ARTIGOS ORIGINAIS
Desacoplamento entre emissões de CO2 e crescimento econômico no Brasil e em outros países
Decoupling between CO2 emissions and economic growth in Brazil and in other countries
Desacoplamento entre emissões de CO2 e crescimento econômico no Brasil e em outros países
Vértices (Campos dos Goitacazes), vol. 19, núm. 2, 2017
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
Recepción: 20 Junio 2016
Aprobación: 04 Mayo 2017
Resumo: O objetivo deste artigo é examinar a alteração de comportamento entre as emissões de CO2 e o crescimento econômico no mundo, registrada nos anos de 2013/2014, que poderá se configurar em desacoplamento e, desta forma, contribuir para o debate sobre as alternativas de redução do efeito estufa. Estabelecemos como eixo temporal de análise o período 19902014, pois neste intervalo há duas inflexões na curva de crescimento da emissão de CO2 no mundo: uma associada à crise mundial de 2008; outra, a partir de 2013, em destaque neste artigo. Escolhemos seis países: Estados Unidos, Japão, Brasil, China, Índia e Rússia. Em comum a todos eles o fato de somarem expressiva participação na produção mundial na mesma medida da emissão de CO2. Como resultado, identificamos alteração relativa aos vetores produto interno bruto e emissões de CO2 no mundo, em favor da redução das emissões, como reflexo do comportamento destas duas variáveis nos países estudados, o que, se confirmado, aponta na direção de mudanças estruturais entre estas duas variáveis.
Palavras-chave: Energia, Emissão de CO2, Desacoplamento, Produto interno bruto, Desenvolvimento.
Abstract: The aim of this article is to examine the change in behavior between CO2 emissions and the world economic growth in the years 2013 and 2014 which may represent decoupling, and, thus, contribute to the debate on alternative forms of reducing greenhouse effect. We established the 1990-2014 period as time axis because it presents two inflections in the growth curve of global CO2 emissions: one associated with the 2008 world crisis; and the other starting in 2013, discussed in this article. We selected six countries: the United States, Japan, Brazil, China, India, and Russia. In common, they share the same amount of CO2 emissions in world production. As a result, we identified changes related to the vectors gross domestic product and global CO2 emissions, favoring gas emissions reduction, as behavioral reflection of these two variables in the investigated countries which, if confirmed, points to structural changes between these two variables.
Keywords: Energy, CO2 emission, Decoupling, Gross domestic product, Development.
1 Introdução
Historicamente, a expansão da economia tem ocorrido juntamente com o aumento dos níveis de emissões de CO2, resultado de um modelo de desenvolvimento altamente dependente da energia obtida por meio da queima de combustíveis fósseis. Para os estudiosos da ciência ambiental, esta vinculação entre a atividade econômica e os fósseis alcançou níveis inaceitáveis, uma vez que os prejuízos ambientais, em especial aqueles associados ao aquecimento global, exigem a reversão de situação instalada e tornam imperativa a busca de um novo padrão de desenvolvimento. A constatação de que apesar desta vinculação, entre 2013 e 2014, mesmo com a economia mundial crescendo 6,5%, as emissões de dióxido de carbono não evoluíram no mesmo ritmo de antes, representa um alento. Estudos recentes apontam a ocorrência de um possível desacoplamento entre estas duas variáveis.
O objetivo deste artigo é examinar a alteração do comportamento entre as emissões de CO2 e o crescimento econômico no mundo e em seis países no período de 1990/2014, uma vez que neste intervalo há duas inflexões na curva de crescimento da emissão de CO2 no mundo, uma notadamente associada à crise econômica norte-americana de 2008 com seus reflexos globais; outra, a partir de 2013, em destaque neste artigo, que poderá se configurar em desacoplamento, ou seja, em uma dissociação entre as taxas de crescimento da atividade econômica e as emissões de CO2 a partir do consumo de energia, caracterizada pela mudança de direção nos vetores destas duas variáveis, recolocando o debate em torno das alternativas de desenvolvimento em novas bases.
Para tanto, definimos como objeto o Brasil e os cinco países maiores emissores de CO2, a saber: Estados Unidos (EUA), China, Japão, Índia e Rússia, tendo como eixo temporal de análise o período 1990-2014. Estes últimos países estão considerados entre os “Dez países maiores emissores em 2013” (IEA, 2015a). Além deste critério de elegibilidade, há também o fato de que, somados, estes seis países representam em torno de 50% do PIB mundial.
Obviamente que o foco da nossa análise se concentra em um conjunto de países que diferem em seus estágios de desenvolvimento. Entretanto, foi esta diferença que se constituiu em atrativo. Afinal, este comportamento típico entre PIB e emissão de CO2 não poderia acarretar em uma espécie de “condenação” aos países em desenvolvimento pela crescente pressão ambiental? Se for possível crescer sem intensificar as emissões, não seria a oportunidade para os países adotarem um novo padrão de desenvolvimento, distinto do hegemônico desde a Revolução Industrial?
De forma geral, a economia mundial cresceu nos últimos dez anos, possibilitando um transbordamento que alcançou os países em desenvolvimento. Os EUA e o Japão, no que pese um menor crescimento, não reduziram a força e a dinâmica de suas economias. Alguns países emergiram, como a China e a Índia, o primeiro com taxas de crescimento acima da média mundial; o segundo com a força do setor de serviços. A Rússia vem recuperando as perdas do colapso da antiga União Soviética, por meio do incremento das exportações de petróleo e gás natural. E o Brasil, que vem concentrando suas exportações em produtos primários, em especial os agrícolas e os minerários, apresenta um crescimento menor, mas considerável em termos de paridade de compra (GOLDEMBERG; LUCON, 2012).
