Artigos Originais

Os cursos de licenciatura em ciências e a preparação de professores para atuar na educação de jovens e adultos

The undergraduate teaching degree courses in sciences and the preparation of teachers to work in young and adults education

Las carreras de grado en ciencias y la preparación de docentes para actuar en la educación de jóvenes y adultos

Elizabeth Augustinho 1
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Brasil
Valeria da Silva Vieira 2
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Brasil

Os cursos de licenciatura em ciências e a preparação de professores para atuar na educação de jovens e adultos

Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 25, núm. 1, e25118191, 2023

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense

Recepción: 11 Agosto 2022

Aprobación: 22 Noviembre 2022

Publicación: 31 Enero 2023

Resumo: O presente trabalho se propõe a analisar como a modalidade Educação de Jovens e Adultos tem sido contemplada na formação de professores de cursos de licenciatura em ciências. Parte-se do pressuposto de que a preparação para o magistério na Educação de Jovens e Adultos não tem sido priorizada nos cursos de formação inicial. O objetivo é aprofundar os estudos na área e modalidade e contribuir para o aperfeiçoamento dessa formação. Trata-se de uma pesquisa empírica, estruturada com base em revisão bibliográfica e análise documental. Os dados foram coletados por meio da aplicação de formulário online a professores e da apreciação de projetos pedagógicos de cursos de licenciatura em Química e Física de uma instituição pública do Rio de Janeiro. Foi utilizada a Análise Textual Discursiva para tratar os dados subjetivos do formulário, de forma qualitativa. Averiguou-se a necessidade de aperfeiçoamento para a Educação de Jovens e Adultos na formação de professores de Ciências.

Palavras-chave: educação de jovens e adultos, formação de professores, ensino de ciências.

Abstract: The present work proposes to analyze how modality Youth and Adult Education has been contemplated in the training of teachers of licentiate Science Courses. It is assumed that preparation for teaching in Youth and Adults Education has not been prioritized in initial training courses. The objective is to deepen studies in the area and modality and contribute to the improvement of this training. This is an empirical research that is based on bibliographic review and documentary analysis. Data were collected through the application of an online form to teachers and the appreciation of pedagogical projects of degree courses in Chemistry and Physics of a public institution in Rio de Janeiro. Discursive Textual Analysis was used to treat the subjective data of the form in a qualitative way. The need for improvement for the Youth and Adults Education in the training of science teachers was investigated.

Keywords: youth and adults education, teacher training, science education.

Resumen: El presente trabajo se propone analizar cómo la modalidad Educación de Jóvenes y Adultos ha sido contemplada en la formación de docentes de Carreras de licenciatura en Ciencias. Se supone que en los cursos de formación inicial no se ha priorizado la preparación para la docencia en la Educación de Jóvenes y Adultos. El objetivo es profundizar estudios en el área y modalidad y contribuir al perfeccionamiento de esta formación. Se trata de una investigación empírica, estructurada a partir de la revisión bibliográfica y el análisis de documentos. Los datos fueron recolectados a través de la aplicación de un formulario en línea a los profesores y la apreciación de proyectos pedagógicos de los cursos de licenciatura en Química y Física de una institución pública en Río de Janeiro. Se utilizó el Análisis Textual Discursivo para tratar los datos subjetivos de la forma de forma cualitativa. Se investigó la necesidad de perfeccionamiento de Educación de Jóvenes y Adultos en la formación de profesores de Ciencias.

Palabras clave: educación de jóvenes y adultos, formación de profesores, enseñanza de las ciencias.

1 Introdução

Ao se refletir sobre a formação de professores de Ciências, há de se considerar que, além de uma substancial formação específica na área, esta deve abarcar conhecimentos relacionados à educação, à história, à psicologia, à filosofia, à sociologia e a outros temas, tão imprescindíveis a uma prática docente eficaz, coerente com a realidade da escola e com as demandas sociais. Schnorr e Pietrocola (2021, p. 16) ressaltam que essa formação “ocorre imbricada entre uma especialização científica, institucionalizada pela universidade, e uma pedagogia para ensinar, conduzida pela escola.” Essa é uma questão complexa que precisa ser analisada e, na medida do possível, ser superada. Universidade e escola precisam dialogar, e questões como para quê, para quem e como ensinar precisam estar presentes na formação docente, além do o quê ensinar. A formação inicial deve fomentar essa articulação entre o saber científico e o saber escolar. Corroborando essa percepção, Cachapuz, Praia e Jorge (2004) destacam que é preciso repensar o estatuto epistemológico da Educação em Ciência, pois este só tem sentido se estiver articulado com uma justificativa social da Educação em Ciência. Portanto, o que se pretende é buscar uma formação que diminua o abismo entre as elites científicas e os cidadãos cientificamente analfabetos.

A partir dessas questões, que fazem parte da Educação em Ciências, a hipótese inicial deste estudo é que a formação de professores de Ciências ainda carece de formação pedagógica que preconize a formação para uma escola real, na qual o professor não seja o centro do processo educativo e sejam valorizadas a autonomia e as experiências dos estudantes.

