resultado de cada município e de cada estado será (e já esta sendo) utilizado para ranquear as redes de ensino, para acirrar a competição e para pressionar, via opinião pública, o alcance de melhores resultados. Ou seja, a função do MEC assumida pelo governo Lula mantém a lógica perversa vigente durante doze anos de FHC.
Assim, o IDEB vem servindo como um instrumento regulatório, responsabilizando professores e funcionários, e criando situações de disputa entre as escolas, esvaziando a luta conjunta por uma melhor política educacional e dever do Estado. Portanto,
[...] fazer do resultado o ponto de partida para um processo de responsabilização da escola via prefeituras leva-nos a explicar a diferença baseados na ótica meritocrática liberal: mérito do diretor que é bem organizado; mérito das crianças que são esforçadas; mérito dos professores que são aplicados; mérito do prefeito que deve ser reeleito etc. Mas e as condições de vida dos alunos e professores? E as políticas governamentais inadequadas? E o que restou de um serviço público do qual as elites, para se elegerem, fizeram de cabide de emprego generalizado, enquanto puderam sem regras para contratação ou demissão? O que dizer da permanente remoção de professores e especialistas a qualquer tempo, pulando de escola em escola? O que dizer dos professores horistas que se dividem entre várias escolas? O que dizer dos alunos que habitam as crescentes favelas sem condições mínimas de sobrevivência e muito menos para criar um ambiente propício ao estudo? Sem falar do número de alunos em sala de aula. (FREITAS, 2007, p. 971-972).
Dessa forma, o sucateamento da educação pelo poder público é negligenciado pela sociedade, que deposita a melhoria da educação nos alunos, professores, funcionários. A partir de Freitas (2007), se a melhoria e universalização da educação se ancorar na ideologia da meritocracia, a mesma será o seu limite de desenvolvimento, pois no âmbito do mérito se esconde a questão da desigualdade social e se estipula indicadores “neutros”, que o autor diz ser o caso do IDEB.
A forma regulatória e concorrencial pela qual vem ocorrendo o IDEB, impactando a bonificação de professores, verbas e reeleição de governantes, vem incentivando o drible dos processos avaliativos, inclusive com o incentivo dos “melhores” alunos para a realização das provas e disponibilização de cursos específicos para o SAEB e Prova Brasil. Assim, o foco educacional é a obtenção de índices nesses sistemas a qualquer custo, invertendo as prioridades políticas (Id.).
A partir das reflexões acerca da avaliação de políticas sociais feitas no item anterior, podemos afirmar que a forma como vem sendo encarado o IDEB não seria a ideal no que concerne à melhoria efetiva da política educacional, haja vista que somente vem avaliando e responsabilizando a escola.
O mais grave é o fortalecimento da ideia de que seria possível, a partir de sistemas de larga escala centralizados em Brasília ou em uma capital, reorientar escolas específicas, à distância, por exposição dos resultados à sociedade e acordos com prefeitos. Pode-se imaginar a pressão autoritária, verticalizada que os acordos assinados entre os prefeitos e o governo federal, para assumir metas do IDEB para seu município e obter verbas, vão gerar nas escolas e em seus profissionais. Não deveria ser este o papel da avaliação em larga escala ou de sistema, como veremos mais adiante, a qual deveria ser destinada, preferencialmente, à avaliação das próprias políticas públicas e não das escolas (FREITAS, 2007, p.973).
Freitas (2007) não dispensa a necessidade da avaliação. Ele a considera de extrema necessidade, porém sem a ótica da responsabilização e sim da exigência por escolas públicas de qualidade ao Estado. O autor defende o conceito de “qualidade negociada, via avaliação institucional”, que conceitua como:
A qualidade não é um dado de fato, não é um valor absoluto, não é adequação a um padrão ou a normas estabelecidas a priori e do alto. Qualidade é transação, isto é, debate entre indivíduos e grupos que têm um interesse em relação à rede educativa, que têm responsabilidade para com ela, com a qual estão envolvidos de algum modo e que trabalham para explicitar e definir, de modo consensual, valores, objetos, prioridades, ideias sobre como é a rede (...) e sobre como deveria ou poderia ser. (BONDIOLI, 2004, p.14 apud FREITAS, 2007, p.975).