Considerando a complexidade e as contradições que permeiam a temática, não há pretensão, neste artigo, de aprofundar uma análise com base na comparação entre os países, uma vez não ser recomendável este expediente por se tratar de países com padrões de desenvolvimento e características tão diversas inscritas em cultura, história, ambiente natural e condições climáticas.
Assim, na seção 1, abordaremos a relação entre riqueza e emissão de CO2 oriundas da produção e consumo de energia, em que, de forma indelével, traz a Revolução Industrial como marca da intensificação do uso dos combustíveis fósseis.
Na sequência, a seção 2 apresenta dados que relacionam a emissão de dióxido de carbono (CO2) e o PIB do mundo e dos países selecionados neste artigo, considerando para esta análise, respectivamente, o período de 1990-2014 e o de 1990-2013. De forma breve, serão feitas também análises apoiadas em indicadores como intensidade de dióxido de carbono, intensidade energética e coeficiente de dióxido de carbono.
A seção 3 apresenta, com base na abordagem de Goldemberg e Lucon (2012), a relação entre energia e desenvolvimento a partir das variáveis: consumo de energia primária per capita e os indicadores que compõem o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) para os países selecionados, ou seja, a renda em função do consumo de energia primária total per capita; o IDH como função do consumo de eletricidade (em kWh) per capita e o IDH como função do consumo de energia primária total per capita. E, por fim, a seção 4 destaca as considerações finais.
2 Contexto histórico da relação entre riqueza dos países e emissão de CO2 oriundos da produção e do consumo de energia
A energia constitui-se em condição intrínseca à existência humana e fundamental ao seu desenvolvimento. Na medida da evolução da espécie, o Homem aumentou sua demanda por energia, utilizando-a para tornar sua vida mais confortável, a natureza é tomada como fonte de suprimento de energia para satisfazer necessidades básicas da espécie humana, quer sejam na forma de calor, movimento e iluminação (LA ROVERE, 2001).
A dependência da natureza para o atendimento de suas necessidades básicas faz da espécie humana um agente responsável por modificar o funcionamento dos sistemas naturais, a ponto de, em muitos casos, levá-los ao colapso. Este processo de modificação e apropriação da natureza foi ascendente.
Nas sociedades primitivas, eram menores as consequências provocadas pelo homem aos sistemas naturais, na medida em que a sua ação derivava, em grande parte, da utilização de recursos renováveis, como a caça e as pequenas lavouras. Mesmo na antiguidade clássica, em que os registros já apontam para uma sociedade detentora de práticas produtivas, comerciais e desenvolvimento populacional, os impactos ambientais eram restritos e locais. Na Idade Média, de economia de base agrícola, a ameaça aos sistemas naturais fora pequena, ainda que haja registros de desflorestamento e poluição do ar devido à prática da fundição, como fabricação de ferramentas e utensílios (LAGO; PÁDUA, 1989).
Com o advento da Revolução Industrial, registra-se um aumento substantivo no uso dos recursos naturais não renováveis e na produção de resíduos cujos impactos à natureza, estima-se, está no centro da ameaça aos diferentes ecossistemas. O que antes significava consumo dos recursos para atender as necessidades humanas básicas passou para um padrão de consumo que se justificava para garantir o processo de acumulação de capital1.
A industrialização, no sentido histórico, a) impõe um novo modelo de organização da sociedade (urbano-industrial) com costumes e estilo de vida que implicam maior impacto na relação do homem-natureza e b) se desenvolve de forma intrínseca ao capitalismo, pois enquanto sistema, caracteriza-se pela promoção de um mercado em contínua expansão, isto faz com que o modo de vida urbano a ele associado e os interesses da biunívoca relação industrial-capitalista estejam no cerne da valorização e difusão de padrões comportamentais, sociais e culturais.
A mudança de paradigma a partir da era industrial foi expressiva. O consumo energético per capita explodiu, chegando a 77 mil kcal/dia em 1875, bem como a quantidade de energia mobilizada por minuto também cresceu (LA ROVERE, 2001). A história da civilização identifica um aumento crescente das necessidades humanas, o que implicou maior consumo de energia, conforme o observado na Figura 1.
Goldemberg & Lucon (2012, p. 58) correlacionam os diversos estágios de desenvolvimento do homem com a respectiva energia consumida, como mostra a Figura 1.
Para La Rovere (2001), a partir da Revolução Industrial começava a grande transição para os combustíveis fósseis. A Figura 2 mostra que, desde 1870, as emissões de CO2 a partir da queima de combustíveis fósseis têm aumentado exponencialmente.
É importante destacar que, no período de transição entre os anos de 1960 e 1970, foram tomadas as primeiras iniciativas no âmbito das políticas ambientais e da gestão ambiental no mundo. A inserção da questão ambiental na agenda política dos países é gradativa e ocorre na medida em que ocorre uma tomada de consciência da comunidade científica acerca do elevado poder de destruição dos sistemas técnicocientíficos aplicados aos processos industriais e o engajamento e mobilização de importantes parcelas da sociedade interessada em modificar uma realidade marcada por paradoxos e contradições reveladas nas visíveis divergências entre o discurso do progresso industrial e a prática da destruição.