Nessa perspectiva, a EJA, sendo uma modalidade da Educação Básica, se constitui como uma demanda da formação para o magistério, pois possui uma especificidade de saberes e uma clientela formada por sujeitos com conhecimentos e experiências prévias que devem ser considerados no processo educativo. A educação é direito de todos, conforme preconiza a Constituição Federal do Brasil de 1988, porém aos alunos da EJA esse direito foi negado em algum momento de suas vidas, seja por necessidade de trabalho, gravidez precoce ou outros motivos que os levaram a abandonar a escola e a retornar, posteriormente, para retomar seus estudos. Arroyo (2006) esclarece que esses jovens e adultos retornam à escola buscando resgatar outros direitos negados, como o direito ao trabalho, à terra, à sua identidade negra ou indígena, à dignidade, ou seja, o direito à educação está imbricado com direitos humanos básicos que esses sujeitos buscam recuperar. Conhecer esses sujeitos da EJA e pensar em uma prática educativa coadunada com esse público deve fazer parte da formação docente.

Nesse contexto, há de se pensar tanto na formação inicial quanto na formação continuada, pois existe atualmente um número significativo de professores já licenciados atuando na EJA sem o devido preparo. Para esses profissionais, a formação pode ser oferecida tanto a nível de aperfeiçoamento quanto através de cursos de pós-graduação lato sensu e stricto sensu (MACHADO, 2008).

Quando a atenção é direcionada para os professores-formadores dos cursos de licenciatura em ciências, a formação continuada para a modalidade EJA se constitui como extremamente pertinente, pois observa-se que a formação inicial não vem contemplando a modalidade com a devida relevância. A falta de propostas adequadas em relação às demandas da sociedade pode comprometer a prática em sala de aula, contribuindo para um fazer desprovido de significado.

Nesse sentido, a questão a ser analisada é: a formação de professores na área de Ciências tem contemplado a modalidade EJA? A proposta é aprofundar os estudos na área e modalidade, buscando contribuir para o aperfeiçoamento dessa formação.

Para dar sustentação a este trabalho, foi realizada uma pesquisa qualitativa, com revisão bibliográfica sobre o tema, destacando autores, como Freire (2010), Rummert (2017) e Chassot (2003); os dados foram coletados por meio da aplicação de formulários online a professores que atuam em cursos de licenciatura em Ciências de uma instituição pública do Rio de Janeiro e foi feita a análise documental por meio da apreciação de projetos pedagógicos de cursos de licenciatura em Química e Física, tomando como base metodológica a ATD e as referências de Minayo (2012), Gil (2019), Moraes (2003), Moraes e Galiazzi (2006).

2 Fundamentação teórica

Pensar na formação de professores nos remete ao questionamento de como está a educação brasileira e, nesse contexto, a preparação dos profissionais habilitados para atender às necessidades das novas gerações e da sociedade atual. Por conseguinte, cabe avaliarmos se a formação inicial dos licenciados tem atendido a essa realidade e se a formação continuada tem sido fomentada nos espaços educacionais. Paulo Freire (2010) nos aponta que a formação do educador deve levá-lo a refletir sobre o seu cotidiano, de modo a aprimorar a sua prática; é um ser histórico, crítico, político e, por isso, deve possuir uma postura coerente com a sua visão de mundo.

Ao analisar a realidade educacional brasileira, percebemos a desvalorização da educação e do magistério; um ensino marcado pela dualidade, no qual se observa uma aparente democratização do acesso a todos os níveis de certificação, porém profundas diferenças são mantidas, conforme evidencia Rummert (2017). O que se vê, na prática, é uma educação diferenciada para pobres e para os ricos; e, segundo Oliveira (2004), traz a marca da precarização do magistério, com o incremento de contratos temporários no ensino público, arrocho salarial, inadequação ou ausência de plano de cargos e salários, perda de direitos trabalhistas e outras ações que degradam a profissão e geram instabilidade na carreira.

Direcionando o foco para a formação de professores em Ciências no Brasil, uma questão fundamental que se observa é que esses docentes têm sido formados num modelo científico no qual são valorizados conhecimentos específicos da área em detrimento dos conhecimentos pedagógicos, tão necessários à prática do magistério (SCHNORR; PIETROCOLA, 2021). Os cursos de licenciatura em Ciências precisam repensar esse modelo, pois ambos os conhecimentos são valiosos para a prática docente; no magistério é tão importante ter conhecimento quanto saber transmiti-lo.

Dessa forma, a situação que se apresenta é uma formação inicial insuficiente, que não tem dado segurança ao professor para atuar frente à realidade cotidiana da sala de aula. Os saberes pedagógicos têm sido relegados e o aprender fazendo pela experiência acaba sendo valorizado, desconsiderando discussões já realizadas pela área de pesquisa em educação em ciências. Nessa conjuntura, os docentes têm sido formados mais pelas suas práticas, pelas suas experiências e interações com outros docentes (seus colegas de profissão ou próprios professores da educação superior) do que pelos cursos de licenciatura (SCHNORR; PIETROCOLA, 2021).

A escola não deve ser o lugar no qual se pretende testar ou colocar a teoria em prática; há que se reconhecer a escola como instituição parceira da universidade (MASSENA; SIQUEIRA, 2016). O saber obtido através da prática educativa deve retroalimentar a teoria e vice-versa, de modo que a universidade forme o profissional de que a escola precisa.

Outra questão relevante apontada por Chassot (2003) é que o ensino de ciências precisa fazer sentido para o educando, estar conectado a sua realidade ou partir desta. Ele enfatiza que atualmente não cabe mais conceber nos currículos dos cursos de ensino de ciências propostas que não incluam aspectos sociais e pessoais dos licenciandos. A formação inicial de professores precisa considerar a preparação do docente que atuará em escolas com diferentes realidades. Assim, o Ensino de Ciências deve ser direcionado para práticas pedagógicas que busquem um ensino contextualizado e socialmente significativo.