Assim, o autor defende que o ideal são avaliações que dialogam com todos os atores inseridos no processo em curso, construindo seus próprios indicadores, sugestionando, refletindo, para uma real transformação e melhoria da qualidade educacional.
Portanto a avaliação institucional é necessária, dando voz aos alunos, professores, funcionários e comunidade local. A avaliação do sistema como um todo é necessária também, porém em articulação com a avaliação institucional que converge tanto nas avaliações dos alunos pelos professores, como na avaliação externa, realizada pelo sistema. Dessa forma:
A avaliação em larga escala de redes de ensino precisa ser articulada com a avaliação institucional e de sala de aula. Nossa opinião é que a avaliação de sistema é um instrumento importante para monitoramento das políticas públicas e seus resultados devem ser encaminhados, como subsídio, à escola para que, dentro de um processo de avaliação institucional, ela possa usar estes dados, validá-los e encontrar formas de melhoria. A avaliação institucional fará a mediação e dará, então, subsídios para avaliação de sala de aula, conduzida pelo professor. Entretanto, sem criar este mecanismo de mediação, o simples envio ou a disponibilização de dados em um site ou relatório não encontrará um mecanismo seguro de reflexão sobre estes. Os dados podem até ter legitimidade técnica, mas lhes faltará legitimidade política. (FREITAS, 2007, p.979).
Diante disso, é de extrema necessidade ampliar os debates sobre avaliação da política educacional, trabalhando em torno do IDEB, para que o mesmo possa realmente contribuir de maneira efetiva na qualidade de vida das pessoas, via educação escolar. Para isso, a participação, reflexão e construção em torno dos processos avaliativos da sociedade são fundamentais para se arquitetar formas para o desenvolvimento da qualidade, haja vista que são os atores (professores, alunos, funcionários, pais) que vivenciam essa realidade dia a dia.
Uma boa avaliação educacional serve de base para uma maior e melhor intervenção das políticas sociais e de subsídio para exigir do Estado os direitos previstos em lei, construindo e garantindo uma política educacional de excelência.
5 Considerações finais
O presente estudo se propôs a trazer algumas questões sobre a avaliação dentro da política educacional e suas contribuições para alcançar a qualidade. As políticas de avaliação cada vez mais ganham destaque entre os estudos, dado o seu caráter de importância na efetivação das políticas sociais.
A avaliação, a partir da sua forma teórico-metodológica, pode realmente cumprir com a missão de propiciar um diagnóstico real da situação, levantando dados precisos sobre os caminhos a serem tomados, possibilitando políticas sociais sérias e de qualidade para seus usuários, ou pode somente contribuir para a lógica mercadológica e performática, em que são evidenciados somente os dados estatísticos, que não trazem caminhos sólidos para a melhoria da política em si.
O IDEB atualmente é o principal método de avaliação da política educacional e vem levantando críticas sobre o seu caráter padronizado, puramente estatístico, não conseguindo retratar a verdadeira situação da educação e propor medidas para tal. Porém, seus defensores o apontam como essencial para se alcançar a qualidade.
Dada à importância das formas de avaliação, principalmente quando articulada com a população alvo das políticas, creio ser extremamente necessária uma avaliação via professores, alunos, pais e funcionários, sobre o IDEB, seus pontos fortes, fracos, possíveis melhorias e modificações para uma melhor gestão dessa importante ferramenta para a educação, pois como disse Danton na Revolução Francesa em 1973: “Depois do pão, a educação é a primeira necessidade do povo”.
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Notas
Notas de autor