A ocupação e o processo civilizatório construíram mundos diferentes e desiguais, forjados pelas contradições do capitalismo. Neste contexto, o debate sobre o desenvolvimento vem sendo travado atualmente tanto nos países em estágio mais avançado como nos demais. Em relação aos primeiros, a questão centraliza em como manter seu crescimento sem esbarrar nos limites impostos pela questão da qualidade ambiental e social; aos demais, os desafios envolvem a afirmação de um desenvolvimento que considere o equilíbrio entre eficiência econômica, justiça social e prudência ecológica.
O pano de fundo é a consciência dos limites do crescimento e também da natureza, com destaque para o imperativo do desenvolvimento. O que está em questão é se o padrão adotado pelos países mais avançados poderá ser seguido pelos países em desenvolvimento. Em contraponto, a ocorrência do efeito leapfrogging, que significa a possibilidade de, no processo de desenvolvimento, uma determinada sociedade aprender com os erros de outras, saltando etapas (GOLDEMBERG; LUCON, 2012)2.
A correlação direta que há entre o padrão de desenvolvimento e os impactos ambientais dele decorrentes faz com que pesquisadores debatam e desenvolvam estudos e alternativas a fim de enfrentar os desafios de romper esta correlação em favor da superação de uma visão ingênua em que as questões ambientais são percebidas como uma restrição ao desenvolvimento e não como uma de suas dimensões (LA ROVERE, 2001).
Esta relação direta entre desenvolvimento e consumo de energia não se configura como indissolúvel,
(...) existem caminhos alternativos para o desenvolvimento da sociedade sem um aumento correspondente do consumo de energia. Em outras palavras, é possível desacoplar o crescimento econômico do consumo. As evidências são as seguintes: 1) histórica e 2) as comparações entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento (GOLDEMBERG; LUCON, 2012, p. 83)3.
Como visto, os efeitos dos impactos ambientais têm como fonte originária as emissões de dióxido de carbono, que, por definição, têm elevada conexão com a temática sobre energia. Desta forma, ao longo do tempo, a problemática decorrente das emissões de CO2 provocou a necessidade de se buscarem alternativas às energias fósseis. Entretanto, apesar do crescimento das energias não fósseis, a matriz mundial da oferta total de energia primária (dados de 2013) ainda se encontra dependente de fontes fósseis (81%), considerando carvão, petróleo e derivados e gás natural (Figura 3). Segundo IEA (2015a), esta porcentagem ficou relativamente inalterada nos últimos 42 anos.
Na Figura 3, observa-se que o predomínio da oferta mundial de energia de origem fóssil, em grande parte, é reflexo de realidades semelhantes em países como EUA, Japão, Brasil, Índia, China e Rússia, cujas matrizes energéticas são marcadas pela dominância de fontes produtoras de gases de efeito estufa. Podemos ainda ressaltar alguns aspectos relevantes: os países desenvolvidos dependem fortemente do petróleo (EUA e Japão), a China e a Índia têm sua matriz altamente poluente, a Rússia tem uma forte dependência ao gás natural e o Brasil utiliza bastante energia hidráulica e biocombustíveis (participação de 27% e 66%, respectivamente, dentro da categoria “Outros”).
Essa estrutura hegemônica da matriz de produção de energia, em nível global, que tem impactos significativos nas temperaturas globais, no aumento do nível dos oceanos e nos índices de carbono na atmosfera, mostra que a era do consumo sem consequência chegou ao fim. Assim, se está provado o limite, há alguns pressupostos que podemos assumir: o padrão de consumo dos países desenvolvidos não pode ser referência, considerando a necessidade do crescimento de um conjunto de países ainda subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. No mesmo sentido, é imperativo defender um mundo mais equilibrado do ponto de vista do desenvolvimento humano, daí a necessidade de pensar outro padrão de consumo que assegure a todas as pessoas a possibilidade do alcance de condições de dignidade humana, ou seja, o alcance de uma realidade em que haja uma distribuição mais equitativa de renda e do acesso aos bens (sociais e materiais).
Na próxima seção, será analisado o comportamento da emissão de CO2 em relação ao PIB nos países selecionados e no mundo nas últimas duas décadas, como também a intensidade energética, o coeficiente de dióxido de carbono e as relações entre energia e as variáveis que compõem o IDH.
3 Emissão de CO2 e crescimento econômico no mundo e nos países selecionados
Neste item, serão apresentados dados que relacionam a emissão de dióxido de carbono (CO2) e o PIB do mundo e dos países selecionados e, de forma breve, serão feitas também análises apoiadas em indicadores como intensidade de dióxido de carbono4, intensidade energética5 e coeficiente de dióxido de carbono6.
O principal objetivo, tendo como base a relação PIB e CO2, é realçar aspectos que configurem em singularidades, uma vez que escapam ao comportamento que tipifica a relação de acúmulo crescente, ao longo do tempo, dessas duas grandezas. A evolução do PIB e o aumento das emissões apresentam no intervalo considerado, semelhanças e diferenças entre os países selecionados, que repercutem no contexto mundial.