Ao se dirigir o olhar para a Educação de Jovens e Adultos, a formação qualificada tanto inicial como continuada se faz necessária. Essa modalidade engloba uma grande parcela da população, excluída dos cursos regulares e que possui sua especificidade, saberes, características e experiências prévias, que não podem ser desconsideradas na sala de aula. Nessa perspectiva, a inserção de estudos da EJA nos currículos dos cursos de licenciatura é de extrema relevância.

A luta pelo reconhecimento da EJA como uma modalidade da Educação Básica sempre se pautou nas características de seu público, isto é, dos sujeitos que se configuram em seus potenciais educandos. Se seus traços essenciais se referem à faixa etária e às fases da vida humana, a eles agregam-se outras especificidades que ajudam a compreender, inclusive, os motivos que levaram à própria existência da modalidade e à luta por sua valorização. (NICODEMOS; SERRA, 2020, p. 873).

Portanto, quando nos referimos à EJA, estamos nos reportando a sujeitos pertencentes às classes trabalhadoras, que possuem histórias de vida e, portanto, experiências já vivenciadas. Saber escutar esses sujeitos, problematizar os conteúdos, indicando caminhos possíveis, sem soluções prontas, deve estar presente na práxis docente. Paulo Freire (2010), em seu livro Pedagogia da Autonomia, ressalta que ensinar exige respeito aos saberes do educando:

[…] pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à escola, o dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os das classes populares, chegam a ela – saberes socialmente construídos na prática comunitária, mas também […] discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes em relação com o ensino dos conteúdos. (FREIRE, 2010, p. 30).

É necessário refletir sobre o mundo vivido, entender as relações sociais que são estabelecidas e o que tem sido priorizado em termos de valores humanos. Nesse contexto, a escola tem papel fundamental no desenvolvimento de uma consciência crítica e social para que sejam alcançados os pressupostos de uma educação emancipatória, que forme para a vida e que desenvolva integralmente os sujeitos, como apontam Carvalho, Derossi e Fonseca (2021).

O professor de Ciências deve possuir essa formação ampliada, especialmente aquele que for atuar na EJA, considerando os saberes construídos pelos seus sujeitos em suas vivências e relações sociais. Para tanto, é necessário repensar os cursos de formação inicial e investir na formação continuada dos professores, inserindo estudos sobre a modalidade EJA.

3 Metodologia

Selecionar as metodologias mais pertinentes é sempre um momento importante para a pesquisa científica; pensar nas estratégias adequadas para levantamento e tratamento dos dados é imprescindível para melhor apreensão da realidade.

No presente trabalho, optou-se por uma pesquisa empírica, de abordagem qualitativa. Para Minayo (2012, p. 6), “a análise qualitativa de um objeto de investigação concretiza a possibilidade de construção de conhecimento e possui todos os requisitos e instrumentos para ser considerada e valorizada como um construto científico.”

Ao considerar essa premissa, a proposta foi realizar o levantamento de dados e analisá-los qualitativamente. O objetivo foi analisar como a EJA tem sido contemplada na formação de professores, detectando ações e lacunas relacionadas a essa modalidade.

Assim, na primeira etapa da pesquisa foi aplicado um formulário a professores que atuam em cursos de licenciatura em Ciências de uma instituição pública de ensino do Rio de Janeiro. A seleção desse instrumento para a coleta de dados foi realizada de acordo com as orientações de Gil (2019), que destaca a utilização do formulário como um dos instrumentos mais recorrentes, elaborado a partir de perguntas previamente formuladas e registro das respostas. Nesse levantamento, além de questões objetivas, foram incluídas questões subjetivas, de modo a aprimorar o estudo e permitir ao professor pontuar dados qualitativos, relevantes para o estudo. Para a aplicação dos formulários, foi feito contato prévio com os coordenadores de curso e professores, de modo a sensibilizá-los a contribuírem com a pesquisa. As questões subjetivas foram analisadas a partir da Análise Textual Discursiva (ATD) que, de acordo com Moraes (2003), é uma forma de análise que pode ser definida como um processo auto-organizado de elaboração de novas compreensões dos fenômenos que investiga.

Na segunda etapa, foi realizada a análise documental de projetos pedagógicos de cursos (PPCs) de licenciatura em Ciências. Esses projetos foram obtidos através do acesso aos cursos de graduação, pelo portal virtual da instituição de ensino.

A presente pesquisa faz parte de um estudo de Curso de Doutorado Profissional, foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da instituição1 e está sendo desenvolvida, buscando garantir todos os procedimentos éticos necessários a uma pesquisa científica, bem como o sigilo e não identificação de seus colaboradores.

4 Resultados e Discussão

Para a coleta dos dados relativos à experiência profissional docente, atuação na EJA, demanda por formação na modalidade, entre outras informações relacionadas ao perfil docente relevantes para a pesquisa, foi prevista a aplicação de um formulário online a professores de cursos de licenciatura em Ciências de uma instituição pública do Rio de Janeiro. Cabe ressaltar que a ATD foi utilizada na análise dos dados do formulário.

No levantamento de informações relacionadas à presença da disciplina ou de estudos sobre a EJA nos cursos de licenciatura em Ciências da instituição pesquisada, foram analisados os Projetos Pedagógicos de Cursos.