Ao longo da história, o aumento da produção sempre esteve acompanhado de maior consumo energético e, por conseguinte, de maior nível de emissão de CO2. Em apenas três momentos tivemos registros em que as emissões globais foram iguais ou menores que no ano anterior: a) início dos anos 1980, após o choque do petróleo; b) em 1992, com o fim da União Soviética, e c) em 2009, na crise financeira mundial (Tabela 1).
Momento | Ano/Emissão de CO2 mundial (em gigatoneladas) | |
1º momento | 197917,96 | 1980 17,78 |
2º momento | 199120,75 | 1992 20,70 |
3º momento | 200828,87 | 200928,32 |
Em seguida, apresentaremos as variações ocorridas no PIB e nas emissões no mundo e nos países selecionados para o período proposto.
3.1 Mundo
Na análise da Figura 4, a seguir, correspondente à relação PIB e CO2 do mundo no período de 1990 a 2014, percebe-se, à exceção de 20097 em que houve uma inflexão, que o produto econômico cresceu relativamente mais do que a produção de energia, com ganhos de eficiência no período. Crescimento quase linear do PIB, com uma variação de 87% no período e um aumento de 1,8% na emissão média anual de dióxido de carbono.
O aspecto mais relevante, no que se refere à Figura 4, é a ocorrência a partir de 2013 de uma quase estabilidade, em nível global, na emissão de CO2. Em 2013, as emissões foram de 32,07 Gtoe e de 32,13 Gtoe em 2014. Entretanto, registra-se uma expansão na produção mundial, o PIB mundial de 2013 para 2014, foram, respectivamente, 56.519 e 58.156 bilhões (por 2005 US$). Esta fuga do comportamento convencional, por razões ainda não totalmente elucidadas, pode significar o início de um processo que muitos estudiosos denominam como desacoplamento. A previsão de PIB e CO2 para o ano de 2015, com base em dados preliminares8, acentua a possibilidade do que poderá implicar quebra de um padrão estrutural que vem, desde a Revolução Industrial, sugerindo novas possibilidades nessa relação. Se confirmado este desacoplamento, outro importante debate se descortina, concernente aos países não desenvolvidos, uma vez que isso pode redefinir os caminhos para seu desenvolvimento.
O processo de desacoplamento, tomando como base as figuras 4 e 5, pode ser explicado mais pela variação da intensidade energética que pela variação do coeficiente de dióxido carbono, uma vez que este se manteve inalterado no período. Analisando a intensidade energética de forma dinâmica, ou seja, em uma série temporal de longo prazo, a Figura 5 mostra que ela muda com o tempo, como consequência dos efeitos combinados de alterações na estrutura do produto econômico, como também pela combinação das fontes de geração de energia, sua estrutura de consumo e na eficiência do seu uso final (GOLDEMBERG; LUCON, 2012). Uma eficiência energética maior não está relacionada apenas aos aspectos econômicos (relacionados a tecnologias mais eficientes), uma vez que as políticas de uso mais racional de energia podem contribuir significativamente para redução dos gases de efeito estufa.
3.2 Estados Unidos
As emissões de CO2 nos EUA revelam que, no período de 1990 a 2013, inicialmente, houve uma elevação; em seguida, observa-se uma redução acentuada de 2008 para 2009 (Figura 6), notadamente em função da crise econômica originada no ano anterior no país, com uma variação posterior ascendente, mas não retornando ao patamar anterior de 2008, como também não seguindo a tendência do PIB. Segundo o Departamento de Estado norte-americano, com base no Relatório de Ação Climática 20149, houve um aumento médio de 0,5% de emissão no período de 1990 a 2011, sendo que o país vem substituindo o uso do carvão pelo gás natural10, como também investindo em energia eólica, solar e geotérmica. Com base nos dados da Agência Internacional de Energia, observa-se que entre 1990 e 2013 houve uma redução de 16,7% de produção de carvão e um aumento de 21,4% na oferta total de energia não fóssil.
Ao observarmos a Figura 7, percebe-se que há uma discreta descarbonização e uma redução relativa na intensidade energética (-35%), o que confirma que países mais desenvolvidos atingem, ao longo do tempo, uma menor intensidade energética, pois, de acordo com Goldemberg & Lucon (2012), direcionam suas estruturas produtivas para atividades menos intensivas em energia e quase sempre menos poluentes. Este comportamento dos EUA aponta, de alguma forma, o potencial do país como determinante no possível desacoplamento iniciado, em nível global, registrado no item anterior.
3.3 China
A condição de país mais emissor de CO2 do mundo estabelece para a China singular responsabilidade no debate sobre a redução dos impactos ambientais relacionados à produção e ao consumo de energia. Há três fatores que justificam tal importância: o contingente populacional de 1,5 bilhão de habitantes; a elevada dinâmica econômica (país que mais cresceu no mundo nos últimos anos) e a sua matriz energética altamente poluente, o que configura um movimento de derivadas ascendentes em praticamente todo o intervalo representado na Figura 8. Como demonstrado na Figura 3, em 2013, apenas 12% de sua matriz era oriunda de fontes primárias não fósseis; os restantes (88%) vinham de matriz fóssil, com destaque à participação do carvão (67%), tornando-o mais intensivo na emissão de CO2.
No entanto, faz-se importante considerar as medidas mitigadoras que vêm sendo adotadas e anunciadas pelo país: o fechamento de minas de carvão, a maior geração de eletricidade em usinas hidrelétricas, eólicas e solares11, o aumento das reservas florestais do país em 4,5 bilhões de metros cúbicos em relação a 2005, como também o desafio de elevar a porcentagem de energia não fóssil no consumo primário a 20%, o que vem, neste último caso, justificando o aumento de investimento em energias renováveis. O mundo em desenvolvimento, incluindo China, Índia e Brasil, aumentou em 19% seus investimentos em renováveis de 2014 para 2015, e a China foi fundamental nesta reviravolta, na medida em que elevou seu investimento em 17% ou 36% do total mundial, em 201512.
Não há neste artigo a pretensão de uma exatidão em relação à contribuição da China no cenário mundo, mas certamente estas medidas supracitadas não podem ser desconsideradas em uma análise de cenário mundial futuro, haja vista aspectos que estão associados aos compromissos chineses nos próximos 15 anos.
Na China ocorreu um forte crescimento do PIB (Figura 8), mas com níveis de redução na intensidade energética13 (Figura 9) maiores que os dos países desenvolvidos, como EUA e Japão, sendo certo que esta redução se constitui importante estratégia associada à mundialização da manufatura chinesa, ou seja, há um menor dispêndio de energia por unidade de produto interno bruto e isso não se coloca em detrimento da importância da eficiência energética na questão da segurança energética. Chama atenção o destoante comportamento da economia chinesa14 no período da crise financeira de 2007-2008 dos EUA em relação aos demais países selecionados neste estudo, que tiveram redução na produção e nas emissões para este período.
3.4 Brasil
Apesar do aumento de 3,8% na emissão média anual de dióxido de carbono no período de 1990 a 2013, representado na Figura 10, as emissões brasileiras ainda são muito baixas quando comparadas com os países selecionados (Tabela 2). O país apresenta uma matriz energética bastante diferenciada, se comparada internacionalmente. A Figura 3 mostra o percentual elevado das fontes não fósseis na matriz de oferta de energia primária em 2013. Enquanto a matriz mundial é composta por 19% de combustíveis não fósseis, no Brasil esta participação é de 42%, enquanto que a participação dos combustíveis fósseis, em âmbito mundial, é de 81%, e no Brasil esse número é de 58%. Segundo Schutte (2014), este quadro foi resultado do esforço realizado para garantir condições de crescimento sem constrangimentos externos15.
Vale mencionar as elevações nas emissões de CO2 observadas na Figura 10 ocorridas nos períodos de 2001/2002 e de 2011/2013, que coincidem com as alterações relacionadas à produção de energia elétrica em função das crises hídricas e que implicaram o acionamento de usinas termoelétricas a gás, carvão e óleo e a redução da geração de energia originária das hidrelétricas.
Neste sentido, Schutte (2014) alerta que, mesmo diante do quadro favorável do Brasil, com matriz energética relativamente limpa, consumo per capita relativamente baixo e com uma redução sem precedentes na emissão de CO2, possa haver uma acomodação e o país perder a chance de consolidar sua posição de liderança no desafio por uma economia menos poluente.
No Brasil, como de um modo geral, mesmo diante de aspectos positivos no que diz respeito a uma baixa emissão de CO2, por exemplo, quando fazemos referência ao potencial de geração da matriz hidrelétrica, há um enorme caminho ainda a ser trilhado em direção à produção e ao consumo de energia que sejam menos comprometedores ao meio ambiente. Evidentemente, que são caminhos que devem ser inseridos como prioridades nas políticas públicas relacionadas ao planejamento energético.
A energia elétrica representa sempre uma parte da oferta da energia e, no caso brasileiro, o principal problema que envolve a questão da emissão de CO2 se relaciona ao setor de transportes, que se transformou em um dos maiores responsáveis pelas emissões de gás de efeito estufa. Assim, o alerta faz sentido, pois não cabe acomodação, de nenhuma natureza, que seja referente à matriz elétrica que vem sofrendo alterações em face à redução dos níveis dos reservatórios, como também na questão apontada do setor de transporte.
Do ponto de vista da relação PIB e CO2, observa-se, na Figura 10, um comportamento típico em relação ao uso de energia para produção de sua riqueza, com variáveis intrinsecamente relacionadas. O coeficiente de dióxido de carbono (Figura 11) confirma que a matriz de oferta energética brasileira é menos poluente que as dos países em estudo e, pelas oscilações no período estudado, a intensidade energética representada na Figura 11 sugere que ela não resulta de medidas orientadas por um ordenamento mais constante.
3.5 Rússia
No início da década de 1990, após a crise que levou à dissolução da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a Rússia sofreu oito anos consecutivos de crescimento negativo do PIB e, somente a partir de 1999, seu PIB passa a ter seguidas taxas positivas de crescimento, embora registrando uma acentuada queda em 2009, em decorrência da crise mundial. A partir de 2010, há uma mudança de tendência do PIB russo que volta a subir como mostra a Figura 12. Quanto às emissões de CO2, observa-se que, a partir de 1990, caíram continuamente até 1998 e a partir do ano seguinte, essa tendência de queda se inverteu, concomitantemente com o início de sua recuperação econômica. Entre 1999 e 2013, as emissões de CO2 cresceram em média 0,4% ao ano. Em 2013, em termos percentuais, a Rússia foi o único país dos selecionados que apresentou redução significativa da emissão, com uma queda nas emissões de 28,6% (Tabela 2), posicionando-se neste ano como 14ª maior economia mundial.