A seguir, serão apresentados os resultados analisados e discutidos no presente estudo.

4.1 Aplicação do formulário online

A opção pelo formulário online ocorreu para facilitar a ampla participação dos professores, devido ao fato de a pesquisa ocorrer no período da pandemia de covid-192. Nesse contexto, o formulário foi aplicado a 54 professores que atuam nos cursos de licenciatura em Química e Física da instituição campo de estudo.

Os dados subjetivos foram analisados com base na ATD. De acordo com Moraes e Galiazzi (2006, p. 118), a Análise Textual Discursiva é descrita como “uma abordagem de análise de dados que transita entre duas formas consagradas de análise na pesquisa qualitativa que são a análise de conteúdo e a análise de discurso.” Dessa forma, a ATD está fundamentada na interpretação do significado atribuído pelo autor e nas condições de produção de um determinado texto.

Em relação à experiência no magistério, foi detectado que grande parte dos professores participantes da pesquisa possui vasta experiência profissional (Gráfico 1). A maioria possui 15 anos ou mais de magistério (52%); adicionando os que possuem de 10 a 14 anos (20%) esse percentual atinge 72%. Os professores que possuem de 5 a 9 anos de experiência representam 17% e apenas 11% possuem até 4 anos de magistério.

Percentual de professores por tempo de magistério
Gráfico 1.
Percentual de professores por tempo de magistério
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ- 2º semestre de 2020

Quando se direciona o olhar para a modalidade EJA, isso não se reflete, ou seja, apesar da elevada experiência docente, quando se analisa a atuação na EJA, o que se percebe é que cerca de 40% dos professores não possuem experiência na modalidade. Do total de professores, aproximadamente 60%, que possuem experiência docente na EJA, a grande maioria (75%) possui experiência de até 4 anos (Gráfico 2), o que representa pouca experiência. Nenhum professor possui experiência de 15 anos ou mais na EJA.

Percentual de professores com experiência na EJA por tempo de atuação
Gráfico 2.
Percentual de professores com experiência na EJA por tempo de atuação
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ- 2º semestre de 2020

Ao universo de professores que não possui experiência docente em EJA (40%) foi questionado sobre o desejo de trabalhar nessa modalidade, havendo cerca de 70% desses professores manifestado o desejo de trabalhar na EJA. Esse dado pode levar ao entendimento de que muitos professores ainda não atuam na EJA por falta de conhecimentos e se sentem consequentemente inseguros para atuar na modalidade.

A partir dessa constatação, dos 22 professores sem experiência na EJA, 19 professores justificaram positiva ou negativamente o desejo de atuar na modalidade: 13 professores (68,4%) pontuaram os motivos pelos quais gostariam de trabalhar na EJA, e 6 professores (31,6%) disseram por que não gostariam.

Ao analisar as respostas dos professores que não possuem experiência com turmas de EJA, mas que gostariam de trabalhar nessa modalidade (respostas positivas), foram criadas três categorias de respostas, analisadas com base na ATD:

  1. - Categoria denominada de Formação Acadêmica, que buscou agrupar as respostas relacionadas ao reconhecimento de que o professor é habilitado para atuar na modalidade e/ou possui experiência prévia ou desejo de atuação futura.

  2. - Categoria denominada Motivacional, que agrupou as respostas relacionadas aos desafios/interesses/oportunidades de atuar na modalidade.

  3. - Categoria denominada Relevância Social, que abarcou as respostas que demonstraram o reconhecimento da importância da EJA para minimizar desigualdades de oportunidades e contribuir para a inclusão social e garantia do direito à educação.

A seguir, será apresentada a categorização das 13 respostas de professores que não possuem experiência em turmas de EJA, mas gostariam de trabalhar na modalidade (Quadro 1).

Quadro 1.
Análise das respostas dos professores que não possuem experiência na EJA, mas que gostariam de atuar na modalidade
CATEGORIA (respostas positivas)FREQUÊNCIATRECHOS DAS RESPOSTAS
Formação acadêmica: relacionada à habilitação para atuar na modalidade e/ou experiência prévia ou futura7 Seria uma experiência diferente das que já tive.
Fiz estágio na EJA. A experiência foi gratificante porque os alunos da EJA nos dão retorno imediato.
Fui coordenadora pedagógica. É uma experiência enriquecedora e desafiadora.
Para ampliar minha experiência docente.
Tenho experiência com trabalhos religiosos/sociais envolvendo jovens e adultos, além de gostar muito do contato e troca de experiências com indivíduos dessa faixa etária.
Seria uma experiência nova poder atuar na educação de jovens e adultos.
Por ser uma experiência relevante.
Motivacional: relacionada ao(à) desafio/interesse/oportunidade de atuar na modalidade5Desafio de construir uma metodologia de ensino focada no contexto do estudante, que é bastante diferente dos demais estudantes do campus.
Gostaria de contribuir para a inclusão e incentivo de pessoas que se encaixam nessa categoria de ensino.
Porque me interessa o trabalho com um público para quem a escola é uma oportunidade tão cara e importante.
Seria desafiador. E uma possibilidade de aprender.
É mais uma oportunidade para atuar em um outro nível de ensino.
Relevância social1Acho importante a modalidade EJA. Nosso país é assolado por uma desigualdade social enorme. Oportunizar a adultos a continuidade dos estudos me parece uma forma de contribuir para combater esta desigualdade. Também tenho interesse como pesquisador do ensino de física. Não há muito interesse dos pesquisadores em investigar a modalidade EJA, quase não há publicações e trabalhos nessa área. É um desafio interessante lecionar física nessa modalidade.
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ- 2º semestre de 2020