Em termos de sua oferta de energia primária, as fontes fósseis representavam, em 2013, 91% desse total, com destaque para o gás natural (Figura 3).
De acordo com Lucon e Goldemberg (2009, p. 124), “... a Rússia desponta como uma potência energética, hoje apoiada especialmente em suas exportações de petróleo e gás natural” e reforçada também pela sua extensão geográfica e variação climática e de suas topografias que lhe proporcionam capacidade de transformar em uma superpotência de energias renováveis (TYNKKYNEN; AALTO, 2012, p. 98 apud COSTA, 2014, p.24). No entanto, um dos desafios da política energética consiste em estimular os investimentos em eficiência energética, pois boa parte da capacidade industrial do país foi instalada há décadas, e desse modo opera com equipamentos obsoletos e altamente ineficientes (CHARAP; SAFONOV, 2010, p. 140 apud COSTA, 2014, p.42). A Figura 13 mostra uma redução de 29% da intensidade energética no período, mas com uma relativa estabilização a partir de 2009.
3.6 Índia
A relação indiana PIB e CO2 mostra-se convencional. Trata-se de um país que apresenta dois fatores determinantes quando a questão envolve as emissões: seu contingente populacional e seu importante desempenho econômico.
Ainda que não seja desprezível a presença de combustíveis não fósseis na produção energética indiana (dados de 2013 apontam para 28%, vide Figura 3) este país vem elevando a emissão de CO2, uma vez que ao observar a Figura 15, no que pese a queda da intensidade energética, há um substantivo aumento do coeficiente de dióxido de carbono, o que pode também ser ratificado nas variações na oferta de energia primária com base no carvão, petróleo, e gás natural no período de 1990 a 2013, respectivamente, de 42%, 15% e 100%. Esta análise encontra respaldo em Lucon e Goldemberg (2009):
Nos países em desenvolvimento, onde o consumo per capita é pequeno, somente a eficiência energética não vai resolver o problema porque, em muitos casos, os serviços energéticos finais (iluminação, aquecimento, cocção, etc.) são ainda insuficientes. Assim, a produção e o consumo global de energia precisam aumentar para suprir essa demanda reprimida.
3.7 Japão
País que tem importância econômica elevada no cenário mundial, o Japão apresentou um crescimento relativamente pequeno, porém seu PIB permaneceu alto, com a manutenção de seu estado de bem-estar social e de sua paridade de compra, um resultado esperado de países avançados. Destaca-se atualmente por uma economia intensiva do ponto de vista das emissões, principalmente após o fechamento da Usina de Fukushima Daiichi, em 2011, quando foram desligados seus reatores (54 reatores desativados após o acidente de Fukushima, dos quais 6 reatores em Fukushima), o que impactou não apenas o meio ambiente, mas também o seu desempenho econômico, que pode ser observado pela relativa queda no PIB no ano de 2011.
Conforme dados da Agência Internacional de Energia, após o acidente de Fukushima, do ponto de vista do balanço energético, o Japão inicia um processo de drástica redução de produção de energia de fonte nuclear, compensada pelo aumento das importações de petróleo, gás natural e carvão. Assim, mesmo com campanha de racionamento de energia, foi inevitável o aumento da emissão de CO2, a partir de 2011 (Figuras 16 e 17). Quanto à intensidade energética, o Japão, como país desenvolvido, atingiu uma menor intensidade ao longo do período estudado.
3.8 Emissão de CO2 em função da população e do produto interno bruto
A emissão de CO2per capita apresenta diferenças importantes, o que reflete fatores que influenciam no comportamento das emissões, como hábitos de consumo quer sejam dos indivíduos, quer do sistema produtivo. Em termos de emissões per capita, houve diferentes variações por parte dos países selecionados, conforme representado na Figura 18. A China mais que triplicou suas emissões per capita, o que neste caso demonstra que o aumento da população refletiu no aumento das emissões, como também na Índia em que sua emissão per capita mais que dobrou. Entretanto, as emissões per capita diminuíram significativamente nos EUA (16%) e na Rússia (26%), apesar de estarem em estágios de desenvolvimento diferentes, enquanto que, no Brasil, o aumento foi expressivo (83%) e, relativamente moderado no Japão (14%).
Pela Figura 18, nota-se que todos os países selecionados, com exceção do Brasil, mostraram reduções de emissões por unidade do PIB no período de 1990 a 2013, sendo esta redução mais perceptível na China e na Rússia, seguida dos Estados Unidos.
Em se tratando das emissões em nível mundial, na Figura 18, cabe destaque o que descreve o Relatório (IEA, 2015a, p. 13):
Em nível global, as emissões de CO2 cresceram 56% entre 1990 e 2013. A decomposição simples pode ser usada para mostrar os principais fatores determinantes da tendência das emissões de CO2 no mundo. Globalmente, o crescimento econômico dissociou-se parcialmente do uso da energia, visto que a intensidade energética teve uma redução de 29% no período. No entanto, com uma intensidade de carbono praticamente inalterada da matriz energética, o crescimento conjunto da população (35%) e do PIB per capita (60%) levou a um aumento dramático nas emissões globais de CO2 entre 1990 e 2013 [tradução nossa].
País | Ranking Mundial 20131 | 1990 | 2013 | ∆1990/2013% |
Mundo | 20.623 | 32.190 | 56 | |
China | 1º | 2.184 | 8.977 | 311 |
EUA | 2º | 4.803 | 5.120 | 6,6 |
Índia | 3º | 534 | 1.869 | 249 |
Rússia | 4º | 2.163 | 1.543 | -28,6 |
Japão | 5º | 1.049 | 1.235 | 18 |
Brasil | 11º | 184 | 452 | 145 |
4 Consumo de energia e desenvolvimento
A energia está intrinsecamente relacionada à questão do crescimento econômico e ao desenvolvimento humano. Na medida em que se sustenta no consumo de energia, o progresso econômico, a princípio, impacta na geração de renda, emprego e, principalmente, no aumento da riqueza da sociedade como um todo, mas ao mesmo tempo, gera impactos ambientais.
Há uma visível diferença entre pobres e ricos quando consideramos os diferentes estágios de desenvolvimento dos países e, por conseguinte, as diversas formas como a energia é consumida. Os países desenvolvidos tendem a ter um padrão de consumo similar e orientar o uso da energia para o luxo, enquanto os países não desenvolvidos dependem da energia para atender suas necessidades básicas (cozimento do alimento, acesso a emprego, saúde, educação).
Regiões mais desenvolvidas consomem mais eletricidade por habitante, porém é possível perceber diferentes perfis de consumo num mesmo grupo de países (GOLDEMBERG; LUCON, 2012), como exemplifica a Figura 19, em que estão representados o mundo e 16 (dezesseis) países, sendo metade membros da OCDE e a outra metade os não membros, ou seja, dois grupos distintos no que se refere aos estágios de desenvolvimento. Percebe-se que não há um padrão típico no perfil de consumo entre os países; há outros fatores que impactam no consumo das nações, como também o fato de existirem países cuja distribuição de renda apresenta-se mais concentrada, ou o inverso, e que retratam dois mundos muito diferentes em um mesmo país: uma minoria que concentra a maior da renda do país e uma grande maioria pobre, o que influencia nas necessidades, aspirações e formas de vida da população.
O consumo de energia também pode apresentar uma associação com indicadores sociais, como taxas de mortalidade infantil e de alfabetização. Para Goldemberg e Lucon (2012), o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)17 é o mais usado quando se quer estudar estas correlações. No entanto, os mesmos autores recomendam cautela no uso deste índice, em função das mudanças de metodologia de cálculo ocorridas ao longo do tempo, mas mesmo assim, reconhecem que o IDH pode identificar uma melhora ou não das regiões em um determinado período de tempo, conforme ilustra a Figura 20.
Com base em Goldemberg e Lucon (2012), abordaremos a relação entre energia e desenvolvimento a partir das variáveis: consumo de energia primária per capita e os indicadores que compõem o IDH para os países selecionados, tendo como referência o ano de 2013.
A Figura 21 apresenta o IDH como função do consumo de energia primária total per capita. Para os países selecionados e para o ano de 2013, um consumo de energia acima de 2,5 tep por pessoa pode ser considerado uma quantidade de energia mínima necessária para garantir um nível de vida confortável, proporcionando ao país um IDH próximo a 0,8. Vale destacar que tanto o Japão quanto os EUA apresentam IDH semelhantes, mas com o consumo de energia diferenciado entre os dois países, o que se explica por o Japão priorizar setores econômicos menos intensivos em energia.
A Figura 22 apresenta o IDH como função do consumo de eletricidade (em Kwh) per capita, em que o nível de correlação parece mais ajustado. Os países com IDH alto (EUA e Japão) possuem um consumo de eletricidade acima de 8.000 kWh por pessoa no ano aproximadamente. No caso da China e da Rússia, as variáveis consumo de eletricidade e IDH apresentam-se mais correlacionadas.
A Figura 23 apresenta a renda em função do consumo de energia primária total per capita. Um baixo consumo de energia não é o único indicador de um quadro de subdesenvolvimento, mas certamente contribui bastante para indicar um quadro de educação insatisfatória e atendimento inadequado da saúde, por exemplo. À medida que o consumo de energia primária per capita aumenta para acima de 2 tep (ou mais), as condições sociais melhoram de forma considerável (GUTEMBERG; LUCON, 2012).
Cabe mencionar que estes indicadores são referências, mas não podem ser analisados de forma linear. Há fatores culturais, históricos, perfil da indústria, as tecnologias, as condições climáticas, o ambiente natural que influenciam no desenvolvimento do país, no nível de renda ou no perfil de consumo de energia. Pode haver países, por exemplo, com o mesmo IDH (como é o caso da China e da Rússia, para o ano de 2013), mas com renda per capita diferente e também níveis de consumo de energia diferenciados. Por outro lado, Dai, Zhang e Huang (2016) falam também a respeito de uma diferença de intensidade energética do grupo de países dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e países desenvolvidos. Assim, a utilização de novas tecnologias e novas políticas deveria ser fortalecida nesse grupo de países de forma a auxiliar o desenvolvimento.
5 Considerações Finais
A consciência de que os limites do crescimento está diretamente relacionada à capacidade da natureza em assegurar os insumos e as matérias-primas indispensáveis ao desenvolvimento no padrão vigente, emerge em um tempo marcado por um mundo profundamente desigual. Diante desta correlação, desenvolvimento e degradação ambiental, ao menos uma questão se coloca: estariam os países subdesenvolvidos, os países mais jovens, os países emergentes condenados a uma situação de estagnação permanente em relação aos mais avançados?