Os dados apresentados no Quadro 1 indicam que a maioria desses professores que não possui experiência na EJA reconhece a especificidade da modalidade, de seus sujeitos e sua importância, na busca pela garantia do direito à educação para todos. A demanda por formação e a necessidade de aprofundamento dos estudos foram salientadas bem como o desafio ao docente que não possui experiência na EJA. Essas falas corroboram questões já apontadas na Conferência de Hamburgo (1997), como o direito à educação a todos os sujeitos, independentemente de idade e a especificidade da educação de adultos e a sua relevância, com o objetivo de oferecer a homens e mulheres as oportunidades de educação continuada ao longo de suas vidas.

Ao analisar as respostas dos professores que não possuem experiência com turmas de EJA e que não gostariam de trabalhar nessa modalidade (respostas negativas), foram criadas duas categorias, analisadas com base na ATD:

  1. - Categoria denominada de Formação Acadêmica, que buscou agrupar as respostas referentes à falta de formação e perfil profissional;

  2. - Categoria Motivacional, que agrupou as respostas relacionadas à falta de interesse em atuar na EJA.

No Quadro 2, será apresentada a categorização das seis respostas de professores que não possuem experiência em turmas de EJA e que não gostariam de trabalhar na modalidade.

Quadro 2.
Análise das respostas dos professores que não possuem experiência na EJA e que não gostariam de atuar na modalidade
CATEGORIA (respostas negativas)FREQUÊNCIATRECHO DE RESPOSTAS
Formação acadêmica: relacionada à falta de formação/perfil 4 Acho que o meu perfil de trabalho é mais voltado para a área de ciências, tecnologia e engenharia.
Não tenho formação para atuar com este público.
Não tenho perfil.
Não me sinto preparado nem capacitado.
Motivacional: relacionada à falta de interesse em atuar na modalidade. 2Apesar de entender que a EJA é fundamental, a ideia de trabalhar na EJA nunca me seduziu.
Porque já tenho outras turmas.
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ - 2º semestre de 2020

A partir das respostas do Quadro 2, pode-se inferir que a maioria dos professores que não possui experiência na EJA não tem interesse em atuar na modalidade por motivos relacionados à falta de formação e ao perfil profissional; mas também há aqueles que não se identificam com esse campo de atuação.

Outro dado importante da pesquisa, conforme pode ser observado no Gráfico 3, aponta que uma grande parcela dos professores (54%) não teve nenhuma formação (inicial ou continuada) na EJA, o que ratifica a demanda por formação, destacada por Machado (2008), sobre a necessidade de se repensar os cursos de formação inicial de professores e inserir nos currículos dos cursos de licenciatura estudos sobre a modalidade.

Percentual de professores com/sem formação na EJA
Gráfico 3.
Percentual de professores com/sem formação na EJA
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ - 2º semestre de 2020

Ao verificar o total de professores que tiveram alguma formação na EJA, a maioria foi adquirida em sua formação continuada (84%). O contato com a EJA na formação inicial não é expressivo (16%). Os dados estão sistematizados no Gráfico 4.

Percentual de professores com formação em EJA inicial e/ou continuada
Gráfico 4.
Percentual de professores com formação em EJA inicial e/ou continuada
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ - 2º semestre de 2020

Cabe ressaltar que alguns poucos professores tiveram formação inicial e continuada na EJA (16%), mas a grande maioria obteve somente formação continuada na modalidade (84%). Esse dado nos leva a crer que a preparação de professores nos cursos de licenciatura carece dos estudos relativos à EJA. Nesse sentido, a formação continuada tem buscado suprir essa falha na formação inicial e investido na atualização de docentes para uma prática mais adequada aos sujeitos e à realidade dessa modalidade. Paiva (2004) ratifica a importância da formação continuada dos educadores e acrescenta que é necessário ressignificar os processos de aprendizagem pelos quais os sujeitos se produzem e se humanizam ao longo de toda a vida.

Outra questão importante para a pesquisa foi mapear a percepção dos professores sem formação na EJA sobre a importância dos estudos da modalidade para a sua atuação profissional. Nesse levantamento, 87% dos professores reconhecem a relevância da formação na EJA (percepção positiva) e apenas 13% afirmaram não perceber a importância dessa formação na sua atuação profissional (percepção negativa). Esse dado indica que a grande maioria dos docentes sem preparo para atuar na modalidade considera importante essa formação.

Ao analisar as respostas dos 20 professores que não possuem formação na EJA, mas que reconhecem a importância da formação nessa modalidade (87%), respostas positivas, foram criadas 6 categorias de respostas, analisadas com base na ATD:

  1. - Categoria denominada Especificidades da modalidade EJA, que buscou agrupar as respostas que evidenciaram a EJA como modalidade de ensino que possui suas especificidades, demandando formação específica.

  2. - Categoria denominada Necessidade de preparo técnico/aprimoramento e adequação profissional, que agrupou as respostas que ressaltaram a necessidade de formação adequada para atuar na EJA, reconhecendo que essa modalidade necessita de uma “adaptação”/ação diferenciada.

  3. - Categoria denominada Complemento/atualização profissional, que agrupou as respostas que priorizaram a necessidade da formação continuada para atuar na EJA.