Em contraponto à questão, este artigo traz elementos com objetivo em contribuir para o debate sobre as alternativas possíveis para um desenvolvimento menos intensivo em emissões de CO2.
Para tanto, analisamos o comportamento do mundo e de seis países: os Estados Unidos, o Japão, o Brasil, a China, a Índia e a Rússia com base na correlação de variáveis determinantes na relação PIB e emissão de CO2. Em relação aos países selecionados, cabe destaque o fato de somarem expressiva participação na produção mundial na mesma medida da emissão de CO2.
A principal constatação foi a alteração de direção dos vetores produto interno bruto e emissão de CO2 no mundo no período de 2013/2014, com forte indício de desacoplamento. Tudo indica que este crescimento mundial desacoplado da emissão de CO2 (em um cenário win-win) no mundo esteja associado a importantes iniciativas voltadas para a redução da intensidade energética e do coeficiente de dióxido de carbono nos países estudados no período de 1990/2013. Confirmado o desacoplamento em cenário futuro, desponta-se uma oportunidade de crescimento para os países em desenvolvimento com base em um padrão menos intensivo no uso dos recursos naturais, o que não exclui a responsabilidade, no mesmo sentido, dos países desenvolvidos, a fim de se alcançar um desenvolvimento mundial mais homogêneo. Neste contexto, cabe observar que as dimensões globais das pressões ambientais no que se refere ao desafio da redução das emissões devam ser assimiladas por meio de políticas ambientais mais eficientes por todos os países.
A prova deste evento (desacoplamento) não está desvinculada do movimento que se estabeleceu quando os países resolveram enfrentar de forma mais direta os problemas dos impactos ambientais, em destaque, o acúmulo dos gases de efeito estufa. Sendo assim, é fundamental que os acordos não se façam apenas em uma perspectiva formal, uma vez que cabe aos países agir de forma legítima em nome de um uso mais racional da energia. No que concerne aos acordos feitos até hoje, mesmo que se possa discutir a sua efetividade, não se pode minimizar sua importância política, até porque o que se faz muitas vezes a título diplomático, seguramente repercute pedagogicamente para toda a população, na perspectiva do empoderamento, pois as pessoas começam a se colocar neste contexto e no exercício da cidadania, cobrando a fuga do limite protocolar desses compromissos.
É fundamental intensificar o compromisso dos países em alterar a relação entre crescimento econômico e emissão de dióxido de carbono em benefício do desacoplamento desde o planejamento energético. Para tanto, é necessário que sejam projetadas, nesta etapa, soluções que reduzam a dependência excessiva das fontes poluentes e viabilizem tecnológica, econômica e funcionalmente o uso de fontes limpas a fim de reduzir o coeficiente de emissão de CO2. Neste caso, em prol de um melhor resultado para o meio ambiente, é imprescindível somar, obrigatoriamente, a opção pelas fontes limpas e a edição de normas e regulamentos que potencializem mudanças de hábitos e comportamentos com vistas ao declínio da intensidade energética, ou seja, iniciativas em favor da eficiência e contração do desperdício.
A expansão da economia mundial gerou mundos diferentes e desiguais: de um lado, uma grande massa que não dispõe de energia capaz de atender suas necessidades básicas; de outro, uma elite que se habituou ao luxo e ao desperdício de energia em forma de exagero, por exemplo, no tamanho dos automóveis e na quantidade de eletrodomésticos.
Assim, a possibilidade de que países em desenvolvimento possam incorporar novos padrões de desenvolvimento requer que países desenvolvidos revejam os seus. É visível, no comportamento tradicional, que a busca permanente do crescimento econômico, que implica o uso cada vez maior de novas tecnologias, novos produtos e processos, gera, como consequência, a necessidade de mais energia. Também se deve ressaltar o custo social em buscar incessantemente o aumento da oferta de energia, pois os recursos investidos para o aumento da energia provocam um efeito negativo sobre o desenvolvimento, na medida em que são de grande monta e normalmente ficam imobilizados por um longo tempo, o que significa indisponibilidade para investimentos em outras prioridades como educação e saúde.
Por fim, não podemos desconsiderar que temos ainda um mundo muito desigual, de modo que é justo e necessário que uma parte se desenvolva e, na mesma medida, é necessário que se alterem os padrões que guiaram a sociedade após a era industrial até os dias atuais. Nesse contexto, na relação entre as nações, cabem o compromisso e a solidariedade de reconhecer os diferentes estágios de desenvolvimento em relação ao acesso de bens, ou seja, a redução das emissões não pode desconsiderar a necessidade real de crescimento de uma parcela de países que ainda se encontram em condições desiguais. Seja pelo aumento da população ou pela necessidade de provimento de uma estrutura que dê dignidade e condições efetivas de vida, estes países têm que crescer, o que implica, portanto, maior consumo de energia. Entretanto, se este consumo continuar nos mesmos padrões dos países desenvolvidos, o mundo não o suportará. Portanto, o grande desafio constitui-se em prover as necessidades com vistas ao desenvolvimento que tem como objetivo maior assegurar a dignidade humana dos países do terceiro mundo.
Referências
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Notas
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