  4. - Categoria denominada Carreira abrange esta atuação, que englobou as respostas que valorizaram a necessidade de formação para todos os docentes que atuam na Educação Básica.

  5. - Categoria denominada Formação inicial inadequada, que abarcou as respostas relacionadas às falhas nos cursos de licenciatura e à desvalorização de disciplinas educacionais/pedagógicas nesses cursos.

  6. - Categoria denominada Necessidade desde a formação inicial, que buscou agrupar as respostas que valorizaram a importância da formação na EJA desde a formação inicial de professores.

No Quadro 3, apresenta-se a categorização das 20 respostas dos professores que não possuem formação na EJA, mas que reconhecem a importância dessa formação na modalidade.

Quadro 3.
Análise das respostas dos professores que não possuem formação na EJA e que reconhecem que essa ausência fez falta na sua atuação profissional
CATEGORIA (respostas positivas)FREQUÊNCIATRECHOS DE RESPOSTAS
Especificidades da modalidade EJA5Penso que a forma como o aluno da EJA aprende é bem diferente da forma como um adolescente aprende a física.
Porque a EJA requer alternativas didáticas.
Para lidar com as questões didáticas e pedagógicas específicas desse público que teve o seu acesso à educação em outros tempos.
As disciplinas de ensino, avaliação e de instrumentação para o ensino discutiram os aspectos da EJA.
Porque esse grupo apresenta especificidades que nem sempre sabemos explorar.
Me adaptei muito com a EJA em outra instituição.
Necessidade de preparo técnico/ aprimoramento e adequação profissional5Porque considero que a EJA necessita de muito preparo técnico, mais do que outras modalidades de ensino. Proporcionar aprendizagem de fato junto a esse público é algo muito satisfatório, demanda preparação, investigação, contínua busca de estratégias adequadas, disponibilidade.
Porque é uma realidade para a qual devemos estar preparados.
Eu poderia ser um professor melhor, com mais ferramentas.
Desconhecia totalmente a realidade e suas necessidades.
Me adaptei muito à EJA em outra instituição.
Complemento/atualização profissional3Para minimamente entendermos os processos pedagógicos-didáticos desta modalidade.
Atualização profissional sempre é bem-vinda.
Seria um complemento importante.
Carreira abrange esta atuação3Minha carreira abranger esta atuação.
Porque a instituição possui turmas de EJA e eu não atuo por não ter formação.
Porque se, em algum momento eu precisar trabalhar nessa modalidade não terei formação.
Formação inicial inadequada (desvalorização de disciplinas educacionais/pedagógicas)3Me formei numa universidade e num curso que não valorizava a EJA e nem as práticas educativas. […].
Os objetivos de quem busca a EJA é totalmente diferente do ensino regular e todo o esforço da graduação é para o segundo. As lacunas do processo de ensino aprendizagem já é pouco abordada com o público-alvo do ensino superior, então para a EJA essa carência se torna um abismo.
No início da minha atuação docente nas turmas de EJA, não tinha noção das especificidades do curso.
Necessidade desde a formação inicial1[…] tem uma palestra ou outra, mas acho que na formação já podia haver alguma especialização nessa área.
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ - 2º semestre de 2020

Os dados apresentados no Quadro 3 indicam que esses professores reconhecem que a EJA possui especificidades, demandando preparo técnico, aprimoramento, adequação, complemento e atualização profissional. Por exemplo, quando o professor afirma que se adaptou à EJA em outra instituição, pode-se inferir que ele observa que essa modalidade de ensino possui demandas próprias, que necessita adequar sua prática pedagógica para atuar na EJA, diferindo da atuação docente no ensino regular. Outro dado relevante está relacionado à carreira do magistério/atuação profissional, pois os professores licenciados estão habilitados para exercer a docência na Educação Básica, sendo a modalidade EJA destinada a estudantes desse nível de ensino (fundamental e médio). Assim, é ressaltado que estudos sobre a Educação de Jovens e Adultos já deveriam estar previstos desde a formação inicial. No entanto, a pesquisa revelou que os estudos sobre a modalidade EJA não estão sendo contemplados nos cursos de licenciatura, pois apenas 16% dos professores afirmaram ter obtido preparação para atuar na EJA em sua formação inicial. Soares (2008) evidencia que à medida que a EJA se torna um campo pedagógico específico da educação e requer profissionalização, a formação de professores precisa considerar essa demanda.

Ao analisar as respostas dos professores que não possuem formação na EJA e que não reconhecem a importância da formação nessa modalidade (13%), respostas negativas, foram criadas 3 categorias de respostas para cada uma das 3 respostas, analisadas com base na ATD:

  1. - Categoria denominada Experiência prévias em outros contextos.

  2. - Categoria denominada Atuação em outras frentes.

  3. - Categoria denominada Desconsidera a importância da formação na EJA.

A seguir, será apresentada, no Quadro 4, a categorização das 3 respostas de professores que não possuem formação na EJA e que não consideram que essa ausência fez falta em sua atuação profissional.

Quadro 4.
Análise das respostas dos professores que não possuem formação na EJA e que não reconhecem que essa ausência fez falta em sua formação
CATEGORIA (respostas negativas)FREQUÊNCIATRECHO DE RESPOSTAS
Experiência prévia em outros contextos1Devido a minha experiência pessoal com jovens e adultos em outros trabalhos.
Atuação em outras frentes1Porque já faço outras atividades, não é meu foco.
Desconsidera a importância da formação na EJA1Não fez falta, já que não tenho problemas com o trabalho desenvolvido com esse público. […]
Fonte: Formulário online aplicado a professores das licenciaturas em Ciências/RJ - 2º semestre de 2020

Ao categorizar as respostas dos professores que não reconhecem a importância da formação na EJA, sistematizadas no Quadro 4, percebe-se que um professor considera sua experiência externa suficiente, outro, por não atuar na modalidade e desenvolver outras atividades, não necessita dessa formação, e apenas um professor afirmou considerar totalmente desnecessária a formação na modalidade.

Ao finalizar essa etapa da pesquisa, pode-se inferir que a maioria dos professores participantes da pesquisa reconhece a importância da formação na EJA devido a sua especificidade, características de seu público e demandas próprias.

4.2 Análise documental

De acordo com Gil (2019, p. 62), “a análise e interpretação dos dados na pesquisa documental tende a variar conforme a natureza dos documentos utilizados.” O documento selecionado para este estudo foi o projeto pedagógico de curso (PPC), documento que dá identidade ao curso de graduação, contemplando aspectos teórico, metodológico, organizacional, entre outros, que embasam o perfil do profissional que se deseja formar. Oliveira et al. (2017, p. 138) acrescentam que “no PPC podemos encontrar a descrição (com fundamentos teóricos e metodológicos) e as formas de organização do processo de formação, o que nos permite observar os objetivos, as diretrizes e a dinâmica de determinado curso.”

Na pesquisa apresentada, foram selecionados os projetos pedagógicos de cursos de licenciatura em Ciências de uma instituição pública do Rio de Janeiro com o objetivo de verificar se a EJA tem sido contemplada nesses documentos. Para tratamento dos dados foram definidas as seguintes unidades de análise: atualização do PPC; se contempla a disciplina ou estudos relativos à EJA e a forma de oferta (obrigatória ou optativa); tipo de abordagem (teórico ou prática); carga horária/ tempos semanais/créditos; disponibilidade do programa ou plano curricular aos alunos; se a ementa e o objetivo geral estão adequados à modalidade, considerando os pressupostos atuais e carga horária da disciplina e, por último, verificar a atualização das bibliografias básica e complementar e a inclusão de referências importantes na modalidade.

A partir dessa definição, foram pesquisados quatro projetos pedagógicos de cursos, sendo dois de Química (LQ1 e LQ2) e dois de Física (LF1 e LF2), de diferentes campi, a partir do acesso ao portal virtual da instituição, na aba Cursos de Graduação.

Ao analisar os projetos, verificou-se que os quatro cursos possuem a EJA como disciplina optativa em seus cursos, de abordagem teórica, com carga horária de 27 horas (dois tempos semanais/créditos).

No PPC da LQ1, as disciplinas optativas não aparecem listadas; o Plano da Unidade Curricular da disciplina Educação de Jovens e Adultos está disponibilizado no link Plano de Disciplinas. O PPC foi revisado em dezembro de 2018. A ementa e o objetivo geral demonstram estar adequados; porém as bibliografias básica e complementar carecem de atualização. Para se inscrever na disciplina, o aluno tem que ter cursado a disciplina obrigatória História, Política e Legislação da Educação, relacionada como pré-requisito.

No PPC da LQ2, a EJA está relacionada como optativa das áreas de Ensino e Educação e o programa da disciplina está acessível no Plano de Disciplinas. A última atualização do PPC foi feita em outubro de 2018. A ementa e o objetivo geral são considerados pertinentes, mas as bibliografias básica e complementar não estão atualizadas. No programa, não há pré-requisito para a disciplina.

Comparando os PPCs de LQ (1 e 2), percebe-se uma relativa similaridade, como a presença na bibliografia básica de obras de Paulo Freire (Pedagogia do oprimido, 2005 e Pedagogia da autonomia, 2011) e do livro Educação de Jovens e Adultos: teoria, prática e proposta, de Gadotti e Romão (2011, 2010), porém tanto o objetivo geral quanto a ementa diferem em alguns aspectos. A partir de uma breve análise, pode-se observar uma bibliografia adequada, considerando as especificidades da EJA e seu público, porém necessitando ser atualizada; verifica-se, ainda, que apesar das diferenças pontuadas, os Projetos Pedagógicos das licenciaturas em Química demonstram pertinência e compatibilidade com a carga horária proposta.

O curso de LF1 foi atualizado em maio de 2018 e apresenta no PPC a disciplina EJA na relação de disciplinas optativas do eixo comum das licenciaturas, todavia no site institucional não estão disponíveis os programas das disciplinas optativas, somente das obrigatórias. O acesso ao plano de ensino da disciplina Fundamentos da Educação de Jovens e Adultos foi obtido diretamente com a professora que a ministra. Ao analisar o documento, foi verificado que a ementa e o objetivo geral estão adequados, bem como as bibliografias básica e complementar, mas serão ajustados para o próximo período letivo, conforme relato da professora da disciplina. O plano está detalhado, incluindo objetivos específicos, conteúdos e critérios de avaliação.

O PPC de LF2 relaciona a EJA como disciplina optativa na área de Educação e o programa da disciplina encontra-se disponível no site institucional, no link Programa de Disciplinas. A revisão do PPC foi feita em junho de 2018. A ementa e objetivo geral estão coerentes; a bibliografia básica está atualizada com referências dos últimos cinco anos, mas a bibliografia complementar não está atualizada.

Comparando os PPCs de LF (1 e 2), observa-se que ambos relacionam em suas ementas a preocupação com os estudos da atualidade para a EJA na formação do futuro professor; o livro Diálogos na educação de jovens e adultos, de Soares, Giovanetti e Gomes (2005) está relacionado como bibliografia básica nos dois cursos; como também obras de Freire estão relacionadas nos dois cursos, sendo que em um deles aparece somente na bibliografia complementar e, no outro, em ambas (básica e complementar). Ao analisar os Projetos Pedagógicos das licenciaturas em Física, percebe-se que a bibliografia está coerente e a atualização está sendo priorizada em ambos os cursos; eles possuem similaridades e demonstram adequação e compatibilidade com a carga horária prevista.

Finalizando essa etapa, pode-se inferir que a oferta de disciplina optativa, abordando a Educação de Jovens e Adultos demonstra um certo avanço nos PPCs das licenciaturas em Ciências; porém, sendo uma modalidade da Educação Básica de ampla oferta tanto na rede pública quanto na particular, deveria ser contemplada como disciplina obrigatória, de modo a evitar que os licenciandos concluam seus estudos na formação inicial sem terem nenhum contato com os conteúdos relativos a essa modalidade, salvo algumas disciplinas de ensino, cujo professor aborde questões relacionadas à EJA. Outra questão relevante observada é que, em todos os cursos analisados, os planos ou programas da disciplina são diferentes; apesar de possuírem algumas semelhanças, fica evidente que cada um tem uma identidade própria, não demonstrando haver preocupação institucional em padronizar a oferta da disciplina. Santos, Massena e Sá (2011) reafirmam a falta de inserção dos estudos sobre a EJA em currículos de curso de licenciatura em Ciências, apesar da normativa legal vigente contemplar a modalidade EJA. Os autores acrescentam e ratificam a importância de as universidades e instituições de ensino estreitarem os laços de modo a oportunizar maior interação entre ambas e promover o acesso ao que tem sido pesquisado na educação superior relativo à EJA nas universidades, buscando a reflexão sobre o ensino adequado à realidade das escolas.

5 Considerações finais

O estudo apresentado buscou demonstrar que a formação de professores de Ciências para a Educação de Jovens e Adultos ainda carece de obrigatoriedade nos cursos de licenciatura. A inclusão da disciplina EJA nos currículos dos cursos, como foi observado na análise documental, representa um relativo avanço para a Educação em Ciências, porém a oferta como disciplina optativa não garante que o futuro professor irá adquirir o conhecimento acerca da modalidade durante a sua formação inicial.

A existência de um número significativo de professores sem formação ou com pouca experiência na Educação de Jovens e Adultos atuando nos cursos de licenciatura apontam que a formação continuada se apresenta como imprescindível oportunidade de complementação pedagógica na modalidade.

Reconhecer a importância da Educação de Jovens e Adultos na formação do professor de Ciências pode representar uma oportunidade ímpar para se debater questões relacionadas à educação popular, à diversidade, a políticas públicas para a educação básica, profissional e formação de professores, bem como outros temas pertinentes a essa modalidade, na busca por um ensino adequado às características de seu público, considerando a realidade excludente ainda existente e vivenciada por muitos de seus sujeitos.

A Educação de Jovens e Adultos ainda se constitui como um desafio para os cursos de licenciatura em Ciências. É mister oportunizar os estudos nessa modalidade desde a formação inicial de forma mais efetiva e incentivar a atualização e complementação dos professores por meio da formação continuada/permanente.

Tão importante e fundamental quanto formar professores para ensinar Ciências, é conhecer seus estudantes, interesses e desejos para uma prática educativa mais humana, crítica, reflexiva, inclusiva, emancipatória e coerente com as demandas da atualidade.

Agradecimentos

Aos diretores, coordenadores e professores participantes da pesquisa pela valiosa contribuição.

Ao Instituto Federal Fluminense pela oportunidade de divulgação deste trabalho.

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Notas

1 Projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP). Número do Parecer: 4.007.669.
2 A Covid-19 é uma infecção respiratória aguda causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, potencialmente grave, de elevada transmissibilidade e de distribuição global, de acordo com o Ministério de Saúde (BRASIL, 2021).

Notas de autor

1 Doutora em Ensino de Ciências pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ). Pedagoga e professora do Curso de Pós-Graduação lato sensu em Educação de Jovens e Adultos, ambos no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ) – Rio de Janeiro/RJ – Brasil. E-mail: betheaug@gmail.com.
2 Doutora em Ciências pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ) – Rio de Janeiro/RJ – Brasil. E-mail: valeria.vieira@ifrj.edu.br.

Información adicional

COMO CITAR (ABNT): AUGUSTINHO, E.; VIEIRA, V. S. Os cursos de licenciatura em ciências e a preparação de professores para atuar na educação de jovens e adultos. Vértices (Campos dos Goitacazes), v. 25, n. 1, e25118191, 2023. DOI: https://doi.org/10.19180/1809-2667.v25n12023.18191. Disponível em: https://www.essentiaeditora.iff.edu.br/index.php/vertices/article/view/18191.

COMO CITAR (APA): Augustinho, E., & Vieira, V. S. (2023). Os cursos de licenciatura em ciências e a preparação de professores para atuar na educação de jovens e adultos. Vértices (Campos dos Goitacazes), 25(1), e25118191. https://doi.org/10.19180/1809-2667.v25n12023.18191.

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